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Sapatos vindos da rua, não. Pais? Só à porta. Máscaras em todos os funcionários, quer contactem diretamente com as crianças, quer não. Estas são algumas das regras que irão ser aplicadas na maioria das creches, que reabrem portas esta segunda-feira, com autorização do Governo. E vai ser assim também no Jardim-Escola João de Deus, em Belas (Sintra), e no Novo Colégio Chupetão, junto à Circunvalação (Porto), que o Observador visitou para perceber como se está a preparar o regresso nos bastidores.
As creches reabrem oficialmente as portas, mas isso não significa que todas as crianças que estavam inscritas regressem já. Nos dois locais visitados pelo Observador, menos de metade dos pais avisaram que iriam levar os filhos na próxima segunda-feira. De qualquer forma, os responsáveis garantem que abririam as portas à mesma para receber “nem que fosse só uma criança”.
O principal foco está na desinfeção e limpeza. Desde um produto que custa milhares de euros até à limpeza redobrada de talheres e copos, tudo parece estar a ser pensado ao pormenor. Há lugares marcados e com distância entre as crianças, quer nas salas, quer nos refeitórios, quer até nos catres onde se dorme a sesta — mas educadoras e diretores são unânimes em dizer que será “muito difícil” manter as crianças afastadas umas das outras. António Ponce de Carvalho, diretor-geral do grupo João de Deus, diz até que seria “criminoso” negar colo a uma criança para respeitar a 100% o distanciamento social.
“Vai ser duro”, como “o início de um ano novo letivo”, admite Maria do Céu Teixeira, responsável da creche Novo Chupetão. Ainda para mais porque será um grupo de adultos de máscara — com bonecos e desenhos, mas que tapam parte do rosto à mesma — a receber estas crianças, que estão há dois meses em casa, em contacto apenas com a família mais próxima. Mas, para além do trabalho a dobrar na limpeza e desinfeção, aqueles que trabalham nas creches garantem que estão prontos para receber e ambientar os mais pequenos com toda a alegria e disponibilidade.
Em 50 crianças, só 8 regressam à creche João de Deus em Belas
“A primeira coisa a fazer é tratar dos sapatos”. É assim que António Ponce de Carvalho, o diretor dos colégios João de Deus, recebe o Observador na pequena antecâmara atapetada onde todas as crianças irão, a partir desta segunda-feira, tirar os sapatos com que vêm da rua e depositá-los numa saca branca, onde se pode ler “Calçado externo”. Depois, e de acordo com as instruções que os pais já receberam, irão calçar outro par de sapatos, mais confortáveis, vindos de casa. O bibe também virá, mas só voltará a sair da creche na sexta-feira, para ser lavado durante o fim-de-semana, em casa.
Por fim, será altura do abraço de despedida e de dizer olá à educadora, que ali os espera, de máscara no rosto. “A partir daqui, não passa ninguém estranho ao jardim-escola”, assegura o diretor, com a cara coberta por uma máscara azul-clara, com o logotipo do grupo João de Deus — uma das cerca de 5 mil que foram encomendadas por esta IPSS.
Para já, serão apenas oito crianças a serem aqui recebidas na próxima segunda-feira. O enorme jardim-escola João de Deus, localizado no Belas Clube Campo, tem capacidade para mais de 500, mas o facto de só ter aberto em janeiro deste ano atrasou as inscrições. Por enquanto, há cerca de 50 crianças inscritas neste jardim-escola, que recebe desde bebés com menos de um ano até alunos do 2.º ciclo. Para já, e de acordo com as instruções do Governo, apenas a creche e o ensino pré-escolar irão estar a funcionar plenamente.
Ponce de Carvalho, contudo, prevê que no início de junho já mais pais estarão suficientemente tranquilos para trazerem os seus filhos para a creche e para o pré-escolar: “Estou convencido de que os pais depois vão ver como estamos a tratar de tudo e começarão a vir mais”. Neste jardim-escola, à semelhança dos restantes do grupo João de Deus, o funcionamento é o de uma IPSS, onde os pais pagam de acordo com os seus rendimentos. Mas, independentemente da questão das mensalidades, o diretor-geral do grupo aponta os casos em que os mais pequenos têm irmãos mais velhos, que já não irão mais à escola este ano. “Quando se tem um em casa não faz sentido o outro depois andar a sair. Nesse caso, muitos pais optarão por ficar com os dois ou mais filhos em casa.”
