O futebol alemão até pode ser o preferido de Sérgio Conceição, que admite não ficar “sonolento” quando vê os encontros da Bundesliga, mas não há nada como a Serie A para o técnico que fez carreira depois de crescer no FC Porto em clubes como Lazio, Inter ou Parma. “Tenho uma paixão grande por Itália, isso sim, porque passei os anos mais bonitos da minha carreira como jogador em Roma, Milão ou Parma”, explicara o técnico na antevisão da segunda mão dos oitavos da Champions. E se tinha uma história com os transalpinos dentro de campo, não fugia também a isso fora dele. Uma história que, muito provavelmente, mesmo não querendo falar sobre isso agora, lhe poderá mais tarde abrir portas num dia em que queira treinar no calcio.

Tentar tudo não chegou: FC Porto cai nos oitavos da Champions após empatar sem golos com Inter

Quando cumpriu os primeiros 1.000 dias ao leme do FC Porto, e entre todos os desafios que tinha enfrentado no comando técnico dos dragões, Sérgio Conceição destacava sobretudo um encontro em termos europeus na lista dos melhores, no caso o triunfo frente ao RB Leipzig por 3-1. “Acho que em termos táticos foi a vitória mais bonita. Foi um jogo fabuloso da minha equipa, que interpretou quase na perfeição o que preparámos. Foi o jogo mais bonito, não na beleza estética, mas na tática. Quem percebe de futebol sabe o que estou a dizer, a forma como o FC Porto desmontou a estratégia do RB Leipzig dentro do encaixe existente foi algo espetacular”, frisou. No entanto, era o histórico com os italianos que mais se destacava faltando apenas o Inter para fazer bingo no top 5 extra Nápoles no Dragão: 3-1 à Roma nos oitavos da Champions de 2018/19, 2-1 à Juventus nos oitavos da Champions de 2020/21, 1-0 ao AC Milan na fase de grupos da Champions de 2021/22 e 2-1 à Lazio no playoff de acesso aos oitavos da Liga Europa de 2021/22.

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Questão 1: como dar a volta à desvantagem mínima trazida de Milão? “É um jogo entre as mesmas equipas mas não será igual. Dentro da estrutura do Inter, depende dos jogadores que jogarem, que torna a equipa diferente na forma como ataca e como defende. O que será o jogo depende do que nós fizermos ou para onde queremos estrategicamente levar as coisas. Penso que será equilibrado, muito difícil. Temos noção das dificuldades e sabemos o que somos capazes de fazer. Queremos ser uma equipa intensa, dentro das nossas características, pressionante e inteligente no jogo. Não nos podemos esquecer que estamos a meio da eliminatória e a perder”, defendera o técnico dos azuis e brancos, pedindo em paralelo que a vontade de marcar golos não atraiçoasse a organização habitual da equipa com e sem bola no plano defensivo.

Questão 2: como conseguir a reviravolta sem as presenças de Otávio e João Mário na equipa? “Tem a ver com a estratégia definida para o jogo. Num plano defensivo é preciso perceber que o Inter tem muita gente pelo centro, no corredor central tem oito jogadores. Temos de preparar o jogo de acordo com o que penso que é o melhor para nós. Nestes encontros temos de jogar da forma como estamos mais confortáveis, caso contrário as coisas podem não correr tão bem. Podemos jogar com três médios, pode ser um segundo avançado ou um terceiro médio… Depende da forma como vamos apresentar o jogo. Estamos a meio de um jogo, temos 90 minutos para virar este resultado e temos de ser inteligentes”, reforçara Sérgio Conceição.

A única abordagem que o antigo extremo nos tempos de jogador fintou foi mesmo a possibilidade de esta ser mais uma eliminatória e uma eventual passagem que abrisse as portas de ligas superiores como a Serie A. “Não penso nisso, o meu crescimento e o da minha equipa técnica tem a ver com os desafios que vamos tendo diariamente, com mudança de jogadores no nosso plantel, ano após ano. Temos de fugir àquilo que gosto como sistema de jogo e ir à procura de outras situações. É isso que faz com que o treinador cresça e eu quero crescer, quero aprender todos os dias até ao fim da minha vida. Ninguém sabe tudo. Saber é maravilhoso, até com um tratador da relva aprendemos. Música para este jogo? Depende dos ouvintes. Gostamos de fazer 70 passes ou de chegar à baliza em apenas dois ou três? Para mim é mais bonita essa forma, para outros há de ser outra. Do que vou conhecendo dos adeptos, eles querem é ganhar, seja com bombo, ópera ou concertina. É assim para mim”, destacara numa versão 2.0 da história do ganhar com “nota artística”.

Houve um pouco de tudo do bombo à concertina, Grujic foi um pouco de tudo entre o bombo e a concertina. Tão depressa carregava a equipa para a frente a tomar conta do meio-campo como jogador com mais duelos ganhos e bolas recuperadas no terreno contrário como ia com classe assistir os companheiros perto da área ou mesmo arriscar o remate. O último do jogo, também esse, pertenceu-lhe. E foi um gesto daqueles que parecem ópera, com um toque de tal forma artístico e colocado que fez a bola bater na trave e sair. Apesar de toda a pressão, apesar de todos os remates e apesar de todo o risco assumido sobretudo nos minutos finais, nada foi suficiente para furar a muralha transalpina e possibilitar a terceira passagem aos quartos da Liga dos Campeões em seis anos de Sérgio Conceição. Grujic, esse, acabou a chorar. Mas só pode fazê-lo de cabeça levantada porque a exibição que fez foi uma das melhores desde que chegou aos azuis e brancos.

