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Pepe é o defesa mais velho do Mundial no Qatar

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Pepe é o defesa mais velho do Mundial no Qatar

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Indiscutível aos 40. Pepe, "uma exceção" à base de carnes secas, descanso e doce de rapadura

Come mais proteínas para ajudar os músculos, descansa mais vezes e compensa as dificuldades físicas com a força mental. Pepe, à porta dos 40 anos, é excecional. A ciência explica porquê.

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Pepe não parece normal. Não é comum chegar aos 39 anos, a apenas dois meses de completar os 40, e atingir praticamente a mesma velocidade em campo que o defesa mais jovem da seleção portuguesa, António Silva, com apenas 19 anos. A diferença de corrida em sprints entre ambos, com 20 anos a separá-los, foi de apenas 1 km/h, de 31,4 para 32,4 km/h, na época atual da Liga dos Campeões, em que FC Porto e Benfica estão nos oitavos de final.

Não é natural que Pepe se tenha tornado no segundo jogador mais velho da História a marcar na fase eliminatória de um Mundial (mais velho que ele, só o camaronês Roger Milla, aos 42 anos), ainda por cima com um salto “à Ronaldo” — embora valha a pena recordar que, nos treinos de Portugal no Mundial de 2014, num desafio em que os dois atletas tinham de saltar tão alto quanto os postes de um campo de NFL (10 pés, 3,05 metros), Pepe ganhou e CR7 não.

[Ouça aqui a explicação da jornalista Marta Leite Ferreira para a boa forma de Pepe aos 39 anos]

“Pepe não serve de exemplo para ninguém”. A jornalista Marta Leite Ferreira tenta explicar boa forma física do jogador aos 39 anos

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Pepe "é uma exceção" e "está fora do que é normal" num atleta desta idade, confirmou ao Observador o especialista em medicina desportiva João Beckert, fisiatra na Unidade de Medicina Desportiva e Performance da CUF. "Devemos admirar futebolistas como ele".

E também não parece normal que a prestação de Pepe convença os olheiros da EA Sports — cujas avaliações da prestação dos atletas na vida real constam depois no jogo FIFA, desenvolvido em parceria com a própria Federação Internacional de Futebol —, considerando-o mais dinâmico em campo que o holandês Virgil van Dijk, o primeiro defesa na História a ser considerado o melhor jogador da UEFA na Europa, pelo trabalho realizado na temporada de há quatro anos. E que só tem 31 anos.

Mais proteína, mais descontração e rapadura. Os segredos da longevidade de Pepe

Mas a questão é mesmo essa: Pepe “é uma exceção” e “está fora do que é normal” num atleta desta idade, confirmou ao Observador o especialista em medicina desportiva João Beckert, fisiatra na Unidade de Medicina Desportiva e Performance da CUF. “Devemos admirar futebolistas como ele”, admite: “O comum dos praticantes desportivos nem deve sentir-se pressionado em ter o mesmo desempenho ou procurar chegar aos 40 anos naquele nível, porque é raro.”

Pepe é o resultado de uma conjunção de fatores — os que não dependem da sorte: ser regrado com a alimentação, empenhado nos treinos, metódico na recuperação pós-jogo e respeitoso com o direito a desligar; e os que nasceram com ele: ter bons genes, resistir às lesões (e ter poucas das mais críticas também tem ajudado) e manter uma grande força mental. De tudo isto e dos desafios do pai, quando ele era mais jovem e o fazia saltar e correr dentro da água na praia no Brasil.

Um dos segredos de Pepe atualmente é evitar a perda de qualidade da massa magra e promover a regeneração muscular. Faz isso consumindo mais proteínas, como carnes secas — além de hidratos de carbono, para que o corpo reponha a energia gasta durante a prática desportiva — e introduzindo suplementos alimentares na dieta. Tudo é feito ao milímetro e de modo personalizado, com GPS’s para estudar os movimentos do atleta e escalas de esforço de acordo com a perceção do próprio jogador.

Pepe já admitiu que a gula pode muito bem ser o segredo para a sua longevidade. Em entrevista à TNT Sports, confessou: gosta de rapadura, um doce feito a calda do cano-de-açúcar; come mel do sul do Brasil e prefere a culinária do nordeste do Brasil. "Com um mel daqueles estás imune a muitas coisas".