Já dentro das instalações, o cheiro a desinfetante paira no ar. Esta sexta-feira foi dia de uma empresa especializada aplicar o produto Zoono, o desinfetante norte-americano que já se tornou famoso por garantir que elimina o novo coronavírus e mantém uma placa protetora nas superfícies durante um mês — e que foi aplicado nos transportes públicos quase todos em Lisboa e no Porto. “Só nisto gastámos 40 mil euros”, revela o diretor, que explica desde o início que a grande aposta do grupo está a ser feita na limpeza e desinfeção. No chão ainda é possível ver uma espécie de manto de água — o produto que esteve a ser aplicado nesta primeira sala por um funcionário, completamente coberto por equipamento de proteção, ainda não secou.
Para além do álcool-gel em vários locais, há também um acrílico na mesa da sala da presidente do conselho diretivo, Sandra Ramalinho, para a separar de algum pai que se tenha de reunir consigo ali. No edifício, com mais de sete mil metros quadrados, todos os tapetes e carpetes foram retirados e as cadeiras com tecido foram embrulhadas em película aderente, por recomendação de uma empresa privada que o grupo consultou.
Daqui para a frente, haverá limpeza a fundo de manhã e ao final do dia e, pelo meio, mãos lavadas várias vezes e superfícies limpas novamente. A sala de isolamento, onde qualquer criança com sintomas ficará (acompanhada de um auxiliar), já existia — numa escola construída de raiz e terminada já em 2020, essa é uma contingência que já estava planeada ainda antes do surgimento da Covid-19. Ali, em cima da mesa, estão as bolachas Maria e as garrafas de água sugeridas pela Direção-Geral de Saúde.
“As escolas sempre tiveram vírus, não é?”, comenta António Ponce de Carvalho. “Ora são viroses, ora são gastrites, umas febres… Aquilo que é sobretudo diferente é o facto de agora estarmos todos de máscara — e este sistema de desinfeção a fundo que aplicámos”.
“A história do coelhinho” contada através das máscaras
As máscaras serão, sem dúvida, a diferença mais notória no dia-a-dia das crianças que aqui chegarem, a esta creche em Belas, na segunda-feira. “Nós já os estamos a tentar habituar”, explica ao Observador a presidente do conselho diretivo Sandra Ramalhinho. “À segunda-feira normalmente os pais vêm cá entregar as atividades que nós enviámos na semana anterior para eles fazerem. E eles já começaram a vir com os pais e a ver-nos à distância. Nós começámos já a usar máscara, para eles se irem habituando”, conta.
O primeiro impacto, contudo, impressionou alguns. Uma das meninas não reconheceu a educadora. “A mãe dizia-lhe ‘É ela!’ e ela só repetia ‘Não, não é’”, conta Sandra. Agora, poucas semanas depois e com a memória já ultrapassada, sente que já é possível rir-se ao contar a história.
“A capacidade de adaptação das crianças é incrível”, comenta Ponce de Carvalho. “Estive há seis meses em Xangai, a convite da própria China. E as crianças ali vão todas de máscara para a escola. E estão habituadas, faz parte da rotina delas”, afirma, confiante de que será uma questão de tempo até todos se adaptarem.
Apesar disso, o jardim-escola tentou minimizar o impacto. “As educadoras não vão ter uma máscara qualquer. Fizemos máscaras específicas para elas que contarão ‘A história do coelhinho’”, acrescenta Sandra. São várias máscaras com o desenho de um coelho, algumas com ele à esquerda, outras ao centro, em diferentes posições. A ideia é as próprias educadoras brincarem com isso e criarem uma história em torno da máscara, para que as crianças não a sintam tanto como um objeto estranho. Também no próximo ano letivo haverá viseiras com bonecos desenhados para os alunos do 1º ciclo — mas, para já, aos mais pequenos não se coloca nada na cara, como recomenda a OMS para crianças com menos de 2 anos.
