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FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

FRANCISCO ROMÃO PEREIRA/OBSERVADOR

Fernando Negrão avisa Santos Silva: "Temos de ter cuidado com o nosso lado autoritário"

Fernando Negrão diz que ralhete de Santos Silva "pecou por excesso de vigor" e diz mesmo que presidente da AR e Chega estão a puxar por esta "contenda" para retirarem proveitos políticos.

O antigo vice-presidente da Assembleia da República, Fernando Negrão, diz que Augusto Santos Silva “não tem legitimidade política” para proibir partidos de seguir em viagens oficiais, como fez com o Chega. Em entrevista ao programa Vichyssoise, da Rádio Observador, o presidente da mais importante das Comissões da AR (a de Direitos, Liberdades e Garantias) diz que o ralhete do presidente da AR teve “excesso de vigor”, pois tinha a obrigação de “ser alguém que modere” e não contribuir para um ambiente crispação.

Fernando Negrão considera que existe “interesse político da parte dos contendores no sentido de poderem tirar aproveitamento político desta situação”, sugerindo que o Chega quer retirar benefícios eleitorais deste combate e Santos Silva também quer promover uma eventual candidatura a Belém.

Fernando Negrão desvaloriza o vídeo em que as três principais figuras da Nação são apanhados a conversar, dizendo que os políticos são também “cidadãos comuns” que estavam a relaxar, mas discorda que o vídeo tenha sido apagado e deixa um aviso para as medidas que possam estar a ser preparadas para deixar proibições por escrito: “Temos de ter muito cuidado com o nosso lado autoritário”.

[Ouça aqui a Vichyssoise desta semana na íntegra:]

A fúria do Augusto gelado e a conversa de café

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Esta semana Augusto Santos Silva deu um ralhete ao Chega durante a sessão de Lula da Silva. Concorda com esta reprimenda foi justa e na medida certa?
As reprimendas normalmente pecam por excesso, ou seja, as intervenções musculadas normalmente têm sempre uma reação do outro lado e o presidente da Assembleia da República deve ser alguém que modere os comportamentos e os debates no plenário. A intervenção tinha de ser feita, os termos tinham de ter algum vigor, só discordo na medida em que achei que houve algum excesso no vigor da intervenção.

Perdeu as estribeiras?
Isso, porque o presidente da Assembleia da República deve ser um elemento moderador e não o elemento que intensifique o mau estar que leve à sua intervenção.

Teve excesso de agressividade em termos de linguagem corporal?
Sim, mesmo físico.

E depois disso proibiu o Chega de integrar delegações parlamentares nas visitas oficiais. O PS diz que o presidente da AR tem este poder. É legítimo?
Essa proibição ele não a tem expressamente, mas na medida em que é ele que escolhe os deputados que o acompanham nas visitas oficiais a outros países. Mas o critério para essa escolha tem de ter alguma racionalidade, não pode estar constantemente a ser acompanhado por deputados do seu partido. Tem de haver rotatividade de maneira a que todos os partidos sejam representados pelos seus deputados nessas deslocações de âmbito nacional. Agora, se o PAR em qualquer momento decidir que o partido A o deixa de acompanhar em determinadas visitas, não há nada que o proíba de fazer isso. Porém, de alguma forma, viola o princípio do tratamento igualitário relativamente a todas as forças políticas.

Tem legitimidade formal mas não política, é isso?
Não tem essa legitimidade política. A posição do PAR é um pouco como a do Presidente em relação aos portugueses, é o presidente de todos os deputados.

Decisões destas não podem dar argumentos ao Chega para se vitimizar? O efeito pode ser contraproducente?
Já vimos o Chega a vitimizar-se, já o fez logo a seguir. Agora está a guardar-se para a Conferência de Líderes, em meados de maio, onde estarão representados todos os partidos através dos líderes parlamentares para discutirem o que aconteceu e porem na mesa soluções para estes problemas.

Essas soluções não podem só alimentar o discurso do Chega?
Sim, sim. O Chega já se vitimizou, já disse que discordava por completo, que estava a ser destratado na AR, não estava a ser tratado como as outras forças. Isto dá gás às pretensões do próprio Chega e no fim do dia vamos todos concluir que isto se calhar interessa às partes que fazem parte desta contenda. Não quero acreditar que seja isto, mas a continuar pode confirmar-se esta tese.