Apesar de ser necessária mais atenção por parte das equipas médicas, a idade continua a ser um posto para jogadores na faixa etária de Pepe. “Muda o reconhecimento da importância de ser regrado na alimentação”, explica João Beckert: “As adaptações não devem ser fontes de pressão e não devem ser demasiado punitivas“, sob pena de darem azo a perturbações alimentares — que não só prejudicam o desempenho desportivo, como desrespeitam o bem-estar mental do jogador.

Pepe já admitiu que a gula pode até muito bem ser o segredo para a sua longevidade. Em entrevista à TNT Sports, o jogador português nascido no Brasil confessou: gosta de rapadura, um doce feito com a calda da cana-de-açúcar; come mel do sul do Brasil e prefere a culinária do nordeste brasileiro. “Com um mel daqueles estás imune a muitas coisas”, afirmou, acrescentando: “É um dos segredos da longevidade. Costumo comer um cuscuz com carne seca. Há coisas da gastronomia brasileira que gosto muito, às vezes a minha mãe traz escondido na mala quando me vem visitar.”

Outro segredo: saber parar. “À medida que a idade avança torna-se cada vez mais importante respeitar a necessidade de descansar, fazer mini-férias“, exemplifica o fisiatra da CUF. E na página de Instagram, Pepe indicia que o sabe fazer: publica conteúdos em que dança descontraidamente, a celebrar os Santos Populares no Porto e a desfrutar do tempo em família.

A partir dos 30 anos, segundo um estudo da Universidade de Califórnia do Sul, perde-se entre 3% e 8% da massa muscular a cada 10 anos — e essa percentagem pode alcançar os 10% a partir dos 40 anos e os 15% a partir dos 70. A Universidade de Harvard indica que essa perda muscular é de 1% a 2% por ano a partir dos 35 anos.

São fatores que contribuem para a saúde mental e que podem ser suficientes para colmatar as dificuldades físicas próprias da idade, aponta João Beckert: “Do ponto de vista cognitivo, de confiança na experiência, a idade pode ser um fator que favorece. Atletas mais experientes, que confiam que estão em forma e com rendimento, pode nem parecer que são afetados por questões fisiológicas”.

Isso não significa paralisar completamente, alerta João Beckert: “Um estilo de vida sedentário dificulta a regeneração dos músculos e torna-se mais difícil repô-los”. À medida que se envelhece, os músculos e tendões perdem elasticidade e a manutenção do peso torna-se mais difícil. A partir dos 30 anos, segundo um estudo da Universidade de Califórnia do Sul, perde-se entre 3% e 8% da massa muscular a cada 10 anos — e essa percentagem pode alcançar os 10% a partir dos 40 anos e os 15% a partir dos 70. A Universidade de Harvard indica que essa perda muscular é de 1% a 2% por ano a partir dos 35 anos.

O exercício físico continuado e um esforço para manter um estilo de vida ativo e saudável pode ajudar os atletas a compensarem o impacto do envelhecimento. Não totalmente: a idade traz sempre perda de força muscular e diminuição no número de fibras musculares (que pode ser superior a 50%). Mas porque não treinar a corrida, e aliviar o peso da idade, com uma vista para o pôr-do-sol, como Pepe?

A resistência de Pepe pode esconder-se nos genes

A qualidade do treino e da recuperação, o acompanhamento clínico e o estilo de vida também são essenciais para prolongar a vida profissional de um atleta. Mas Pepe pode ter um empurrão natural para o sucesso. Domingos Gomes, responsável pelo departamento clínico do FC Porto entre 1976 e 1999 e antigo médico da UEFA e da FIFA durante 15 épocas, encontra respostas longe da gastronomia e do ginásio: os genes de Pepe podem esconder os segredos do sucesso do defesa português, revelou ao Observador.

Há dois que podem ter um papel especialmente importante na resiliência física de Pepe. Um deles é o que codifica a enzima conversora da angiotensina (ACE), que corta uma proteína (a angiotensina I) transformando-a numa outra (a angiotensina II). Esta função permite regular a pressão arterial e o equilíbrio entre os fluidos e os sais presentes no corpo humano. Enquanto a segunda proteína induz uma contração dos vasos sanguíneos e um aumento da pressão arterial, a primeira faz precisamente o contrário.

Esse equilíbrio de sais coloca-se ainda mais no Mundial do Qatar por causa das características climatéricas do país: muito quente e muito húmido. Esta combinação pode culminar num desequilíbrio dos eletrólitos — minerais (como ódio, o potássio e o cloro) que entram e saem das células para manter o funcionamento estável e normal do organismo, garantindo o transporte de água: “Se houver uma desidratação muito grande, estas composições alteram-se e o corpo deixa de funcionar devidamente“, explicou João Beckert.

