Índice
Índice
Se está com sintomas de Covid-19 — uma tosse, um espirro persistente — e está nos primeiros cinco dias dessa sintomatologia, o médico Germano de Sousa não tem dúvidas. “Faça um teste rápido de antigénio, feito por um profissional, e se estiver negativo, com certeza não será Covid, será outra coisa”, diz o antigo bastonário dos Médicos ao Observador. Se estiver positivo, deve fazer um PCR para confirmar o diagnóstico. Mas as certezas que os testes rápidos lhe dão, acabam por aí.
Esta sexta-feira, a ministra da Saúde avisou que todos temos de estar preparados para fazer mais: mais testes, mais vacinação, mais controlo de fronteiras, face ao crescimento da variante Ómicron. Mas serão os testes rápidos, cada vez mais usados antes de festas, eventos ou simples encontros de amigos suficientes?
“Os testes de antígenio não são infalíveis e criam uma falsa sensação de segurança”, acrescenta Germano de Sousa, proprietário de uma das maiores redes de análises laboratoriais do país. Desenvolvidos para encontrar proteínas específicas do agente infeccioso, os testes antigénios recolhem uma amostra de produto (exsudado) através do nariz (até à nasofaringe) com a ajuda de uma zaragatoa.
Esse exsudado da nasofaringe é testado numa cassete, sem necessidade de recorrer a um laboratório. “Estes testes têm menos sensibilidade e tem de haver uma concentração muito elevada de vírus para dar positivo. Se a concentração viral for baixa, se a infeção começou há pouco tempo, é possível que dê negativo”, argumenta Germano de Sousa.
“Um antigénio negativo não nos descansa”, muito menos se for feito pelo próprio em casa. “Pôr uma zaragatoa na narina serve de muito pouco, a sensibilidade é diminuta.” Já o PCR, afirma Germano de Sousa, é uma técnica muito sensível, que serve para detetar todo o tipo de agente infeccioso, desde que esteja preparado para isso.
Na última quinta-feira, por todo o país, os seus laboratórios fizeram cerca de 6 mil testes (em Portugal nunca se fizeram aliás tantos testes durante a pandemia como no último mês). A taxa de positividade dos PCR foi de cerca de 8%, os antigénios de 1,2%.
[Vídeo da FDA, em inglês, a explicar os diferentes testes]
“Todos os testes servem para alguma coisa”, diz Tato Borges
Apesar de tudo, Germano de Sousa acredita que estes testes são úteis, por exemplo, nas escolas quando aparecem crianças constipadas. Se der negativo é sinal de que não há problemas de Covid. “Se forem feitos continuamente apanha-se sempre qualquer coisa e, com sorte, sempre é menos um infetado que fica a contagiar os outros sem saber”, sublinha o antigo bastonário.
Os testes antigénio são iguais, na sua essência, quer sejam feitos em casa quer sejam feitos por um profissional. A grande diferença é onde é feita a recolha da amostra, explica Tato Borges.
“Todos os testes servem para alguma coisa”, diz o também presidente da Comissão de Acompanhamento da Luta Contra a Pandemia nos Açores. Os autotestes procuram o antigénio do vírus, explica, e as pessoas não qualificadas fazem a colheita na ala nasal.
“Nós sabemos que o primeiro sítio onde a infeção é mais preponderante é a garganta. Para chegar à ponta do nariz, a doença já tem de ter evoluído. Quando é colhida por um não profissional, a amostra é retirada do lugar anatómico que demora mais tempo a colonizar”, explica o médico de saúde pública.
Já nos testes grátis, feitos nas farmácias e comparticipados pelo Estado, é feita uma colheita nasofaringea, mais profunda e cuidadosa. Para além disso, o profissional tanto pode processar a análise na cassete, que demora 15 minutos, como analisá-la em laboratório, o que demora cerca de uma hora, mas também dá maior sensibilidade ao teste.
A falsa sensação de segurança
Mesmo com um teste PCR negativo não se pode fazer tudo, diz Tato Borges. É preciso continuar a usar máscara, higienizar as mãos e por aí fora e não se deixar levar pela falsa sensação de segurança de que falava Germano de Sousa.