O seu colega de bancada, Duarte Pacheco, disse que o próximo passo, caso o Chega impedisse o presidente brasileiro de falar, seria pedir à PSP que retirasse os deputados da sala. Parece-lhe que isso seja possível de acontecer com o extremar de posições?
Sim, isso já seria boicote à continuação dos trabalhos. Porque está contemplada na agenda a intervenção — no caso — do presidente do Brasil Lula da Silva. Portanto, o presidente da AR, quando aconteçam problemas, tem de procurar a melhor forma de ser cumprida toda a agenda. Se houver algum obstáculo ao cumprimento dessa agenda, no caso a intervenção do presidente Lula da Silva, o presidente da AR pode ter de chegar a essa medida de evacuação de quem esta a obstacularizar o prosseguimento dos trabalhos.

Foi também divulgado um vídeo em que, em conversa com António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa, Augusto Santos Silva critica a IL e o Chega. Aquele parece-lhe um registo adequado às principais figuras da Nação?
Temos de olhar para as principais figuras da nação como homens e mulheres que quando não estão nesses funções são cidadãos comuns e têm uma vida igual à nossa.

Foi António Costa que disse que os ministros não se podem esquecer que são ministros nem à mesa do café…
Naturalmente que não, mas nenhum de nós se deve esquecer que somos cidadãos e devemos ter um comportamento urbano uns com os outros. E mais do que urbano, gentil. A conversa que ocorreu foi informal, entre três pessoas que estavam a relaxar do que tinha acontecido e é natural que se pudessem ter excedido um pouco. E depois isto leva a outra conversa que é a presença das câmaras naquela sala.

Esse é que foi o erro?
Não é erro. Eu conheço aquela sala, conheço as circunstâncias em que as coisas acontecem e aquela câmara, do canal Parlamento, está lá sempre e toda a gente sabe. E que tem som.

"Aquela câmara, do canal Parlamento, está lá sempre e toda a gente sabe. E que tem som."

Augusto Santos Silva não tem razão para se indignar como indignou com a captação de som naquele momento?
Acho excessiva essa indignação. E já vi que vão ser estudadas medidas, inclusive a nível penal, para se criar um tipo legal de crime para contemplar estas situações. E relativamente a isso só posso dizer que temos de ter muito cuidado com o nosso lado autoritário e não deixar que ele seja preponderante nestas situações.

Concorda com o facto de a AR TV ter apagado o vídeo?
Não, não concordo. Para apagar esse vídeo tinha de apanhar todos os outros dos anos anteriores, de conversas dos anos anteriores. Portanto, foi excessivo apagar este vídeo.

"Acho excessiva a indignação [de Santos Silva] já vi que vão ser estudadas medidas, inclusive a nível penal, para se criar um tipo legal de crime para contemplar estas situações"

A IL diz que Augusto Santos Silva está a utilizar o cargo para se autopromover como candidato da esquerda a Belém. É uma acusação justa?
Pois, era o que dizia. A continuar este clima, este confronto, esta troca de argumentos excessivos na forma e na linguagem, podemos chegar a essa conclusão: que há algum interesse político da parte dos contendores no sentido de poderem tirar aproveitamento político desta situação.

Passando para o Chega. O líder do PSD nunca disse “o Chega nunca”. Alinhando numa perspetiva intermédia que é dizer: “Com xenófobos e racistas, não”. Montenegro não devia ser claro a dizer que o PSD nunca aceitará uma solução de Governo com o Chega?
Montenegro tem sido claro quando diz que nunca pactuará com partidos que defendem ideias xenófobas. É suficientemente claro para nós, sabemos a quem se está a dirigir.

Mas se há tantas pessoas com dúvidas, não seria mais acertado dizer “com o Chega não”?
O partido tem muitos anos, vem da fundação da democracia, é um partido de poder que tem governado o país especialmente nos momentos mais difíceis. Está preparado e quer preparar-se melhor ainda para eleições que possam ocorrer a médio prazo. Tem os seus tempos e têm de ser compreendidos. O presidente do PSD já disse o que aqui dissemos e, a seu tempo, se assim pretender e achar necessário, tenho a certeza que dirá claramente o que referiu.

Vê uma solução parecida com Açores?
Não, não vejo. Também não o vejo na Madeira, onde o PSD, em coligação com o CDS, terá possibilidade de ter uma maioria absoluta.

Há no PSD, e até na sua bancada, deputados que dizem que “Montenegro não vai chegar lá”. Acredita que vai?
Claro que acredito. Os partidos têm uma vocação e é de poder, mas não é o poder só pelo poder. Têm de estar preparados para exercer o poder e tem de ter as melhores soluções para os problemas do país e dos portugueses. por isso, neste momento, estamos todos juntos e preparados para ver Montenegro como primeiro-ministro e o PSD a governar.

