Ana Gomes tira notas à mão num papel e, por vezes, faz sublinhados com marcador de feltro. Marisa Matias tem um discurso impresso onde coloca algumas notas também manuscritas, que inclui uma numeração manual. Tiago Mayan Gonçalves chegou a ter papéis, mas colocou-os no lixo antes de o Observador os conseguir resgatar. João Ferreira anda sempre com um iPad, onde tem o discurso, mas não autorizou que fosse fotografado pelo Observador. André Ventura diz que tem tudo na cabeça e que não leva nada para o púlpito, exceto umas pequenas notas que também se estraviaram. Marcelo Rebelo de Sousa nem sequer discursou em lado algum e falou só em frente aos microfones.
Após pedir às candidaturas, o Observador conseguiu resgatar e analisar as notas de Ana Gomes que foi fazendo durante o últimos debate entre todos os candidatos, o discurso de Marisa Matias num comício em Viseu, com marcas de batom vermelho e as notas que — apesar se ter visto livre de tudo o que tinha em papel — Tiago Mayan Gonçalves guardou no iPhone e que foram elaboradas para o embate televisivo a dois contra Marcelo. O que dizem, afinal, as notas dos candidatos?
Ana Gomes. Offshores, jornalistas e o Evangelho entre rabiscos e sublinhados
Ana Gomes ficou duas horas de pé durante o debate presidencial da última segunda-feira, transmitido pelas rádios TSF, Antena 1 e Renascença, mas teve tempo de tirar muitas notas e fazer apontamentos para ir ao repique das críticas dos adversários. Ao Observador, a candidata presidencial chegou a dizer que no debate da semana anterior, transmitido na televisão, a acústica não era boa e, além do frio e das cadeiras desconfortáveis, não conseguia “ouvir bem” o que os outros candidatos diziam. Logo, era difícil responder-lhes. Na segunda-feira foi diferente e prova disso é a folha que tinha nas mãos e que o Observador teve acesso. Chegou vazia ao debate e, ao fim de duas horas, estava totalmente rabiscada de notas soltas, pensamentos, e ganchos de ataque que, no fundo, resumem a narrativa política de Ana Gomes nesta campanha eleitoral. Vamos analisá-los, ponto por ponto.
1. “Estado forte – Saúde – EE banalização”. Que é como quem diz “banalização do Estado de Emergência”. O primeiro tema que foi abordado no debate desse dia, entre seis dos sete candidatos à Presidência, foi a questão da eficácia das medidas de confinamento decretadas pelo Governo e a renovação do estado de emergência. A candidata socialista sempre se mostrou favorável à atuação do Governo e à aplicação de medidas restritivas, mas com um ‘mas’. No seu entender não se devia ter “banalizado” o estado de emergência, renovando-o sucessivas vezes sem que as pessoas percebessem, a páginas tantas, que a situação era de facto excecional e de “tremenda dificuldade”. A crítica era para Marcelo Rebelo de Sousa, que tem elaborado os decretos de renovação do estado de emergência de 15 em 15 dias. O que Ana Gomes defendia era que o Presidente da República tivesse pedido ao Parlamento que elaborasse uma lei de emergência sanitária que desse respaldo legal às medidas que o Governo tinha que impor.
2. “Requisição civil”. O tópico vinha no seguimento do anterior e o objetivo era o mesmo: atacar Marcelo Rebelo de Sousa, que Ana Gomes diz que fez pressão a favor dos privados durante o processo de negociação do Governo e, com isso, prejudicou o processo. Ana Gomes defende há muito a requisição civil de privados para aliviar a pressão hospitalar no SNS e culpa Marcelo por ter impedido o Governo de o fazer desde logo porque, no decreto presidencial, deixou escrito que o recurso a privados deve ser feito “preferencialmente” por acordo.
3. “Offshores – mil milhões”. O caso do “apagão fiscal” de 10 mil milhões de euros que terão sido transferidos para offshores sem passar pela Autoridade Tributária, em Portugal, é um tema que Ana Gomes não larga e, sempre que pode, atira contra Marcelo. A investigação foi aberta em 2017 e está parada desde então, e é Marcelo quem a candidata culpa por inação. No seu entender, o PR devia dar todos os meios e capacidade à PGR para não deixar cair estes processos em saco roto, lembrando que enquanto a escola pública (as propinas gratuitas, como lhe pediram os estudantes em Coimbra) e o Serviço Nacional de Saúde precisam de dinheiro e de investimento, há “dinheiro a ir a rodos para offshores“.
