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José Manuel Fernandes

Vencedores: os ausentes. António Costa e Rui Rio conseguiram ter o debate mais agressivo desta maratona de debates mas com menos divergências substantivas. Em quase nada estiveram em desacordo, em quase nada mostraram ter ideias diferentes para o país, sempre que um passava uma rasteira ao outro, o outro tinha uma canelada pronta na resposta. No anterior debate ficara-se com a sensação de que o PSD era diferente do PS – aqui só se percebeu que ambos os partidos lutam pelo mesmo lugar à mesa do Orçamento. O número de vezes em que disseram estar de acordo só foi proporcional ao número de picardias. Assim ganhou quem não esteve presente.

Vencidos: os cidadãos. Costa e Rio querem aumentar os salários. Todos queremos aumentar os salários. Todos gostaríamos de ter mais dinheiro. Mas como? É confrangedor verificar como estamos no fim de uma pré-campanha onde nunca se debateu tanto e não ter a menor clareza sobre como pretendem os dois principais partidos fazer com que Portugal deixe de continuar a escorregar cada vez mais para a cauda da Europa. Falam sempre do que o Estado pode fazer, nunca do que o Estado deve deixar fazer. Ora, sem perceber isso e sem falar disso estamos sempre todos a perder.

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Nota final. Por obrigação profissional fiz (ou farei logo à noite) o pleno dos debates. Acho que só os muito determinados resistem a esta maratona. E, ao mesmo tempo, não se compreende que alguns partidos mais pequenos tenham ficado completamente de fora desta fase de pré-campanha, sendo que nas europeias até protagonizaram o debate mais interessante e com mais conteúdo. Não há fórmulas perfeitas, mas mesmo sendo de notar o interesse do público, há que fazer melhor.

Helena Matos

Vencedores: o meu Centeno e o teu Centeno. Depois deste debate temos o direito a exigir um debate entre Mário Centeno e Joaquim Sarmento.

Derrotado: a educação. As intervenções de António Costa e Rui Rio sobre o ensino/educação foram de uma absoluta indigência. Ou, mais precisamente, de ausência de discurso sobre o assunto oficialmente em discussão. Rui Rio, depois de defender a aposta nas creches, passou a tratar de uma questão importante mas lateral: a necessidade de disciplina nas escolas, matéria que fez ouvir uma das mais demagógicas intervenções de um jornalista nestes debates: “Vamos voltar às reguadas na escola?”. António Costa insistiu no modelo da enumeração dos apoios, dando destaque à questão do apoio ao alojamento dos estudantes universitários. Voltariam Costa e Rui ainda a tratar do ensino ou seja do número/vencimento dos professores. Portanto, nem uma palavra sobre os conteúdos, avaliações, carga ideológica nos programas, fim dos contratos de associação… Ou seja, sobre o ensino propriamente dito NADA.

Nota final: o mistério da CRESAP. A Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CRESAP) ressuscitou nesta campanha. Após ter reduzido a CRESAP a uma assinatura de conveniência (até o portal onde se publicitavam as nomeações foi desactivado por este governo) António Costa invocou a CRESAP para dar conta da independência do seu governo na hora de fazer nomeações. Mais uns tempos e a CRESAP ainda dá sinal de vida.

Alexandre Homem Cristo

Vencedor: Rui Rio. Cobriu bem os vários temas. No início, tocou no ponto-chave: a apropriação que o PS faz do Estado, que é a cultura dominante do partido “dono disto tudo”. Associou o colapso na gestão de serviços públicos à escolha de familiares e militantes, em vez de especialistas. Voltou a vencer nos dossiês económicos (exemplo da TAP), nos quais está evidentemente bem preparado. Na Educação esteve menos seguro, mas não deixou de assinalar que o programa do PS é, nesse domínio, particularmente vago. Foi o debate no qual mais criticou opções políticas do governo e saiu-se geralmente bem.

Vencido: António Costa. Teve um início de debate difícil, confrontado com a derrota na Madeira e a instabilidade na composição do governo, com demissões e várias investigações a cercar os gabinetes ministeriais. Tentou sacudir responsabilidades políticas refugiando-se no argumento habitual – a distinção infeliz entre a legalidade e o comportamento ético. Foi, ainda, encostado à parede no dossiê “TAP”, confrontado com o acumular de prejuízos e distanciando-se da gestão da empresa, cuja privatização reverteu (e, por isso, ficará sempre associado ao desempenho da TAP como co-responsável). Tentou resgatar temas mais simpáticos para a sua governação (como os passes sociais), mas isso não impediu que passasse o debate à defesa. Se os debates contarem, a maioria absoluta vai ficando mais longe.

