À mesma hora em que o Mónaco ganhava ao Saint-Étienne, o Sporting jogava frente ao Madeira SAD no Funchal em andebol. Leonardo Jardim estava a ser campeão no principado, mas podia estar apenas a ver o jogo da modalidade que praticou e tanto gosta além do futebol. Afinal, tinha prometido que, caso não chegasse à Primeira Liga até aos 40 anos, desistia de tudo. Mas conseguiu, com uma subida a pulso. O andebol, esse, foi uma paixão que durou até aos 16/17 anos. Continuou a jogar futebol, mas fez apenas um ano nos seniores – o que ele gostava mesmo era de treinar.
Leonardo Jardim foi o primeiro técnico escolhido por Bruno de Carvalho, em junho de 2013. O líder do Sporting tinha passado meses e meses a recordar em campanha o dia em que entrou no estádio José Alvalade, com seis anos, e disse ao pai que um dia gostaria de ser presidente dos leões. Na primeira conversa que tiveram, também não passou ao lado uma outra frase que Jardim tinha atirado, com 15 anos: que um dia treinaria o seu clube do coração, o Sporting. Aquela afinidade precipitou um acordo que ambos tinham como certo. Mas a carreira começou antes.
Quando tinha apenas 23 anos, o campeão de França orientava os juvenis do Santacruzense, na Madeira, onde tinha chegado com três anos depois de ter nascido em Barcelona, na Venezuela. Era aí que jogava, futebol e andebol, foi aí que começou, apenas no futebol. O mais importante eram os estudos: terminou o 12.º ano e seguiu Educação Física e Desporto na Universidade da Madeira, tendo feito o IV nível de treinador com apenas 24 anos. Os trabalhos que ia fazendo impressionaram, sobretudo o estudo que fez sobre os pontapés de canto no Europeu de 1996. Foi adjunto no Portosantense, no Câmara de Lobos e no Camacha, onde teve a primeira experiência a solo em 2003.
O vício dos estudos manteve-se. Era isso mesmo, um vício. E um projeto de formação que desenhou intitulado DES (Desenvolvimento desportivo, escolar e social) acabou mesmo por ser apoiado pelo Governo Regional, apostando no acompanhamento dos jogadores mais jovens para não deixarem o futebol por vacilarem nos estudos. Em 2007 dá o primeiro grande salto, para o Desp. Chaves, numa carreira que a partir daí foi sempre a subir: Beira-Mar, de 2009 a 2011, sendo campeão da Segunda Liga em 2010; Sp. Braga, em 2011/12; Olympiacos, onde ganhou Campeonato e Taça em 2012/13; Sporting, na época de 2013/14; e Mónaco, a partir daí, até ao título desta noite.
“Criticaram muito Leonardo Jardim nos primeiros dois anos, diziam que era defensivo, mas este ano mudou tudo. Ele diz-nos para sermos agressivos, para comermos o adversário. Aponta para os lábios e mostra os dentes e diz-nos para termos presas. É louco, mas é assim que gostamos. Tem sempre tempo para nós, fala connosco e brinca muito, está sempre a contar piadas e histórias. É isso que faz dele um grande treinador”, disse esta semana Benjamin Mendy ao L’Équipe. Mais um elogio entre tantos que o treinador português tem recebido, sobretudo este ano. Mas por trás do sucesso está mais, bem mais do que pedir atitude e intensidade em campo aos jogadores.
Jardim disse um dia em jeito de brincadeira que era apologista da gestão GALO: Gestão Andando de um Lado para o Outro. Em vez de marcar reuniões, anda de um lado para o outro no clube e vai falando diretamente com as pessoas. Essa é uma das chaves para uma carreira que pode conhecer em breve novos capítulos, olhando para o interesse que se tem falado de clubes como o PSG, o Inter e até o Barcelona. Atento a todos os pormenores, estuda ao detalhe os adversários, motiva o grupo com vídeos. O grupo, esse pilar que sustenta tudo. Como assumiu em entrevista, há dez anos ligava mais à parte do treino, hoje prefere focar mais as atenções na gestão do plantel a outros níveis.
