No dia da inauguração do Vale dos Caídos, o arquiteto que finalizou a obra, Diego Méndez, fez questão de apresentá-la a sós a Francisco Franco. Durante a visita pela qual o ditador tanto ansiou, o arquiteto levou-o até à basílica, onde, à altura, já se encontrava a campa de José Antonio Primo de Rivera, chefe da Falange e fuzilado por republicanos no início da Guerra Civil de Espanha. Ali chegados, Franco pediu a atenção do arquiteto e disse-lhe: “Bom, Méndez, quando o dia chegar, eu fico aqui, sim?”.
O relato deste momento, feito pelo próprio arquiteto ao escritor Daniel Sueiro para o livro La verdadera historia del Valle de los Caídos, não é consensual. Na verdade, não há nenhum documento onde Franco dê qualquer tipo de indicações quanto ao seu enterro. No seu testamento, pede apenas para ser enterrado consoante a fé católica. “A minha vontade constante é a de ser um filho fiel da Igreja, em cujo seio vou morrer”, escreveu, num documento tornado público postumamente.
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O tal “dia” de que Franco terá falado ao arquiteto chegou a 20 de novembro de 1975. Dois dias depois, com a morte do ditador, Juan Carlos tornou-se Rei de Espanha e tomou uma das suas primeiras medidas: pedir ao abade responsável pela basílica que pusesse em marcha os procedimentos para enterrar Franco no “sepulcro destinado a esse efeito, no presbitério entre o altar maior e o coro da basílica”. Foi um momento de viragem. Assim acabou a ditadura franquista e começou a Transição, cujo ponto de consolidação foi a aprovação da Constituição de 1978. Porém, para muitos espanhóis, é um tema longe de estar encerrado.
O Vale dos Caídos — e, em particular, a campa onde jaz o corpo embalsamado de Franco — está no centro deste debate reavivado pelo recém-empossado Governo de Pedro Sánchez. Na sexta-feira passada, dois meses depois de ter feito essa promessa, o executivo socialista avançou com um decreto-lei que altera a Lei da Memória Histórica, de maneira a que esta permita inequivocamente a exumação de Franco.
“Não há uma só razão de fundo para que a democracia espanhola não tome esta decisão. Não podemos cumprir o aniversário dos 40 anos da Constituição [celebrado a 6 de dezembro deste ano] sem ter isto feito. Foram muitos anos em que se abandonou uma questão muito importante para a dignidade deste país. Nenhum país que se sinta digno consigo próprio, nenhuma democracia à nossa volta manteve uma situação destas durante 40 anos”, disse, na sexta-feira de manhã, a vice-Presidente de Governo, Carmen Calvo, depois da reunião do Conselho de Ministros.
A número dois de Pedro Sánchez informou ainda que a 31 de agosto vão ser iniciados os trâmites para levar a cabo a exumação de Franco. Um dos primeiros passos será contactar a família do ditador, representada pelos seus sete netos. A estes, será dado um prazo de 15 dias para que respondam em que sítio pretendem enterrar os restos mortais do seu avô. Se não chegarem a acordo ou não responderem, o Governo passa a poder decidir o destino final do cadáver de Franco. Carmen Calvo sublinhou que a escolha passaria por um local “digno e respeitoso”.
O decreto-lei terá ainda de ser aprovado no Congresso dos Deputados, num prazo de 30 dias. No entanto, é sabido que os socialistas já reuniram os apoios necessários, sobrando apenas a abstenção do Partido Popular (PP) e do Ciudadanos. Já em 2017, o Congresso dos Deputados tinha aprovado uma moção a favor da exumação do ditador espanhol. Na altura, o Governo de Mariano Rajoy fechou os olhos a esse pedido. Agora, já com os socialistas no poder, Franco deverá mesmo sair do Vale dos Caídos. Ainda não há data para retirar dali os restos mortais do ditador, mas isso pode acontecer já em setembro. Tudo deverá ser feito em segredo, para evitar protestos.
Ainda assim, não será tarefa fácil. Já depois da decisão do Conselho de Ministros, a família de Franco anunciou que vai recorrer à justiça para impedir que o corpo seja retirado do local onde foi enterrado.
