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Artigo em atualização ao longo dia dia
Agora já não é deputado pelo distrito do Porto, passou para cabeça-de-lista pelo círculo fora da Europa num gesto que foi lido como o sinal mais claro de que António Costa estava apostado na maioria absoluta. Augusto Santos Silva tinha trocado a candidatura a deputado pela sua cidade, pelo círculo onde raras vezes o PS elegeu um deputado, sendo uma delas a quase-maioria de Guterres em 1999. Por isso, não deixa de ser curioso que tenha sido ele quem veio baixar as expectativas dessa ambição (sempre ocultada), ao admitir que o objetivo eleitoral socialista é antes travar o crescimento dos parceiros dos últimos quatro anos, nomeadamente o Bloco de Esquerda.
Os socialistas temem ficar na mão do partido de Catarina Martins numa segunda versão da “geringonça” e, por isso mesmo, Santos Silva veio até ao almoço-comício de Matosinhos — onde também esteve o socialista Francisco Assis (e voz contra a geringonça) — para alinhar as tropas para a última semana de campanha: “Esses que dizem que as contas certas não interessam a ninguém não podem ter o poder decisivo e uma influência desmesurada na próxima legislatura”.
Há um novo diabo entre os socialistas e tem nome de parceiro parlamentar dos últimos quatro anos. Foi basicamente isto que o socialista que geriu os Negócios Estrangeiros veio fazer à campanha, ele que marcou o último congresso do partido com uma discussão ideológica sobre o risco de o PS se chegar demasiado à esquerda. Esclarece que não tem sombra de dúvida de que o partido deve “manter o mesmo diálogo à esquerda”, só não quer que essa esquerda fique com o PS na mão.
“Queremos manter o mesmo diálogo que tivemos nesta legislatura, um diálogo à esquerda que garanta no Parlamento as condições mais amplas de apoio a políticas progressistas, mas para que isto seja possível, é essencial a força do PS, a estabilidade política”, detalhou para, mais à frente no seu discurso, ainda sublinhar como é decisivo clarificar a posição socialista nesta altura: “É necessário sermos claros sobre isto: queremos seguir o caminho, continuar com as atuais condições políticas, mas com força do PS. Que seja claro que o PS é que lidera, que o Governo é do PS, a política é do PS”.
Santos Silva deu por garantido o “derrube do muro”, daquela “estúpida teoria do arco da governação” da qual BE e PCP estavam excluídos. Sublinha que isso já foi conseguido por Costa, mas que agora é importante que essa solução não lhe fuja do controlo. O exemplo de Espanha voltou a ser referido, mas agora por Santos Silva que o aproveita para mostrar como é “quando os socialistas “não têm a força necessária. E quando as forças que têm dúvidas sobre a relação com a Europa têm força desmedida”. “Não há estabilidade política e a vida torna-se mais difícil para as pessoas”, conclui.
Acusações de “ataques e calúnias” ao PSD e o afundanço de Cristas
António Costa subiu ao palco a seguir e também aflorou esta questão, embora de forma bem menos clara que o seu número dois no Governo. Disse que “todos os dias” ouve na rua “quem quer votar no PS para a maioria ou sem maioria”, “que quer o PS no Governo com ou sem geringonça”, dúvidas a que respondeu ali no Centro de Desportos e Congressos de Matosinhos, tornado numa enorme cantina socialista: “Qualquer que seja a forma que desejem [para o futuro Governo], só têm um ponto em comum: é preciso votar no PS para ter Governo do PS, para mais quatro anos e estabilidade política”.
Ainda desejou que os que querem “alternativa” “possam ir rio abaixo à procura” dela, um trocadilho óbvio mas que serviu para não ter de referir diretamente o seu adversário Rui Rio. Já Santos Silva, fê-lo sem cerimónias e não só chamou Rio pelo nome, como fez o mesmo com Assunção Cristas, a líder do CDS. Aliás, os socialistas de Matosinhos presentes do almoço reagiram com mais apupos a Cristas do que ao antigo autarca do Porto (contra Rio mal se ouviram).
