Várias pessoas e uma grande agitação. À porta de duas escolas de Madrid, que servem como local de voto para as eleições gerais, a afluência às urnas este domingo ao final da manhã parecia ser elevada, apesar do calor que se fazia sentir. Em certos momentos, em que confluíam muitos eleitores, formavam-se algumas filas dentro das salas de aulas e pavilhões desportivos com mesas onde estavam amontoados boletins de voto e envelopes, urnas e cabines onde se garante que o voto é secreto.
Mesmo que o voto seja secreto, não será difícil fazer uma previsão dos resultados na escola de Guindarela, no bairro de Salamanca, localizado no coração de Madrid, e no centro de Educação Infantil e Primário, localizado no bairro de El Pozo. Apesar de ficaram a apenas 10 quilómetros de distância, as diferenças ideológicas não poderiam ser mais expressivas nos dois espaços.
Foi na escola da Guindarela, rodeada de apartamentos com fachadas bem cuidadas, que três amigas estavam a conversar no recreio, após terem votado. Ao Observador, Toñi Núñez confidenciou que ia agora para a “serra” do norte de Madrid, um local onde tem uma casa de férias e de onde vai acompanhar a noite eleitoral. “Espero que haja uma mudança”, afirmou, ao mesmo tempo que abanava o leque que tinha na mão esquerda.
Apesar de não se querem “comprometer” e de não revelarem o sentido de voto, as críticas deixadas pelas três amigas deixaram bem claro em que é que elas não votaram. Mar Vásquez, funcionária pública, deixou duras críticas ao estado da economia: “Está pior do que nunca e a culpa é do governo. Há várias pessoas a viverem de subsídios sociais e eles têm de sair de algum sítio”, lamentou. “Concordo, concordo”, comentava Toñi Martínez.
Mais confiante do que as três amigas estava Jesús Medina, de 57 anos. “É hoje que o sanchismo vai ser finalmente derrotado”, preconizou o advogado, que foi bastante crítico com o socialista e com a sua parceira do governo, Yolanda Díaz. “A esquerda tem feito muito mal a Espanha. Díaz e Sánchez estão a entregar o país aos independentistas”, criticou visivelmente irritado, acrescentando: “Nenhum espanhol quer isso e espero uma grande derrota para o PSOE”.
A 10 quilómetros de distância, à entrada do centro educativo no bairro do El Pozo, localizado em frente a uma estação de comboios e de autocarros de onde saíram várias pessoas para irem votar, Joaquin García, um reformado de 82 anos, não teve pudores em divulgar em que é ia votar. “Gosto muito da senhora Yolanda [do Sumar]. Acredito nela para não me cortarem a reforma, como a direita fez”, defendeu. Ao seu lado, a mulher, Natalia García, abanava a cabeça, mas acabou depois por confidenciar ao Observador que preferia Pedro Sánchez: “Ele acaba por ter mais presença. Espero que continue a governar-nos”.
Por sua vez, a família Gómez, que vive a cinco minutos do centro educativo e que veio votar a pé, realçava que estas eleições eram “muito importantes”. Ignacio, de 47 anos, destacou que esta era a primeira vez que a filha, Julia, de 19 anos, iria votar. “Ela já podia ter votado em maio [nas eleições autónomas], mas não viemos. É que já se sabia quem ia ganhar aqui em Madrid”, disse, aludindo à vitória de Isabel Díaz Ayuso, do Partido Popular (PP). “Mas agora é diferente, há muitas coisas em jogo”, indicou, ao mesmo tempo que a mulher, Lola, dizia: “Muitas coisas mesmo, como a extrema-direita”.
Nas últimas eleições autónomas, em maio, o PP obteve mais de 57% dos votos na escola da Guindarela, enquanto o PSOE se ficou pelos 11,5%. Em sentido inverno, quando todos os votos foram contados no centro educativo de El Pozo, os socialistas venceram com 34,1%, enquanto os populares não foram além dos 23%. Este domingo, ver-se-á se a tendência se repete.
O calor e as primeiras eleições do verão
Eram 13h15 deste domingo quando Cristina Ocaña foi votar no bairro do El Pozo. As últimas horas da professora de ensino primário tinham sido atribuladas. “Cheguei hoje de manhã de Valência, onde estive de férias”, revelou ao Observador. Quando as eleições gerais foram adiantadas de dezembro para julho, após a derrota do PSOE nas eleições autónomas, a mulher de 43 anos já tinha marcado um hotel onde ficou com a família e tinha previsto apenas chegar este domingo à noite. Mas teve de alterar os planos: “Para mim, o mais importante é votar”.
Pela primeira vez na história democrática, umas eleições em Espanha realizam-se no verão. E isso era bem visível no vestuário de vários dos eleitores: abundavam os leques, os calções de banho, os chinelos e os vestidos. Juan Delgado, de 28 anos e que votou no bairro de Salamanca, já tinha destino após ir votar: “Vou para a piscina e já vim com os calções. Não me importa que as eleições tenham sido agora, se calhar em dezembro ia ser pior para mim”.
No entanto, nem todos compreenderam a decisão de Pedro Sánchez em adiantar as eleições. À porta do centro educativo de El Pozo, María Fernanda Vicente, mostrou a sua indignação ao Observador com a data escolhida. “É que não faz sentido votar-se no verão. Acho ridículo, porque as pessoas estão de férias e está muito calor. Tive amigas que não vieram votar por isso”, referiu a mulher de 74 anos, num dia em que a temperatura máxima pode chegar aos 36.ºC na capital espanhola.
Uma opinião muito semelhante tem Mar Vásquez: “Acho tudo horrível. É horrível as deslocações, o tempo, tudo”. No recreio da escola da Guindarela, María González sustentava o ponto de vista da amiga: “Depois do desaire que sofreu em maio, o PSOE teve de as adiantar para não acontecer o que aconteceu naquelas eleições. Achei que foi uma atitude desesperada”.
Até às 14h00 deste domingo, tinham votado 40,48% dos espanhóis, uma subida de dois pontos percentuais face a 2019, o que indicia que o calor talvez não tenha afastado os eleitores. “Eu vim votar na mesma, porque acho importante para a democracia”, chegou a conceder María Fernanda Vicente, com um encolher de ombros. Uma decisão que muitos espanhóis parecem ter tomado até ao momento.