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Bernardo Correia é diretor-geral da Google em Portugal. Antes de gerir os destinos portugueses daquela que é uma das maiores empresas do mundo, esteve entre os responsáveis da tecnológica para a área de Indústria de Bens de Grande Consumo (FMCG) e, depois, para o Entretenimento.
Em entrevista ao Observador, falou sobre o novo centro em Oeiras, anunciado no final de janeiro, e do qual houve o rumor de se tratar “apenas de um call center“. Quanto à polémica que o assunto levantou na altura, assume: “Nós próprios não sabemos muito bem [o que aconteceu]”. No entanto, Bernardo Correia reafirmou o que a Google já tinha dito: os mais de 500 empregos referidos pelo primeiro-ministro António Costa envolvem empresas parceiras da Google, num modelo em outsourcing.
Com outsourcing ou não, a Google está mesmo em expansão em Portugal e quer ter uma presença maior na capital: “Queremos, de facto, um espaço maior. Estamos à procura de opções mais no centro de Lisboa”. Quanto a novas contratações para a Google Portugal, os números não são avançados, mas Bernardo Correia assume que todos os dias há um “número de headcount [contas de vagas] diferente” porque querem mais pessoas. Para se ser contratado, assume que “ser português” é uma mais-valia para a empresa.
Google Oeiras, o centro de fornecedores em outsourcing
Primeiro, foi dito que a Google vinha para Portugal. Depois, que era um centro de operações e finalmente um call center. O que foi isto?
Nós próprios não sabemos muito bem o que é que isto foi. O que eu sei, aquilo para o qual trabalhámos, é que vamos abrir um centro de operações internacional em Oeiras. É um centro que vai trabalhar maioritariamente com empresas de tecnologia com as quais trabalhamos. Atenção, parceiros de tecnologia que trabalham connosco. E esse escritório vai ter mais de 500 pessoas que trabalham para mercados da Google, para EMEA (Europa, Médio Oriente e África).
Esse escritório vai abrir em julho?
Vai abrir no verão.
Tinham dito que ia ser em julho. É a data que tínhamos…
Não temos data certa porque está em remodelação. Os arquitetos… Não há uma data certa.
A data que disseram em fevereiro não fecharam?
Não há compromissos com o Governo nem com a Câmara de Oeiras. Deixe-me ser bastante claro quanto a isso. Não houve qualquer trade-off [troca] entre nós, o Governo e a Câmara de Oeiras. Zero. Isto é um investimento da Google, decidido 100% sob nossa responsabilidade, sem qualquer contrapartida. Tivemos várias conversas, mas nada em termos de contrapartidas.
Porque é que o Governo avançou com a notícia?
Acharam que era um investimento interessante para comunicar. E, de facto, é um investimento importante para o país. Acho perfeitamente relevante que o Governo tenha decidido anunciar.
Foram apanhados de surpresa?
Não é uma questão que ache relevante. Acho que é um anúncio que o primeiro-ministro decidiu fazer. No contexto onde estava, em Davos [Fórum Económico Mundial], ainda por cima.
Mas a Google não sabia que o anúncio ia ser feito em Davos.
Não vou responder diretamente a essa pergunta, porque o Governo português escolhe os seus próprios timings e respeitamos os timings que são decididos.
Falou-se também de pessoas qualificadas, mas surgiram dúvidas. Na primeira, já temos a resposta: vão ser todos contratados em outsourcing [empresas terceiras que trabalham para a Google é que contratam]. Ninguém vai ser diretamente contratado pela Google?
Sim. Não é bem ninguém, porque há sempre uma equipa de apoio. Mas isto é, tal como foi comunicado na altura, um centro de operações. Posso garantir que são empregos qualificados na área de tecnologia.
O que define como empregos qualificados?
O que é que você define como empregos qualificados?
Não sei neste caso, por isso lhe pergunto.
Empregos qualificados são empregos que têm necessidades de formação técnica elevadas.
Mas estamos a falar de formação académica? De quê?
Estamos a falar de mais 500 pessoas em não sei quantas áreas de áreas…
De que áreas estamos a falar?
São uma série delas. Não vou detalhar, porque faz parte das nossas operações internas e não posso detalhar exatamente que serviços vão lá pôr. Se é marketing, se é finanças, se é mapas, se é… É um bocadinho de tudo.
Mas é um bocadinho desses exemplos que referiu?
Não, apenas estou a dar exemplos de coisas que poderiam ser. É um serviço que vai fazer operações numa série de áreas. Não é uma, nem duas, nem três. Cada uma delas tem qualificações diferentes, todas elas importantes para a gestão internacional de uma empresa como a nossa. Todas elas através de parceiros de tecnologia.
E de que parceiros estamos a falar, em Portugal?
Não é informação pública. São contratos que temos e não andamos a divulgar todos os contratos que temos com todos os parceiros. Não é difícil olhar para o que é a indústria de BPO [Business Process Outsourcing] em Portugal e perceber quem são os principais players [empresas] em Portugal.