Família de Franco anuncia recursos legais para impedir exumação do ditador
“Franco não é Hitler”
Quase 43 anos depois da morte de Franco, a sepultura do ditador continua a não ser consensual em Espanha. As sondagens não são claras e apontam em direções opostas, como acontece com as duas que foram feitas depois de, a 26 de junho, Pedro Sánchez ter dito que a exumação de Franco era para avançar.
Em julho, o El Mundo publicou uma sondagem da Sigma Dos com uma ténue maioria que dizia ser a favor da exumação de Franco (40,9% contra 38,5%), mas onde, ao mesmo tempo, 54,3% dos inquiridos dizia que esta é uma má altura para fazê-lo, contra 34,4% que dizia que era o momento adequado. Também em julho, numa sondagem da Invymark publicada pelo canal La Sexta, 56,4% dos inquiridos disse ser a favor da exumação de Franco e 33,8% respondeu que eram contra.
Entre a incerteza que as sondagens transmitem há, ainda assim, algo que fica claro nas duas: quem votou na direita e no centro-direita (Partido Popular e Ciudadanos) não quer que a exumação aconteça; e quem votou na esquerda e no centro-esquerda (PSOE e Unidos Podemos) quer retirar Franco do Vale dos Caídos.
“No fundo, a esquerda pensa que a democracia espanhola está contaminada desde a sua origem. É a nostalgia de uma rutura que não se fez”, diz ao Observador Charles Powell, historiador e professor na Universidade CEU San Pablo, em Madrid.
Charles Powell diz que é “partidário” da retirada de Franco do Vale dos Caídos, mas entende que “tudo é discutível”. “É insólito ver que há um ditador num monumento desde o século XX, sim, mas só em parte”, diz. No debate que tem sido feito nos últimos dois meses, para o qual têm contribuído historiadores de diferentes sensibilidades políticas, as comparações a outros ditadores europeus têm sido frequentes. Hitler é, por norma, mais referido. Aí, Charles Powell é frontal: “Franco não é Hitler”.
“Há duas formas de olhar para Franco. Uma é aquela em que se diz: ‘Que barbaridade, esse senhor descende de Hitler’. A outra é: ‘Este senhor foi ditador de uma economia que cresceu a uma média de 7% e que deu serviços de saúde e educação a pessoas que nunca tinham tido nada disso’”, contrapõe o historiador. “Ele foi tanto um ditador que cometeu atrocidades durante e depois da Guerra Civil, como foi o homem que levou ao milagre económico dos anos 60, que abriu o país ao Ocidente, que criou o turismo. O regime de Franco conseguiu ter um equilíbrio entre sombras e luzes.”
Num e-mail enviado ao Observador, o historiador Julián Casanova, da Universidade de Saragoça, defende a exumação de Franco o quanto antes. “A continuidade da sua campa, com os seus restos, nesse lugar que é um símbolo da sobrevivência dessa longa e cruel ditadura, não deve manter-se”, diz. “Deve ser exumado.”
Já Pío Moa, historiador conhecido pela sua defesa do franquismo, lançou uma campanha apelidada de “Manifesto Católico Contra a Profanação da Campa de Franco”. A 10 de agosto, esta iniciativa tinha o objetivo de chegar às 100 mil assinaturas, mas, à hora a que este artigo foi escrito, não passava das 4 mil.
No texto que dá a base ao manifesto, Pío Moa escreve que os católicos “têm a obrigação moral e política de reconhecer a importância histórica de Francisco Franco no salvamento da Igreja e da cultura cristã”, aludindo à perseguição do clero levada a cabo pelos republicanos. Durante a 2.ª República, foram mortos 4.184 sacerdotes, 2.365 frades, 283 monges, 13 bispos e mais de 3 mil fiéis.
“As atrocidades foram cometidas pelos dois lados”, resume Charles Powell. No entanto, apesar de ter sido concebido já depois do fim da guerra, na hora de escolher qual lado queria homenagear o Vale dos Caídos pendeu claramente para um deles.
