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"Temos de explicar às pessoas o que se está a passar no mundo"
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"Temos de explicar às pessoas o que se está a passar no mundo"

TIAGO PETINGA/LUSA

"Temos de explicar às pessoas o que se está a passar no mundo"

TIAGO PETINGA/LUSA

Gerard Ryle: "Putin achou que os Panama Papers eram um truque da CIA"

Acredita que o jornalismo tem de trabalhar para o bem comum. Gerard Ryle, diretor do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação, estará nas Conferências do Estoril no próximo dia 1.

Acredita que o gosto por uma boa história é um laço que une os jornalistas de todo o mundo, mas também acrescenta que isso não basta se não se compreender o que realmente interessa ao cidadão comum. Gerard Ryle, diretor do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação desde 2011 (é o primeiro não americano a assumir o cargo), vem às Conferências do Estoril para uma conversa marcada para a tarde de 1 de Setembro, com José Manuel Fernandes (publisher do Observador) e Annelise Borges. Acreditando que o jornalismo tem de abandonar os seus métodos tradicionais, Ryle não tem parado de fazer conferências e talks pedagógicas um pouco por todo o mundo, desde que a investigação dos Panama Papers, conduzida pelo consórcio por si dirigido, mas que reuniu centenas de jornalistas e dezenas de órgãos de informação, revelou a extensão global do escândalo dos paraísos fiscais. Gerard Ryle, de 57 anos, natural da Irlanda mas a viver na Austrália há 35 anos, diz ter aprendido que um jornalista de investigação não se faz tão depressa como nos filmes de Hollywood.

Numa das suas TED talks, diz que os Panama Papers demonstraram que o trabalho de equipa é possível em Jornalismo. Ainda se cultiva a imagem algo romântica do repórter solitário, que faz tudo sozinho?
É um velho mito. Claro que há histórias e circunstâncias que beneficiam de algum isolamento e reserva, e eu também fiz esse tipo de jornalismo durante anos, mas estou cada vez mais convencido de que, independentemente do lugar onde estamos, todos falamos a mesma linguagem, que se resume ao fascínio por uma boa história. Por isso, quando começámos a trabalhar na investigação dos Panama Papers, certificámo-nos de que os repórteres envolvidos não alimentavam qualquer espírito de competição entre si.

Os Panama Papers foi uma investigação conduzida pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação

AFP via Getty Images

E foi fácil consegui-lo?
Eu diria que me surpreendeu a adesão das pessoas. Mas esse é, de facto, o caminho porque há cada vez mais histórias globais, que envolvem muitos países e redes inteiras de ligações. Nestes casos, é impossível trabalhar sozinho, por maior que seja a determinação. O caso dos Panama Papers é um bom exemplo porque debatíamo-nos com milhões de documentos que uma pessoa sozinha não conseguiria ler em menos de 20 anos, mesmo que trabalhasse a tempo inteiro neste assunto. Em grupo, conseguimos fazê-lo num ano, o que, ainda assim, é um milagre. E, de algum modo, derrubámos o mito de que os repórteres têm de ser muito competitivos entre si e são incapazes de partilhar informação.  Por outro lado, rapidamente percebemos que a rede dos Panama Papers abrangia dezenas de países, tão diferentes como o Afeganistão, Portugal, Estados Unidos ou Nigéria.

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“O facto de os Panama Papers terem chegado a tantos nomes de tantos países foi uma surpresa para toda a gente”

O know how dos jornalistas de cada país foi importante? Em Portugal, por exemplo, sabemos quem são os portugueses referidos nos documentos, o que fazem, quais são as suas relações, o que não é fácil para um estrangeiro…
Claro que sim. É evidente que qualquer pessoa pode googlar um primeiro-ministro ou uma figura mais destacada, mas há ali muitos nomes que só podem ser identificados com eficácia pelos jornalistas locais.