Será o caso de três bebés com menos de um ano, cujos pais já confirmaram que irão ali deixá-los na segunda-feira — embora um deles fique apenas da parte da manhã. O berçário já está preparado para os receber. Três dos oito berços que estão naquela sala têm o nome da criança e o desenho de um animal para cada um dos bebés, a fim de os identificar. É assim em todo o lado: também no pré-escolar as cadeiras estão marcadas com o nome e o desenho de um animal, exclusivo de cada criança. Se um tem um gato, outro tem uma vaca, outro uma girafa e por aí fora. “Se vierem mais crianças, não há problema. Utilizamos a outra sala do berçário”, explica Ponce de Carvalho, apontando para a sala gémea que existe do outro lado de corredor — que é na verdade uma cozinha equipada para se aquecer papas e esterilizar biberões. “Espaço não nos falta, felizmente”.
Mas o dia-a-dia numa creche não foi feito para se adequar a uma pandemia, nem mesmo numa tão espaçosa como esta. Basta olhar para a cadeira onde os bebés mais pequenos se sentam para comer. É um único móvel, com 5 cadeiras que partilham a mesma mesa, impossíveis de separar e afastar. Estão todas do mesmo lado, para que o adulto se possa sentar à frente e ir alimentando os cinco ao mesmo tempo. “Eles adoram. Comem melhor aqui do que em casa”, confessa Sandra Ramalhinho. Normalmente, o facto de interagirem uns com os outros enquanto comem estimula o apetite destes bebés. Desta vez, contudo, só as duas cadeiras das pontas estão identificadas com nome e animal. O distanciamento social assim o obriga.
Com os mais velhos, entre os 1 e os 3 anos, os desafios são outros. Apenas uma sala será utilizada e ali cada um terá a sua própria mesa e cadeira. Cada conjunto com a sua cor: um terá a verde, outro a amarela, outro a azul. Mas a sala está mais “despida” do que o costume, confessam os diretores ao Observador: “Tivemos de retirar todos os brinquedos que não fossem facilmente desinfetados e laváveis, retirar desenhos das paredes…” António Ponce de Carvalho abre a porta da sala ao lado só para mostrar alguns dos tipos de brinquedos que tiveram de ser ali guardados: é o caso dos tapetes de atividades, onde os bebés se costumam deitar de barriga para cima, por serem feitos de tecido.
Na sala principal, apenas ficaram os brinquedos que são de plástico e materiais semelhantes: “E sim, eles vão tocar e vão passar ao colega do lado. É normal. Estas pequenas coisas fazem a diferença no desenvolvimento da criança. A motricidade, o morder, etc…“, explica o diretor. Aquilo que educadores e auxiliares farão, garante, é limpar sempre, assim que algo for utilizado.
Nas casas de banho, repetem-se as regras de distanciamento. Para evitar que usem os lavatórios ao lado uns dos outros, a cada um de intervalo cobriu-se a bacia com película aderente, formando uma espécie de barreira contra a água. Na zona das sanitas, já existiam baias de plástico a separar cada um dos cubículos, embora sem porta. “Por acaso a Segurança Social até embirrava connosco por termos isto, diziam que nesta idade deve ser tudo misturado… Mas nós sempre achámos bem, até para desenvolverem os conceitos da privacidade e tudo o mais. Agora, com a Covid, ajuda”, admite o diretor-geral.
No enorme refeitório, onde em letras gordas amarelas se pode ler “Bom Apetite!” numa das paredes, a rotina é a mesma: as mesas mais baixinhas, onde irão comer os mais pequenos, têm cadeiras amarelas identificadas com o nome de cada um. E comerão com distância uns dos outros, é claro.
Abraços e colo não vão ser proibidos aqui. “Creche é afeto”
O mesmo acontecerá à hora da sesta. Os catres onde cada um dorme ainda estão despidos, mas na segunda-feira serão cobertos com os lençóis trazidos de casa, pelos familiares. Agora, passarão a dormir um com a cabeça para um dos lados e o outro com a os pés para esse mesmo lado, de forma a não terem as cabeças próximas. “Tirando isso, as rotinas mantêm-se. Foi só mais uma questão de separar os catres uns dos outros, de os distanciar. Porque normalmente eles gostam de se pôr juntinhos, ao lado uns dos outros, para dormir a sesta”, ilustra o diretor-geral.