“Com um teste negativo não se pode fazer tudo. As pessoas não se podem fiar naquilo que é resultado negativo para poderem fazer o que quiserem”, acrescenta Tato Borges. Neste período de festas, de maior convívio social, diz que é preferível fazer um teste, qualquer teste, do que ir jantar com amigos sem ter tomado nenhuma precaução. Isso não significa que se levante a guarda durante o encontro. A máscara, por exemplo, é para manter o mais possível.
Germano de Sousa tem outra posição. “Se fosse para uma festa de Natal, fazia um PCR se suspeitasse que podia ter sido contaminado. Se tivesse algum sintoma, fazia logo um antigénio. E se fosse uma festa com pessoas vulneráveis, mais velhas, mesmo sem sintomas ou suspeitas, fazia um PCR.”
Quase 650 mil testes entregues nas farmácias
Na última semana, entre 10 e 17 de dezembro, a Associação de Distribuidores Farmacêuticos (Adifa) entregou meio milhão de autotestes nas farmácias portuguesas, a que ainda somou 144 mil testes de antigénio para uso profissional. No total, estas 644 mil unidades representam um salto em relação à semana anterior (200 mil), mas ficam longe do milhão que foi entregue na primeira semana de dezembro.
Fonte oficial da Adifa garante que a reposição de stocks de testes faz parte da rotina diária dos fornecedores e não têm qualquer indicação de que venham a ocorrer falhas do lado dos produtores.
O recorde de testes feitos num dia em Portugal foi registado na sexta-feira passada, 10 de dezembro, quando se realizaram 197.718 (destes, 141.768 foram de antigénio).
Os dados disponibilizados no site da Direção Geral de Saúde vão sendo atualizados e, até à publicação deste texto, os valores mais recentes (mas que ainda podem aumentar) são de quarta-feira, 15 de dezembro: 140.620 testes no total, dos quais 85.174 de antigénio. E ficam de fora todos os autotestes que não foram registados no sistema, fugindo à malha da DGS.
A marca usada conta. A sensibilidade varia quase 10%
Em Portugal, o Infarmed tem listadas 144 marcas de testes rápidos de antigénio (TRAg) de uso profissional (veja aqui a lista). Quando se olha para a percentagem da sensibilidade, sempre com recolha através de zaragatoa nasofaríngea, os valores variam entre 98% e 90%, uma diferença significativa, na opinião do antigo bastonário.
“Há algumas marcas pelo mundo que têm uma sensibilidade de 50%, nem vale a pena usar”, defende Germano de Sousa. Para si, os que lhe dão maiores garantias são os que estão na lista da FDA (Food and Drug Administration) norte-americana. Sem querer referir nomes de farmacêuticas, também o médico Tato Borges concorda que há diferenças de sensibilidade no material que se encontra no mercado para testar a infeção pelo vírus da Covid: “Não são todas iguais, algumas são mais fidedignas. Sabemos que algumas das marcas usadas nas empresas para testar trabalhadores quando dão positivo, é mesmo positivo, dificilmente há falha.”
Antigénio positivo, PCR negativo. É possível
Embora seja mais comum receber um falso negativo depois de fazer um teste rápido de antigénio, os falsos positivos também acontecem. “Pelo próprio modo como estes testes são construídos, os falsos positivos podem acontecer. Imagine que tem uma doença autoimune, só isso já pode interferir com o resultado. Por isso é que se recomenda a confirmação com um teste PCR”, explica Germano de Sousa.
Há mais motivos, acrescenta Tato Borges. “Para além de uma reação cruzada com um antigénio parecido, o líquido que faz a preparação da zaragatoa podia não estar nas melhores condições, a cassete podia ter algum problema ou até ter passado o prazo de validade do teste”, diz o vice-presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública.
E, claro, há os verdadeiros falsos positivos. “É assim mesmo, nada estava errado, o vírus não existe, mas dá positivo. É o chamado resultado anómalo”, explica Tato Borges.