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FÁBIO PINTO / OBSERVADOR

FÁBIO PINTO / OBSERVADOR

O voo de Passos para a oposição. "Se o PSD quer outro líder, está à vontade"

Passos foi a casa, a Trás-os-Montes, explicar aos militantes do PSD o que está a fazer. Não vai mudar. "Tenho confiança e não tenho medo", diz ao Observador na avioneta para Lisboa.

Pedro Passos Coelho para de falar, aperta o nariz com os dois dedos, e faz força para desobstruir os ouvidos. “É preciso ir fazendo a descompressão”, diz. Mas não, não se trata da descompressão da vida política. Estamos sentados numa avioneta, um bimotor que faz a viagem para Lisboa a partir de Vila Real — terra do líder do PSD. Não é agradável a sensação que fica nos ouvidos com a pressão, mas Passos Coelho continua, descontraído, a conversa com o Observador. “Não tenho falta de confiança nem tenho medo. Não estou agarrado ao meu lugar. Se o PSD achar que há outro líder melhor do que eu, façam favor, eu não fico zangado”. Soa a desprendimento — embora também isso seja uma forma de exercer o poder –, que sobressai quase tanto quanto a voz de barítono perante o barulho contínuo e irritante que sai do pequeno avião de 19 lugares.

A questão de que se falava era sobre um possível mau resultado nas autárquicas de 2017. Até lá ainda falta muito tempo, mas o líder do PSD sabe que as eleições locais são o momento alto das estruturas partidárias e o tema vai correndo nas bases como se a ida às urnas fosse já amanhã. Assume desde já que não vai sentir-se derrotado se perder, e que não vê razões para se ir embora se não correr bem. “Fazer pior do que em 2013 em termos de score é muito difícil”, deixa escapar, lembrando as 106 câmaras (20 das quais em coligação com CDS) que os sociais-democratas tiveram nas autárquicas de há três anos, contra as 150 socialistas. É tudo, de resto, uma questão de perceção, e sobretudo de gestão de expectativas. Ao contrário do que viria o Presidente da República a dizer um dia depois desta aeronave ter aterrado em Tires, Passos acredita que só houve gente a cair por causa das autárquicas, não por causa da derrota no sentido direto do termo, mas porque acharam que “já não conseguiam ganhar as eleições”. As legislativas, claro. “Sentiram-se derrotados”.

Não vai ser o seu caso, garante. Já Marcelo Rebelo de Sousa dizia esta quarta-feira ao Observador que “quer Pedro Passos Coelho quer António Costa são duros e resistentes”, e que não é pelas autárquicas que caem. Pelo menos nisto os dois parecem concordar. Passos Coelho continua a sorrir conversa fora. Foi assim, de resto, nos dois dias em que esteve no terreno, pela região de Trás-os-Montes em clima de quase campanha. Diz-se na comitiva que o presidente anda “bem-disposto”. É ele que assobia para chamar um cão rafeiro que passa entre pilhas de troncos de madeira, numa empresa em Chaves, e que se baixa para o acarinhar. É ele que puxa o Benfica à conversa para convencer os militantes do PSD que não é só nos anos em que se é campeão que se veste a camisola. Seja ela vermelha ou cor de laranja. Já lá vai o tempo em que a equipa que acompanha o líder social-democrata, por motivos da austeridade ou da queda sinuosa do Governo, tinha ordens tácitas para não filmar ou fotografar o presidente do partido a rir.

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DR. João Pedro Domingos

São 7h20 da manhã de terça-feira, dia 24 de maio. Pedro Passos Coelho dormiu na casa dos pais, em Vila Real, depois de um dia inteiro com o pé na estrada, a saltitar entre vários concelhos dos distritos de Bragança e Vila Real. Chamou-lhe “jornada de valorização do território” e serviu para mostrar, in loco, as propostas que o PSD tem para combater os problemas dos territórios de baixa densidade — que acabaram quase todas chumbadas no Parlamento durante a discussão do Programa Nacional de Reformas do Governo.

