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Municipalização da Carris aconteceu em 2016, desde então a setorial do PS na empresa teve mais 160 filiações.
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Municipalização da Carris aconteceu em 2016, desde então a setorial do PS na empresa teve mais 160 filiações.

Municipalização da Carris aconteceu em 2016, desde então a setorial do PS na empresa teve mais 160 filiações.

Dos "picas" nos autocarros à administração. Como o PS controla a Carris

A setorial da Carris é uma das maiores do partido e controla quase todas as áreas da empresa. Duplicou de tamanho desde que regressou à Câmara e tem sido centro de lutas pelo poder no PS em Lisboa.

Desde que foi reativada, em 2008, a setorial do PS da Carris já cresceu o suficiente para se tornar uma das maiores estruturas do partido. Na empresa, os funcionários com cartão de militante ocupam lugares estratégicos e têm o controlo do dia a dia da Companhia Carris de Ferro de Lisboa. Há guerras internas pela liderança que já obrigaram à intervenção de Fernando Medina. Como é que o PS reforçou e agora mantém a influência nos setores fundamentais da Carris?

A setorial do PS/Carris tornou-se arma de arremesso político nas últimas semanas. No final de junho, o Correio da Manhã divulgou um vídeo onde se via Fernando Medina, convidado especial num jantar organizado por aquela estrutura, a anunciar a contratação de mais funcionários e a piscar o olho aos trabalhadores da Carris. Dizia Medina: “Estamos a contratar mais pessoas, a contratar mais trabalhadores. Espero, aliás, que os possamos convencer da nossa estratégia e que venham a ser trabalhadores do PS e da secção do PS da Carris.”

A publicação do vídeo, gravado há dois anos, já em 2019, motivou acusações de que Medina estaria a tentar instrumentalizar politicamente uma empresa pública — algo que o autarca rejeitou veementemente. Seja como for, olhando para a estrutura da empresa, não restam grandes dúvidas: muitos dos quadros de maior relevância são ocupados por militantes socialistas, alguns deles muito influentes na região de Lisboa e, por arrasto, no partido.

Como o PS tem na mão a chave da Carris

Controlar uma empresa que transporta milhares de passageiros por dia exige que além de presença no Conselho de Administração se esteja presente também na área de recursos humanos, na fiscalização e, efetivamente, nas operações. O PS, através dos seus militantes, consegue estar representado em quase todas estas dimensões da empresa.

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O Conselho da Administração da empresa tem cinco pessoas, um presidente, dois ‘vices’ e duas vogais não-executivas. Tiago Lopes Farias preside ao Conselho de Administração desde janeiro de 2017. Não é, segundo conseguiu apurar o Observador, militante do PS. Mas orbita em torno do universo Costa-Medina há muito tempo.

Em 2008, Lopes Farias foi nomeado por António Costa como vogal do Conselho de Administração da EMEL; depois, ainda com Costa, seria diretor municipal de Mobilidade e Transportes da Câmara de Lisboa, entre 2014 e 2015; e, finalmente, acabou nomeado presidente do Conselho de Administração da marca ‘Transportes de Lisboa‘, empresa que reunia também o Metropolitano de Lisboa, a Transtejo e a Soflusa — e que chegou ao fim com a municipalização da Carris concluída em fevereiro de 2017.

António Pires chegou a vice da Carris depois de ser Diretor de Comércio Internacional na SONAE Distribuição e Diretor Executivo na Associação Portuguesa de Empresas de Gás Natural. Também não é conhecida qualquer militância ativa no PS, ainda que tenha sido assessor governamental no último governo de José Sócrates.

Já o outro vice-presidente da empresa, José Realinho Matos, é reconhecidamente militante socialista. Tem um percurso profissional dividido entre a Portugal Telecom e o IEFP.

Francisca Ramalhosa, uma das vogais da administração, é diretora municipal de mobilidade da Câmara Municipal de Lisboa e, por inerência, administradora executiva da EMEL e administradora não executiva da Carris. Antes de chegar à autarquia tinha sido assessora no Governo de António Costa. Não é, no entanto, conhecida militância ativa no PS.

Helena Caria, diretora municipal da Unidade de Coordenação Territorial da autarquia lisboeta, também faz parte da administração da Carris. Além da natural confiança de Medina, não foi possível estabelecer ligações ao PS. No entanto, à medida que se desce na estrutura da empresa, as ligações tornam-se mais e mais evidentes.

Organograma da Carris. Fonte: Carris.pt

Dos ‘picas’ aos recursos humanos: até onde chega o partido?