4. “Submarinos – sem meios – mas a espiar jornalistas”. O caso dos submarinos é um caso “emblemático” de alegada corrupção que Ana Gomes tem sempre na ponta da língua para atingir Marcelo no mesmo ponto. É que na Alemanha já se fez justiça neste caso, foram identificados os corruptores, que foram condenados, e em Portugal ainda nada. Ou seja, cabe ao Presidente da República garantir que a justiça tem meios e tem capacidade para dar seguimento aos processos. O salto no raciocínio é claro: a justiça não tem meios para avançar com mega-processos como esses mas investe a espiar jornalistas por alegada violação do segredo de justiça, como foi denunciado na primeira semana de campanha.
5. “Regionalização”. Mais um tópico rabiscado para atingir Marcelo Rebelo de Sousa. Ana Gomes diz sempre que pode que Marcelo foi um dos maiores “bloqueadores” do processo de descentralização e de regionalização, desde logo quando era líder do PSD em 1998, ano em que se fez o referendo. No debate, o tema originou um grande despique entre os dois, com Marcelo a dizer que a Constituição obriga à realização de referendo, e com Ana Gomes a dizer que, antes da consulta popular, a Constituição permite abrir caminho à descentralização e à desconcentração de competências, coisa que não tem sido feita, no seu entender.
6. “Lesados do BES”. Um tópico que a candidata escreveu para não se esquecer mas que não chegou a ser abordado. Vinha no seguimento do caso do “apagão fiscal” e da transferência de 10 mil milhões de euros para offshores, principalmente da parte do BES. Ana Gomes tem dito que esse pode ser mesmo um dos maiores roubos organizador das poupanças dos depositantes, conhecidos como lesados do BES, de que há memória. Daí saltaria para Ricardo Salgado, que ainda aguarda julgamento.
7. “Acesso à justiça – megaprocessos – pacto justiça”. Ana Gomes tinha-se queixado de o tema da justiça não ter sido aflorado no primeiro debate a sete, transmitido na televisão, e talvez por isso, neste debate, não quis deixar nada por dizer. O alvo: sempre Marcelo. Já a prever que o PR ia argumentar com o Pacto de Justiça que celebrou no início do seu mandato, na abertura do ano judicial, Ana Gomes tinha a deixa preparada: “Não serve de nada falar uma vez na abertura do ano judicial e depois a justiça não funcionar”. Ao longo da campanha a crítica aos “mega-processos” tem sido recorrente, com a candidata a dizer que eles apenas existem para “prescrever” e a dizer que apenas servem para alimentar o descrédito nas instituições, que é o primeiro alimento das forças anti-democráticas.
8. “Jorge Sampaio — palavra decisiva para maioria de governo”. Ana Gomes já vinha a ensaiar o discurso na véspera e o gancho de um artigo de Jorge Sampaio publicado no jornal Público serviu o propósito: colar Marcelo Rebelo de Sousa ao papel de normalizador de forças anti-democráticas como o Chega. Quando o tema do debate era o acordo de governação firmado nos Açores, Ana Gomes chamou o ex-PR socialista para o debate, citando-o para dizer que o Presidente tem uma palavra decisiva na definição de maiorias de governo. Ou seja, o PR poderia ter dito que não aceitava qualquer acordo com o Chega, mesmo que fosse do foro parlamentar. Marcelo respondeu-lhe ali mesmo com uma novidade: se o cenário se colocar na governação nacional, exigiria acordo escrito ao Chega, ao contrário do que fez em 2019 com o governo minoritário de António Costa apoiado implicitamente pela esquerda.
9. “Ameaças a jornalistas”. O tema por esta altura era André Ventura e o Chega, que dominou grande parte do debate. Ana Gomes escreveu “ameaças a jornalistas” para não se esquecer de referir o episódio da véspera em que os jornalistas foram ameaçados por membros da comitiva do Chega após terem noticiado que o jantar-comício que estava a decorrer em Braga tinha tido parecer negativo das autoridades distritais de saúde. Um carro da RTP chegou a ser vandalizado.
10. “País não precisa de quem pregue ódio, divisão, racismo”. André Ventura, André Ventura, André Ventura. Enquanto não chegava a sua vez de falar, os tópicos que escrevia falavam por si.
11. “Os últimos são os primeiros – Evangelho São Mateus”. Pelo vistos, Ana Gomes ia com esta fisgada, mas não a usou. Fê-lo mais tarde, nas conferências online que foi mantendo com jovens socialistas nesta última semana de campanha eleitoral. Guarda sempre para o fim, em jeito de apelo ao voto. “Os últimos são sempre os primeiros”, já que o seu nome e a sua fotografia aparecem em último lugar no boletim de voto.
