A comitiva socialista saía do Lar Montepio no Montijo deixando para trás a tuna académica da Universidade Sénior a cantar empenhada o popular “ele vai para a guerra, deixai-o ir”. Tinha o candidato Pedro Marques acabado de mostrar a arte da diplomacia a tentar esvaziar contradições no PS sobre a frente progressista europeia que António Costa promoveu ao lado do presidente francês Emmanuel Macron, que aliou os partidos liberais da Europa. A coligação é “contra a extrema direita”, diz o candidato. Já na Europa, a ação socialista quer-se diferente da dos liberais, adianta por outro lado. Mas nem por isso colada à da esquerda — aliás, esta quarta-feira, chegou à campanha o primeiro ataque ao PCP e BE.
“Não há nenhuma contradição”, disse aos jornalistas Pedro Marques quando confrontado com o discurso de Pedro Nuno Santos e o ataque “contra quem quer impor resposta liberal, que não diminuirá populismos”. Isto ao mesmo tempo que, em Paris, António Costa aparecia ao lado do representante dos liberais da Europa a insistir na coligação de forças progressistas para combater o populismo na Europa. Explicada por Pedro Marques, “esta coligação pode incluir gente de todas as famílias políticas, desde que não se passe a barreira da xenofobia e dos extremismo”. Outra coisa, diz é “evidenciar as diferenças entre nós e os liberais nas escolhas que se fazem para o projeto europeu”.
Já no almoço, no grupo recreativo “Os Leças” do Barreiro, Pedro Marques fez uma clara separação da esquerda portuguesa em matérias europeias e, pela primeira vez no tempo de campanha oficial do PS, apareceu um ataque concreto aos parceiros parlamentares, Bloco de Esquerda e PCP. No país, diz, o PS “teve de concordar em discordar com a esquerda”, mas em Bruxelas, os socialistas “estão coligados” mas com a Europa: “Nós estamos coligados com a Europa. Somos Europa. Somos o partido de Mário Soares”. E perguntou ao BE e PCP: “Onde estão na saída do euro? Defendem mesmo a saída do euro? Sabem o que isso poderia representar para Portugal”.
Par o socialista, a saída da moeda única “é a desvalorização das pensões, dos salários, dos depósitos, provavelmente a nacionalização dos bancos. Essas ideias da saída do euro parecem simples, mas têm muito que se lhe diga e podem representar grande perigo “, atirou ao PCP e ao BE recordando que os comunistas falam “explicitamente em saída do euro” que os bloquistas “falam da preparação da saída do euro, ou pelo menos Catarina Martins falou”.
No mesmo almoço comício, o dirigente socialista Eduardo Cabrita falou da sua experiência como ministro para acrescentar argumentos à questão da força progressista europeia, a propósito da receção aos migrantes e refugiados. “Um que se debateu durante décadas por uma Europa sem muros não aceita aqueles que querem criar novos muros na Europa”. E dramatizou mesmo a escolha de domingo, entre uma “Europa que acolhe “migrantes e salva refugiados no Mediterrâneo, contra a xenofobia, o racismo com todos os aliados”. Todos e mais alguns, com Cabrita a especificar que isso inclui “Espanha, França, a senhora Merkel que tem estado do lado da solidariedade”, colocando esse como traço comum com a líder do centro-direita alemão, ideologicamente distante do PS.
Cabrita aproveitou mesmo para lembrar o CDS que “há 20 anos foi expulso do PPE” e que “agora parece novamente alinhado com a extrema direita europeia, com o Vox, com o senhor Órban”. A Europa, diz, que esta a “branquear a extrema direita”: “A esse CDS temos de dizer que não porque é uma vergonha”.
“Esta semana foi a do 37”. O difícil apelo ao voto
A discussão promete equilíbrios delicados no centro da União durante o mandato dos eurodeputados que sairão eleitos das eleições de domingo. Será tema sensível, ainda que sem os dentes aguçados do pequeno yorkshire terrier que ladrava ao candidato no início da arruada do Montijo, a terra “onde começou o político” Pedro Marques.