O que são negócios BPO?
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BPO são as siglas para “business process outsourcing” (algo como processos de negócios para terceiros). É um termo utilizado para referir serviços necessários às empresas que não precisam de ser feitos internamente. Operações de vendas, recursos humanos, contabilidade, serviços de informática e sim, também atendimento ao cliente (como é o exemplo de serviços de call centers), são alguns exemplos de serviços que se enquadram na definição.
Que outros países estavam a disputar o investimento da Google?
Isto é um centro para EMEA, que é onde estamos dentro da Google. É um centro internacional e, a partir daí, vêm todos os países. Nos relatórios iniciais que recebi, não havia país que não estivesse lá.
Então todos os países quiseram ter este centro?
Não andámos a negociar um a um. Como disse, não andámos a negociar contrapartidas. O que fizemos foi olhar para todos os países disponíveis. Olhámos para as acessibilidades, especialmente em termos de estruturas de informação. Olhámos para tudo. Depois fez-se uma matriz com os benefícios e os custos de cada uma das opções e Portugal apareceu. Posso dizer que apareceu como a escolha natural naquele processo de decisão. Não houve enorme resistência. Foi mais uma questão de “estão aqui 30 opções dos países quase todos” e escolheu-se.
Foram vocês que fizeram essa triagem, sem antes falarem com os países?
Tivemos umas conversas iniciais para tirar uma dúvida ou outra, mas isso foi uma decisão profundamente interna, na qual comparámos os países todos, e Portugal apareceu muitíssimo bem posicionado numa série de áreas. Por exemplo, na capacidade de haver mão-de-obra que fale inglês e na atração de mão-de-obra internacional. Isto é uma coisa que nunca tinha havido na história de Portugal. Hoje, se pedirmos a um alemão para vir para Portugal, ele vem. Eles vêm para Lisboa.
Estes 500 empregos que estamos a falar, são para pessoas de todo o mundo?
Há de tudo. Podem vir de cá, podem vir de fora, não está tudo contratado. Está tudo em aberto, como disse. A agência de investimento do Governo português, a AICEP, teve um papel importante nisso ao disponibilizar a informação sobre a mão-de-obra, mas não houve contrapartidas nenhumas da parte do Governo português.
O vídeo viral com o avô benfiquista de 95 anos
O Bernardo teve, no ano passado, um momento viral, com o seu avô, no estádio do Benfica.
Pois foi.
Conte-nos melhor esse episódio. Esse tipo de exposição é uma coisa que evita?
Foi um momento em família em que fui apanhado na BenficaTV. O meu avô tem 95 anos, foi atleta e queria muito voltar ao estádio do Benfica. Já não ia há muitos anos. Sempre me esforcei por tentar que o meu avô continuasse a ter um papel ativo no desporto a vida toda. Ainda aqui há três ou quatro anos fomos pela última vez ao campeonato do mundo de atletismo em Budapeste para veteranos. Ainda ganhou duas medalhas de ouro e duas de prata nesses mundiais. Já lhe custou, foi muito difícil e depois ficou com uma mobilidade muito reduzida.
[Passado quatro anos] Decidi que o ia levar ao estádio pela última vez. Cheguei muito cedo para evitar confusões e estava na bancada. Só descobri, ao final da noite. Eram 11 e tal e começaram a chover mensagens: “Já foste ver uma página no Facebook que apanhou um vídeo?”. Era o Azar do Kraj, e aquilo depois explodiu. Foi uma coisa perfeitamente pessoal, fui apanhado completamente de surpresa. Depois, começaram a associar o meu nome ao meu papel do Google, que é uma coisa que não estava à espera. Por isso também não dei entrevistas nenhumas. Não falei sobre o assunto. Mas, para mim, o mais importante dali é a mensagem: o meu avô nasceu numa altura em que o desporto era uma coisa sinceramente bonita. Era uma coisa com nobreza, com valores. O desportivismo era a mensagem principal. E acaba por ser essa mensagem que ele quer passar.
Tinha falado que essa exposição, exactamente pelo emprego que tem, fez com que não desse entrevistas. É uma política para os funcionários da Google?
Não é uma questão de evitar. Acho que é um momento em família e eu não estive propriamente escondido. Até respondi a algumas mensagens no Facebook de pessoas que me foram perguntando coisas. Não vale a pena estar a misturar a minha vida pessoal com a minha vida profissional de maneira demasiado forte. Acho que foi um momento engraçado.
Os candidatos que a Google quer em entrevistas e a expansão em Lisboa
Vão abrir novos escritórios em Lisboa?
Estamos a olhar para novos espaços de escritórios em Lisboa. Como disse, ainda não há contratos fechados. Como ainda não tenho espaços fechados, considerámos que é prematuro estar a fazer qualquer tipo de anúncio. Porque estamos a olhar para isto. Neste momento, não passa disso, não temos nenhum contrato assinado. Faremos o anúncio no dia em que tivermos alguma coisa assinada. Aliás, como aconteceu com o espaço de Oeiras. Só anunciámos quando tivemos um contrato assinado com o senhorio. Até lá, não fazemos nenhum anúncio oficial.