Sem João Mário (lesionado), Otávio (castigado) e a baixa de última hora de Pepe, Sérgio Conceição apostou numa espécie de 4x3x3 dinâmico e assimétrico para encaixar nesse reforço do corredor central transalpino sem deixar de fazer prevalecer os seus pontos fortes. Assim, com Galeno aberto na esquerda e Evanilson ou Eustáquio a caírem na direita como falsos alas para permitirem que Pepê desse a profundidade enquanto iam fazendo movimentos para dentro, foi o meio-campo que assumiu a posição de barómetro de toda a equipa e foi do meio-campo que chegou a primeira grande ameaça à baliza de Onana, com Uribe a arriscar a sorte grande com um remate a 30 metros que passou muito perto do poste ainda com um ligeiro desvio (3′). Entre a paragem mais demorada para assistir Evanilson e a postura mais recuada dos transalpinos, esse seria o único sinal de perigo em 15 minutos entre um FC Porto com mais bola mas sem velocidade de processos.

Quando os azuis e brancos em bloco conseguiam subir as zonas de pressão para condicionarem a saída do Inter pelos centrais mais abertos, conseguiam provocar erros e foi dessa forma que Eustáquio ganhou espaço para testar também a meia distância para uma defesa apertada de Onana (19′). Quando essa subida de linhas não funcionava de forma mecânica e Barella ganhava o espaço nas costas dos médios, o Inter conseguia sair com muito perigo como aconteceu pouco depois numa vantagem numérica de 3×2 que terminou com Diogo Costa a tirar o golo a Dzeko (21′). Mas havia mais movimentos capazes de deixar os transalpinos em apuros como as variações rápidas após trocas de bola curtas, falhando depois a finalização desta vez por Taremi (28′). Çalhanoglu era uma sombra do que é habitual, o ataque contrário tinha pouca bola mas ainda havia pouca definição no último terço para o FC Porto desafiar a oportunidade de empatar as contas.

Simone Inzaghi tinha mesmo dado instruções à equipa para sair apenas pela certa, não tendo problemas em baixar linhas para trás do meio-campo sempre que o FC Porto passava as primeiras zonas de pressão. Mas havia uma tónica incontornável na partida: quando os azuis e brancos se conseguiram instalar até sem posse na frente e quando colocavam uma maior agressividade na reação à perda, criava perigo como voltou mais uma vez a suceder num lance em que Dimarco teve um corte salvador para canto quando o remate cruzado de Evanilson seguia com selo de golo para a baliza (39′). Ainda houve mais uma tentativa quase sem ângulo de Lautaro Martínez para defesa de Diogo Costa e um cruzamento de Pepê na direita que por pouco não encontrou Eustáquio ao primeiro poste mas o intervalo chegaria ainda com o nulo apesar do domínio dos azuis e brancos a todos os níveis. Era isso que faltava, o golo. E com as mesmas opções iniciais.

O início do segundo tempo foi tirado quase a papel químico do arranque do jogo, com Uribe a subir uns metros, a ganhar uma segunda bola e a rematar forte mas ao lado da baliza de Onana (47′). E houve ainda mais minutos em que o FC Porto conseguiu instalar-se em posse no meio-campo contrário, sem com isso ter capacidade para criar grandes oportunidades. Aliás, esse seria o principal problema dos azuis e brancos, que viam os minutos passar sem chegar com perigo à tentativa de golo que empatasse a eliminatória numa fase em que os transalpinos perdiam ainda mais a capacidade (ou vontade) de saída. Sérgio Conceição tinha de mexer e arriscar mais, apostando em André Franco para dar critério em posse e em Toni Martínez para emprestar outra agressividade à frente de ataque que tinha um Evanilson em claro desgaste físico (71′).

Não era apenas o avançado brasileiro que dava sinais de quebra e o FC Porto muitas vezes já tentava com as pernas a não corresponderem ao que a cabeça pedia. Também por isso, e até aos instantes finais em que Danny Loader e Wendell foram para jogo, Grujic (75′) e Galeno (84′) tiveram remates à baliza italiana mas para defesas não muito complicadas de Onana, que entretanto ia aderindo à moda de perder mais uns segundos sempre que possível caindo no chão como se tivesse feito a maior intervenção da carreira. O risco passaria a ser total até perante a falta de vontade nerazzurri em “matar” a partida com um golo mas, tirando um cabeceamento por cima de Danny Loader (90+1′) e um pontapé em semi bicicleta de Toni Martínez (90+3′), era bem maior a vontade do que o proveito até ao minuto de loucos em que Taremi atirou de cabeça ao poste ainda com defesa de Onana e Grujic acertou logo de seguida em cheio na trave (90+5′).