Nota final. O prestígio social e político de Mário Centeno é tão evidente que o seu nome já entrou no dicionário para designar “alguém que percebe de contas”. É uma espécie de figura consensual: cada líder partidário fala do “seu Centeno” – o que poderia ser razão suficiente para o eleger a ele como o vencedor do debate de hoje. Mas, bem vistas as coisas, é ridículo, caricato e, muito provavelmente, precipitado – isto de levar ministros das Finanças em ombros não é inédito e acabou sempre mal. Seja como for, está claro que a relação de forças está invertida: Mário Centeno é tão imprescindível para António Costa que o seu poder cresce diariamente e ninguém no PS ousará colidir com ele (incluindo Costa).

André Azevedo Alves

Vencedor: Rui Rio. Rui Rio esteve à vontade e assertivo, reforçando indicações positivas de anteriores debates. A discussão sobre o caso das golas antifumo e a demissão do secretário de Estado da Proteção Civil foi-lhe especialmente favorável e permitiu a Rio acusar o PS de olhar para o Estado como o “dono disto tudo”, uma ideia forte e que pode ter algum impacto na melhoria das (fracas) perspectivas eleitorais do PSD face à possibilidade de uma maioria absoluta do PS.

Vencido: António Costa. António Costa apresentou-se mais uma vez na defensiva e com discurso e números estudados mas o caso das golas antifumo acaba por marcar o debate e causar alguns danos ao PS. De resto, foi notória a vontade de não hostilizar Rio, elegendo até em alguns momentos o Bloco de Esquerda como o principal alvo.

Nota final: o meu Centeno é melhor que o teu. O debate (e o pós-debate) fica também marcado pelo consenso em torno de Mário Centeno. Indo de encontro às sondagens que apontam a elevada popularidade de Centeno, António Costa tentou reforçar a apropriação pelo PS do objectivo das “contas certas”. Uma apropriação que Rui Rio acaba por facilitar ao apresentar Joaquim Sarmento como “o seu Centeno”.

Miguel Pinheiro

Vencedor: Mário Centeno. Ouvindo o debate, podemos concluir que o país devia antecipar o inevitável e mandar já construir uma estátua de Mário Centeno, que seria cerimonialmente colocada no Terreiro do Paço, depois de se remover de forma expedita a figura de D. José. António Costa gosta de Mário Centeno, Rui Rio gosta de Mário Centeno e já se percebeu que Mário Centeno também gosta de Mário Centeno. Nesse ponto não há, pelos vistos, nada a discutir.

Vencido: António Costa. Foi a primeira vez que o líder do PS não conseguiu controlar o tom e os temas dos debates. Isso percebeu-se pela forma insistente como tentou introduzir a discussão sobre os passes sociais, que claramente considera um dos seus grandes trunfos eleitorais. No final, até sentiu necessidade de recorrer a um truque bizarro: desapertou as mangas da camisa para mostrar que não tinha nada escondido para o pós-eleições.

Nota final. Rui Rio teve a frase do debate quando, a propósito do caso das golas, atirou que o PS tem a tentação de ser o “dono disto tudo” quando está no poder. Esse é o argumento mais forte para impedir a maioria absoluta de António Costa.

Filomena Martins

Vencedor: Mário Centeno. Depois de no primeiro frente-a-frente Rui Rio ter surpreendido ao entrar a pés juntos no debate desmontando as contas certas deste Governo, desta vez António Costa ia muito melhor preparado e driblou-o. Não só pediu números que o líder do PSD não tinha (e que o primeiro-ministro prometeu levar-lhe à noite para o debate a seis nas televisões), como fez com que Rio se embrulhasse numa troca de bolas sobre qual dos dois tinha o melhor Centeno. Como o social-democrata já não conseguiu agarrar na questão da carga fiscal e do crescimento económico que lhe tinha valido pontos da outra vez, foi o ‘Ronaldo das Finanças’ quem acabou por marcar mais golos.