Lá fora, o parque infantil continua igual à espera deles para a hora do recreio — que, contudo, à medida que chegarem mais crianças será feito por sala, à vez, de forma a não estarem todos aglomerados ao mesmo tempo. Do outro lado do edifício, também no exterior, poderão voltar a ajudar a regar a horta comunitária da escola. Uma tradição antiga no grupo João de Deus, segundo o seu dirigente máximo: “Temos hortas pedagógicas nos nossos jardins-escola desde 1911. Agora é que virou moda, começaram todos a fazer isto nos últimos anos por causa da Michelle Obama…”. As curgetes estão muito maiores do que estavam há dois meses, quando os miúdos as viram pela última vez. Mas Sandra Ramalhinho explica que eles estão a par disso: “Temos-lhes enviado fotografias a mostrar como elas estão, para eles irem acompanhando o crescimento.”
A preocupação com a limpeza e a desinfeção norteiam todas as novas medidas, mas aquilo que preocupa mais educadoras, auxiliares e diretores aqui em Belas é o equilíbrio emocional das crianças que vão receber esta segunda-feira. As primeiras medidas que foram anunciadas pela DGS, exigindo que cada criança mantivesse um distanciamento de dois metros de outras crianças ou adultos, foram encaradas por Ponce de Carvalho como descabidas. “Como é possível haver distanciamento com um bebé de 4 meses? Eles vêm ao colo e passam do colo dos pais para o colo das educadoras”, afirma o diretor. “Acho que às vezes os nossos decisores se esquecem de como funcionam as coisas no terreno. Não sei se não se lembram de quando foram pais, se é porque estão obcecados com a questão da Covid. Felizmente as coisas com a DGS foram melhorando”, reconhece.
Prova disso foi o discurso do primeiro-ministro António Costa, esta sexta-feira, que sublinhou o “conjunto de normas de higiene e distanciamento adequadas àquela realidade muito específica” das creches. “Uma criança de colo tem de obviamente estar ao colo e não estar em distanciamento físico”, acrescentou.
O diretor do agrupamento João de Deus diz que o contrário seria “criminoso”. “Uma criança de um ano não compreenderia se estendesse os braços à educadora para esta lhe pegar ao colo e ela recuasse”. Então as vossas educadoras vão fazê-lo regularmente? “É claro que vão pegar neles ao colo!”, responde Ponce de Carvalho. “Creche é afeto, acima de tudo”, acrescenta Sandra Ramalhinho.
“Vi aquelas imagens em França das crianças dentro dos quadrados e fiquei horrorizado. Não houve nenhum pensamento pedagógico ali, só queriam mostrar à comunicação social que o isolamento estava a ser cumprido”, completa o diretor-geral. Na creche do jardim-escola de João de Deus em Belas, a regra está definida: se as crianças se abraçarem, isso será permitido. Serão limpas posteriormente. Se partilharem um brinquedo, também será aceite, havendo cuidado redobrado na higienização do brinquedo e das mãos das crianças a seguir.
O álcool-gel estará por todo o lado, a direção tem confiança no produto de desinfeção que foi aplicado e os trabalhadores estão todos conscientes das regras. Mas ninguém impedirá as crianças de brincar: ”Até porque há crianças que não têm irmãos, nem primos, que estão há dois meses sozinhas sem outras crianças. Podem precisar disto”, aponta o diretor.
Mais cedo ou mais tarde, acredita António Ponce de Carvalho, os restantes 42 alunos voltarão e adaptar-se-ão às educadoras e professores de máscara, ao lavar mais frequente das mãos e à hora de refeição feita sem um colega exatamente ao lado. Tudo o resto regressará à normalidade e aqui isso é visto com bons olhos: “Pôr a criança dentro de uma campânula pode protegê-la do vírus, mas elas podem ficar mais doentes de outras formas e a longo prazo.” A decisão final de quando destapar essa campânula caberá, por isso, aos pais.
