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O Mastodon surgiu em 2016 mas tem conquistado popularidade nas últimas semanas.

SOPA Images/LightRocket via Gett

O Mastodon surgiu em 2016 mas tem conquistado popularidade nas últimas semanas.

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Entre “toots” e “boosts”, pode o Mastodon ser mesmo uma alternativa europeia ao Twitter?

O Mastodon existe há seis anos e nas últimas semanas conquistou números mais expressivos de utilizadores. A confusão no Twitter está a levar muita gente a migrar para lá, mas será uma alternativa?

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Como muitas coisas na vida, também a plataforma social Mastodon começou por ser fruto de uma boa dose de descontentamento. Em 2016, o alemão Eugen Rochko estava desencantado com a experiência que tinha no Twitter. Na altura com 24 anos e recém formado em engenharia de software, arregaçou as mangas e decidiu criar uma alternativa ao ambiente que se vivia na rede social do pássaro azul.

“Na altura, pensei que era muito importante para mim conseguir exprimir-me online e também para os meus amigos através de mensagens curtas e que talvez isso não devesse estar nas mãos de uma única empresa”, contou Rochko numa entrevista à revista Time. A criação do Mastodon ficou assim ligada a um “sentimento de desconfiança em relação ao controlo vindo a partir de cima que o Twitter exerceu.”

Embora tenha sido batizada tendo por base o nome do extinto mamífero pré-histórico, o mastodonte, esta rede social que se gaba de ser descentralizada e “não estar à venda” está mais viva do que nunca – e tudo à conta de um fenómeno de “migração”. Quando a 28 de outubro ficou fechada a novela da aquisição do Twitter, com a empresa a passar para as mãos de Elon Musk, muitos utilizadores decidiram transferir-se para outras paragens. As razões apontadas eram diversificadas, como o receio de que a empresa pudesse intensificar a atividade nas subscrições pagas ou da possível ausência de moderação de conteúdos. O Mastodon foi um dos escolhidos pelos utilizadores que procuraram refúgio noutra rede social.

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Através da página de estatísticas do Mastodon, é possível perceber como a compra do Twitter fez mexer os números de utilizadores. As estatísticas relativas a 22 de outubro, antes de Musk se tornar oficialmente dono do Twitter, mostravam cerca de 4,6 milhões de utilizadores registados no Mastodon, mas só 1,3 milhões ativos. Já a atualização seguinte, partilhada a 13 de novembro, mostra os mesmos 4,6 milhões de utilizadores mas já com 1,7 milhões de utilizadores ativos mensais, uma diferença de 400 mil pessoas.

À Time, Rochko explicou que está a ser notório um fluxo de novos utilizadores na sequência da compra do Twitter. “É algo muito positivo perceber que o teu trabalho está finalmente a ser apreciado, respeitado e reconhecido de forma mais ampla”, defendendo que é também uma espécie de recompensa pelo trabalho “árduo” de “transmitir a ideia de que há uma forma melhor de estar nas redes sociais do que aquela que é feita por empresas comerciais como o Twitter ou o Facebook”.

Passados seis anos do lançamento do Mastodon – Rochko admitiu que não é a melhor pessoa a batizar coisas –, o criador da plataforma continua a ser o único trabalhador da empresa Mastodon, com um salário de 2.400 euros. Como é que mantém tudo isto a funcionar desde 2016? Através dos donativos recolhidos na plataforma Patreon. É possível fazer contributos que podem ir de 1,5 até 535 euros mensais. De acordo com a informação disponível nesta plataforma, a organização tem mais de 3.700 patronos e arrecada quase 17.951 euros por mês.

O relatório de 2021 do Mastodon, disponível online, revela mais alguma informação sobre o financiamento da plataforma. A Mastodon gGmbH, uma empresa sem fins lucrativos de responsabilidade limitada na legislação alemã, é detida na totalidade por Eugen Rochko, o fundador da plataforma. A empresa foi registada com esta designação em junho do ano passado e, entre junho e dezembro, teve 55.300 euros de receita, através das doações feitas através do Patreon e do Stripe. No final de 2021, tinha uma base de 600 patrocinadores. O total de despesas da empresa ascendeu a 23.200 euros, com a principal fatia das despesas ligadas a despesas pessoais (18.400 euros). Feitas as contas, o saldo da empresa no final do ano ultrapassou por pouco os 32 mil euros.