12. “Cultura, identidade”. Eram temas que queria ter abordado, mas não “teve tempo” de falar tanto como gostaria, segundo chegou a relatar ao Observador. Ainda assim, Ana Gomes, que não tem falado assim tanto de cultura (embora tenha organizado uma conferência online dedicada ao tema esta semana), criticou o facto de ter havido “medidas contraditórias” na cultura, que se “adaptou bem” às regras sanitárias, mas está agora novamente impedida de trabalhar. Até comparou o fecho da cultura no atual estado de emergência com a manutenção das igrejas abertas.
13. “Mulheres – Esperança – Jovens”. Ana Gomes tem defendido a maior presença das mulheres nos meios dominados tradicionalmente por homens, e tem feito uma campanha a apelar fortemente à ideia de que, enquanto mulher, fará mais pelas mulheres e pela igualdade de género. O mesmo em relação aos jovens. Prometeu, em Coimbra, criar um conselho consultivo com jovens se for eleita Presidente da República, e prometeu paridade em todos os cargos de nomeação direta do Chefe de Estado.
14. “Integrar os imigrantes”. Ventura tem discurso xenófobo e Ana Gomes responde com discurso inclusivo. Sublinhou a ideia no papel um dia depois de ter visitado o bairro dos navegadores, em Oeiras, como exemplo de bairro social que integra várias comunidades diferentes de imigrantes. Foi recebida de braços abertos pela comunidade cigana, mas deixou o tema de fora do debate com os restantes candidatos presidenciais (à exceção de Ventura).
Marisa. As marcas (de batom) que ficam no discurso
É de discurso já preparado que Marisa Matias sobe ao palco (virtual) em todos os comícios da campanha. Antes da intervenção, quando assiste aos discursos que a antecedem, a candidata apoiada pelo Bloco de Esquerda vai tirando notas e aponta os nomes das pessoas a quem tem de agradecer logo no início. Não é muitas de notas, pelo menos nos discursos de comício desta campanha vai tudo escrito a computador, mas muitas vezes há linhas que não são lidas e outras que são acrescentadas. Apesar de já levar parte do discurso escrito, faz questão de adaptar o que diz na intervenção ao dia a dia (e mesmo em resposta aos discursos da noite). Na hora de se aproximar do púlpito, vai sozinha e já leva aos papéis na mão.
1. “Paulo Meirinhos e Luís Pedraza, Ana Carolina Gomes, José Luís Peixoto e José Manuel Pureza”. No topo da página, as anotações que faltam no discurso e que Marisa Matias faz questão de apontar para não esquecer. O discurso está escrito em computador, foi impresso, mas a candidata não pode esquecer de agradecer a quem esteve ao seu lado em mais um comício virtual. Neste caso, os músicos Paulo Meirinhos e Luís Pedraza, Ana Carolina Gomes, José Luís Peixoto e José Manuel Pureza. Durante toda a campanha, Marisa começou pelos agradecimentos e por várias vezes apontou os nomes no cimo da primeira folha. Neste dia, como em todos os outros comícios, houve música para iniciar a iniciativa e seguiu-se o poeta José Luís Peixoto que, à distância, contou que tinha dado a volta a todas as gavetas de casa e que não havia nem um batom vermelho. Contudo, marcou presença para dar uma força contra a extrema-direita e contra “o outro” ou ao “ídolo” de Trump, como chamou ao candidato apoiado pelo Chega, André Ventura.
2 e 4. Marcas de batom. Até na folha de discurso de Marisa Matias há marcas de batom vermelho. O insulto de André Ventura, que se transformou num símbolo, ‘perseguiu’ a candidata durante grande parte da campanha e nem as folhas escapam. No dia em que José Manuel Pureza pintou os lábios perante centenas de pessoas num comício virtual — que tem sempre uma parte física com os oradores principais — Marisa Matias também estava de lábios vermelhos e as folhas também. É aqui, num comício em Viseu, num dos poucos que se realizou a meio da tarde, que se sente uma viragem nestes momentos da campanha. É o comício em que Pureza ataca fortemente Marcelo Rebelo de Sousa e André Ventura, é o local onde Marisa diz que o batom vermelho foi a “primeira grande lição” à extrema-direita e que a próxima será no dia das eleições. O movimento #vermelhoembelem tinha começado três dias antes no Twitter e espalhou-se rapidamente pelas redes sociais e acabou por passar fronteiras, com apoios vindos de Espanha, Luxemburgo e Brasil (Chico Buarque confirmaria o apoio dias depois). Marisa não voltou a mudar a cor dos lábios e as marcas de batom — que até estão na folha do discurso como impressões digitais — ficam para a história desta segunda campanha presidencial de Marisa Matias.