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Não tinha dormido muito. O dia anterior tinha sido preenchido: uma visita a uma estação de tratamento de águas numa aldeia de Bragança, uma reunião com a reitoria da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, um encontro com pequenos empresários do setor agrícola num auditório de Valpaços — onde ouviu problemas da terra e pedidos de soluções. Fez ainda uma visita a uma empresa de madeiras para produção de biocombustível, e, já ao raiar da noite, teve uma reunião com militantes de todo o distrito em Vila Pouca de Aguiar, onde se viu forçado a explicar qual é afinal sua estratégia para este novo ciclo na oposição. Com isto, eram 3h da manhã quando se deitou. E às 7h já estava a caminho do aeródromo.

Passos Coelho remexe nos bolsos à procura de moedas para tirar café de uma máquina, enquanto espera que a avioneta que saiu de Bragança há minutos aterre em Vila Real para apanhar os seis passageiros que estão no aeródromo. Por azar o café sai com açúcar. Um golo e… blhac. “Quando uma pessoa se habitua, depois é difícil”. O líder do PSD gosta do travo amargo do café.

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Com o pin da bandeira de Portugal teimosamente na lapela, Passos Coelho tem ouvido a crítica de que ainda não despiu o fato de primeiro-ministro. Depois de ter perdido as eleições, mesmo tendo sido a força política mais votada, o líder do PSD, conhecido pela frieza e teimosia, apagou-se do espaço político, optou por não ser presença forte nos debates no Parlamento e depressa soaram as campainhas sobre a inação do agora maior partido da oposição. Recentemente, a propósito da festa de aniversário do PSD, o jornal Público escreveu que parte da direção do partido e dos líderes distritais tinham faltado à cerimónia, sinal de que Passos estava isolado. Em simultâneo, a ala mais conservadora não gostou de ver o líder votar ao lado do BE na questão das barrigas de aluguer.

Mas Passos Coelho não se importa com as críticas. Ri-se delas. Não só nega o isolamento como nega o facto de estar preso ao passado. “Se eu não conseguisse representar um novo começo não tinha ganho as eleições; as pessoas tinham dito ‘ok, este já está, agora precisamos de uma coisa nova'”, afirma a bordo do avião com o Observador, acreditando piamente que esse trunfo na manga não se vai esgotar tão cedo. Além disso, diz, o pin que traz ao peito não é necessariamente um pin de primeiro-ministro, ainda que só o tenha começado a usar depois de ser eleito: “Foi um símbolo que coloquei numa altura em que era preciso dar às pessoas um amor-próprio muito grande, e essa necessidade não desapareceu pelo facto de ter deixado de ser primeiro-ministro”.

É que o líder do PSD não só diz que não se sente derrotado por não ter conseguido formar Governo, como sente uma espécie de superioridade — prefere chamar-lhe “confiança”, ou “uma vantagem muito grande” — pela bagagem que leva às costas. “Hoje sei avaliar muito melhor a maneira como se decide no Governo, ou como não se decide”. Já conhece as manhas, quer dizer. Participa regularmente nas reuniões do PPE, grupo parlamentar em que PSD e CDS estão integrados na Europa, e acompanha os processos com um conhecimento que antes, quando fazia oposição a José Sócrates, não tinha. “Hoje consigo perceber logo o que estão ou não estão a fazer [no Governo]”. E isso, acredita, permite-lhe antecipar algumas jogadas.

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Ainda assim, este é um dia de estreias para o ex-primeiro-ministro. Apesar de ser transmontano, nunca tinha andado na nova rota do AeroVip, que, ao fim de vários anos parado, em maio de 2015 ganhou o concurso público para operar com ajuda de fundos comunitários mas só conseguiu entrar em funções a 22 de dezembro, já com o novo Governo socialista em funções. Na véspera, quando jantava descontraidamente com a equipa que o acompanhava em Vila Pouca de Aguiar, até comentava o batismo de voo que se preparava para fazer:

“Amanhã vou inaugurar…”

Pausa. E risos à volta da mesa, Passos incluído. Desta vez era apenas uma “inauguração pessoal”, uma “estreia”, retificou de imediato. Má escolha de vocabulário.