As doações não foram a única fonte de rendimento da companhia: em 2021, o Mastodon conseguiu assegurar um financiamento de 8.900 euros do Prototype Fund, um fundo financiado pelo Ministério Alemão da Educação e Investigação e pela German Open Knowledge Foundation. É especificado que o montante foi “recebido diretamente por Eugen Rochko porque os estatutos do fundo ditam que só pessoas singulares e residentes na Alemanha podem receber o montante”. É especificado que o Prototype Fund “continuará a financiar o Mastodon em 2022”. Além disso, em dezembro de 2021, a NLnet, a fundação criada em 1997 para “apoiar empresas e pessoas que contribuem para a sociedade aberta de informação”, anunciou que vai conceder ao Mastodon 45 mil euros para financiar os esforços de investigação e desenvolvimento da plataforma.

Como funciona?

O Mastodon é um plataforma social gratuita, descentralizada e de código aberto. É por esta última característica que garante não poder ser comprada.

“No Mastodon, representamos uma visão de rede social que não pode ser comprada e controlada por qualquer multimilionário. A capacidade para comunicar online não deve estar sujeita aos caprichos de uma única empresa comercial”, é possível ler num dos manifestos da companhia.

Na apresentação do Mastodon, o serviço é descrito como “uma plataforma de microblogging inovadora de código aberto e com alojamento próprio, semelhante ao Twitter ou ao Tumblr”. Admitir a semelhança com o Twitter não é o mesmo que ser “um clone do Twitter”, com o Mastodon a argumentar que, “por conceito, estrutura e funcionalidades, é completamente diferente e muito mais interessante”.

À primeira vista, tem um aspeto bastante semelhante ao Twitter – mas as primeiras impressões às vezes enganam. Em vez de ser a tão falada “praça pública” e ao alcance de todos, como é apregoado no Twitter, não há uma rede social única no Mastodon, mas sim milhares de pequenas redes sociais, chamadas instances. Em português, há quem já faça uma tradução para instância.

Os utilizadores do Mastodon organizam-se por instance e cada um destes “espaços” tem o seu próprio servidor e administrador. Há várias instâncias por onde escolher: é possível selecionar se se quer juntar por país ou por tipo de interesse (música, ativismo, artes, LGBTQ+, etc). De acordo com os números mais recentes, há agora 5,77 mil servidores ativos no Mastodon. Na área de ajuda do Mastodon, é possível encontrar um motor de pesquisa que tenta direcionar os utilizadores a encontrar a instance que mais agrade.

Estar numa instance não quer dizer que não possa interagir com pessoas de instâncias diferentes. Como um email: pode ter uma conta no Gmail e mesmo assim conseguir enviar emails a pessoas que têm um email no Outlook. No Mastodon, essas interações são possíveis porque “todas as instances estão mutuamente relacionadas”. Ainda assim, é possível que o administrador de uma instance escolha bloquear utilizadores de outras áreas ou mesmo uma instance inteira.

Servidores Mastodon

Os tipos de servidores disponíveis.

Mastodon

As várias instâncias no Mastodon conseguem interagir entre si. Mas não se ficam apenas por esta rede social. Há um universo mais abrangente — o Fediverse. Há quem recorra à ficção científica para o explicar: “Para os fãs ou nerds de ‘Star Trek’, a analogia que usaria é a da United Federation of Planets”, explica em conversa com o Observador Robert W. Gehl, investigador e professor da Universidade de York, em Ontario, no Canadá. “Há a Terra, depois há outros planetas e todos interagem, mas não há um que domine os outros. Há uma espécie de aliança política onde cada planeta tem a sua própria cultura mas que aceitam partilhar recursos. O Fediverse funciona de uma forma semelhante”, explica o académico, que há dez anos acompanha plataformas sociais vistas como alternativas às redes sociais das big tech. “Há vários servidores pequenos a executar o Mastodon. Usam um protocolo partilhado, que permite que comuniquem uns com os outros.” A lógica de ligação ao Fediverse “não é um exclusivo do Mastodon”, lembra o professor universitário, que desde 2018 faz um uso mais intenso desta plataforma. “O Mastodon é o mais popular, mas há outros”, explica o académico. O PixelFed — que “é essencialmente como o Instagram, muito centrado em imagens e apresenta-se um pouco como uma alternativa se se quisesse sair do Instagram” — é um exemplo que comunica com o Mastodon e que ajuda a criar esta lógica de Fediverse.

Um mundo de toots, boost e mais algumas regras para conhecer

Se no Twitter são publicados tweets, no Mastodon são publicados toots. No entanto, numa primeira fase da vida desta rede social, havia um botão mais tradicional para fazer publicações, chamado ‘publish’. Ao contrário do Twitter, que só há pouco tempo começou a testar a opção de editar tweets, desde março deste ano que se tornou possível editar toots no Mastodon.