Um monumento que foi uma “obsessão” de Franco
Logo quando foi anunciado, ficou claro que, ao invés de ser um monumento destinado a pôr um ponto final na barbárie daqueles três anos de guerra, o Vale dos Caídos tinha na sua génese uma ideia que em nada condiz com a “convivência democrática” que, a partir de 1978, passaria a estar consagrada no segundo parágrafo da Constituição de Espanha.
Essa certeza ficou patente logo no discurso onde, em 1940, Franco anunciava a construção daquele monumento. Nele, falava claramente numa lógica de celebração dos vitoriosos da Guerra Civil de Espanha contra os derrotados. “A dimensão da nossa cruzada, os sacrifícios heróicos que a vitória encerra e a transcendência que esta epopeia teve para o futuro de Espanha não podem ser perpetuados pelos monumentos simples que as vilas e as cidades têm para comemorar a nossa história e os episódios gloriosos dos seus filhos. É necessário que as pedras que levantem tenham a grandeza dos monumentos antigos, que desafiem o tempo e o esquecimento”, disse o ditador.
Em Franco, Caudillo de España, a biografia do ditador espanhol da autoria de Paul Preston, o autor britânico, e um dos historiadores mais aclamados da Guerra Civil de Espanha, escreve que durante os anos em que a construção do Vale dos Caídos se prolongou (ao início previa-se que a obra estivesse concluída em apenas um ano, mas acabou por levar duas décadas para ser finalizada) foi a “maior obsessão privada de Franco, a seguir à caça”. “Diz-se que o Valle dos Caídos chegou a ser o mais próximo que o Generalíssimo teve de uma ‘outra mulher’”, lê-se no livro. Ao todo custou 20 milhões de pesetas, apesar de ali terem trabalhado 20 mil presos políticos, em grupos que foram apelidados de “brigadas penais” e “batalhões de castigo”. A maior parte eram prisioneiros que combateram pelos republicanos na Guerra Civil.
Se no discurso de anúncio da obra Franco já tinha sido claro ao distinguir vencedores de vencidos, na proclamação que fez na inauguração foi ainda mais evidente. Sem demonstrar preocupação em unir os dois lados que a guerra separou, Franco preferiu fazer um discurso que Paul Preston classificou como “triunfal e vingativo”.
Nele, enalteceu os feitos dos combatentes franquistas, que obrigaram o seu inimigo a “morder o pó da derrota” e celebrou os “sacrifícios e heroísmos” que os seus soldados mantiveram nas “nossas linhas”. Além disso, deixou vários alertas para a necessidade de um lado se manter alerta em relação ao outro. “A anti-Espanha foi vencida e derrotada, mas não está morta.”
“Um defeito do nosso caráter é o de realizar grandes esforços para depois nos deixarmos cair na permissividade e na confiança. Nestes tempos, não há lugar para o descanso. Não é altura de desmobilizar os espíritos depois da batalha, já que o inimigo não descansa e gasta somas enormes para minar e destruir os nossos objetivos”, continuou.
Ainda antes de a construção do Vale dos Caídos estar praticamente concluída, em 1958, o Conselho das Obras do Monumento aos Caídos enviou uma carta a todos os governadores civis onde pedia a sua colaboração, tal como a de “autarcas, guardas civis, párocos e autoridades locais”, para assinalar os sítios onde havia valas comuns da Guerra Civil em cada uma das suas localidades. O objetivo era levar os restos mortais enterrados em vários pontos de Espanha para serem depositados numa cripta comum da Guerra Civil.
Ao todo, foram levados pelo menos 33.873 restos humanos para o Vale dos Caídos. Destes, mais de 21 mil terão sido identificados e acima de 12 mil ficaram por identificar. Entre estes últimos, calcula-se que estejam sobretudo militantes republicanos que para ali foram trasladados sem que as suas famílias o aprovassem ou até, em alguns casos, sem que tivessem conhecimento disso.
“Franco idealizou o Vale dos Caídos para imortalizar a sua vitória na Guerra Civil e honrar apenas os mortos do seu lado, apesar de depois ter montado a farsa que foi trasladar também os restos mortais de milhares de ‘vermelhos’ ou daqueles que foram assassinados pelo seu lado durante a guerra”, diz o historiador Julián Casanova.