A equipa está a crescer. Orgulhamo-nos de ser uma das internacionais de tecnologia que mais aposta em Portugal, de longe. E estamos a continuar essa aposta. As instalações que temos hoje em dia podem já não ser suficientes e estamos a olhar para outros locais. Não temos nada a anunciar nesta altura. Ainda não está escolhido, estamos a só a olhar para o mercado e tentar escolher coisas novas.
Google anda à procura de escritórios maiores em Lisboa e está a contratar
É a Google que está cá em Portugal, certo? Não é a Alphabet.
Sim. É a Google Portugal.
Estamos a falar dos projetos de marketing, dos projetos relacionados com a Google?
Sim, não são carros que conduzem sozinhos e essas coisas.
Há outras empresas da Alphabet cá representadas em Portugal?
Penso que nunca tive essa pergunta na vida. Mas, que eu saiba, não.
Que conselhos dá a quem quiser trabalhar na Google? Isto é para alguém que se vá candidatar aos empregos nos escritórios da Google em Lisboa e, também, aos 500 colaboradores de empresas terceiras. Vão ser os mesmo critérios, certo?
Sim. Essencialmente, estamos à procura das melhores pessoas do mundo. É por isso que contratamos tantas pessoas em Portugal e não só para o mercado português. Temos muitos portugueses a trabalhar no mundo inteiro. Às vezes, essa mensagem não passa suficientemente bem. Por exemplo, o Fernando Pereira, que é vice-presidente da Google na área para a inteligência artificial, que trabalha na Califórnia, que é um dos maiores cérebros do mundo nessa área. O Pedro Pina, que trabalha em Londres, é um dos melhores pensadores do marketing digital e também é vice-presidente da Google. Temos uma capacidade enorme de atração de talento português. Não tem é de estar todo em Portugal.
Qual a diferença entre a Alphabet e a Google?
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A Alphabet foi criada em 2015, com uma grande reestruturação da empresa. Atualmente, é a empresa-mãe da Google. A Alphabet, além de deter a Google, detém outras empresas como a Google Fiber (Operaradora de telecomunicações), a Waymo (um projeto de carros autónomos) e a X (uma empresa de investigação semi-secreta que cria tecnologias que podem ser diruptivas).
A Google, mesmo com a restruturação, continua a ser a principal empresa da Alphabet. É a empresa responsável por todos os serviços e produtos Google ligados à Internet. Os principais são as tecnologia de publicidade online, o motor de pesquisa e serviços na nuvem.
Então, ser português é um critério bom para trabalhar na Google. Mas e mais?
Ser português é bom. Mas por que é que é interessante? Porque estamos à procura, essencialmente, de quatro [tipo de] pessoas. Primeiro, que saibam o que estão a fazer, ou seja, que tenham formação relevante necessária, tanto de educação, como de experiência profissional para aquilo que estão a fazer. Nisso, temos pessoas das melhores empresas e universidades do mundo. No entanto, tentamos não olhar só para o canudo, mas também para a capacidade da pessoa em si. Ligamos cada vez menos ao grau universitário e muito mais ao que aquela pessoa consegue fazer. Estamos à procura de pessoas com capacidade de liderança, mesmo que não tenham equipas. Pessoas que sejam capazes de se liderar a si próprias, de agarrar um projeto e levá-lo para a frente. Estamos à procura de pessoas com um enquadramento cultural muito forte com a empresa.
Costumo dizer que o maior segredo na nossa empresa é a cultura fabulosa que temos. Chamamos-lhe Googliness e só quem está lá dentro é que entende muito bem o que isso é. Mas na prática é a cultura de sermos abertos, colaborativos, honestos e transparentes. Estarmos lá para nos ajudarmos uns aos outros. E esse peso da cultura, numa entrevista, vale tanto como outra coisa qualquer. Vale mais, se calhar, do que o canudo ou do que outra área qualquer da contratação. Porque acho que a única maneira de uma empresa crescer da maneira que temos crescido é contratando pessoas que tenham uma cultura semelhante à que já existe, e que contribuam para essa cultura.
Quanto a produtos da Google em Portugal, estamos a falar do smartphone Pixel e dos smartspeakers, o Home (que graças à Google conseguimos experimentar), mas que, mesmo assim, ir comprar diretamente num retalhista em Portugal não é possível…
Essa resposta é relativamente simples: em todos os nossos produtos de hardware, o principal elemento diferenciador é o assistente virtual do Google e estamos a trabalhar para o localizar para português de Portugal. Já o fizemos para o Brasil, já foi lançado. Vendemos alguns produtos de hardware, o Chromecast por exemplo, sem ter o assistente localizado.
Há alguma estimativa para quando é que isso vai acontecer?
Na nossa indústria não há deadlines [prazos].