Desde os primórdios desta rede social descentralizada que é possível escrever publicações bem maiores do que no Twitter, já que o limite é de 500 caracteres. Durante vários anos, um tweet só podia ter 140 caracteres; em 2017, passou a ser permitido escrever 280 caracteres. No Mastodon, é possível escolher com quem quer partilhar os toots: se ficam visíveis para toda a gente, só para seguidores ou apenas para as pessoas mencionadas. Há ainda uma opção para ter as publicações unlisted (visíveis para toda a gente, mas fora do alcance das ferramentas de pesquisa).

Um dos exemplos de um servidor do Mastodon.

Esta não é a única diferença em relação ao Twitter. Nesta rede social há boosts a substituir os retweets e os gostos são “favoritos”. Se gostar de alguma publicação fica prometida outra diferença em relação à rede social de Musk: essa informação não aparecerá visível na timeline de outras pessoas. As hashtags também são usadas, mas há um útil CW, uma opção que significa “Content Warning”. É usada com frequência (aparenta ser especialmente útil para evitar spoilers de séries ou filmes) e implica que se tenha de fazer um clique para se conseguir ver a publicação completa. E, tal como no Twitter, também é possível bloquear outros utilizadores.

Dada a organização por servidores, há quem compare a rede social descentralizada à plataforma Discord. Nesta opção, que começou como algo mais virado para os amantes de videojogos, a organização é igualmente feita através de servidores, que podem ser criados pelos utilizadores. Também é possível juntar-se a servidores que já estejam definidos. Ao contrário do Twitter, não há um feed geral e, portanto, a capacidade de partir à descoberta é mais limitada. Em geral, os utilizadores reúnem-se nestes servidores para falar sobre interesses em comum. Em comparação com o Twitter (e também com o Mastodon), não há a lógica de se seguir utilizadores, dando-se primazia à escolha de canais em determinados servidores.

De qualquer forma, há muitos pontos em comum entre o Mastodon e o Discord – mas a rede social do mamífero já rejeitou a comparação, curiosamente através do Twitter. “Basicamente não são o Discord?”, questionou um utilizador na rede social Twitter, em abril. “Se cada servidor do Discord fosse na verdade alojado e operado por pessoas diferentes e não apenas disponibilizado pelo Discord, se fosse possível seguir pessoas como no Twitter e se não fizesse diferença em que servidor estão essas pessoas para ainda se poder segui-las, então basicamente sim”, foi a resposta.

Como pode aderir-se?

É logo na adesão que o Mastodon se revela mais complexo do que o Twitter. Como mencionado, é preciso, primeiro, escolher uma instance. Só a partir do momento em que tem esta decisão feita é que pode indicar os dados que pretende que fiquem associados à conta (nome de utilizador, email, password, etc). Fica ao critério do administrador de cada instance ter ou não abertas as inscrições para novos utilizadores. Por isso, cada servidor pode ou não precisar de um período de aprovação para deixar que novos utilizadores comecem a escrever toots. Convém também conhecer as regras de cada servidor – o que é aceitável no servidor x pode ser inadequado no y.

“Se se pensar nos primeiros dias do Twitter, as pessoas também se perguntavam para que é que servia e como se usava, havia guias sobre como usar e como construir uma rede. O Mastodon é o mesmo nesse sentido.”
Robert W. Gehl, professor universitário e investigador.

Dois dos servidores mais conhecidos do Mastodon são o mastodon.social (a instance oficial do projeto) e o mstdn.social. Escolher um servidor não se torna algo definitivo. É que pode sempre migrar para outro servidor. Fica a garantia de que os seguidores e contas que segue num determinado servidor vão seguir para outro.

“Diria que todas as redes sociais têm uma curva de aprendizagem”, reconhece o professor Robert W. Gehl a propósito das diferenças do Mastodon contra o Twitter. “Se se pensar nos primeiros dias do Twitter, as pessoas também se perguntavam para que servia e como se usava, havia guias sobre como usar e como construir uma rede. No Mastodon é o mesmo.” O académico diz que “é preciso aprender como é que o sistema funciona”, mas admite a possibilidade de alguns “utilizadores mais impacientes se afastarem”. O outro reverso da medalha é que “há muitas pessoas que estão no Mastodon há já algum tempo e que dizem que é perfeitamente aceitável se os utilizadores impacientes desaparecerem. Há algum elitismo nesse sentido”, reconhece Gehl.

Ouça aqui A História do Dia sobre o Mastodon

Olá Mastodon, adeus Twitter? Vem aí uma nova rede?

Há moderação de conteúdos? E como é feita?