Olhando para a lista dos 20 principais campeonatos de acordo com o ranking da UEFA, 12 já estão definidos. Desses, em proporção igual, metade foram alcançados por técnicos portugueses e italianos. Com uma grande nuance: enquanto os transalpinos Ancelotti (Bayern), Conte (Chelsea) e Carrera (Spartak Moscovo) conquistaram vários títulos nacionais, europeus e mundiais como jogadores nos clubes por onde passaram, Rui Vitória (Benfica), Leonardo Jardim (Mónaco) e Paulo Fonseca (Shakhtar Donetsk) conseguiram apenas os primeiros sucessos já no banco, como técnicos. Aliás, só o último chegou mesmo a jogar na Primeira Liga. Mais: entre os 12 campeões já apurados, só os portugueses não ganharam nada como atletas. “A maior virtude dos portugueses é a sua capacidade de adaptação, faz parte do nosso povo”, justificou Leonardo Jardim.
Eis a lista dos campeões (ou candidatos) das 20 melhores ligas europeias segundo o ranking da UEFA:
Espanha, não atribuído
Candidatos: Real Madrid (Zidane) ou Barcelona (Luis Enrique)
Alemanha, Bayern
Carlo Ancelotti (italiano, 57 anos). Mais uma “velha raposa” do futebol transalpino, que começou no clube onde terminou a formação, o Parma (1976 a 1979), passou pela Roma (1979 a 1987) e acabou no AC Milan, entre 1987 e 1992. Após ganhar um Campeonato e quatro Taças de Itália na capital, o médio aumentou e muito o currículo em Milão, com dois Campeonatos, duas Taças dos Campeões Europeus, duas Supertaças Europeias, duas Taças Intercontinentais e uma Supertaça de Itália.
Inglaterra, Chelsea
Antonio Conte (italiano, 47 anos). O internacional começou a carreira no Lecce, onde esteve seis anos, mas foi ao serviço da Juventus, entre 1991 e 2004, que ganhou estatuto de um dos melhores médios italianos da década de 90, fazendo quase 300 encontros pela Vecchia Signora. Foi finalista vencido num Mundial e num Europeu de seleções, mas tem um impressionante currículo como jogadores: cinco Campeonatos, uma Taça de Itália, quatro Supertaças, uma Liga dos Campeões, uma Taça UEFA, uma Supertaça Europeia e uma Taça Intercontinental, tudo pela Juve.
Itália, não atribuído
Candidatos: Juventus (Allegri) ou Roma (Spaletti)
Portugal, Benfica
Rui Vitória (português, 47 anos). Começou no Fanhões, em 1988, passou pelo Vilafranquense oito anos com uma época pelo meio no Alverca, em 1996/97, foi para o Seixal entre 1999 e 2001, rumou ao Casa Pia e terminou a carreira no Alcochetense, em 2003, ano em que iniciou a carreira de treinador, de novo no Vilafranquense. O médio nunca ganhou nenhum título nem chegou à 1.ª Divisão.
França, Mónaco
Leonardo Jardim (português, 42 anos). Nunca teve a ambição de fazer carreira como jogador e reconheciam-lhe até mais jeito para o andebol do que para o futebol. Ainda fez um ano de sénior no Santacruzense mas, aos 23 anos, já treinava os juvenis do clube, algo que era a verdadeira paixão.
Rússia, Spartak Moscovo
Massimo Carrera (italiano, 53 anos). Os técnicos transalpinos estão mesmo na moda e também na Rússia o campeão veio desse país. O defesa passou por Pro Sesto, Russi, Alessandria, Pescara e Bari antes de chegar à Juventus, onde brilhou entre 1991 e 1996 e ganhou todos os seus títulos: um Campeonato, uma Liga dos Campeões, uma Taça UEFA, uma Taça de Itália, uma Supertaça Europeia, uma Supertaça de Itália e uma Taça Intercontinental. A seguir, esteve na Atalanta, no Nápoles, no Treviso e no Pro Vercelli.
Ucrânia, Shakhtar Donetsk
Paulo Fonseca (português, 44 anos). Quem tiver memória ainda se lembra do central de cabelo comprido e meia para dentro da caneleira que esteve vários anos na 1.ª Divisão. Começou a dar nas vistas no Leça, em 1995/96, depois de ter passado muitos anos no Barreirense. Passou depois por Belenenses, Marítimo e V. Guimarães antes de fazer os últimos cinco anos da carreira ao serviço do E. Amadora. Entre 1995 e 1998 estava ligado ao FC Porto mas nunca jogou nos dragões. Nunca ganhou um título como jogador.
