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De "patinho-feio" ao "monstro" Harvey Weinstein. A ascensão, a queda e agora o julgamento do magnata do cinema

De jovem "com acne", "peso a mais" e sem jeito para as mulheres passou a um dos maiores nomes da indústria do cinema até à grande queda. Harvey Weinstein começa a ser julgado esta segunda-feira.

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[Este artigo foi originalmente publicado em setembro de 2018 e atualizado em janeiro de 2020, a propósito do início do julgamento de Harvey Weinstein]

Alguns dos maiores nomes de Hollywood consideravam-no um amigo e empresário de confiança. Do jovem “medonho”, com “acne” e “peso a mais” que nunca foi “de ter namoradas ou encontros”, Harvey Weinstein passou a magnata do cinema, rodeado de mulheres, amigos e celebridades que faziam vénias ao seu trabalho e conquistas. Construiu um império do nada e foi um dos nomes mais importantes da indústria cinematográfica. Agora é o “monstro de Hollywood” e o “predador sexual”, cujo lastro de escândalo, que incendiou o movimento #MeToo, começa esta semana a ser julgado em Nova Iorque, depois de um adiamento motivado pela soma de novas acusações.

Uma queda vertiginosa que ainda assim não compromete a fé do arguido. Num troca recente de emails com a CNN, Weinstein confia mesmo no seu regresso uma vez resolvido o caso. “Vai implicar algum trabalho para reconstruir”, admite no entanto, sobre o seu papel na indústria do cinema, e a leste de um dos cenários mais drásticos em cima da mesa: a possibilidade de incorrer numa pena de prisão perpétua. Já em dezembro, foi duramente criticado na sequência de uma entrevista dada ao New York Post, na qual se apresentava como “um homem esquecido”. De imediato, grupos como o Silent Breakers, movimento de mulheres que rejeitam silenciar o caso e esquecer o efeito nefasto de Harvey, sublinharam que o antigo magnata será sempre recordado. Pelos piores motivos.

O produtor norte-americano passou de adorado a odiado depois de dezenas de mulheres o terem acusado publicamente, em outubro de 2017, de conduta sexual imprópria. Os testemunhos foram publicados primeiro pelo New York Times e depois pela revista The New Yorker. As investigações foram o início daquele que viria a ser um dos maiores escândalos que abalou Hollywood. Abuso sexual, violação, assédio: são estas as palavras que hoje se associam àquele que foi um dos homens mais influentes do entretenimento. Depois da ascensão – com altos e baixos pelo caminho –, Weinstein caiu em desgraça. O homem que mudou a forma como se olha para o cinema é o exemplo perfeito de como em Hollywood se pode subir bem alto, mas também descer a pique.

Entretanto, a estratégia seguida pela defesa de Weinstein, encabeçada por Donna Rotunno, poderá basear-se num argumento de “senso comum” — o de que uma vítima não costuma manter contacto com o predador, como terá acontecido em alguns casos.

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A trajetória de Harvey Weinstein, o famoso e temido magnata de Hollywood, tem sido tão volátil quanto a sua personalidade. Ao longo do caminho, impulsionou carreiras de cineastas como Quentin Tarantino e Steven Soderbergh e ganhou a admiração de muitos, mas a reputação de homem “abrasivo” com “temperamento lendário” rendeu-lhe também muitos inimigos (e agora mais que nunca).

No rescaldo do escândalo Weinstein, episódios que envolvem outras personalidades foram revelados. As consequências são óbvias (a Netflix revelou a morte de Frank Underwood, personagem interpretada por Kevin Spacey, ator que deixou de ter trabalho depois dos casos em que esteve envolvido terem sido tornado públicos), mas os efeitos ninguém sabe até onde podem chegar — e durante quanto tempo. No meio de tudo isso, Weinstein tornou-se figura central nesta tempestade. Afinal, quem é o homem que se esconde por trás do produtor de cinema?

Há muito que “já era um predador”

As acusações de que foi alvo ao longo dos últimos dois anos levam a crer que Weinstein é um homem sedento de poder que deixou que a fama lhe subisse à cabeça e mudasse a forma como lidava com os que o rodeavam – especialmente no que toca às mulheres. Mas muito antes de Weinstein ser o famoso Weinstein, o produtor de 66 anos parecia já desenvolver um padrão de comportamentos abusivos, de assédio e de violência desde a juventude.