Ainda assim, foi com Rio que o socialista foi mais fundo dos ataques. Começou por reconhecer que “parece ter recuperado alguma energia e visibilidade e até alguma unidade”, para depois aplicar aos sociais-democratas o golpe maior: “Nós não queremos trazer as instituições da República para a lama onde elas nunca estiveram. E com o PS nunca estarão”. Neste ponto tocou no caso Tancos para dizer que “as questões judiciais se resolvem nos tribunais e as políticas tratam-se no Parlamento. Nós sabemos que há um nível de degradação da linguagem política, ataque e calúnia e o voto no PS será também o voto contra essa degradação da democracia”.
Ainda no ataque a Rio, Santos Silva chamou-lhe “introdutor de belas teorias, de rigor financeiro e clareza de decisões” e lembrou que o social-democrata sempre disse “que ser acusado não é ser condenado”. Depois disse que as suas teorias “só têm um problema”, acusando Rio de “desdizer o que disse” em ambas as situações.
Já com Cristas foi mais poupado nas críticas e disse apenas que a líder do CDS “parece querer afundar o nível do debate político democrático”, mas que a julgar pelas sondagens é ela própria que “se quer afundar no sufrágio dos portugueses”.
António Costa está na expectativa que o voto antecipado dos emigrantes permita que Santos Silva seja eleito antes dele mesmo, em Lisboa. Esta foi uma aposta alta, com uma carta forte do partido num círculo de eleição pouco certa. O que o PS tem por certo é que está a entrar na semana do tudo ou nada e o apelo à mobilização vai em crescendo. Costa até agarrou no exemplo que ali estava na sala, Rosa Mota, para lembrar que a atleta olímpica “não ganhou a maratona aos 21 km, mas quando cortou a meta em primeiro lugar”. Desta vez, não há volta a dar, Costa quer ganhar as eleições.
Deputado do SMS aparece, de cassete enfiada: “Não comento”
Tiago Barbosa Ribeiro apareceu em Vila Nova de Gaia, depois de ter desaparecido na arruada do PS de Santa Catarina há dois dias. Ele é o elemento que liga a campanha socialista diretamente ao caso Tancos, já que é candidato a deputado e foi apanhado numa troca de SMS com o ex-ministro da Defesa que o Ministério Público valoriza na acusação do caso Tancos, tal como o Observador revelou. Em declarações aos jornalistas, meteu a cassete: “Não vou fazer nenhum comentário”; “Não tenho nada a acrescentar”; “Tenho conhecimento através da comunicação social”.
Tancos é assunto sensível para o PS, como uma granada de mão sem a cavilha de segurança. Tanto que atrás dos jornalistas estava o ministro do Ambiente e também candidato pelo Porto, Matos Fernandes, a dar uma ajuda ao jovem deputado com gestos para que acabasse por ali as declarações. O deputado socialista seguiu o guião à risca e não avançou mais que aquelas três ideias, fossem quais fossem as perguntas. O ministro confessou que já sabia, no SMS? “Não vou fazer nenhum comentário. Tenho conhecimento através da comunicação social”.
“Eu sabia.” Azeredo Lopes admitiu a deputado do PS que sabia do ‘achamento’
O socialista é testemunha no processo de Tancos, mas ainda não foi ouvido. “Não fui ouvido nem contacto pelas autoridades, como tal não tenho mais nada a acrescentar”. Não foi mesmo além disto e seguiu para a arruada, pela marginal da praia da Aguda, em Arcozelo, atrás do candidato António Costa, mas sempre afastado do epicentro da caminhada onde seguia o líder socialista.
Aida monopoliza os beijinhos do candidato que mais diz “muito bem” por minuto
A Aguda é praia de pescadores e naqueles cerca de 500 metros que Costa percorreu pela marginal as queixas foram sobretudo nas áreas da saúde e das pensões. O candidato foi registando, recusando, mas sobretudo esquivando-se com o habitual “muito bem” com que responde a quase tudo na rua — mesmo que nem sequer encaixe assim tão bem na conversa, como quando pela frente aparece um caso mais dramático. “Muito bem”, “é preciso é ter força”, “felicidades”. Começou com Aida, uma das figuras mais extasiadas desta arruada a recusar partilhar o candidato com as amigas que, lá atrás, tentavam furar a barreira de jornalistas, seguranças e apoiantes para chegar ao beijinho eleitoral.