Quanto é que desse seu otimismo vem das recentes sondagens, que dão o PSD à frente?
Não vem propriamente das sondagens, mas da preparação do líder do PSD, que é um homem muito bem preparado, da preparação de muitas pessoas, quadros com grande qualidade que o PSD tem, e do que está a passar no país e que nos deixa atónitos, atordoados, com tanta incompetência, com tanto caso e casinho, com comportamentos inexplicáveis e este nível que nos levam a perguntar se vamos continuara ser governados por este Governo e pelo PS, que tem demonstrado que não tem condições para continuar a governar.

Se o PSD não vencer as Europeias, no ano que vem, isso pode ser um rude golpe nessas ambições?
Sim, mas isso não é problema nenhum, é a vantagem das eleições. As eleições vão sempre dando aos políticos e aos partidos sinais de como as coisas estão a correr.

"O PSD tem sempre dito que a legislatura deve ser cumprida até ao fim."

E haveria tempo para trocar de líder e ganhar corpo suficiente para ser alternativa até 2026?
Não seria a primeira vez que aconteceria a eleição de um líder perto de umas eleições e, depois, poder ganhá-las ou perdê-las.

Não vê uma fatalidade numa derrota nas Europeias?
Não, não vejo. As eleições podem ser perdidas de muitas formas, ou por muito ou por poucos, e essa leitura terá de ser feita no pós das eleições.

Marcelo tem ajudado o PSD ao falar constantemente da hipótese de uma dissolução do Parlamento? É desejável que o Governo caia antes de tempo?
O PSD tem sempre dito que a legislatura deve ser cumprida até ao fim. O PS, que ganhou, tem essa obrigação. Mas temos de ver se o PS vai continuar a governar como tem governado durante este primeiro ano da sua maioria absoluta, em que até me faltam as palavras para classificar o espanto relativamente à governação do PS.

"A dissolução da AR e a demissão do Governo só devem ocorrer em casos que ponham em causa a legalidade democrática."

Mas nesse quadro não era melhor antecipar eleições? Qual o limite?
A dissolução da AR e a demissão do Governo só devem ocorrer em casos que ponham em causa a legalidade democrática.

E não estamos nesse ponto, é isso?
Não estamos nesse ponto. Estamos num ponto de incompetência do Governo que, a prosseguir nestes termos, pode levar a uma situação dessa natureza.

Qual a ideia de Marcelo, que insiste publicamente que não há uma alternativa de Governo?
Depois de o termos ouvido dizer isso, vimos também, numa audiência com o líder do PSD, classificá-lo como líder do maior partido da oposição.

Isso é um sinal de ventos de mudança em Belém?
Podem existir ventos de mudança nesse sentido, mas eu não sou um comentador.

Alinha na crítica de que o presidente Marcelo, nos últimos sete anos,  tem sido mais aliado do PS do que do partido ao qual presidiu?
Os últimos sete anos têm sido difíceis para o PSD. Tem tido dificuldade em afirmar-se, unir-se, apresentar aos portugueses uma alternativa verdadeiramente convincente. O Presidente, naturalmente, fazendo um equilíbrio de forças e não vendo a existência de uma alternativa ao PS, tem dado o apoio que considera necessário ao PS nas suas medidas. E tem estado a aguardar que surja uma alternativa. As palavras do PR dizem tudo, quando passou a classificar o PSD como maior partido da oposição.

"Passos Coelho fica melhor em São Bento do que em Belém"

Passamos agora para o segmento Carne ou Peixe, onde vamos apresentar-lhe duas opções e só pode escolher uma. Quem preferia levar a comer um choco frito em Setúbal: Rui Rio ou Luís Montenegro?
Luís Montenegro, conheço-o há mais anos e sei que é um bom garfo.

E a comer um gelado no Santini de Belém: Pedro Passos Coelho ou Luís Marques Mendes?
Pedro Passos Coelhos e teria um enorme gosto não só em comer o gelado na sua companhia, como conversar sobre o que se vai passando no país.

Mas porque Passos gosta mais de gelado ou porque fica melhor em Belém?Porque gosta de gelado [risos]. Passos Coelho fica melhor em São Bento do que em Belém.

Preferia ser ministro de um governo bloco central liderado por Pedro Nuno Santos ou Fernando Medina?
Nem por um nem por outro. E eu já tenho 67 anos e acho que há quadros mais novos do que eu e com mais garra e mais entusiasmo para oferecer aos portugueses.

A quem ofereceria uma t shirt com a expressão: “Eu tenho pelos no coração”. António Costa ou André Ventura?
Ofereceria a António Costa, porque lhe disse uma vez cara a cara. Continuo a achar que ele tem pêlos no coração, uma expressão que suscitou grande curiosidade mas é uma velha expressão que a minha avó e bisavó usavam — e as suas amigas também — e eu ouvi-a muitas vezes Depois caiu em desuso.

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