Numa série de relatos recolhidos pelo The Hollywood Reporter, amigos e conhecidos que com ele conviveram na cidade de Buffalo dão conta de um jovem de extremos: charmoso e grosseiro, brilhante e beligerante, mas sempre “ferozmente competitivo”. A par de alguns episódios de violência, em que chegou a agredir física e verbalmente o amigo de infância Alan Brewer e mesmo o irmão mais novo, Bob Weinstein, há também relatos de comportamentos perversos já nessa altura.

Os irmãos Weinstein: Bob e Harvey.

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Uma das histórias remonta aos anos 70, altura em que era promotor de concertos e em que o cinema ainda era uma miragem na sua vida. Certo dia, o jovem Weinstein, com cerca de 22 ou 23 anos, ofereceu bilhetes para um concerto a uma mulher – que não quis ser identificada – e pediu-lhe que se dirigisse a sua casa para os ir levantar. Ora, assim que chegou, foi o colega de casa quem lhe abriu a porta e quem lhe disse para ir ter com Harvey à casa-de-banho. Para seu espanto, assim que entrou encontrou-o nu e ele pediu-lhe, de forma natural, que lhe massajasse as costas. A mulher disse que estava atrasada para um encontro com os amigos e saiu imediatamente da casa-de-banho, pegando nos bilhetes que estavam na mesa de jantar. Quando depois assistiu ao concerto, sentiu que devia agradecer-lhe o gesto e foi até ao seu escritório, onde ele a tentou beijar, deixando claro aquilo que procurava. “Ele queria sexo oral”, afirmou.

“Eu pensei: Tudo bem. Vou só olhar para a cara dele, conseguir os cheques assinados e sair daqui. São pessoas sofisticadas, fazem isto o tempo todo”
Paula Wachowiak, 2018

“Eu desmoronei. Estava a tremer”. Foi assim que Paula Wachowiak se sentiu depois de ter um encontro menos agradável com Harvey Weinstein. Corriam os anos 80 quando esta jovem estudante sonhava com uma carreira no cinema e estava a fazer parte da produção do filme “The Burning” (1981). Certo dia, um funcionário da produção pediu-lhe que levasse uma pasta de cheques ao quarto de hotel de Harvey. Quando Wachowiak bateu à sua porta, o então inexperiente produtor estava em tronco nu, apenas com uma toalha enrolada à cintura. Só quando a porta se fechou atrás de si, percebeu o que se estava a passar. “Eu pensei: Tudo bem. Vou só olhar para a cara dele, conseguir os cheques assinados e sair daqui. São pessoas sofisticadas, fazem isto o tempo todo”. Foi então que Weinstein largou a toalha e colocou a pasta de cheques em cima do seu colo. Perante o embaraço da jovem, ele riu-se, pedindo-lhe ainda uma massagem. “Isso não faz parte do meu trabalho”, respondeu ela na altura. Assim que saiu porta fora, desatou a chorar.

O cenário não é muito diferente daquele que foi sendo descrito por inúmeras mulheres nos últimos tempos. Eram os primeiros indícios de que à sua frente se poderia desenhar um caminho que ia terminar de forma desgostosa. Muitos dizem que o poder lhe subiu à cabeça e que se aproveitou do seu estatuto, do seu cargo bem posicionado, para fazer (ou tentar fazer) das mulheres o que queria, mas os amigos de infância afirmam que não foi só o poder que fez dele aquilo que é hoje e que há muito que “já era um predador”.

Dizem que aquilo em que se tornou é também fruto da forma como os pais lidavam com ele e com o irmão e do facto de Miriam, ser “uma mãe irritada”, e de Max ser “um pai ausente” — embora Harvey e Bob sempre tenham descrito os pais como “amorosos”. Um amigo do irmão mais velho afirma que “a maneira como ela [a mãe] o tratava está ligada à personalidade explosiva que ele desenvolveu“. Uma amiga de Miriam conta mesmo que eles, os irmãos, “estavam aterrorizados” com a mãe, que era muito autoritária e que fazia comentários — dirigidos ao filho mais velho — como: “És gordo. Vai lá para fora brincar!”