“Está aqui a minha história da minha vida”, ia explicando Pedro Marques no início da ação de rua socialista que se “sente naturalmente bem em casa” onde as pessoas o “conhecem por sempre ter trabalhado para fazer coisas concretas pela sua terra e o seu país”. Falava na terceira pessoa, do Pedro de outros tempos, que um senhor com quem se cruzou se lembra de ter visto “andar por ali de bicicleta”. A memória do candidato nem por isso discorreu a partir daquela deixa: agradeceu e apelou ao voto no domingo. Mais adiante outra abordagem, mas agora a tempos mais recentes. De manhã, pelo centro do Montijo estava sobretudo idosos e o apelo que ia recebendo sobre pensões também lhe apareceu no caminho, o candidato tinha a deixa preparada: “Já sabe que a minha vida foi sempre essa”.
O passeio matinal (na verdade foi mais isto do que uma “arruada) da comitiva socialista contou com Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, e António Mendonça, secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ambos do distrito (o último é líder do PS-Setúbal). Mas nem por isso foi de peso, foi antes um passeio ameno com o candidato a distribuir uns cumprimentos, uns votos de “saúde” e apelo a outros votos, os de domingo. “Esta semana foi a do 37”, respondeu-lhe antes um homem que o candidato socialista cumprimentou.
No café Praça Central, o socialista entrou para pedir um”descafeinado. Se não é cafeína a mais e fico acelerado“. Não foi sinal que se visse por estes dias em Pedro Marques, normalmente num registo mais controlado e sereno, com a pressão baixa.
O alerta contra “os protagonistas do passado”
Seguiu dali para o Lar Montepio, também no Montijo, onde procurou — mais uma vez — mostrar a sua vertente social, como antigo secretário de Estados da Segurança Social, apontando que este foi “o seu trabalho durante anos, o desenvolvimento destes equipamentos sociais”. Faliu dos cuidados continuados, que existem naquele lar e também da “rede de 9 mil camas” que diz ter mão sua no país.
À sua espera, na entrada do Lar, estava a tuna da Universidade Sénior a cantar o “Menina estás à janela” que o candidato acompanhou antes de seguir a visita às instalações. E ao quarto da Dona Olívia que lhe explica que já não vai em bailaricos porque uma lesão na anca já não a deixa. Mas que no lar tem atividades diárias fora, como a dia ao cinema que aguardava para o dia seguinte. Pedro Marques ri-se, deseja-lhe saúde, ouve um “vai correr tudo bem se Deus quiser”.
Mas o candidato dos “pés na terra” (a resposta ao helicóptero de Rangel que todos os dias aparece no discurso socialista) e da campanha “sem calúnias”, prefere acreditar no terreno. Por isso alerta para quem regressa à campanha do PSD. Não refere Passos Coelho, nem Ferreira Leite, nem Paulo Portas, mas antes “os protagonistas do passado”. “De alguma maneira facilitam-me a campanha”, admite para logo depois alertar para o que considera que representam: “Corte das pensões, dos rendimentos, o enorme aumento de impostos”. E o candidato Rangel coloca-o entre os que “aplaudiram esses corte”.
Também a secretária-geral adjunta do PS, Ana Catarina Mendes, falou de Passos e Porta para classificar de “pedagógico” o “regresso à cena política”, na medida em que recorda os portugueses “dos rostos de quem empobrece, de quem cortou, convidou a emigrar, depauperou os serviços públicos”. E são rostos “que apoiam Rangel e Melo”, lembra ainda.
À noite, o jantar-comício será em Setúbal e volta a ter a participação do líder socialista António Costa. Mas também Mário Centeno, o ministro das Finanças do Governo e também presidente do Eurogrupo.