É que quem o ouviu lembrou-se automaticamente do famoso episódio em que, a propósito da inauguração do Túnel do Marão, Passos recusou o convite do atual primeiro-ministro para estar presente na inauguração da obra, argumentando que nunca tinha inaugurado obras desse género. A comunicação social e a redes sociais não perdoaram. Agora ei-lo em mais uma “inauguração”.

1300 km para marcar (o)posição

O dia de Passos Coelho começa cedo, embora não tão cedo como antes. Se quando era primeiro-ministro entre as 8h00 e as 8h30 já estava a trabalhar, agora o despertador dá-se ao luxo de atrasar uma hora. Às 9h00, Passos Coelho toma o pequeno-almoço num hotel em Bragança, e aproveita para conversar com alguns jornalistas da imprensa regional. Às 10h, está a subir a Serra de Montesinho, por entre caminhos quase vertiginosos, para visitar a Estação de Tratamento de Águas. Ao seu lado vai Jorge Moreira da Silva, o ex-ministro do Ambiente que conduziu a reforma da fusão das águas. Ambos sabem que ali — onde os preços foram reduzidos — são reis. E Moreira da Silva, que no jantar da véspera, em Mirandela, já tinha recebido elogios de dirigentes locais por ter tido a “coragem” de iniciar a discriminação positiva do interior, vai pronto para brilhar.

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“A reversão deste processo de reforma tornará mais difícil que a empresa Águas de Portugal tenha a devida sustentabilidade financeira. Não apenas pelo passado mas sobretudo para futuro, há uma escala de novos investimentos que ganharia em ser avaliada de acordo com a consolidação que estava em curso e que agora vai ser interrompida”, vai dizendo Passos Coelho durante a visita. Ao seu lado, os deputados e dirigentes locais que o acompanham reforçam a ideia: “A reforma das águas demorou muito tempo a preparar, só começou a funcionar em 2015 e agora o governo está a andar para trás, o que só vai fazer crescer o défice tarifário”.

O objetivo é mesmo esse. E foi transversal a toda a visita a Trás-os-Montes no âmbito da valorização do território: mostrar que o Governo socialista está a “desaproveitar” oportunidades “boas” que estavam a ser postas em prática no Governo anterior. Foi o que aconteceu também na UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), onde o ex-primeiro-ministro se reuniu com o reitor e o conselho diretivo para saber qual estava a ser o acompanhamento feito pelo atual Governo ao projeto do centro de excelência que estava a ser desenvolvido na Universidade, na sequência da candidatura a fundos comunitários. “A última vez que ouvi o ministro [Manuel] Heitor falar deste projeto foi para mostrar desinteresse, e se o Governo não tiver interesse nisto é muito fácil encontrar outros destinatários para aqueles fundos europeus, que são sempre apetecíveis…”, dizia Passos ao reitor, ao mesmo tempo que sublinhava que os centros de excelência que tinham sido pensados para a Universidade da Beira Interior e para a de Évora, estavam parados.

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E era preciso fazer estes quilómetros todos para passar essa mensagem? É assim que Passos tenciona responder às críticas do partido de que se está a “fazer de morto” e não está a fazer uma oposição suficientemente aguerrida? “Isto não é uma resposta ao partido, é ao país”, teima-se a dizer entre a comitiva. Mas as críticas do partido são audíveis, sobretudo entre as bases, por natureza mais impacientes. E Passos sabe que tem de lhes explicar o que está a fazer (ou a não fazer). É para isso que reserva as últimas horas do dia

Um por um, os militantes de Vila Pouca que se reuniram no auditório levantam-se para questionar, ou mesmo criticar, o líder do partido:

“Quem tem sentido de Estado não pode permitir que esta ‘geringonça’ dure quatro anos. Se no dia-a-dia não reagirmos com violência são os nossos filhos que não nos vão perdoar”, atirava um dos primeiros militantes que se levantou para intervir, mostrando desacordo com o “ritmo” de Passos. Ou melhor, a falta de pressa.