“Acho que as pessoas estão chateadas com o seu sucesso. Ele não é uma pessoa humilde. Há, no Harvey, um certo tipo de confiança que as pessoas veem como arrogância. As pessoas querem que sejas um pouco humilde relativamente ao teu sucesso, e ele não o é, de todo”
Cineasta Sydney Pollack, 2001

Com o pai, que passava a vida “a trabalhar no duro para sustentar a família”, aprendeu a ser persistente. Segundo o filho mais novo, Max queria “controlar o seu destino e ter um certo estatuto”uma característica que Harvey viria a herdar – daí ter tentado vários negócios. O sucesso, porém, era sol de pouca dura e seguiam-se sempre períodos de instabilidade e incerteza. Foi uma grande influência para os filhos, mas foi com o tio Shimmy que Harvey aprendeu que “talvez a honestidade importe menos que o sucesso”.

“Acho que as pessoas estão chateadas com o seu sucesso. Ele não é uma pessoa humilde. Há, no Harvey, um certo tipo de confiança que as pessoas veem como arrogância. As pessoas querem que sejas um pouco humilde relativamente ao teu sucesso, e ele não o é, de todo”, disse o cineasta Sydney Pollack à New York Magazine, em 2001.

Quando entrou na secundária John Bowne, em Nova Iorque, “mergulhou na vida extracurricular”: fez parte do clube de rádio, da associação de estudantes e do jornal da escola. O filho mais velho de Max e Miriam tinha uma vida preenchida e, apesar de não fazer parte do grupo dos “populares”, tinha um núcleo de amigos bem forte. Um deles era Alan Brewer. “Ele [Harvey] não era particularmente atlético, mas era inteligente”, contou. Tinha uma ótima memória — conhecia o elenco de todos os filmes — e era um rapaz organizado. Brewer recorda que para o testar, um dia, Jeff Malek, amigo de ambos, lhe perguntou sobre o elenco de “O Feiticeiro de Oz”. O resultado foi incrível: “Ele fez uma lista completa, assim, de memória, do elenco, da equipa toda, até do guarda-roupa”.

A inteligência estava lá, mas faltava-lhe uma certa elegância e jeito para lidar com o sexo oposto. “Era muito desajeitado com as mulheres porque era realmente medonho”, relembrou Peter Adler, acrescentando: “Usava sarcasmo e humor nas suas amizades, mas nunca foi rapaz de ter uma namorada”. Nem Adler nem os outros amigos de Harvey recordam comportamentos suspeitos que sugerissem que se tornaria uma espécie de “predador sexual”, até porque as mulheres estavam bem longe da sua vista e do coração.

O mesmo não se pode dizer sobre o seu lado mais violento. Alan Brewer, que contou um episódio de violência de que foi alvo disse mesmo que Harvey “era uma pessoa que tinha tremendos ataques de raiva e nenhum sentido de lealdade ou amizade”. Talvez a revelação não seja tão surpreendente assim, basta relembrar, por exemplo, o testemunho de Salma Hayek sobre um comportamento semelhante. A atriz contou que durante a rodagem do filme “Frida”, em 2002, Harvey ameaçou matá-la depois de ela ter recusado envolver-se com ele sexualmente.

Salma Hayek sobre Harvey Weinstein: “Ele ameaçou matar-me”

Os primeiros passos para o sucesso e quando perdeu o fio à meada

O sucesso do produtor norte-americano começou muito antes de enveredar pelo caminho da indústria cinematográfica. Depois de se formar pela State University de Nova Iorque, em 1973, Weinstein lançou um negócio de promoção de concertos — com o irmão mais novo, Bob Weinstein, e com Cork Burguer –, que colocou Buffalo no mapa, trazendo grandes nomes da música como os Rolling Stones e Jethro Tull à cidade. “Eles eram muito bons promotores, e Buffalo é uma cidade ótima se fizeres coisas boas, por isso as pessoas gostavam muito deles”, contou o jornalista local Michael Healey.