Bélgica, não atribuído
Candidatos: Anderlecht (René Weiler) ou Club Brugge (Michel Preud’Homme)
Holanda, Feyenoord
Giovanni van Bronckhorst (holandês, 42 anos). Foi um dos melhores laterais esquerdos holandeses das últimas décadas, tendo começado no clube de sempre, o Feyenoord, onde esteve entre 1993 e 1998 com um ano de empréstimo ao RKC Waalwijk. Passou depois por Rangers, Arsenal e Barcelona até voltar a Roterdão. Além de ter somado mais de 100 internacionalizações, conquistou dois Campeonatos, duas Taças e uma Supertaça na Escócia; um Campeonato e uma Taça em Inglaterra; dois Campeonatos, duas Supertaças e uma Liga dos Campeões em Espanha; e duas Taças da Holanda.
Turquia, não atribuído
Candidatos: Besiktas (Senol Günes) ou Istanbul Basaksehir (Abdullah Avci)
Suíça, Basileia
Urs Fischer (suíço, 51 anos). Não foi dos jogadores mais conhecidos do futebol helvético, mas chegou a internacional quatro vezes e fez mais de 500 jogos no Campeonato distribuídos por Zurique (1984 a 1987 e 1996 a 2003) e St. Gallen (de 1987 a 1995). Ganhou uma Taça da Suíça pelo Zurique, em 2000.
Rep. Checa, não atribuído
Candidatos: Slavia Praga (Jaroslav Silhavy) ou Viktoria Plzen (Roman Pivarnik)
Grécia, Olympiacos
Takis Lemonis (grego, 57 anos). Foi o substituto de Paulo Bento, que saiu a meio de março, e regressou onde tinha começado a carreira sénior como futebolista, entre 1978 e 1987. Médio e duas vezes internacional, passou ainda por Levadeiakos e Panionios. Como atleta, conquistou quatro Campeonatos e uma Taça da Grécia.
Roménia, Viitorul Constanta
Gheorghe Hagi (romeno, 52 anos). Era um pequeno génio com a bola no pé esquerdo e um dos jogadores que passaram pelos dois grandes de Espanha. Começou a carreira de sénior no Farul Constanta, foi para o Sportul Studentesc e chegou ao Steaua Bucareste, onde brilhou entre 1987 e 1990, ganhando três Campeonatos, duas Taças e uma Supertaça Europeia. Saltou depois para o Real Madrid, onde ganhou uma Supertaça de Espanha entre 1990 e 1992. Foi para Itália, jogando dois anos no Brescia, antes de assinar pelo Barcelona, onde ficou entre 1994 e 1996 e ganhou outra Supertaça de Espanha. Acabou a carreira de jogador com cinco anos no Galatasaray, conquistando quatro Campeonatos, duas Taças, duas Supertaças, uma Taça UEFA e uma Supertaça Europeia.
Áustria, Red Bull Salzburgo
Óscar García (espanhol, 44 anos). Foi um dos miúdos da cantera do Barcelona que esteve nas grandes equipas da década de 90 (à exceção de 1994/95, onde foi cedido ao Albacete), tendo conquistado quatro Campeonatos, duas Taças do Rei, uma Taça dos Vencedores das Taças e uma Supertaça Europeia. O médio ofensivo/avançado passou depois por Valencia – onde ganhou uma Supertaça de Espanha –, Espanyol e Lleida.
Croácia, não atribuído
Candidatos: Rijeka (Matjaz Kek) ou Dínamo Zagreb (Ivaylo Petev)
Polónia, não atribuído
Candidatos: Jagiellonia (Michal Probierz), Lech Poznan (Nenad Bjelica), Legia Varsóvia (Jacek Magiera) e Legia Gdansk (Piotr Nowak)
Chipre, APOEL
Thomas Christiansen (dinamarquês/espanhol, 44 anos). Nascido em Hadsund, na Dinamarca, chegou muito cedo a Espanha, entrando na equipa B do Barcelona com 18 anos. Esteve cedido ao Sp. Gijón, ao Osasuna e ao Racing Santander antes de seguir a sua carreira sem vínculo com os catalães, passando por Oviedo, Villarreal, Terrassa, Panionios, Herfolge, Bochum e Hannover. Jogou sete minutos na Supertaça Europeia de 1992, único título pelos blaugrana. O avançado naturalizou-se espanhol e foi internacional duas vezes (com um golo).
Bielorrússia (campeonato leva apenas 8 jornadas)