Uma das questões já apontada como um receio nesta nova era do Twitter com Elon Musk ao comando é a de que haja um decréscimo da moderação de conteúdos. Aliás, Musk assume-se como “absolutista da liberdade de expressão” e em declarações públicas já defendeu que não devem ser as redes sociais a decidir que publicações devem ou não ser removidas. A 28 de outubro, o primeiro dia como dono do Twitter, Musk fez saber que vai ter um “conselho de moderação de conteúdos com pontos de vista amplamente diversos”. Mas especificava que “nenhuma decisão importante relativa a conteúdo ou ao restabelecimento de contas [bloqueadas]” seria tomada antes da formação desse conselho.

Só a possibilidade de Elon Musk fazer alterações na moderação de conteúdos, um problema já antigo no Twitter, foi suficiente para afastar muitos utilizadores. Mas o ponto curioso é que, no Mastodon, ao contrário do Twitter, não há uma entidade geral a fazer moderação de conteúdos – essa responsabilidade fica ao critério dos administradores de cada servidor. “É preciso moderação de conteúdos”, reconhece o professor canadiano Robert W. Gehl, mas nota que há uma diferença grande em relação ao Twitter. “Uma das coisas que acho fascinante nas redes sociais federadas é que, ao manter o servidor pequeno, a moderação de conteúdos torna-se uma prática mais humana. Isso é um grande contraste em relação ao Facebook e ao Twitter, que parecem ser empresas muito, muito grandes, de escala global, que depois têm problemas, porque estão a tentar impor valores globais.”

Além disso, Gehl destaca que estas grandes empresas muitas vezes “tentam fazer moderação de conteúdos de forma mais barata, recorrendo a prestadores de serviços, com moderadores de conteúdos muitas vezes exaustos e traumatizados”. E, a juntar a isto, “ainda tentam construir sistemas de inteligência artificial, como se isso fosse ajudar a moderar a comunicação humana.” Este académico mostra-se mais esperançoso em relação à moderação de conteúdos em opções como o Mastodon. Tudo porque a moderação “pode acontecer numa escala mais pequena, onde as pessoas se podem conhecer e falar com os administradores e moderadores, em vez de ter tentativas mais desastradas e moderação global das redes”.

“Uma das coisas que acho fascinante nas redes sociais federadas é que, ao manter o servidor pequeno, a moderação de conteúdos torna-se uma prática mais humana. Isso é um grande contraste em relação ao Facebook e Twitter, que parecem ser empresas muito, muito grandes, de escala global, que depois têm problemas, porque estão a tentar impor valores globais.”
Robert W. Gehl

É inevitável perguntar a este professor académico se ainda usa o Twitter. “Já não uso muito, mas não estou surpreendido por haver um multimilionário a comprar uma empresa destas, porque é assim que estão estruturadas, são muito centralizadas e passíveis de serem compradas – e um multimilionário usá-las para fazer aquilo que quiser.”

Masto.pt, o servidor para quem fala português, tem 5 mil contas por aprovar

Usando o filtro de pesquisa para explorar as diferentes opções de instances disponíveis no Mastodon, há poucas que recorram ao português. Destaca-se a Masto.pt, “uma instância de Mastodon para pessoas que falam português”. As estatísticas revelam que tem mais de 8 mil utilizadores e que cerca de metade estão ativos.

Hugo Gameiro é o administrador desta instância. Em conversa telefónica explica ao Observador que a ligação ao Mastodon começou devido à sua atividade profissional. O administrador do Masto.pt trabalha com alojamento de plataformas online e tentou instalar um servidor do Mastodon há alguns anos, quando a rede social descentralizada tinha “cerca de seis meses”. “Experimentei o software, achei que era uma abordagem diferente, refrescante”, recorda. Acabou por introduzir na empresa que tem as opções de alojamento de servidores de Mastodon, mas a administração da instance em português é um hobby.

Masto.pt, a instância em português do Mastodon

O servidor Masto.pt, em português.

Masto.pt

Desde que Musk comprou o Twitter tem sido notória a chegada de mais utilizadores ao servidor, relata Hugo Gameiro. “Há cem vezes mais utilizadores”, o que aumenta a carga de trabalho para o administrador. As inscrições para este servidor estão abertas, mas sujeitas a aprovação, através de “um processo manual e só com uma pessoa”. Hugo Gameiro explica que, de momento, “tem cinco mil contas pendentes de aprovação”. “Estou a aprovar muito devagarinho”, admite, relembrando que tudo é feito “por boa vontade”.

“Não recebo dinheiro nenhum, estou a pagar estes servidores do meu bolso.” O aumento de utilizadores poderá pesar seus nos gastos? Responde que ainda não sabe “como vai evoluir a nível de custos”, admitindo até que “também é um pouco relativo”, já que “uma parte dos utilizadores que entram não usa” a rede social. Muitos aderem só para ver como funciona, reconhece Hugo Gameiro.