Todos os repórteres envolvidos foram fiéis ao pacto de reserva e ao compromisso de publicarem as notícias em simultâneo?
Muito poucos tinham a noção da real dimensão da história, a não ser algumas pessoas, em Washington, no Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação.

Houve um momento crítico neste processo, pouco tempo antes da publicação, quando Putin descobriu que era referido nestes documentos e reagiu publicamente.
Ele só descobriu porque foi interpelado por nós, com uma longa carta cheia de perguntas. Quando recebeu a carta, decidiu fazer uma conferência de imprensa porque estava convencido que a história era toda sobre ele e que era um truque da CIA contra a Rússia. Na verdade, esta reação foi ótima para nós porque preparou o mundo para o facto de algo muito importante estar prestes a “rebentar”. Se um líder mundial convoca uma conferência de imprensa, não será para falar de uma trivialidade. O facto de termos chegado a tantos nomes de tantos países foi uma surpresa para toda a gente, incluindo para os envolvidos.

Antes e depois da publicação, algum de vocês se sentiu ameaçado?
Não, e o facto de sermos muitos foi decisivo. Aqueles repórteres que eventualmente estariam em situações mais delicadas, em boa parte devido à natureza dos regimes políticos, já tinham deixado os seus países antes de se envolverem nesta investigação. Na verdade, ninguém podia atacar-nos, dizendo que o nosso trabalho não era credível porque tínhamos os documentos em nosso poder.

"Temos de saber fazer autocrítica e pensar se o desinteresse do público, e até a sua desconfiança, não se deve ao facto de fazermos muitas vezes um jornalismo que não interessa às pessoas."

“Dizemos aos nossos mecenas que divulgaremos o que apurarmos, mesmo que comprometa a nossa avó”

O impacto deste trabalho coloca questões sobre o modelo de jornalismo que praticamos, sobretudo num momento em que a falta de financiamento se conjuga com um certo desinteresse do público pela informação?
Temos de saber fazer autocrítica e pensar se o desinteresse do público, e até a sua desconfiança, não se deve ao facto de fazermos muitas vezes um jornalismo que não interessa às pessoas.

Como pode ser financiado o jornalismo de investigação, que precisa de tempo e de meios humanos?
Estou convencido que fomos bem sucedidos com este trabalho porque desenvolvemos um modelo de jornalismo sustentável, baseado na partilha de informação e na otimização de recursos. Mas também temos de ser realistas e compreender que este modelo só pode ser aplicado em circunstâncias específicas. Acredito que temos de pensar mais na relevância do nosso trabalho para o bem comum e de explicar às pessoas o que se está a passar no mundo porque a maior parte não percebe toda a complexidade do panorama. E isso fá-las sentir-se injustiçadas. Geralmente somos muito apaixonados pelo que fazemos, temos de mostrar essa paixão às pessoas. Também temos de fazer um uso mais sábio da tecnologia e não ter medo dela — ela é nossa aliada.

Como se processa o financiamento das investigações realizadas pelo Consórcio que dirige?
Temos mecenas, alguns dos quais pessoas com muito dinheiro. Mas fazemos questão de lhes dizer que a nossa informação é isenta e que divulgaremos o que apurarmos, mesmo que comprometa a nossa avó.

Sempre quis ser jornalista?
Não tinha esse sonho, mas comecei a trabalhar num pequeno jornal sobre casos de polícia.

O que costumava ser uma boa “escola” de reportagem…
Sem dúvida, mas também é muito fácil cometer erros. Mas foi o caminho que percorri, um caminho de anos.. Só em filmes  de Hollywood, como Os Homens do Presidente, é que um estagiário se transforma automaticamente em jornalista de investigação.

Este artigo faz parte de uma série sobre as Conferências do Estoril, evento de que o Observador é media partner. Resulta de uma parceria com a Nova Medical School, Nova School of Business and Economics e a Câmara Municipal de Cascais. É um conteúdo editorial independente.

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