Na Direção de Operações onde se insere o departamento de controlo de tráfego, de informação e controlo, a produção de horários e escalas, a gestão de rede e informação e as quatro estações — Santo Amaro, Musgueira, Pontinha e Miraflores — está António Martins Marques, militante socialista e um dos homens do partido destacado em cargos de relevo na empresa. António Marques Martins já dirigia a estação de Santo Amaro antes de ser nomeado diretor de operações com a entrada na reforma do anterior responsável.

No que diz respeito aos trabalhadores, a militante socialista Ana Maria Lopes assume a Chefia de Pessoal. É responsável pela abertura de concursos para admissão de pessoal, coloca os funcionários nos diversos departamentos e tem também a competência, por exemplo, de propor promoções.

Na Fiscalização, responsável pelos fiscais — os ‘picas’ da Carris — está o líder da setorial do PS na Carris, António Pereira. Além de tutelar cerca de quatro dezenas de fiscais tem ainda a incumbência de controlar a venda de bilhetes na rua aos estrangeiros para, entre outras coisas, poder agilizar as entradas de passageiros nos elétricos da empresa.

Fica a faltar apenas a comissão de trabalhadores, onde os socialistas têm Paulo Gonçalves, um homem da inteira confiança de António Pereira e, consequentemente, de Fernando Medina.

Sob alçada das operações está a Central de Controlo de Tráfego, responsável por resolver qualquer problema que surja durante o dia. Qualquer imprevisto que aconteça na rota planeada para as várias viaturas que a Carris tem nas estradas da capital ao longo do dia é reportado à Central de Controlo de Tráfego (CCT).  E também aqui há uma prevalência clara de trabalhadores com cartão de militante do PS.

De acordo com o relatório e contas da empresa mais recente, de 2019, havia 2.450 pessoas a trabalhar na empresa. Destas, 327 tinham as quotas de militante na setorial socialista em dia no final desse ano. Isto é o mesmo que dizer que, dos funcionários da Carris, quase 14% eram militantes no PS/Carris, grande parte deles com cargos destacados.

Na Central de Controlo de Tráfego essa relação de proporcionalidade é muito maior. Entre inspetores, coordenadores e controladores trabalham nesta secção da empresa cerca de 60 pessoas — 45 têm cartão de militante do PS.

Subindo na hierarquia, a prevalência de militantes socialistas vai aumentando. Por exemplo: os coordenadores de tráfego, que coordenam a equipa de controladores de tráfego, são oito. Seis deles pertencem à setorial da Carris. Os casos não se esgotam aqui: acima de todos os coordenadores e chefes de turno está ainda o Coordenador Geral da CCT, Luís Carlos Silva, também ele militante da setorial socialista.

Luís Carlos Silva reporta à diretora da CCT Helena Leal (sem qualquer ligação ao PS), que por sua vez responde a António Martins Marques que, como vimos, é diretor das Operações. O ciclo fecha-se: António Martins Marques também é militante socialista.

Outro dos pontos nevrálgicos da empresa está nas estações da Musgueira, Pontinha, Miraflores e Santo Amaro. Aqui, nos lugares de chefia da estação, seja o número um ou número dois, há sempre um militante socialista. Miraflores é coordenada por Fernando Freire. Na Musgueira o coordenador é António Manuel Ferreira Marques. Na direção da estação de Santo Amaro está o coordenador Paulo Martins Birra. E na Pontinha está o inspetor de tráfego João Alves.

Fotografias tiradas no último jantar de natal da setorial do PS da Carris, dezembro de 2019

À esquerda José Realinho Matos, vice presidente do conselho de administração da Carris. Na imagem da direita (da esq. para a dir.): Luís Pereira – Controlador técnico; Ana Santos – Controlador de Tráfego; Pedro Neves – Controlador de Tráfego; Fernando Medina; António Martins Marques – Diretor de Operações; Nuno Magalhães – Controlador de Tráfego; Artur Almeida – Chefe de Turno; Sérgio Dias – técnico administrativo; José Correia – Chefe de turno; Ana Maria Lopes – Diretora de Pessoal; José Pinheiro – Inspetor de tráfego.

Setorial da Carris é a maior do país — e explodiu quando empresa passou para a Câmara

O Observador tentou, com insistência, falar com António Pereira, o líder da PS/Carris, para perceber como funciona esta estrutura partidária e o porquê de estar tão presente em cargos de destaque da empresa. Não foi possível obter um comentário de António Pereira até à publicação deste artigo apesar de contactos telefónicos e mensagens escritas.

De acordo com os dados dos filiados que no final de 2019 tinham as quotas em dia, quando a setorial da Carris foi reativada, em 2008, havia apenas 36 filiados. Em oito anos, entre 2008 e 2016, cresceu para os 167, ou seja quase quadruplicou o número de militantes.