“A imagem que queremos dar do nosso partido nas próximas eleições é a imagem da austeridade?”, perguntava outra militante, que lamentava a perda de simpatia que o PSD estava a ter. Certo é que as sondagens mais recentes dão conta disso mesmo, de um decréscimo nas intenções de voto no PSD e da fraca popularidade do líder do partido. Outro militante pedia ainda a palavra para se queixar da redução de freguesias feita pelo Governo de Passos e Portas.

Eram algumas centenas os que tinham decidido perder horas de sono para ouvirem e questionarem o presidente do partido em Vila Pouca de Aguiar. Cansado mas forçosamente bem-disposto, Passos Coelho queria agradar e respondia a todos, tratando-os pelo nome. “Se quero que os militantes percebam o que estou a fazer tenho de lhes explicar, essa sempre foi a minha maneira de fazer política”, dizia mais tarde ao Observador, reconhecendo que essa é a “única atitude inteligente a tomar” neste momento. “Podia responder com slogans, podia, mas isso só satisfaz as pessoas na hora, não lhes dá entendimento sobre aquilo que se está a fazer”.

Então explicava. Lembrava que não tinha tido gosto em executar uma política de austeridade, mas que para o “PSD não ser o partido da austeridade é preciso que os outros não sejam os partidos do esbanjamento”. E ao primeiro militante que o tinha questionado dizia que é preciso ter “paciência” porque a única maneira de “correr com o Governo” é pela via democrática. E ninguém no PSD quer eleições já. Primeiro, é preciso deixar o Governo governar, “cumprir com aquilo que prometeu”, e quando surgirem problemas, terá de ser o Governo, com os parceiros parlamentares, a resolver. Então depois é que se poderá “avaliar”. É nessa avaliação, nesse “juízo democrático”, que Passos pede que confiem.

"Se não acreditarmos no juízo que as pessoas farão, como havemos de acreditar na democracia?"
Pedro Passos Coelho

Se no PSD antes se ouvia dizer que o Governo não durava nem dois meses, agora sabe-se que não é o PCP, o BE ou o PEV que farão cair António Costa. “Eles precisam todos uns dos outros e só o medo de nós voltarmos para lá faz com que se mantenham unidos”, ia dizendo Passos Coelho. Nem será por via de Bruxelas que a “geringonça” perde os parafusos, porque quando não bastar dizer que sim, que se cumpre, e a “conversa endurecer”, o Governo “terá de adotar um Orçamento que já contenha medidas adicionais”. E adopta. As medidas não serão cortes de salários, porque sem troika já não é preciso ir tão longe, mas serão aumentos de impostos, por mais indiretos que sejam, acredita o ex-primeiro-ministro. E os partidos da esquerda aprovam? Passos não tem dúvidas de que sim.

Por isso, para o líder do PSD, o ponto de fuga é mesmo só um: a economia. “A economia não é uma ciência exata, mas também não é uma batata. Vai ser por aqui que cai [o Governo]”, dizia aos militantes ávidos de explicações. Os números, já os tinha dito na véspera e voltado a sublinhar depois, recorrendo a dados do INE: 48 mil postos de trabalho destruídos no último trimestre e cerca de 60 mil nos últimos seis meses, com agravamento da população inativa. E “mesmo que a economia nos próximos trimestres crescesse a um ritmo cinco vezes superior ao dos últimos três meses, ainda assim não cresceria mais de 1,2%, contra os 1,8% que o Governo prevê”, diria Passos mais tarde, por aqueles dias.

Diante das bases partidárias da sua região, explicava ainda uma das perplexidades que esta fase da sua liderança tem gerado. “Ninguém ganha eleições a fazer barulho”. E é por isso que Passos Coelho não faz questão de marcar presença em todos os debates quinzenais no Parlamento, onde o confronto com o primeiro-ministro, diz, é mais barulho do que conteúdo. Mais tarde, no avião de regresso a Lisboa, Passos viria a lembrar-se de António José Seguro e de como não lhe quer seguir as pisadas enquanto líder da oposição: “[Seguro] teve medo de ser corrido e por isso foi fazendo a vontade às tribos todas, mas correram com ele na mesma. Quem ande a gerir as tribos com medo de ser corrido não sabe o que há de fazer se algum dia ganhar”.

