O PCP considerou esta sexta-feira “inconstitucional” a proposta do Governo, aprovada em Conselho de Ministros, e que conta com o aval do PS, que pretende dar aos serviços secretos a possibilidade de aceder a meta dados, isto é, a dados de faturação telefónica e de localização dos cidadãos. Segundo o deputado comunista António Filipe, tal reforço dos poderes das secretas viola “gravemente” a Constituição, uma vez que a competência de aceder a dados pessoais pertence apenas às autoridades judiciais.

“A proposta do Governo propõe que os serviços de informações possam ter acesso a meta dados, ou seja, dados de faturação telefónica e de localização dos cidadãos. Ora, essa possibilidade dada aos serviços de informações afigura-se notoriamente inconstitucional na medida em que a Constituição só permite que haja qualquer intromissão nas comunicações em sede de investigação criminal”, disse o deputado aos jornalistas, falando nos Passos Perdidos no Parlamento.

Acontece que os serviços de informação “não fazem nem podem fazer investigação criminal”, sublinhou, lembrando que essa é uma função unicamente das autoridades judiciais e dos órgãos de polícia criminal. Trata-se de um “grave atentado aos “direitos, liberdades e garantias públicas” que se tem escondido no “pretexto do combate ao terrorismo”, disse.

“Portanto, estamos perante um reforço inconstitucional que o Governo pretende levar a cabo nos serviços de informações e que é extremamente grave, porque, de facto, representa um grave atentado às liberdades públicas. Para mais, este diploma é apresentado num momento em que o sistema de fiscalização democrática dos serviços de informações está manifestamente desacreditado. A somar à falta de fiscalização democrática, somos agora confrontados com uma proposta do Governo no sentido de reforçar poderes de forma inconstitucional e em grave violação dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos”, criticou.

Segundo o deputado comunista, o facto de os chamados meta dados dizerem respeito ao registo do tráfego de comunicações, dados bancários e fiscais, e não ao conteúdo dos dados propriamente dito não é relevante, uma vez que o regime em Portugal é idêntico para os dois caos – dos dados de tráfego e das escutas – e para ambos os casos é “exigido o mesmo tipo de autorização judicial”.

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Sobre outros aspetos a realçar do teor da proposta de alteração legislativa do Governo, o coordenador do PCP para os Assuntos Constitucionais destacou ainda o facto de a fusão dos serviços de informação evidenciar uma “concentração de poder não desejável” e um “reforço da blindagem” das secretas, para além de conceder um “estatuto especialíssimo” ao funcionário das secretas, nomeadamente em termos remuneratórios.

António Filipe lamentou ainda que a proposta do Governo de alteração à lei-quadro do SIRP conte aparentemente com o apoio do PS, dizendo que, se isso se confirmar, como de resto se tem confirmado na generalidade das propostas sobre o tema das secretas, então é “profundamente lamentável” e “extraordinariamente grave”. “Mas o PS terá de responder pelas suas decisões”, sublinhou. Com o apoio do PS e dos partidos da maioria, a proposta do Governo passará no Parlamento com uma ampla maioria de dois terços.

Nessa lógica, e demarcando-se completamente da proposta do Governo, António Filipe anunciou que na segunda-feira o PCP irá avançar com um projeto de lei de alteração à lei-quadro das secretas, no sentido de reforçar os poderes de fiscalização da atuação dos Serviços de Informações da República Portuguesa. A ideia é, disse, que o projeto do PCP seja debatido, por arrastamento, no mesmo dia em que for feito o debate da proposta do Governo.