Mas a evolução não ficou por aqui. O maior crescimento da estrutura haveria de chegar já depois da empresa passar para as mãos da autarquia socialista. Em três anos — 2017, 2018 e 2019 — mais 160 funcionários da Carris passaram a ter na carteira também o cartão de militante. Neste período de três anos, a setorial da Carris praticamente duplicou o número de militantes para os 327.

Por outras palavras: a secção do PS/Carris cresceu mais nos três anos em que a Câmara passou a ter o controlo da empresa do que nos oito anos anteriores.

Sendo a maior setorial do país, ultrapassa também algumas concelhias socialistas. Tem mais militantes do que a Azambuja, quase tantos como os de Mafra e metade dos da Amadora. Ao próximo Congresso do PS, que se realiza no final do mês, a setorial da Carris levará cinco delegados. Tantos quantos a concelhia de Fafe, Felgueiras ou Ponta Delgada e mais que a concelhia da Guarda, Nazaré, Odemira ou Póvoa de Lanhoso.

O poder da estrutura explica-se também noutra dimensão: quem quer ser alguém no PS na região de Lisboa tem de ir ao ‘beija-mão’. E não faltam exemplos disso.

Os braços dos partidos ainda mexem nas empresas. Trabalhadores organizam-se pelo cartão de militante

A luta que ia fazendo quebrar o PS/Carris — e que envolveu Duarte Cordeiro e Medina

A poucos dias das eleições para as setoriais, que decorreram no final de janeiro de 2020, o ambiente na setorial era tudo menos pacífico. António Pereira — homem da confiança de Fernando Medina — tinha perdido na eleição anterior a direção da setorial para José Ribeiro e procurava recuperá-la. Mas foi também nesse ano que Duarte Cordeiro, presidente da FAUL, decidiu pedir à setorial da Carris que organizasse o jantar de Natal da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL).

Cartaz do jantar de natal da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL)

A decisão de José Ribeiro, de aceitar o pedido de Duarte Cordeiro para organização do jantar de Natal da FAUL não foi bem recebida pela totalidade dos membros da setorial e Paulo Gonçalves (da Comissão de Trabalhadores e presidente da mesa da Setorial) convocou uma Assembleia extraordinária para avançar para a realização de um jantar exclusivo da própria setorial da Carris. Além da organização do jantar da FAUL, a Carris manteve a realização do seu habitual jantar de Natal, mas onde não era habitual a presença de qualquer militante socialista de fora da setorial.

Sem a presença do líder da setorial, dias depois do jantar da FAUL aconteceu mesmo o jantar da setorial da Carris. Fernando Medina discursou e deixou bem claro quem apoiava. Numa altura em que o líder José Ribeiro se ia confrontar nas urnas com António Pereira, Medina usou da palavra para deixar elogios à dupla António Pereira e Paulo Gonçalves, falando numa “dívida da cidade aos trabalhadores do PS da Carris”.

“Foram os trabalhadores do PS, vocês, que naquele momento difícil disseram que tínhamos os trabalhadores connosco. O Paulo [Gonçalves], o [António] Pereira, aos dois. Quando naquela mesa de reuniões no final se levantam todos e se deixam sair aqueles com quem tínhamos convergências no momento, mas não eram os nossos camaradas, quando temos uma pequena conversa de camaradas, me disseram ambos ‘vão em frente que os trabalhadores estão convosco’. Marcou muito do destino da Carris nos anos que se seguiram”, recordou Medina.

As eleições internas aconteceriam daí a poucos dias e a imagem de Medina, ao lado de António Pereira, foi exibida como um troféu nas redes sociais pela Lista – A. Na página de Facebook da setorial da Carris estão, aliás, disponíveis várias imagens do jantar realizado no dia 13 de dezembro.

Numa das publicações é possível assistir ao vídeo que foi apresentado no jantar de Natal “em homenagem aos que lutaram por esta empresa, aos que dão o seu melhor atualmente e principalmente a referência às futuras gerações de trabalhadores da CARRIS”.

Nas várias fotografias publicadas na página da setorial em vários momentos, é possível encontrar aliás  António Costa e Fernando Medina e em grande parte delas também António Pereira a acompanhá-los.

https://www.facebook.com/pscarris.sectorial/posts/2773273676044817

Resultado das eleições: a lista A, liderada por António Pereira e abençoada por Medina, venceu com 180 votos; a lista de José Ribeiro, a quem Duarte Cordeiro tinha pedido, em nome da distrital de Lisboa, que organizasse o tal jantar, perdeu com 77 votos.  No dia das eleições para as setoriais do PS, a 31 de janeiro de 2019, António Costa posou para a fotografia ao lado de António Pereira. Duplamente vencedor, portanto.

No dia das eleições para as setoriais do PS, a 31 de janeiro de 2019, António Costa posou para a fotografia ao lado de António Pereira

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