Duas formas de pronunciar a palavra “política”

Há duas formas de pronunciar a palavra política. E a palavra políticos. A primeira é assim como acabou de ler, política. A segunda é enchendo as bochechas de ar para juntar o “p” e o “o” e deitá-los para fora: “Política!”.

“Quem sabe de política acha que deve enganar, manipular, esconder. E eu estou farto desses grandes políticos”.

Foi assim, pronunciando os ‘p’ da segunda maneira, que Passos terminou a intervenção que fez em Vila Pouca de Aguiar, perante a plateia de militantes mais ou menos insatisfeitos. E é assim que se pretende distinguir dos outros, nomeadamente do atual primeiro-ministro, que tem reconhecidas “habilidades” políticas.

Não é demais lembrar que, em Vila Real, Passos Coelho joga em casa, e que também por isso a audiência aguentou-se até muito depois da meia-noite. No final, o vice-presidente da concelhia resumia aquela que parecia ser a perceção da sala: “Agora vamos muito mais animados e esclarecidos para casa”. Mais: “Vamos dormir melhor e amanhã estaremos mais dispostos para o combate”. A sala aplaudiu de pé.

"Felizmente sou do Benfica, que foi campeão este ano e no ano passado e no anterior. Mas houve muitos anos em que não foi, e não deixei de torcer por ele na mesma"
Pedro Passos Coelho

A estratégia parece funcionar. Fala-se ao ouvido dos militantes, explica-se trocando por miúdos, usa-se analogias com o Benfica e o Sporting se for preciso para animar a plateia, e arrancam-se aplausos. “Felizmente sou do Benfica, que foi campeão este ano e no ano passado e no anterior. Mas houve muitos anos em que não foi, e não deixei de torcer por ele na mesma. Não mudamos o discurso nem aquilo em que acreditamos por conveniência, estamos aqui para as horas boas e para as horas más”, disse em Vila Pouca. E os benfiquistas laranjas aplaudiram. Voilà.

Certo é que o líder social-democrata sabe que não vai poder ir a todo o país fazer o mesmo. Então como é que se responde à agitação interna, ainda por cima em clima de autárquicas? “Com paciência”, responde mais tarde, durante a conversa com o Observador. É que, daqui a dois anos, Passos terá de ser reeleito líder do partido caso queira mesmo concorrer a primeiro-ministro. Mas isso “logo se vê”. Não lhe peçam é que mude: “Não aceito é ser demagógico e irresponsável, se um dia o PSD quiser um presidente do partido assim, eu não levo nada a mal”, tinha dito aos militantes. É essa a sua visão de “levar Portugal a sério”, como dizem agora todos os cartazes do partido.

Três vezes em oito minutos de telejornal

Parece ser este o voo de Passos, de primeiro-ministro para a oposição. Não um voo em altitude, mas em comprimento. No final da jornada por Bragança e Vila Real, enquanto jantava com a equipa mais restrita depois de um dia no terreno, os assessores lançavam olhares mais ou menos atentos aos telejornais. Às 20h08, ou seja, em oito minutos de notícias, o líder do PSD já tinha aparecido três vezes na televisão.

Com uma preocupação pouco habitual em gerir o espaço mediático, Passos tentava dosear as respostas às perguntas dos jornalistas que acompanhavam as visitas e que o queriam pôr a falar mais dos assuntos da atualidade do que das propostas para a valorização dos territórios de baixa densidade. Primeiro foi a reação à “incoerência do Governo” sobre a reposição das 35 horas de trabalho na função pública, depois foi a acusação de “falta de estudo” do Governo em torno dos contratos de associação com os colégios privados. Mais tarde, já em Chaves, reagiu ao despedimento coletivo dos trabalhadores do porto de Lisboa. Antes já tinha chamado a atenção para os números da “destruição de emprego” que estava a ser feita nos últimos seis meses. E assim se aparece três vezes em oito minutos no horário nobre de um canal generalista — a fazer “oposição”.