Aproveitando a onda de sucesso, os irmãos decidiram apostar noutra área e foi assim que surgiu a companhia de distribuição de filmes Miramax – cujo nome é uma junção dos nomes dos pais, Miriam e Max –, que apostava em filmes com orçamentos reduzidos e não ligados aos “grandes estúdios” de Hollywood, tendo-se tornado esta numa das imagens de marca da produtora. Chegou já perto dos anos 80, mas foi no final da década que tudo mudou. “Sexo, Mentiras e Vídeo”, de Soderbergh, “O Meu Pé Esquerdo”, de Jim Sheridan e “Cinema Paraíso”, de Giuseppe Tornatore, foram os primeiros grandes êxitos que deram à Miramax pernas para continuar a andar. E tudo mudou não só a nível profissional. Em 1987, aquele que viria a ser um dos grandes nomes do cinema casou com a sua então assistente, Eve Chilton Weinstein. A relação, da qual pouco se falou pelo facto de Chilton ser reservada relativamente à vida pessoal, viria a terminar 17 anos depois.

Harvey Weinstein e Quentin Tarantino, em 2005.

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Parecia que os anos dourados tinham vindo para ficar. A Disney comprou a Miramax, ainda que o negócio tenha ficado sempre nas mãos dos irmãos Weinstein, e seguiu-se o financiamento de um dos mais icónicos filmes da década de 90 — “Pulp Fiction”, de Quentin Tarantino –, que arrecadou mais de 200 milhões de dólares em todo o mundo. Durante 11 anos, a Miramax teve, pelo menos, um filme por ano a ser nomeado para os Óscares, tendo ganhado o prémio para melhor filme com obras como “O Paciente Inglês” (1996), “A Paixão de Sheakespeare” (1998) e “Chicago” (2002).

Os irmãos mudaram o modo como o mundo olhava para a indústria do cinema, mas foi a forma peculiar de agirem que marcou aqueles que com eles trabalhavam: “A Miramax funcionava na base do medo. Eles são intimidadores, gritam muito, espumam pela boca”, disse Stuart Burkin, funcionário da empresa, à Vanity Fair. Nesta altura, já o magnata do cinema tinha começado – há muito — a fazer-se valer do poder para pedir favores sexuais às mulheres com quem se cruzava. Ao longo da década de 90, e segundo o New York Times, assinou acordos extrajudiciais com várias mulheres, incluindo uma jovem assistente, em Nova Iorque, em 1990, a atriz Rose McGowan, em 1997, e uma outra assistente, em Londres, em 1998.

A entrada nos anos 2000 podia significar um passo ainda maior para a companhia que tinha fundado com o irmão, mas os problemas começaram a surgir quando em 2005 a Disney largou a Miramax, altura em que Harvey e Bob decidiram fundar um novo estúdio independente: The Weinstein Company. Porém, o toque especial do norte-americano parecia ter deixado de ser isso mesmo, especial. Dos cerca de 70 filmes que lançaram entre 2005 e 2009, a maioria não tinha qualquer sucesso – “Pecado Capital” (2005), com Clive Owen e Jennifer Aniston, é um dos muitos exemplos, descrito pelos críticos como “um pedaço de lixo polido e muitas vezes ridículo” e “risível”. Em 2011, o produtor disse à Vanity Fair: “Acho que tirei os meus olhos da bola. Em 2005, 2006, 2007, eu estava completamente fora”. Para complicar toda a situação, a NBC Universal processou a empresa por Harvey e Bob terem feito um acordo para alterar o “Project Runway” da Bravo para a Lifetime.

“The Comeback Kid”, o regresso de Weinstein

Depois da tempestade, diz-se, vem a bonança. E o caso de Weinstein não foi exceção. O ano de 2011 marcou o seu regresso em grande: “O Discurso do Rei” (2010) foi nomeado para 12 Óscares, tendo arrecadado o de Melhor Filme. “The comeback kid”, foi assim apelidado pelos críticos nesse ano, impressionados com o feito do norte-americano. “Estamos concentrados nos filmes, a colocar a equipa reunida, e acho que o próximo ano pode ser tão bom ou melhor do que qualquer ano que tivemos na Miramax”, disse ao Times nesse mesmo ano.

E tinha razão. No ano seguinte arrecadou três Globos de Ouro, incluindo o de Melhor Filme com “O Artista”. Durante a cerimónia de atribuição dos prémios, Meryl Streep chamou-lhe “Deus”, arrancando da plateia, e do próprio, múltiplos risos.