No Colégio Chupetão os funcionários entram pela cozinha e os pais deixam os filhos à porta
Fundado há 32 anos, o Novo Colégio Chupetão, no Porto, nunca tinha fechado portas por causa de um vírus. “Estou aqui desde 1999 e tudo isto é novo para nós”, confessa ao Observador o diretor António Vaz Teixeira. A instituição integra uma creche, salas de pré-escolar e um espaço dedicado ao 1.º ciclo do ensino básico, totalizando 140 crianças e cerca de 20 funcionários.
A creche encerrou a 16 de março e das 35 crianças inscritas apenas 11 vão regressar na próxima segunda-feira. “Abriria nem que fosse para uma criança”, garante o diretor, acrescentando que até setembro “muitos já não vêm”. O importante agora parece ser olhar para o futuro e preparar a reabertura. “Até domingo ainda há muito para fazer”, salienta, apesar de uma boa parte das mudanças já serem visíveis logo na entrada.
Mal se abre o portão branco da moradia, situada junto à Circunvalação, há linhas pretas e amarelas no chão que ditam a distância recomendada e papéis afixados com avisos sobre o uso obrigatório de máscara, a necessidade de desinfetar as mãos num dos dispensadores de álcool em gel ou o alerta para que o tempo de permanência no local seja o mínimo possível.
Do lado direito do jardim, onde agora os escorregas estão vazios, uma seta indica o novo caminho para os funcionários, que passarão a entrar no edifício pela cozinha, depois de avaliarem a temperatura corporal, colocarem uma máscara cirúrgica e mudarem de roupa e de calçado. Numa primeira fase, a equipa responsável vai resumir-se a seis pessoas — duas educadoras, duas auxiliares, uma cozinheira e uma empregada de limpeza — todas já foram testadas para a Covid-19 e o resultado é conhecido este sábado.
“Reduzimos ligeiramente o nosso horário de funcionamento até ao fim deste mês e temos duas pessoas a trabalhar a meio tempo. A partir do dia 1 de junho contamos receber mais 10 crianças, aí haverá um reforço de mais três auxiliares”, sublinha Maria do Céu Teixeira, que divide a direção do Novo Colégio Chupetão com o marido.
Ao contrário de outros tempos, a entrega e a recolha da criança só é permitida se for efetuada apenas por um adulto, que o deve fazer logo após trocar o calçado do mais novo. No hall de entrada, há uma televisão em cima da porta onde se podem ver vídeos explicativos da Direção-Geral da Saúde e no chão estão dois caixotes, um etiquetado como “zona suja”, onde são colocados os sapatos das crianças que chegam da rua, e outro batizado como “zona limpa”, onde se guardam os sapatos ou as meias antiderrapantes exclusivas do espaço.
“Damos aos pais um saco plástico com o nome de cada criança para que essa troca seja feita pelos próprios”, explica Maria do Céu Teixeira. Enquanto as batas do colégio passam a ir para casa das famílias apenas ao fim de semana, ou quando estão muito sujas, os brinquedos, os casacos e as mochilas são agora impedidas de entrar.
Outra das mudanças que saltam à vista é a antiga sala de reuniões convertida numa sala de isolamento, devidamente identificada como tal na porta. É lá que irá ficar quem apresentar sintomas como febre, tosse ou falta de ar. “Se isso se verificar, ligamos imediatamente aos pais, que têm 30 minutos para os vir buscar. Não vamos facilitar, caso não venham contactamos diretamente o delegado de saúde para saber o que fazer. Não temos circuitos Covid e não Covid, com as dimensões que temos não se justifica.”
A temperatura corporal de cada criança será medida de manhã e após o almoço, antes da sesta, e nenhuma que esteja medicada será admitida nesta fase.
Menos brinquedos, cadeiras e sanitas
As salas das crianças de um e dois anos estão mais vazias. Nas prateleiras cabiam vários brinquedos, mas agora restam poucos, a maioria simples e pequenos. “Já desinfetávamos os brinquedos uma vez por semana, mas agora será diferente. Teremos três grupos de brinquedos: de manhã usam uns, à tarde outros e no dia seguinte outros”, garante Maria do Céu Teixeira, enquanto lá fora está uma auxiliar a lavar com água e lixívia cada peça de um puzzle e outra a guardar peluches que não serão utilizados tão cedo.
