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TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

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No teatro, na televisão, "seja onde for": depois do Globo de Ouro, Rita Rocha Silva quer mostrar que é capaz

O reconhecimento de um grande prémio trouxe-lhe as expectativas que não queria. Agora, a atriz Rita Rocha Silva sabe que a pressão está sempre lá.

Passaram dois anos desde que Rita Rocha Silva vestiu a pele de Leila em Lua Amarela, peça do escocês David Greig encenada pelos Artistas Unidos que lhe valeu o Globo de Ouro de Melhor Atriz de Teatro. Na mesma categoria competiam nomes consagrados da representação nacional: Carla Maciel, Dalila Carmo, Joana Bárcia, Rita Blanco. O ar estupefacto que se exige aos vencedores apoderou-se do rosto da jovem de 28 anos que, de estatueta na mão, em direto em horário nobre, acabaria por dizer: “Isto parece um bocado sonho. Ninguém me conhece muito bem”.

“Não sou uma pessoa de me deixar deslumbrar pelas coisas facilmente. Mas naquele entusiasmo de tantas mensagens, tantas chamadas depois… Se a tua família, os teus amigos, toda a gente, se criam essas expectativas em ti, há um momento em que quase acreditas que vai correr tudo bem. E se a coisa não corre assim tão bem, como não correu logo, ficas um bocadinho… Sem chão.” Sentada num banco de jardim, no meio da azáfama da cidade, Rita Rocha Silva, 30 anos feitos, reflete sobre o prémio com que muitos sonham uma vida inteira.

“Venho de um meio mais pequeno em que [o Globo] é um feito enorme. Não estou a desvalorizar de todo, fico feliz e agradecida por ter tido esse reconhecimento. Mas também sinto que me trouxe alguma pressão. Não tanto de mim própria, mas do que os outros começaram a dizer do que achavam que poderia acontecer a seguir. ‘Agora é que não sei o quê…’ Agora nada, está tudo igual”.

Não choveram trabalhos, não se tornou uma celebridade, não deixou de ter de trabalhar em bares para pagar as contas. Depois do Globo, “a vida continuou.” Desde então, a atriz têm-se mantido discreta, mas com participações consistentes em projetos que a estimulem. Como é o caso de Se te portares bem, vamos ao McDonald’s!, peça de Mário Coelho, em cena no Teatro Ibérico, em Lisboa, desde sexta-feira até este domingo. Trata-se de uma reposição de um espetáculo que, em 2022, esteve esgotado em todas as récitas no Teatro do Bairro Alto. Rita é a protagonista, uma jovem que trabalha numa empresa que disponibiliza pessoas que se fazem passar por outras. Coube-lhe o serviço de ir substituir uma criança que morreu, convivendo com a família em luto. “É dos espetáculos mais desafiantes que já fiz. É uma viagem de duas horas em que passo por muitas emoções. É um processo muito intenso, há um desgaste físico e mental muito grande, mas é um sítio que eu adoro trabalhar”. No palco sente-se realmente “livre”, diz, e é um porto “seguro” o que encontra ao trabalhar ao lado de Mário Coelho, autor e encenador do espetáculo com quem partilha amizade.

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Rita Rocha Silva tem 30 anos. Cresceu em Oliveira de Azeméis, é a mais velha de quatro irmãos e a única rapariga

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Criada em Oliveira de Azeméis, a irmã mais velha de quatro irmãos e a única rapariga, Rita Rocha Silva aprendeu cedo a importância de escutar o seu corpo, fruto de uma consciência corporal que conquistou ao dançar desde tenra idade. “Ouço muito a minha intuição. O corpo é muito inteligente”. É esse escutar do corpo que a leva a dizer “alguns nãos” — não muitos, ou não fosse o trabalho de ator tantas vezes acumulado com outros para contrariar a precariedade que impera no setor. “É comum a quase todos os artistas, teres de trabalhar noutra coisa qualquer para sobreviver”.

Ainda assim, descreve o seu percurso até aqui como “feliz e privilegiado”. No teatro, trabalhou com encenadores como Maria João Luís, Pedro Carraca, Jorge Silva Melo e Tónan Quito. No cinema, soma créditos em filmes de diferentes estéticas e gerações, desde Verão Danado (2014), de Pedro Cabeleira, a Ordem Moral (2020), de Mário Barroso. No pequeno ecrã, pudemos vê-la na série da RTP Erro 404 (2024), ou no streaming, na estreia portuguesa na Netflix, Glória (2021). Nem a participação em outros formatos tem faltado, como foi o caso da websérie do humorista Guilherme Geirinhas, Vai Ficar Tudo Bem (2020). “Tenho tido bastante sorte nas coisas que me aparecem”, assume.