Campa de Franco é “incongruente” com monumento nacional
Pedro Sánchez está agora perto de fechar um assunto — mas não foi ele o primeiro a pegar nele. Depois de anos em que reinou aquilo que alguns críticos da Transição chamam de “pacto de esquecimento” sobre as barbaridades da Guerra Civil e do franquismo, o governo do socialista José Luis Zapatero aprovou a Lei da Memória Histórica, em 2007. À altura, por razões muito diferentes, só o PP e os independentistas da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) votaram contra.
Naquela lei, pouco se falava do Vale dos Caídos. Dali, resultaram sobretudo outras duas coisas. Uma, simbólica: a alteração do nome de praças, ruas e avenidas dedicadas a personalidades do franquismo. Outra, mais prática: a exumação de valas comuns. Na lei de 2007, ficou estabelecido que “o Governo, em colaboração com as administrações públicas, elaborará um protocolo de atuação científica e multidisciplinar que assegure a colaboração institucional e uma intervenção adequada das exumações”. As exumações aconteceriam com a iniciativa sociedade civil e com a ajuda de um fundo estatal de 6,2 milhões de euros por ano.
No entanto, em 2011, no seu último ano como Presidente de Governo, José Luis Zapatero quis debruçar-se sobre o tema dos Vale dos Caídos. Para isso, formou a Comissão de Especialistas sobre o Futuro do Vale dos Caídos, composta por 12 personalidades de áreas como Direito Público, História ou Antropologia.
No relatório final que aquela comissão redigiu, lia-se que a presença dos restos mortais de Franco no Vale dos Caídos é “incongruente com a finalidade original que motivou a construção do Vale dos Caídos, que não era senão o de acolher unicamente os restos dos falecidos da Guerra Civil”, já que o ditador espanhol morreu 36 anos depois do fim da guerra. Além disso, os especialistas sublinhavam que a sua presença “dificulta” o “propósito” daquele monumento — o de não ter “nenhuma conotação ideológica ou política”.
Na parte final do relatório, a comissão recomendava, então, que os restos mortais de Franco fossem “trasladados para o lugar que a família designar ou para o lugar que seja considerado digno e mais adequado”. Para isso, sugeriam que fossem atingidos “os mais amplos acordos parlamentares” e que o Governo conseguisse “negociar com a Igreja a oportuna autorização”, já que a basílica lhe pertence.
José Luis Zapatero já não foi, porém, a tempo de realizar o desejo de exumar Franco. O relatório da comissão de especialistas foi publicado a 29 de novembro de 2011 e, menos de um mês depois, a 21 de dezembro, Zapatero foi derrotado por Mariano Rajoy nas eleições gerais. Quando o governo do PP subiu ao poder, a Lei da Memória Histórica foi em quase tudo congelada. Além de reduzir as subvenções estatais para exumar os restos mortais de fossas comuns de 6,2 milhões anuais para 2 milhões, Mariano Rajoy deixou o Vale dos Caídos intacto. E assim ficou, até que, em junho deste ano, Pedro Sánchez o derrotou numa moção de censura.
O que ganha Pedro Sánchez com isto? E Espanha?
“Chegou o momento.” Foi com esta frase que, a 26 de junho, no Congresso dos Deputados, Pedro Sánchez anunciou que o seu Governo ia exumar Franco. “As feridas estiveram abertas durante demasiados anos e chegou o momento de fechá-las. A nossa democracia tem de ter símbolos que unam a cidadania e não que a separem.”
Como seria de esperar, as reações variaram muito consoante a bancada parlamentar. Se a ideia agradou aos partidos à esquerda do PSOE (sobretudo ao Unidos Podemos) e à maioria dos independentistas e regionalistas que têm assento no Congresso dos Deputados (Partido Nacionalista Basco, PDeCAT, EH Bildu, Compromís e também da ERC), o mesmo já não se pode dizer do Ciudadanos e do PP.
Da parte do Ciudadanos, Albert Rivera começou por dizer que o seu partido estaria disposto a aprovar um decreto-lei, desde que este passasse por transformar o Vale dos Caídos num “cemitério nacional” que transmitisse a ideia de “união”. Deu até como exemplo o Cemitério de Arlington, nos EUA, criado no estado da Virginia para enterrar soldados dos dois lados da Guerra Civil Americana.