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Um salto impossível... ou talvez não

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É que o corpo é composto em cerca de 70% por água, distribuída em vários compartimentos espalhados pelo organismo. São os minerais que a compõem que, ao entrarem e saírem das células, dão origem aos fenómenos elétricos que determinam a regulação do organismo, o funcionamento dos órgãos ou a comunicação entre as membranas celulares. Um desequilíbrio dessas movimentações pode traduzir-se em “perdas de funcionamento abruptas e instantâneas, cãibras e colapsos”.

Jogadores no Qatar enfrentam calor de 30ºC e humidade nos 70%. Os perigos para o cérebro, coração e músculos

Essa é uma preocupação constante dos atletas e das equipas técnicas. Ter demasiados eletrólitos no organismo pode sobrecarregar os rins, que os filtra e elimina, resultado em m sintomas de enjoo, diarreia, tonturas, crises renais e arritmia. No limite, caso esse equilíbrio não seja reposto, o atleta pode mesmo morrer. Ter falta de eletrólitos — e grandes quantidades de humidade tendem a levar o organismo a eliminar mais sódio — também causa desfechos indesejados: sem eletrólitos, os sinais elétricos em que se baseia o funcionamento do sistema nervoso podem ser interrompidos.

Mas há atletas que têm um gene de cada tipo — e esses parecem estar em vantagem: por um lado, desenvolvem uma resistência especialmente útil para suportar o esforço físico de um jogo de 90 minutos (e às vezes mais) por mais tempo na vida profissional. Por outro lado, também conseguem ter uma força explosiva para batalhar pela bola ou correr velozmente em curtas distâncias.

Ora, uma das formas dos genes que regulam todas estas funções mantém uma maior quantidade da proteína angiotensina I em circulação. A outra forma codifica uma maior produção da angiotensina II. Há pessoas que carregam nos cromossomas dois genes para terem mais angiotensina I em circulação e, por isso, tendem a ser fisicamente mais resistentes. Outras, tendo dois genes referentes à angiotensina II, costumam ter mais força.

Mas há atletas que têm um gene de cada tipo — e esses parecem estar em vantagem: por um lado, desenvolvem uma resistência especialmente útil para suportar o esforço físico de um jogo de 90 minutos (e às vezes mais) por mais tempo na vida profissional. Por outro lado, também conseguem ter uma força explosiva para batalhar pela bola ou correr velozmente em curtas distâncias.

Velhos são os trapos. Como Pepe, o jogador mais velho do Euro 2020, continua no topo do futebol à porta dos 40 anos

O outro gene preponderante para os futebolistas de elite é o ACTN3 que transporta as informações para a produção de alfa-actinina-3, uma proteína encontrada nas fibras musculares de contração rápida. No entanto, algumas pessoas têm uma mutação desse gene que torna essa proteína mais curta e mais facilmente degradada.

Apesar de esta parte genética ser “preponderante”, Domingos Gomes admite que não basta: “Eles não são super homens, não têm nada de diferente. A questão é que cada atleta reage de forma diferente ao ambiente em que está inserido“, aponta o médico. Mas Pepe tem uma "pureza de estrutura que lhe permite ter um desenvolvimento muito grande e suportar bem as lesões".

Neste caso, os que têm essa mutação em ambas as cópias do gene ACTN3 parecem ter menos fibras musculares de contração rápida e mais fibras de contração lenta, o que lhes confere mais resistência. A presença dessa alteração em dois genes parece ser mais comum em atletas de alta competição, embora a comunidade científica ainda se divida sobre quão preponderante é este traço genético para o desempenho do futebolista.

Apesar de esta parte genética ser “preponderante”, Domingos Gomes admite que não basta: “Eles não são super homens, não têm nada de diferente. A questão é que cada atleta reage de forma diferente ao ambiente em que está inserido“, aponta o médico. Mas Pepe tem uma “pureza de estrutura que lhe permite ter um desenvolvimento muito grande e suportar bem as lesões”. Por isso, mesmo tendo estado lesionado e afastado do relvados mesmo antes do Mundial, chegando a colocar-se a dúvida se seria ou não convocado por Fernando Santos, chegou ao Qatar numa forma excecional. E muitos já dizem que vai deixar o futebol como um dos maiores centrais que o futebol conheceu.

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