Vencidos: Rui Rio e António Costa. O líder social-democrata tinha preparado o soundbite para quando o tema surgisse. Assim que a pergunta sobre a demissão do secretário de Estado da Protecção Civil, arguido no caso das golas, foi colocada, não perdeu tempo a agarrar o tema do familygate. E atirou que, apesar de “nenhum partido ser virgem”, quando o PS está no poder “olha para o Estado como se fosse dono disto tudo”. Só que Costa estava à espera do ataque e aproveitou para mexer nos nervos de Rio, falando-lhe de Justiça e respondendo que recusa “lições [leia-se banhos] de ética à vontade do freguês”, evocando os vários casos das listas sociais-democratas e ainda uma antiga nomeação do seu adversário. Foi uma espécie de abraço da jiboia a alguém por quem, entre dentes, ainda disse ter “muita estima”. No fim, como ambos têm telhados de vidro baratos neste assunto, saíram bastante encharcados dele.

Nota final. A coisa deu empate: António Costa desta vez não tentou passar pelos intervalos da chuva, não se defendeu ou assobiou para o ar como tem acontecido, e contra-atacou. Rui Rio, mesmo na ressaca da Madeira, mostrou que continua bem preparado, o que o estará a fazer subir nas sondagens nesta recta final na campanha. O debate foi por isso aguerrido, interessante e teve a vantagem de ter finalmente abordado temas que têm ficado de fora. Como os transportes, onde primeiro Costa patinou e depois Rio teve de comprar o passe social; a educação, com medidas concretas e não só o tema recorrente da reposição do tempo perdido dos professores; e, finalmente, as futuras coligações, com o líder do PSD a admitir um bloco central num caso excepcional e o primeiro-ministro a ser obrigado a exorcizar uma situação idêntica à que se vive em Espanha.

Pedro Benevides

Vencedor: António Costa. À terceira vez que debateu com Rio, Costa lá decidiu entrar no ringue para um verdadeiro combate. Dos banhos de ética à medida do freguês, passando pela inconsistência da narrativa do PSD nos passes sociais, ou o caso dos professores, vinha preparado para atacar um adversário que foi muitas vezes apanhado de surpresa. Não o venceu por KO, mas deixou-o bastante atordoado. Pelo meio, conseguiu aproveitar a pergunta sobre a reestruturação da dívida para falar de estabilidade política e ainda conseguiu dar uma cotovelada ao BE sobre a formação da “geringonça”.

Vencido: Rui Rio. Quando um dos temas do debate entre os dois foi o de saber quem tem o melhor Mário Centeno (foi assim que Rio se referiu a Joaquim Sarmento, “o meu Centeno”) ficou feita a simpática homenagem ao ministro das Finanças do governo e a simbólica entrega de pontos ao adversário.
Foi um erro amador e a prova de que o número do político que chega aos debates com o estilo “conversa de café” ficou esgotado no segundo debate. A graça perdeu-se e ficou apenas a evidência de que nalguns dossiês Rui Rio chega ao debate mal preparado. Houve excesso de declarações vagas, “mais disciplina” nas escolas, menos professores, houve falta de resposta às estocadas de Costa e um olímpico exercício de patinagem nos famosos banhos de ética que agora ficaram reduzidos a “salvaguardar e respeitar o princípio da inocência”.

Nota final. Mais uma vez, e tal como há quatro anos, o debate nas rádios foi bem melhor que os das TVs. Talvez porque as últimas sondagens mostraram uma aproximação do PSD ao PS, talvez porque Rio aparecesse ainda a irradiar o brilho de quem teve direito a ser o último a falar num ato eleitoral, a verdade é que António Costa apareceu pela primeira vez num debate para lutar e não para beber o chá das cinco. O resultado foi um confronto rico, sobretudo na primeira parte, com vantagem clara para o secretário-geral do PS, que vinha mais preparado para explorar as inconsistências do adversário. Depois da Madeira, entrou a questão do familygate, que mostrou ser ainda um tema desconfortável para o primeiro-ministro, mas que permitiu também a mais acesa troca de palavras entre os dois adversários. Rio trazia os “donos disto tudo” no bolso, mas levou com os “banhos de ética à medida do freguês”. A partir daí, foi pôr as pipocas no micro-ondas e deixar a luta correr.