Dias depois, porém, acabou por anunciar que o Ciudadanos se ia abster, por não concordar com o que diz ser a motivação deste decreto-lei. “Existe uma tentativa de voltar às batalhas fratricidas de vermelhos e azuis, que são das que o bipartidismo gosta”, disse em entrevista à Onda Cero. Além do mais, criticou o sentido de urgência que Pedro Sánchez e o seu Governo têm dado a este tema, “depois de 40 anos de democracia”.
Da parte do PP, nunca houve qualquer possibilidade de aprovar a exumação de Franco. “Não gastaria nem um euro a desenterrar Franco e também não gastaria um euro a enterrá-lo de volta”, disse Pablo Casado, o líder que o PP escolheu em julho para suceder a Mariano Rajoy. “Não vou defender esse edifício nem quem está enterrado nele, incluindo por razões familiares, como neto de alguém que sofreu represálias do regime franquista”, disse, em alusão ao seu avô materno, militante do sindicato UGT, que foi preso durante a ditadura franquista. “Mas Espanha tem de olhar para o futuro.”
Para Charles Powell, este tema coloca o PP numa posição “incómoda”, como já tinha acontecido noutros anos. “Na legislatura da crispação [1993-96, a último do socialista Felipe González, que viria depois a perder para José María Aznar, que levou o PP ao seu primeiro governo] houve uma tentativa do PSOE de argumentar que o PP não tinha direito a governar porque não era um partido plenamente democrático, uma vez que não aceitava o carácter ditatorial do regime de Franco”, diz o historiador. “O regresso em força deste discurso pode ser preocupante.”
Na verdade, ele já existe, mas a partir de outra bancada parlamentar que não a do PSOE, argumenta Charles Powell: “Hoje quem diz isto é o Podemos e a verdade é que o PP está num lugar incómodo”. Em parte, por falta de definição. “As gerações mais novas do PP não têm dúvidas sobre o caráter ditatorial de Franco, mas ao mesmo tempo rebelam-se contra a pressão do PSOE”, explica Charles Powell.
O historiador Julián Casanova chega mesmo a apontar o dedo ao partido de Pablo Casado. “Não querer olhar para o passado com liberdade é uma questão de má educação perante a História e, nisso, o Partido Popular, embora seja um partido democrático, incidiu de forma negativa”, disse.
Nos últimos dois meses, pouco se ouviu de Pedro Sánchez sobre a retoma das exumações das valas comuns da Guerra Civil e do franquismo que ficaram por desenterrar — apesar de, no seu programa eleitoral de 2016, o PSOE ter dito que o “Estado deve assumir diretamente a gestão das políticas e ações de busca das verdade, justiça e reparação das vítimas”, indo mais longe do que a lei de José Luis Zapatero, que entregava essa responsabilidade, em grande parte, à sociedade civil. Mesmo com essa promessa, para o Governo de Pedro Sánchez, para já, só Franco parece interessar.
Reiterando que defende a exumação de Franco, Charles Powell refere ainda assim que acha que “é mais escandaloso e importante haver 100 mil cadáveres não identificados nas beiras de estradas de todo o país”. “Igual, só no Camboja!”, enfatiza.
Esta priorização da exumação de Franco (que, para já, ainda não é lei) sobre as das valas comuns (que é lei desde 2007) é, para este historiador, a prova de que “Sánchez quer ganhar rapidamente o apoio dos eleitores do Podemos e danificar o PP”. Ainda assim, concede que a exumação de Franco vai ter para todos os efeitos consequências para as restantes exumações: “A partir de agora, o Governo e as comunidades autonómicas não vão ter outro remédio além de financiar esses processos. Vai ser uma questão estatal, será feito com dinheiro estatal e com especialistas estatais”.
E, acrescenta o historiador, ao tirar Franco do Vale dos Caídos, o Governo de Pedro Sánchez vai deixar “menos um argumento para aqueles que dizem, sem razão, que Espanha não é uma democracia plena”. “Mesmo que faça só isso, já valeu a pena.”