Quando rebentou o escândalo, McGowan acusou Meryl Streep de saber do que se passava e de nada ter feito. Na altura, a atriz, vencedora de três Óscares e nomeada para outros 20, reagiu dizendo: “Eu não sabia dos crimes de Weinstein, nem nos anos 90 quando ele a atacou ou nas décadas subsequentes quando ele atacou outras mulheres. Não estive em silêncio deliberadamente.” À semelhança do já tinha feito, afirmou que nunca teve conhecimento do comportamento do produtor. “Eu não sabia. Eu não aprovo violações. Eu não sabia. Não gosto que jovens mulheres sejam assediadas. Eu não sabia que isto estava a acontecer”.

Nesse mesmo ano, foi nomeado como uma das 100 pessoas mais influentes pela revista Time. “Toda a gente em Hollywood gosta de um regresso, e mesmo que parecesse improvável, Weinstein é o regressado. Eles dizem que não há segundos atos na vida, mas Weinstein encontrou um terceiro. Vamos esperar que acabe bem”, lia-se no jornal britânico The Guardian a propósito do reaparecimento do produtor. Mas o final não viria a ser assim tão feliz.

Harvey Weinstein e Meryl Streep, em 2012.

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A queda, 38 anos depois

Todo o império que construiu e a fama que conseguiu ao longo de anos e anos de trabalho foram deitados abaixo na manhã de 5 de outubro de 2017, com a publicação de uma investigação do New York Times, que dava conta de uma história detalhada de três décadas de alegações de assédio sexual contra Harvey Weinstein. A acusação da atriz Ashley Judd – e que viria a ser apenas a ponta do iceberg — desencadeou uma série de denúncias semelhantes por parte de atrizes como Angelina Jolie, Cara Delevingne, Rose McGowan, Gwyneth Paltrow, Lupita Nyong’o, Salma Hayek, Uma Thurman, Mira Sorvino e Asia Argento, de funcionárias do produtor e de outras celebridades.

A atriz Ashley Judd contou que há 20 anos o produtor a convidou para um pequeno almoço no hotel Peninsula Beverly Hills. Na receção, disseram-lhe que ele estava à sua espera no quarto. Quando a porta se abriu, Weinstein estava de robe e perguntou-lhe se preferia dar-lhe uma massagem ou vê-lo tomar banho. Judd confessou ao jornal que pensou “como é que eu saio deste quarto o mais rápido possível sem rejeitar Harvey Weinstein?

Paltrow e Jolie também relataram situações de assédio sexual pelo produtor no início das suas carreiras, e detalharam como avisaram outras mulheres ou como Brad Pitt confrontou Weinstein. A modelo Ambra Battilana Gutierrez levou o seu caso à polícia, mas o procurador de Nova Iorque não deduziu acusação, enquanto a jornalista Lauren Sivan diz ter sido encurralada num corredor de um restaurante, onde o produtor se masturbou para um vaso em 2007. Por sua vez, Asia Argento contou que foi violada por Weinstein durante o Festival de Cannes, em 1997. O método era sempre o mesmo: um convite para o quarto de hotel utilizando o trabalho como pretexto.

O discurso arrebatador de Asia Argento em Cannes: “Eu fui violada por Harvey Weinstein aqui”

O caso de Weinstein seria, porém, o segredo mais mal guardado de Hollywood. Toda a gente parecia conhecer as manhas deste poderoso homem, mas ninguém se atreveu a fazer qualquer denúncia. McGowan garante que atores como Ben Affleck, por exemplo, sabiam do comportamento genérico de Weinstein. Foram mais de vinte as atrizes que acusarem o produtor de as obrigar, entre outras coisas, a massajá-lo e a vê-lo nu em troca de carreiras no mundo do cinema. Todas sofreram o mesmo, todas ficaram em silêncio. O medo da personalidade agressiva de Weinstein era comum a todas, mas era sobretudo o seu poder que as impedia de agir, com medo de retaliações nas carreiras profissionais. “Ele é uma personalidade diabólica, combinada com um impulso implacável”, disse um realizador, acrescentando: “Com essa combinação, o perigo é enorme e ilimitado”.

Harvey Weinstein e Gwyneth Paltrow.

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Na altura, o produtor norte-americano emitiu um pedido de desculpas, reconhecendo que causou “muita dor”, mas contestou as acusações de que este já vinha sendo um cenário habitual de há três décadas para cá. Weinstein admitiu estar a ser seguido por um terapeuta: “Embora eu esteja a tentar fazer o melhor, sei que tenho um longo caminho a percorrer. Esse é o meu compromisso. A minha jornada agora será aprender sobre mim mesmo e conquistar meus demónios ”. Negou sempre as acusações de que é alvo e diz que nunca teve sexo que não fosse consentido.