Nos últimos meses, já conseguiu largar o segundo trabalho noturno e dedicar-se por inteiro à representação. “Adoro trabalhar, é o sítio onde acho que sou mais feliz e mais livre. É no trabalho e em cima de um palco que posso… Não é ser totalmente quem eu sou, porque isso não é real, mas é um sítio de liberdade gigante”. Foi à conquista dela que com 18 anos veio para Lisboa, depois de uma professora ter visto na “miúda muito reservada” um potencial teatral, e um outro lhe ter mostrado os grandes textos. “De repente comecei a estar mais em contacto com as minhas emoções, a perceber melhor como é que era com os outros, quem é que eu era enquanto pessoa e consequentemente como atriz. Pensei: tenho aqui muita emoção para trabalhar, muito universo que não conheço. O teatro trouxe-me isso.”

“Se Te Portares Bem, Vamos ao McDonald’s”, peça de Mário Coelho, que em 2021 recebeu o Prémio Revelação AGEAS/ TNDMII, e esteve agora em cena no Teatro Ibérico, em Lisboa

Ana Viotti

Experimentou o teatro físico, a dança-teatro, “um sítio de exploração que viesse das entranhas, do abismo”, mas tem-se voltado cada vez mais para o teatro, o cinema. “Sinto que estou sempre à procura da novidade. O meu objetivo e o objetivo de toda a gente é não serem rotulados de ou ator de teatro ou ator de cinema ou ator de televisão. Seja onde for. É bom bebermos de tudo um pouco, até porque são precisas ferramentas muito diferentes para fazer cada uma delas. Tenho feito bastante mais teatro, mas queria fazer cada vez mais audiovisual porque é um sítio que me fascina muito. Essa coisa da contenção, de fazer mais pequeno, mais realista, há uma sensibilidade diferente”.

A atriz durante a peça "Lua Amarela", de David Greig, a partir de uma tradução de Pedro Marques. A encenação de Pedro Carraca estreou-se no Teatro da Politécnica, em Lisboa, em novembro de 2021

Jorge Gonçalves

Por estes dias, está a filmar Finisterra, serie de Guilherme Branquinho e Leone Niel, produzida pela Take it Easy e que será exibida na RTP. Começou por fazer um casting para protagonista. “Tinha 18 anos, era nova demais e aquilo também não me correu muito bem”, admite. Não ficou com o papel, mas voltaram a chamá-la para um outro. “Em audições para audiovisual é raro ficar. Meto uma pressão qualquer sobre mim. Nunca está bom. Se for self-tapes então, faço 20, 25 takes, é muito ingrato. Não temos direção, tens de ser tu a tomar decisões e não sabes se a direção que estás a tomar é a que eles procuram.”

Por isso prefere os castings presenciais, com pessoas de carne e osso, e retorno imediato. “É engraçado, [o casting para a Finisterra] foi numa fase em que eu estava a levar tantos ‘nãos’, e esse também inclusivamente, que quando me chamaram a segunda vez, fui em modo ‘não quero saber, fuck it, vou, vou tentar fazer o melhor que conseguir e não quero saber’. Isso trouxe-me uma liberdade tão grande que quando cheguei lá fiz e fiquei logo.”

Atingir esse sítio de desprendimento e julgamento pessoal ainda é um desafio. “Chega a ser frustrante. É um meio muito pequeno, mas com muita gente. Há imensas atrizes, com ótimas qualidades, super talentosas, todas muito diferentes. É difícil. Agora, não podemos deixar de lutar. Às vezes parece que temos que ir a um sítio de desgaste tão grande para nos voltarmos a reerguer. Eu sei que gosto de ir a esse sítio, mas às vezes não é super positivo.”

A atriz mudou-se para Lisboa quando tinha 18 anos para estudar na Escola Superior de Teatro e Cinema, guiada pela vontade de sair de casa, descobrir o mundo e descobrir-se pelo caminho

TOMÁS SILVA/OBSERVADOR

Ajudou-a a terapia, ficar em casa, escrever. “Aprendi na terapia a escrever, a expor as minhas emoções, a escrever e a olhar para elas. Somos todos humanos e todos falhamos e todos somos imperfeitos. E estamos aqui todos sempre para aprender”, diz, em jeito de mantra. Perguntamos-lhe se tanta autocrítica a impede de celebrar um trabalho bem-feito ou se a busca por perfeição é de tal ordem que não há espaço para um reconhecimento de valor próprio. Concede e cita Erro 404, série de Patrícia Sequeira, também da estação pública. “Sinto que tanto na self-tape como depois no dia em que eu fui gravar, tive uma liberdade tão grande que me deixei simplesmente ir naquilo. E ela [Patrícia] também me deu tanto esse espaço de confiança e à vontade, que sinto que fiquei mesmo feliz com o resultado final.”

Sem nunca de deslumbrar, repete, lembrando as palavras do pai quando decidiu ir de malas e bagagens para a inebriante capital. “É uma profissão muito difícil, é um meio muito difícil, tem cuidado, tens que ser forte e sempre com os pés no chão. E depois do Globo disse-me a mesma coisa: ‘continua com os pés no chão’.”

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