“Ó Aida deixa a gente passar!” Três senhoras já estavam fartas de tanta conversa da amiga com Costa mas ela não descolava e por ali seguiu posicionada, de instinto mediático apurado à frente das câmaras, a gritar “é PS, é PS, é PS”. Costa seguia juntamente com Rosa Mota, Carlos César, Matos Fernandes, Alexandre Quintanilha (cabeça de lista pelo Porto), Eduardo Vítor, presidente da Câmara de Matosinhos, e José Luís Carneiro.
Além de candidato pelo Porto, Carneiro é também o secretário de Estado das Comunidades e está mesmo ali à mão para um pedido que aparece ao candidato a dada altura. “Sou emigrante em França, é muito duro deixar o nosso país. É uma dor muito grande”. A senhora que o aborda quer regressar a Portugal e o líder socialista lembra que tem ali o homem certo para lhe explicar o que o PS promete nessa matéria. “Agora há o programa Regressar tem alguns incentivos” para os emigrantes que querem voltar ao país”. “Nos primeiros cinco anos só paga 50% de impostos, se regressar com promessa de contrato de trabalho”. Costa mete-se na conversa:
– Imagino que lá o ordenado seja superior…
– Lá se ganha, lá se gasta.
– Ora bem!
– O dinheiro não paga estarmos no nosso país, no nosso lar à beira dos nossos pais.
– Olhe: volte!
E com esta, António Costa segue caminho, enquanto Carneiro fica para trás a anotar o contacto da senhora num panfleto do PS que leva na mão. Ela vai ditando os números, de telemóvel em riste a registar mais uma imagem de António Costa.
“Ah pois, agora é abraços e beijinhos, depois os corruptos ficam todos cá fora”
Outras duas abordagens foram no mesmo sentido: “Quero reformar-me mais cedo”. Neste caso, Costa não recorre a mais ninguém e é ele mesmo quem corta a conversa pela raiz ao responder que a “aí é muito difícil, temos de aumentar e reforçar sempre a sustentabilidade da segurança social”. “Pronto, é só um pedido”, responde-lhe uma das senhoras que o aborda com esta queixa. “‘Tá bem. Fica o pedido”, devolve-lhe o candidato encolhendo os ombros como quem diz que nada há a fazer.
Uma outra queixa, de uma senhora, em matéria de saúde.A neta que tem uma “doença genética” precisa de um medicamento demasiado caro e com “baixa comparticipação” do Estado. Costa quer saber mais, mas não tem solução a dar, ali em poucas palavras. “Muito bem”.
“Ai que o homem só se vira para a esquerda”, comenta-se lá atrás entre risos numa crítica ao candidato que corre todos quantos estão sentados no muro do paredão. Nem a cadela Filipa escapa às festas de Costa que, durante o passeio, é amassado a toda a prova, com palmadas sonoras nas costas que o afastaram da rua, devido a uma lesão, no sábado. “Já está tudo bem”, garante a uma senhora que lhe pergunta pela maleita.
O que já não vai tão bem, para um homem que o espera de pé em cima do muro, é o combate à corrupção. Mal o candidato socialista lhe estende a mão, o homem estende-lhe a sua preocupação. “Sou portista. O seu clube é outro”. Costa ainda se ri, mas desmancha de imediato quando percebe que dali não vem uma conversa circunstancial que fique bem numa arruada. O senhor fala-lhe do presidente do clube dele, Luís Filipe Vieira do Benfica, e de Rui Pinto, hacker que terá acedido de forma ilegal a correspondência eletrónica do clube e que foi acusado no caso Doyen.
– Ponha-se firme, meta-os lá dentro!
– Acha que é o primeiro-ministro que prende pessoas?”
– Mas ando a votar no primeiro-ministro para quê? Para poupar a corrupção?
– Não diga isso…
– Ponha-os lá dentro!
– Isso não me compete a mim, isso é com os tribunais.
– Ah pois, agora é abraços e beijinhos, depois os corruptos ficam todos cá fora.
Esta última frase já bateu nas costas do socialistas que seguia a arruada onde foi questionado pelo jornalistas sobre o que era uma “maioria de valor reforçado”. A expressão é de Carlos César que andava por ali ao lado, mas ninguém a traduz. O que é afinal? “É o que os portugueses nos derem”, contorna o líder do PS.