3, “Hoje foi o pior dia da pandemia”. A primeira frase do discurso e uma das mais fortes. “Hoje foi o pior dia da pandemia.” Em 24 horas, Portugal registou 10.385 novos casos de Covid-19 e 152 mortes. Estes eram, de facto, até ali, os números mais altos da pandemia, sendo que nos dias que se seguiram houve mais recordes batidos quase diariamente. No seguimento da frase, Marisa faz ainda uma outra alusão à atualidade, referindo o confinamento que tinha começado um dia antes. Este não acabaria por ser o pior dia da pandemia porque acabaram por se seguir outros piores. O pior de todos foi esta quinta-feira: 13.544 infetados, 221 mortos.
4. “1,2,3,4,5” A numeração das folhas, a ordem do discurso, também é feita à mão. No final de cada página, no lado direito, um número com um círculo à volta para marcar a ordem do discurso. Marisa Matias admite ser distraída em algumas ocasiões, por isso, para que nada saia trocado, é caso para dizer que mais vale prevenir do que remediar. Neste discurso de Viseu, a numeração ia de 1 a 5 (na imagem vê-se apenas a primeira folha do discurso).
Mayan. Atirar o Governo, a estagnação e o “centrão” contra Marcelo
Um Presidente que não foi bem Presidente, foi mais “ministro da propaganda” do Governo de António Costa: é assim que Tiago Mayan Gonçalves vê Marcelo Rebelo de Sousa e foi isso que escreveu numa das notas que preparou para levar para o debate televisivo com o Presidente da República. A lista de tópicos, que Mayan garante que servem só de cábula para estruturar ideias — não olha para as notas depois —, está dividida em tópicos. O candidato preparou-se para fazer um retrato negro do país e do mandato de Marcelo como Presidente. Mayan sabia que existiam tópicos que teria de falar no debate para colar Marcelo a Costa e fê-lo mesmo. No confronto televisivo falou da não recondução de Joana Marques Vidal na PGR, do “pacto de silêncio” com o Governo quanto à morte de um cidadão ucraniano às mãos do SEF, do anúncio da final da Liga dos Campeões ao lado de Costa, Ferro Rodrigues e de Medina e de como Marcelo tomou a garantia de Marta Temido sobre as vacinas da gripe como certa.
1. “Mais de 100kM€ de fundos europeus”. Pode parecer uma referência inócua mas talvez não o fosse tanto assim. O uso dos muitos milhares de milhões de euros recebidos em fundos europeus no passado era um dos pontos com o qual Tiago Mayan Gonçalves queria confrontar Marcelo Rebelo de Sousa. O confronto aqui não era tanto com o Marcelo-candidato, era com o sistema que vê encarnado no Presidente da República. Não é pelas promessas de mais uma “bazuca” europeia, termo que no debate Marcelo diria não gostar, que o país crescerá, queria Mayan vincar — é mudando todo o modelo de desenvolvimento económico e social, nomeadamente com o Estado a “sair da frente onde não tem de estar metido”. Aplicando as receitas do passado, as mesmas aplicadas quando Portugal recebeu todos esses milhares de milhões de euros, nada de substancial mudará. Isto na visão de Mayan.
2. “País ultrapassado por todos os países europeus”. O candidato apoiado pela Iniciativa Liberal tem uma convicção: Portugal ficou para trás na senda do progresso e do crescimento económico, nos últimos anos assistiu-se ao crescimento do fosso (prejudicial a Portugal) para os países mais ricos e até países tradicionalmente mais pobres nos ultrapassaram (mas não pela esquerda). O que tem isto a ver com Marcelo? Tudo. Para o candidato liberal, não só o Presidente-candidato e António Costa têm responsabilidades, como os principais partidos de poder, PS e PSD (o partido de Marcelo), são responsáveis. No debate, Mayan iria ainda mais longe: diria a Marcelo quando este disse que foi autarca no município mais pobre do país que “se o senhor Presidente da República for reeleito, vai terminar o seu mandato com grande probabilidade como o Presidente do país mais pobre da Europa”.