As manifestações em defesa das vítimas surgiram nas ruas e nomes da política como Barack Obama e Hillary Clinton reagiram ao escândalo. “Fiquei chocada e indignada”, disse a ex-candidata. O casal Obama, por sua vez, frisou que “todos temos de construir uma cultura (…) que no futuro possa tornar tal comportamento menos prevalente”. Na sequência das acusações, Weinstein foi expulso da Academia de Hollywood, desapareceu das fichas técnicas das séries de televisão produzidas pela Weinstein Company e vários dos seus projetos com a Apple ou a Amazon foram cancelados.

“Fazemos isto não só para nos separar de alguém que não merece o respeito dos seus companheiros, mas também para enviar a mensagem de que a era da ignorância deliberada e da cumplicidade vergonhosa com os comportamentos sexuais de depredadores na nossa indústria acabou. O que está em questão é um problema muito grave que a nossa sociedade não aceita”, explicou a Academia de Hollywood.

O escândalo não só teve repercussões a nível profissional, como também a nível pessoal. A sua mulher, a designer de moda Georgina Chapman, decidiu pedir o divórcio depois de virem a público as alegações de má conduta sexual. “O meu coração está devastado devido às mulheres que sofreram uma dor tremenda com estas ações imperdoáveis. Escolhi deixar o meu marido. Tomar conta dos meus filhos é a minha primeira prioridade e, por isso, peço à imprensa privacidade neste momento”, declarou Chapman em comunicado.

"Faz filmes fantásticos? Sim. Está disposto a fazer o que for preciso para ganhar? Sim. É incrivelmente duro com as pessoas com quem trabalha? Sim. Ele tem um ego faminto que não pode ser saciado. Ele quer tudo. Acho que por causa de toda a sua disfunção... o seu brilho intoxica as pessoas"
Fonte que já trabalhou de perto com Weinstein, 2001

Abandonado pelos seus, até pelo próprio irmão, — em fevereiro, e segundo o The Hollywood Reporter, os Weinstein já não falavam há meses e a última chamada que tinham feito tinha durado “literalmente um minuto” — e sem quaisquer ligações com os filhos India Pearl, Dashiell – da relação com Chapman –, Lilly, Emma e Ruth – fruto do casamento com Eve Chilton Weinstein –, o cineasta viu-se sozinho depois de anos a ser apoiado por quem nele confiava.

A 25 de maio compareceu num tribunal em Nova Iorque, onde foi acusado de violação, ato sexual de relevo, má conduta sexual e abuso sexual, naquele que seria o primeiro processo criminal a formalizar-se contra Weinstein após as denúncias que levaram também à criação do já famoso movimento #MeToo. A decisão judicial foi tomada depois de terem sido apresentadas duas queixas, por duas alegadas vítimas, uma delas a atriz Lucia Evans, que alega ter sido obrigada a fazer sexo oral.

Face às acusações, o magnata do cinema declarou-se formalmente inocente e acabou por sair em liberdade no dia seguinte sob caução e com pulseira eletrónica. No início deste mês, o promotor público de Manhattan anunciou novas acusações criminais contra o produtor, acusando-o de agredir sexualmente uma terceira mulher, além das duas mencionadas em acusações anteriores. A nova acusação remonta a 2006, quando Harvey terá forçado a realização de sexo oral, e inclui agressão sexual predatória, que pode levar a uma sentença de 10 anos de prisão perpétua, segundo o promotor Cyrus Vance.

“Este homem é um filho da puta? Sim”, disse, em 2001, uma fonte que já trabalhou de perto com Weinstein. “Faz filmes fantásticos? Sim. Está disposto a fazer o que for preciso para ganhar? Sim. É incrivelmente duro com as pessoas com quem trabalha? Sim. Ele tem um ego faminto que não pode ser saciado. Ele quer tudo. Acho que por causa de toda a sua disfunção… o seu brilho intoxica as pessoas”. O brilho de Weinstein está mesmo a intoxicar. A queda foi maior do que alguma vez ele podia ter pensado.

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