E sente alguma responsabilidade por ter aos ombros a moderação de conteúdos, mesmo que seja numa pequena comunidade? “Há situações em que conseguimos fazer uma moderação muito mais fácil”, admite Hugo Gameiro. Na ótica do administrador, as “pessoas têm tendência a juntar-se a um servidor onde estão os mesmos valores”, mas que haverá sempre questões sobre “o que é justo ou o que é demais.” Além de Hugo, havia mais “duas pessoas que ajudam com moderação, que estão a fazer isto de boa vontade”. A nível macro, acredita, gerir uma plataforma já acarreta mais complicações. “Quanto mais a decisão e a regra se adaptar a um grupo mais pequeno de pessoas, mais fácil é não causarmos problema. Uma regra generalista já irá prejudicar.”

A partir desta quinta-feira, o número de ajuda com a moderação ficou mais reduzido. Com a chegada de muitos utilizadores vindos do Twitter, a comunidade expandiu-se e surgiram algumas dores de crescimento. “Infelizmente hoje a pessoa que mais fez pela moderação do Masto.pt decidiu que não queria continuar. Compreendo-a e sei que foi subestimada e criticada por aqueles que não têm, nem querem ter, uma visão para uma comunidade que protege os mais vulneráveis”, escreveu o administrador do Masto.pt num toot partilhado na quinta-feira à noite.

Os servidores das comunidades têm “pedalada” para aguentar a expansão de utilizadores?

Qualquer coisa que se faça na internet ocupa espaço, tem peso – e não é por não pensarmos em quanto pesa uma imagem ou um vídeo que isso desaparece magicamente. Cada instance tem, como já vimos, um servidor associado. Para tentar minimizar contratempos e garantir que a maioria das instâncias continua a ter um sentido de comunidade, há algumas comunidades que já não estão a aceitar novos utilizadores.

“É avassalador ter novos utilizadores”, admite o professor canadiano Robert W. Gehl. “Há muitos administradores de servidores que estão muito stressados agora com a migração do Twitter. Tem havido um grande fluxo de utilizadores vindos de lá, algo que está a pressionar os servidores mais pequenos.”

Mas a razão para serem pequenos, explica este académico, “não é porque o sistema é difícil de utilizar, é porque as pessoas que gerem os pequenos servidores não querem que sejam grandes, porque a moderação é mais fácil se for feita em pequena escala.” E dá um exemplo de servidor pequeno. “Se tem um servidor com 400 utilizadores e alguém se porta mal nesse grupo é muito mais fácil lidar do que se tiver 4 mil ou 40 mil utilizadores.”

“Muitos dos pequenos servidores fecharam a possibilidade de novos utilizadores inscreverem-se e isso coloca pressão no servidor principal do Mastodon para ficar aberto e absorver este enorme fluxo. Por isso têm sido umas semanas difíceis para as pessoas que gerem os servidores”, reconhece.

Mas o professor universitário reconhece inteligência aos administradores dos servidores do Mastodon por tentarem “manter os servidores relativamente pequenos”, já que “pode ajudar a mitigar os chamados utilizadores impacientes”. Gehl antecipa que, ao longo das próximas semanas, possa ser sentida “uma descida dos utilizadores ativos, nomeadamente devido a alguma frustração.” Mas acredita que “a cultura do Mastodon e do Fediverse vai mudar, para o bem ou para o mal, a partir de agora com esta migração do Twitter que está a acontecer.”

Pode ser ou não uma alternativa ao Twitter?

Hugo Gameiro, o administrador do Masto.pt, já fez há alguns anos a troca do Twitter para o Mastodon. “Apaguei tudo do Twitter há quatro anos”, recorda.

Já Robert W. Gehl, o professor universitário do Canadá, ainda não se mostra totalmente convencido. “Isto sou eu a falar enquanto académico”, ressalva, dizendo que “considera que é uma alternativa ao Twitter no sentido em que nos força a pensar naquilo que significam as redes sociais. Nesse sentido sim”. Quando se passa para um sistema como o Fediverse ou o Mastodon, explica o investigador, “que não são virados para um capitalismo de vigilância, veem-se formas radicalmente diferentes de as pessoas se ligarem umas às outras”.

Mas o que pensa enquanto utilizador comum? “Se se estiver a falar de pessoas a saltarem do Twitter para o Mastodon, então acho que não [é alternativa], porque são sistemas diferentes”, independentemente de curvas de aprendizagem mais ou menos exigentes.

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