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Este é, contudo, apenas o lado visível, que faz parte das regras do jogo. Mas não é só esse jogo que o líder do PSD quer jogar. “Não vou andar sempre com o pé na estrada”, diz ao Observador.

É que de Bragança a Lisboa podem já não ser nove horas de distância — como cantavam os Xutos –, e Pedro Passos Coelho até tem um avião (e um túnel) para lá ir mais amiúde. Mas apesar de dizer que a política de proximidade é uma parte importante, o presidente do PSD tem outros planos para fazer aquilo que lhe exigem, que é “fazer oposição”: organizar as tropas, pôr a andar gabinetes de estudos, angariar gente para a equipa, ouvir personalidades várias, estudar dossiês. E ir “denunciando e responsabilizando” o Governo pelos seus atos.

Na equipa do ex-primeiro-ministro tem-se noção da dimensão do desafio e das dificuldades. Mas há algumas certezas: primeiro, que “o tempo em política é tudo”, depois, que não há oposição interna. “Olha-se para um lado, olha-se para o outro, olha-se para baixo da mesa, e não há ninguém que se possa buscar para dizer ‘tu és o próximo'”, ouve o Observador de um dirigente social-democrata. Por enquanto a passadeira laranja ainda está estendida. E Passos é o primeiro a acreditar que vai continuar a estar por mais tempo. Mais difícil será voltar ao Governo. “Não sei se vou conseguir, mas sei que vale a pena tentar. E se conseguir, sei que vai ser um desafio muito maior do que o que tive em 2011”, diz-nos. “É sempre mais difícil da próxima vez”.

"O meu objetivo não é pôr no CV que sou primeiro-ministro, já fui. O que me interessa é saber se tenho condições e força para fazer o que acho que é preciso. Tenho 52 anos, se naquilo que é importante não puder fazer o que acho que é preciso então não estou lá a fazer nada. Vou fazer outras coisas".
Pedro Passos Coelho

Para já, depois de um período de maior resguardo e afastamento do combate direto, a ida do presidente do maior partido da oposição para o terreno, justamente na semana em que o Governo assinala seis meses de mandato, terá sido quanto bastou para o líder do PSD dar o pontapé de saída para aquilo que começou a a ser visto como um novo fôlego na oposição.

A estratégia prosseguiu já depois de aterrar na capital. Esta quarta-feira, o PSD chamou a comunicação social à sede do partido para uma conferência de imprensa. Não foi dito aos jornalistas qual era o tema da conferência, mas viria a ser para analisar os seis meses de Governo do PS com a “sua base de apoio radical”. Em pose de líder da oposição, Passos criticou a “estratégia económica errada” do Governo, que estará a conduzir o país para o “declínio”. Disse que “os resultados negativos não permitem ilusões”. E argumentou que não adianta criticarem o seu pessimismo porque os dados são “objetivos”. Da sua parte limita-se apenas a ser um “irritante realista”.

Não vale a pena. Pedro Passos Coelho não vai mudar. E não quer mudar. Esse, acredita, é precisamente o seu maior trunfo para voltar ao Governo.

Ao partido e aos eleitores limita-se a pedir que creiam e que tenham paciência. O que não é sinónimo de esperar de braços cruzados. Chama-lhe “resiliência” e diz que a melhor forma de responder aos críticos é “com paciência”. “A melhor maneira é ter a resiliência suficiente para dizer às pessoas qual é o caminho que deve ser seguido; transmitir essa confiança e, depois, esperar que as pessoas estejam disponíveis para fazer esse caminho. Se estiverem, acredito que serão recompensadas, se não estiverem estão no seu direito de escolher outro”, remata ao Observador, a poucos minutos de as rodas do AeroVip baterem com estrondo na pista. Em Tires, Cascais. Fim de viagem.

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