Acabaram os debates quinzenais com o primeiro ministro, mas os anuais – onde se discute o estado da nação – vão continuar. Durante as quatro horas de debate do ano passado governo e oposição discutiram o “familygate” no governo, o caso Tancos, os serviços públicos, os transportes e não faltaram promessas em clima de pré-campanha eleitoral para as Legislativas. O tema deste ano deve ser único: a pandemia de coronavirus que parou o país e deixou o futuro em aberto para milhares de pessoas, incluindo finalistas que terminaram cursos superiores e não sabem como vão passar da teoria à prática num mundo que não é igual ao do dia das matrículas.
João Serrano, finalista do curso de Turismo: “Ver Sintra vazia mete arrepios”
João Serrano acabou o curso de Turismo numa altura em que não há turistas, uma realidade bem visível em frente ao Palácio Nacional de Sintra, onde recebe a Rádio Observador. “Num dia normal não conseguíamos estar aqui sentados”, explica habituado que está a ver o Largo Rainha Dona Amélia com “filas gigantes de turistas para entrarem no palácio e a tirarem fotografias a esta vista maravilhosa”.
Os estágios que estavam previstos para o final dos três anos de licenciatura e que deviam ser o primeiro passo para a entrada no mercado de trabalho estão suspensos. “Tinha um estágio no final de maio que já não vou fazer por causa do vírus e também ia trabalhar para Malta uns meses, num grupo hoteleiro, o que também já não vai acontecer”, lamenta avançando, no entanto, que está “otimista”.
“Vejo as coisas de forma positiva porque se chegarmos a uma vacina ou a uma terapêutica eficaz, acredito que o turismo pode voltar ao que era”, mas nem todos os colegas de curso de João Serrano pensam da mesma forma: “Há muitas pessoas pessimistas e que estão um pouco arrependidas”, um sentimento afastado pelo recém licenciado que não deixa de manifestar “algum desgosto” com o estado da nação.
Ouça aqui o testemunho de João Serrano:
Márcia Gomes, finalista do curso de Enfermagem: “Estamos num momento difícil, mas a nação vai melhorar”
Há quatro anos, Márcia Gomes escolheu começar o curso de Enfermagem e agora que chegou ao fim enfrenta uma realidade para a qual não estava preparada: “É um momento difícil no qual fica evidente que há muito receio das pessoas que estão doentes, mas também dos profissionais de saúde”.
A entrada no mercado de trabalho começa no estágio de final de curso que já está a fazer num lar de idosos, o local onde percebe que da teoria à prática vai um longo caminho feito com “máscaras” e “fatos” que, “parecendo que não, são muito maus para qualquer profissional de saúde”. A recém licenciada explica ainda que há práticas aprendidas que não podem ser aplicadas: “o toque é super terapêutico e nós acabamos por não o conseguir usar como gostaríamos com os nossos utentes”.
Apesar das diferenças evidentes registadas desde o dia em que escolheu ser enfermeira, Márcia Gomes acredita que “a nação vai melhorar porque ao longo da história também conseguiu superar outras crises”.
Ouça aqui o testemunho de Márcia Gomes:
Afonso Massapina, finalista do mestrado em Direito Fiscal: “É fundamental a presença física no trabalho porque é lá que estão as pessoas que têm experiência”
Para um estudante de direito que consegue um estágio numa das maiores firmas de advogados do país logo depois de terminar o mestrado o futuro devia ser encarado com otimismo, mas Afonso Massapina tem receios: “esta pandemia deu uma valente estucada em várias economias, principalmente a europeia”.
O teletrabalho é o que lhe levanta mais reticências porque “é fundamental uma presença física num escritório de advogados porque é lá que existe o acompanhamento por parte das pessoas que já têm alguma experiência”, lamenta acrescentando que qualquer estagiário “vai perder algum acompanhamento”.
Para quem estuda leis há também vários desafios no horizonte laboral, nomeadamente “o direito a desligar” que pode “dar aso a alguns abusos por parte da entidade patronal”, alerta.
Ouça aqui o testemunho de Afonso Massapina: