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FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

Bailes de verão, abraços grátis e rock and roll. Na Vigília da JMJ, a fé em Deus foi grande e não dormiu (muito)

Depois da Vigília com o Papa, Francisco recolheu aos aposentos. No Parque Tejo, ficaram um milhão de jovens com sacos-cama e pouca vontade de dormir. O Observador passou a madrugada no Campo da Graça.

“Aquele padre está ali para confessar?”. A dúvida surge em português do Brasil quando faltam poucos minutos para as duas da manhã. Debaixo da lua que nasceu vermelha e ilumina os vigilantes que decidiram passar a noite no Parque Tejo — Campo da Graça para os peregrinos — não há hora para a confissão. Nem para “adorar o santíssimo”, guardado por jovens ajoelhados que se vão revezando à porta das tendas de adoração espalhadas por mais de um quilómetro à beira do Tejo, onde as hóstias consagradas passam a noite. “Para o Senhor não ficar sozinho”. Na madrugada da Vigília, um dos pontos mais altos de cada Jornada Mundial da Juventude, o corpo de Deus não é o único a ficar acordado.

“Parabéns a você, nesta data querida…”. À meia-noite em ponto, Carolina sopra as velas naquela que será a maior festa de aniversário do mundo. Faz 16 anos e tem à volta possivelmente mais de um milhão de pessoas. “Já sabia há algum tempo que ia passar os meus anos aqui e adorei a ideia”. Vem de Tábua, Coimbra, com um grupo de jovens encabeçado pela mãe, e criado de propósito para a JMJ. Dormir até fazia parte dos planos, “mas vai ser impossível”.

Os peregrinos inquietos, mais interessados na diversão do que no descanso físico, partilham o relvado, e os corredores, com aqueles que tentam dormir nem que seja por algumas horas. Alguns, estão equipados para resistir ao barulho, ao desconforto e às luzes que iluminam o recinto: ora com vendas nos olhos, com auriculares para cancelamento de ruído, colchões de ar (e mesmo os de praia), ou até camas de rede que prenderam em dois pontos da grade que delimita o recinto. Mas são os sacos-cama que reinam.

Peregrinos dormem no Parque Tejo na noite da Vigília

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

À meia-noite, a movimentação ainda era muita pelos corredores de terra batida do Campo da Graça e havia quem mostrasse sinais de saturação. Eldwin, voluntário de Aruba, nas Caraíbas, assistiu a alguns confrontos, que depressa se resolveram. “Há pessoas que deveriam estar nos seus setores, mas que vêm ter com amigos a outras, só que como isto está muito cheio pisam outros peregrinos que já estão deitados para conseguir passar, sem grande consideração”, relata.

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Eldwin controla um posto com torneiras para abastecimento de água potável — onde alguns jovens aproveitavam para lavar os dentes ou passar o cabelo por água — e também ele já mostra sinais de cansaço. “Há pessoas que se estão a irritar por tudo, é chato”, desabafa.

É certo que, mesmo na vida normal, não costuma dormir muito — não precisa de mais do que cinco, seis horas para descansar — e na JMJ não tem sido muito diferente. Mas este sábado ficou com o turno da noite e só deverá estar livre pelas 8h30 da manhã de domingo. Até lá, vai-se revezando nas sestas rápidas com um colega, em tendas próprias para voluntários. Pela meia-noite e meia ainda não sabia quando seria a sua vez.

Mesmo durante a tarde o descanso foi pouco. Ao final do dia, ainda tentou dormitar na escola onde tem estado alojado, mas as autoridades, segundo conta, não estavam a deixar ninguém entrar: represálias por um peregrino ter dormido, sem autorização, no gabinete do diretor. Eldwin e outro voluntário só conseguiram dormir 2 horas, deitados no saco-cama, num passeio junto à escola.

“O que é que vamos viver a dormir?”

O som dos batuques irrompe aqui e ali ao longo do manto de tendas, sacos-cama e colchões que se estende da ponte Vasco da Gama até além do rio Trancão. “Aquele grupo vem da Nigéria, já fomos lá perguntar”, diz Elsa Ribeiro, que segundos antes de auxiliar o Observador dançava ao ritmo da música africana que enche o setor B1. Há gente a dormir metros ao lado de gente a bailar. Mas não foi para isso que Elsa e companhia vieram de Lousada. “Temos muito tempo para dormir depois. Estamos aqui para viver a experiência, o que é que vamos viver a dormir?”.

Durante a vigília, a circulação entre setores foi livre, mas, a partir de certa hora, a PSP apertou a triagem: os peregrinos dos setores B, C e D — do outro lado do rio Trancão — não poderiam visitar a zona A, onde está o altar-palco. Tudo para evitar o excesso de concentração de pessoas na nova ponte e no setor próximo do palco. A fiscalização foi apertada: de lanternas apontadas aos peregrinos que se aproximavam da ponte, os agentes vociferavam: “Só com credenciais! Mostrem as credenciais! Têm as credenciais do A?”

Nem o cansaço de horas de espera e calor acumulados no corpo, após um dia que castigou o Parque Tejo com 40 graus sem sombra, faz esmorecer os peregrinos. No centro de um dos corredores de circulação apinhados de vigilantes, Ingrid Bevilliard e um grupo de franceses convidam quem passa a aprender a dançar rock and roll. “Fame, I wanna live forever” é a banda sonora da uma da manhã naquele metro quadrado do Campo da Graça.

“Em França dançamos rock and roll nas nossas festas de jovens católicos. Não sei se é comum noutros países. É artístico e aqui acaba por ser uma forma de conhecer outras pessoas. O meu colega está a ensinar uma espanhola”, aponta. Ingrid tinha intenção de dormir algumas horas esta noite, mas acha que a realidade vai acabar por lhe estragar os planos. “É a nossa última noite em Portugal e queremos aproveitar ao máximo. A semana toda foi muito intensa, estamos cansados, mas não queremos perder nada. Até porque vamos passar muito tempo sem nos vermos depois disto”, lamenta a futura estudante de engenharia.

Não há instrumento musical que não tenha dado entrada na JMJ, e é na noite da Vigília que as cordas, teclas e metais se fazem ouvir em todo o esplendor. Há salmos cantados em coro por pessoas que nunca se viram antes e verdadeiros bailes com coreografias que parecem ensaiadas. Além da fé em Deus, partilham a pertença ao Caminho Neocatecumenal, “um grupo de comunidades” que tem três celebrações na sua génese, conta ao Observador Marta Moreno, de Madrid. São elas a “palavra”, em que a comunidade se reúne um dia por semana para rezar; a eucaristia, celebrada ao sábado à tarde e no fim da qual se faz um baile; e a convivência, que uma vez por mês reúne toda a comunidade para partilharem as experiências que tiveram com Deus. Na noite da Vigília da JMJ, são vários os grupos desta comunidade que espalham música pelo recinto. “Nas eucaristias o baile é mais tranquilo, aqui estamos mais animados”.

Que o diga o jovem José. Tem 18 anos. Ele e os colegas do Texas, nos EUA, tocam uma harmonia de tambores conjugada com guitarra — num “pop espanhol católico”, resume — que atrai peregrinos ávidos por se divertirem e ignorarem o cansaço. “É possível que estejamos a chatear algumas pessoas com o barulho, mas também tornamos a noite de outras mais rica”, atira José.

A música foi uma constante na noite da Vigília da JMJ

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Aliás, já receberam alguns “shhh” e outros pedidos mais diretos para que fizessem menos barulho, mas continuavam firmes quando o Observador os encontrou. Até tentarem passar a nova ponte pedonal sobre o Rio Trancão, que liga Lisboa a Loures. “Não nos deixaram passar enquanto não nos acalmássemos”, lamenta José, para quem acatar essa ordem iria contra o “espírito” do grupo.

O Caminho Neocatecumental — um itinerário de formação católica — , foi criado pelo espanhol Kiko Argüello nos anos 60, em Espanha e, segundo José, tem hoje mais de dois milhões de seguidores. “Kiko Argüello criou uma nova forma de olhar para a Igreja Católica. Não é só ir à missa. Há estudos bíblicos e passos que podemos seguir ao longo da vida”, sintetiza. O caminho, segundo dizem os defensores, permite ao fiel descobrir o que é ser cristão através de um percurso com etapas. A mãe de José juntou-se ao Caminho há 20 anos, e o filho seguiu-lhe as pisadas.

José e os colegas que o acompanham no comboio de festa são “americanos de primeira geração”. Os pais são, na sua maioria, imigrantes que chegaram aos EUA vindos do México, das Honduras ou de El Salvador. E, de facto, a influência espanhola de Argüello continua bem presente — só há poucos anos, as celebrações do Caminho Neocatecumental deixaram de ser feitas em espanhol para passarem a poder ser feitas em inglês.

Ricardo e Giulia, 18 e 16 anos, não resistem à tentação da dança que a música do grupo de José lhes provoca e seguem-nos em ritmo de festa. Não sabem quem têm à sua frente, que tipo de música é ou de que país ao certo — “acho que são do Texas, não tenho a certeza”, tenta Ricardo. Mas também não importa. “Ouvimos a música, gostámos e seguimos”, diz o jovem, para quem dormir será tarefa impensável durante a noite. “É um dia único, especial nas nossas vidas”. O que vão, então, fazer no resto da noite? “Não sei… seguir pessoas do Texas!”, ri-se.

Aquele grupo de italianos, menos de 10, que se separou do grupo original mas tem permissão dos seus ‘animadores’ (uma espécie de monitores) para explorar o recinto, recusa admitir o cansaço. Mesmo apesar de Giulia e outras amigas se queixarem das condições em que têm dormido numa escola em Lisboa, em sacos-cama no chão, tal como muitos peregrinos ao longo destes dias. Ou pese embora as 3 horas que calculam ter ficado à espera, sob um sol abrasador e mochilas “pesadas” às costas. “Está aqui muita gente, podia haver melhor organização na fila de entrada”, critica Ricardo.

A noite foi passada a dormir, para alguns, mas em convívio para outros.

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Para ele, o conceito da JMJ era desconhecido até há pouco tempo. “Disseram-me que era uma ótima experiência. Acreditei e estou a gostar”, garante. Não que seja particularmente devoto, mas crê que o evento o ajudará a aprofundar a fé.

Um dos mais velhos daquele grupo de jovens exploradores, Ricardo tem, por sua vez, dormido em casa de uma família de acolhimento e não hesita: “Dormi otimamente!”. Talvez por isso não tenha dúvidas: esta noite, não é para dormir.

Marta Moreno e o amigo Juan Cerezuela partiram de Málaga de autocarro às seis da manhã de 1 de agosto numa “peregrinação surpresa”, sobre a qual só sabiam que passaria este sábado no Parque Tejo. Picaram o ponto em Sevilha, Évora e numa praia da Costa da Caparica, “porque passámos o dia mortos de calor”, antes de chegarem a Lisboa. “Amanhã não sabemos”. Só sabem que o baile não vai parar.

Abraços grátis e quebras de tensão

A dança da madrugada dos peregrinos que pernoitam no Parque Tejo também se faz em silêncio. De braços abertos, Rudy Costa dá “abraços grátis” sem ninguém pedir. O jovem da Margem Sul e o grupo de amigos que ostenta o cartaz a prometer “free hugs” já perderam a conta aos abraços que deram na hora que levam em pose de Cristo Rei. Puseram a ideia em prática pela primeira vez no dia anterior na baixa de Lisboa e não tiveram dúvidas em passar assim a noite da Vigília. “Estamos a abraçar as pessoas como se estivéssemos a abraçar os países”.

O calor do dia (e as quebras de tensão) são substituídos à noite pelo calor dos abraços e por picos de adrenalina. “Este foi o dia mais difícil, mas também o mais gratificante. É o dia em que estamos mesmo em contacto uns com os outros”, diz Luana Moreira. A JMJ apanhou-os “na altura certa”. Para Ariana Yala, o discurso do Papa Francisco na Vigília já valeu as horas de cansaço acumulado e sono perdido. “Na adolescência enfrentamos muitas lutas internas, muitas mudanças físicas e psicológicas, muitos receios e não sabemos como lidar com as adversidades. O que o Papa disse nos últimos dias vai ajudar-me a sair daqui com mais determinação. Quando disse que o único momento em que devemos olhar uma pessoa de cima para baixo é quando vamos ajudá-la a levantar-se, isso marcou-me muito”.

A mensagem do Papa Francisco ressoa na mente desperta dos peregrinos que, apesar de deixarem as orações para o dia seguinte, trocam ideias sobre a bagagem que vão levar de Lisboa. Perto da fronteira norte de um recinto que parece não ter fim, o grupo de Lousada encabeçado por Elsa Ribeiro, guarda “o companheirismo e uma outra abertura”. “Ficámos com mais esperança nestes jovens. Na religião tem de mudar muita coisa. Tem de mudar a aceitação de outros, porque a Igreja é uma só e ainda há alguma discriminação. É como diz o Papa: é para todos”.

Com o altar-palco da polémica em pano de fundo, Teresa Magalhães, do mesmo grupo de “resistentes” de Lousada, em que “ninguém passou mal”, defende que “mais importante do que a semana em Lisboa é o trabalho que temos feito como país organizador há um ano”. Lamenta “as polémicas que vão sempre ficar”, porque “o que deveria permanecer é o que conseguimos fazer como país, que foi juntar as pessoas, que já não estavam juntas desde antes da pandemia. Essa parte foi um pouco esquecida. Estão aqui um milhão e meio de pessoas menos de dois anos depois de termos estado todos fechados em casa. E isso é notável”.

Um teste à resistência, que promete adensar-se no domingo

O dia de sábado foi um verdadeiro teste à resistência dos peregrinos, com a temperatura máxima em Lisboa a tocar os 38ºC e muitos a terem de esperar horas para conseguirem entrar e refrescar-se. A maior afluência de peregrinos aos postos médicos do INEM aconteceu pouco depois do pico de calor, entre as 15h e as 19h, horas em que “as pessoas estavam mais desidratadas, mal nutridas, com indisposições várias”, sintetiza ao Observador Filipa Taré, médica do INEM destacada para um dos postos médicos avançados. Essa altura também coincidiu com a chegada do maior volume de peregrinos, que “estiveram parados muito tempo” nas filas para entrar, “sem apanhar vento, sempre debaixo do sol”.

A noite da Vigília terminou às 6h30, com música nos altifalantes

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Àquele posto médico, que pouco depois da meia-noite apenas assistia um caso ligeiro, foram chegando ao longo do dia indisposições relacionadas com desidratação, casos de hipoglicemia, traumatismos de menor gravidade como escoriações, edemas, entorses. Em dois casos foi preciso dar assistência a peregrinos asmáticos que não tinham a medicação.

Apenas num caso mais grave, uma peregrina teve de ser transferida para um hospital no exterior do recinto por um episódio de “cariz psicológico/psiquiátrico”, que não poderia ser tratado no hospital de campanha montado no recinto, para onde são enviados os casos mais graves, por não haver neles médicos de psiquiatria, adianta Filipa Taré.

Daí a pouco, uma jovem viria a entrar naquela tenda do INEM equilibrada por dois bombeiros sapadores das equipas apeadas que prestam auxílio ao longo de todo o recinto. “Queixou-se de náuseas e tem um síndrome metabólico. Foram as amigas que a trouxeram ao nosso encontro”, indicou um dos bombeiros.

O desafio promete adensar-se este domingo, dia em que a temperatura deverá subir ainda mais. Isso, conjugado com o cansaço acumulado de dias, leva a médica a antecipar ainda mais procura dos serviços do INEM.

“A partir das 8 da manhã, certamente que vamos ter muitas ocorrências, com as pessoas mais cansadas, com menos tolerância, já com menos reserva funcional para tolerar tanto calor outra vez. Vai haver aqui também uma componente de ansiedade e de saturação que já tem mais a ver com o sistema nervoso propriamente dito do que com o corpo”, acrescenta Filipa Taré.

Os anos da Carolina e a “santa” Jaqueline

Naquele que é o penúltimo dia de JMJ, os balanços começam a ser inevitáveis nas conversas dos peregrinos. Até porque há uma noite para passar. A festa de aniversário de Carolina transformou-se, entretanto, num muro de lamentações de um grupo que, a poucas horas de o Papa revelar onde será realizada a próxima Jornada — correm os rumores de que será Seul —, jura que não vai “meter-se noutra”.

“Não sabe o que passámos para aqui chegar”, começa por contar Miguel Mota. “Pode escrever: o Miguel passou fome na JMJ”. Doses pequenas nas refeições incluídas nas senhas e pouca sensibilidade para intolerâncias alimentares são algumas das queixas. “Era o fundo do prato e um copo de água. Quanto mais rico o restaurante, mais pequenas as doses. Salvou-nos a Jaqueline”, de uma conhecida cadeia de padarias, “que quando viu que estávamos famintos encheu-nos os sacos”, diz Carla Abrantes, mãe de Carolina.

Alguns jovens aproveitaram para lavar os dentes ou passar o cabelo por água

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

O calvário do grupo de Tábua continuou no dia da Vigília. “Fomos expulsos do metro porque estava tanta gente que a polícia estava com medo que as pessoas caíssem à linha”. O caminho até ao Parque Tejo fez-se a pé desde a Alameda D. Afonso Henriques. Quatro horas de caminho feitas debaixo de um sol tórrido. “De lá até aqui não encontrámos nada, nem voluntários nem água”. Foram os moradores do Parque das Nações que salvaram o dia do grupo. “Deram-nos água e molharam-nos com mangueiras e alguidares. O Miguel sentiu-se mal e queriam levá-lo para casa para lhe darem um chá. No meio do caos aconteceu esta coisa boa. Estamos muito agradecidos à população”, diz Ângela Nogueira.

Mas a maior indignação surgiria na hora de dormir. Miguel, Carolina e os restantes 15 companheiros foram alocados ao setor A, o mais próximo do altar-palco da JMJ. “Quando chegámos disseram que já não havia espaço e mandaram-nos para o setor D”, alguns quilómetros além da nova ponte do Trancão. “Pagámos 250 euros para estar aqui”. E ficaram. O acampamento foi montado em “zona restrita”, reservada à circulação. “Se a polícia tiver de passar encolhemos as pernas”. As queixas acabam a ser vertidas já em tom de brincadeira. Afinal, são os anos da Carolina. “Foi uma experiência boa porque nunca estivemos tanto tempo juntos”.

“Ai acordam, acordam”

A ordem de partida, largada, fugida foi dada às cinco da manhã em ponto. Com o altar-palco iluminado de cor-de-rosa, centenas de padres em sprint cortaram a meta da Vigília para ver o Papa de camarote.

Francisco chega antes das 9h e no Parque Tejo a ordem é para que os peregrinos que estejam a dormir nos corredores de passagem de terra batida sejam acordados e instruídos a desimpedir passagem. Às seis da manhã, ainda nem o sol acordou. Faltam três horas para o início da missa de envio, que encerra a JMJ, mas os agentes da PSP avançam em grupo, cerca de 10. Hesitam antes de acordar o primeiro grupo de peregrinos. “Ai acordam, acordam!”, atira um deles. María, de 25 anos, e outras colegas de Espanha, acordaram à força.

Indignada, e enquanto outros agentes continuam a acordar mais peregrinos, Maria explica a um deles que a organização lhe deu autorização para ali dormir, por já não haver lugar junto do grupo que acompanha. “Vou-lhe pedir que respeite o meu trabalho. As indicações que deram é que as pessoas não podem estar na estrada. Tem de passar para aquele lado [gesticula para o lado direito] ou para aquele lado [para o esquerdo]”, explica o agente, calmamente.

Ao Observador, Maria adianta que a justificação dada pelo primeiro polícia que as abordou foi que o Papa ali passaria por volta das 7h30 pelo que, até essa hora, a via teria de ficar desimpedida. Maria e as colegas, espantadas com o que acabou de acontecer, mantêm-se sentadas com os sacos-cama em volta, ainda a decidir o que fazer.

Quem ignorou as instruções dos agentes foi Sara, 17 anos, e as quatro amigas espanholas. Adormeceram às 2h: antes disso, com o barulho que se fazia ouvir, e a vontade de conviver com os colegas de peregrinação, o sono não veio. A Sara, os agentes não deram qualquer explicação. Nem ao jovem espanhol que se abeira do grupo de peregrinas e grita, indignado com a atitude dos polícias: “Hijos de p***! Acordam-nos assim?” Sara e as amigas voltariam a deitar-se, mas não por muito tempo. Passavam 30 minutos das seis da manhã quando a música católica começou a ecoar nos altifalantes do Parque Tejo. Às 7h, o after da Vigília ficou a cargo do techno do Padre Guilherme. No Campo da Graça, já nasceu o dia.

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