3. “País dos tachos e taxinhas”. Foi António Pires de Lima que cunhou uma expressão parecida no Parlamento: “Taxas e taxinhas”. O então ministro de Pedro Passos Coelho queixava-se na altura das burocracias e da carga fiscal elevada que “emperravam” empresas e privados. E essa mensagem, que serviu de inspiração a muitos humoristas pelo modo como Pires de Lima a passou, até tinha um destinatário particular, o à época presidente da Câmara Municipal de Lisboa, António Costa. Aqui, a ideia de Mayan passava por colocar no mesmo caldeirão o “esmagamento de cidadãos” de que muito fala — pelos impostos, isto é, “taxinhas” — e os “tachos” daquele que já considerou ser um “centrão de interesses”: PS e PSD. Ao candidato Marcelo que como Presidente “andou de mão dada com os socialistas” diria uma coisa: neste país, o mesmo que teve Marcelo como Presidente da República nos últimos anos, uma pessoa “tem se inscrever no PS para ter sucesso cá dentro”.
4. “Há uma única coisa que o move, a sua popularidade”. Tem sido uma das principais críticas feitas por Tiago Mayan Gonçalves a Marcelo Rebelo de Sousa e o candidato queria garantir que tinha a ideia bem presente quando os dois se confrontassem num debate televisivo. Mayan acusa Marcelo de agir com outras motivações que não os interesses do país. E no debate a dois, faria questão de deixar esse apontamento dizendo a Marcelo Rebelo de Sousa olhos nos olhos: “A única coisa que move o senhor Presidente é a sua busca por popularidade. Quando a popularidade baixa, é aí que começa a reagir, é aí que veta e é aí que já está pronto para tirar o tapete a ministros”.
5. “Ministro da propaganda”. No conjunto de tópicos que preparou para o debate, Tiago Mayan Gonçalves tinha escrita a nota de que Marcelo era o ministro da Propaganda do Governo de António Costa. E listava um conjunto de momentos em que servira de porta-voz do executivo socialista: “Foi assim quando” prometeu acabar com os sem-abrigo, quando deu voz à promessa da ministra (assumindo-a como verdadeira) que qualquer português que quisesse ser vacinado contra a gripe teria uma vacina à sua espera, quando “participou no pacto de silêncio relativo à morte de um cidadão ucraniano às mãos do SEF”, quando “anunciou uma final da Liga dos Campeões como prémio aos profissionais de saúde” e quando “proclamou o milagre português” na resposta à pandemia.
6. “Lista da comissão de honra”. A estratégia é colar Marcelo Rebelo de Sousa a António Costa e ao PS. Se dúvidas houvesse, um cartaz de campanha que diz que “votar Marcelo é votar Costa” é o suficiente para as desfazer. E nos pontos que preparara para o debate, tinha assinalado uma lista de socialistas que apoiavam Marcelo Rebelo de Sousa, uma espécie de “comissão de honra” (que Marcelo não teve) e que o identificava como Presidente: “Ferro Rodrigues, Augusto Santos Silva, Marçal Grilo, Seixas da Costa, Pedro Marques” foram os nomes anotados que provam o “socialismo” de Marcelo.
7. “SEF, Cabrita”. O homicídio de um cidadão ucraniano, Ihor Homeniuk, por inspetores do SEF no Aeroporto de Lisboa aparece por duas vezes referenciada nas notas que Tiago Mayan Gonçalves levou para o debate com Marcelo Rebelo de Sousa. Nas notas referentes ao “retrato do mandato” do Presidente, o candidato levava preparada a acusação de que Marcelo “participou no pacto de silêncio” relativo ao caso. E aquilo que o candidato da Iniciativa Liberal vê como uma incapacidade do Presidente em chamar à pedra e tirar o tapete publicamente a Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna que a opinião pública acusou de inação durante meses relativamente ao caso, também é incluído nas notas. O tema era um dos calcanhares de Aquiles de Marcelo — foram vários os candidatos presidenciais que o confrontaram sobre isto — e Mayan queria usá-lo. No debate, isso foi visível. O candidato garante que não olha para as notas que leva e se isso se confirmar, então tinha a ideia bem cimentada: usou mesmo a expressão “pacto de silêncio” e atirou o caso do SEF e a conivência com Cabrita a Marcelo. O PR ainda se defendeu, dizendo que já em abril falara do assunto, mas Mayan respondeu-lhe dizendo-lhe que não ligara à viúva e que tinha sido preciso uma entrevista desta e a indignação generalizada para Marcelo ser mais intervertido. Tudo porque, lá está, a sua “força motriz” é a “popularidade”.