Junto à porta de cada sala existe agora um kit especial para cada funcionário, composto por um dispensador de álcool em gel e um pack de proteções para os pés, algo que todas as educadoras e auxiliares devem usar quando entram, apesar de cada uma circular e ser responsável por apenas um espaço.
As mesas de atividades têm agora menos cadeiras e, em vez de ficarem no meio da sala, foram encostadas às paredes. Nos fraldários, os colchões serão desinfetados após cada muda de fralda, já as atividades quinzenais que crianças de um e dois anos faziam em conjunto vão deixar de acontecer.
“Será uma adaptação constante”, diz a responsável, que admite ser “muito difícil” manter os mais novos afastados uns dos outros. “Provavelmente vão deixar de brincar livremente, as educadoras e as auxiliares vão ter que orientar as atividades e as brincadeiras para não promoverem essa união, de forma a que não estejam tão próximos. Será muito complicado, é algo que faz parte do crescimento deles.”
No berçário, situado no piso 1, o cenário não será muito diferente. Os pais vão deixar de subir as escadas para deixar ou recolher os bebés, tudo o que virá da rua será guardado num saco de plástico e as mudas de roupa terão que chegar devidamente embaladas e identificadas.
O casal responsável pelo Novo Colégio Chupetão aproveitou o fecho forçado pela pandemia para fazer algumas mudanças, pintaram paredes, compraram catres e colchões para os berços. “Dos oito berços que temos disponíveis, apenas três vão ficar ocupados”, adianta Maria do Céu Teixeira, que garante existir espaço suficiente na hora de dormir. “Não é possível manter uma distância de dois metros, porque o espaço das salas é limitado, mas vamos ter pelo menos meio metro entre eles. Além disso, iremos alternar cabeças com pernas, que é outra das normas impostas.”
Nas casas de banho a rotina também será outra. Das quatro sanitas, apenas duas vão estar a funcionar e a zona dos potes também estará limitada. “Isto leva a que coisas que faríamos numa hora demorem muito mais tempo”, lamenta a responsável, que não descarta a possibilidade de no futuro precisar de um reforço de pessoal.
Lugares marcados, menos cadeiras e limpeza redobrada dos talheres, copos, pratos e superfícies. Assim é a nova vida do refeitório do Novo Colégio Chupetão. Além da farda, da touca, das luvas e do calçado habitual, a cozinheira tem agora um novo adereço: a máscara cirúrgica. Apenas as crianças de dois anos fazem aqui as refeições, as restantes almoçam e lancham na própria sala de atividades em cadeiras altas.
“Logo que saem do recreio, todos vão passar por um resguardo para muda de fraldas que iremos colocar no chão pulverizado com água e lixívia. Será uma espécie de tapete desinfetante”, explica Maria do Céu Teixeira, que em jeito de desabafo conta que uma das suas dores de cabeça é fintar o material esgotado nas lojas e nas farmácias, como máscaras, álcool em gel e spray desinfetante.
Depois de lavarem as mãos, os mais novos sentam-se num lugar específico com uma cadeira de intervalo da criança do lado. Logo que se acomodem, uma auxiliar coloca uma toalhete de papel individual e a respetiva loiça de vidro. “Apenas o bebés usam loiça de plástico, por uma questão de segurança.”
“Segunda-feira será como o início de um novo ano letivo”
Desde o fecho de portas, o Novo Colégio Chupetão tem garantido o contacto diário com educadoras e crianças de um e dois anos, através de videoconferências onde são dadas aulas de inglês ou de expressão musical. Desde a semana passada, foi pedido aos pais e aos professores que surgissem de máscara no rosto nestas sessões, uma estratégia de os mais novos se habituarem a essa imagem visual.
“Uma educadora resolveu colocar uma máscara num boneco que estava nu. Ao vê-lo, uma das crianças perguntou porque é que ele não tinha um pijama, não estranhou propriamente a máscara, mas sim o facto do boneco não ter roupa”, conta Maria do Céu Teixeira, acrescentando que tem conhecimento de uma marca que fabrica máscaras transparentes e isso talvez seja uma aposta futuro, já que a viseira não é aconselhável neste cenário.
A responsável teme a dificuldade da chegada dos mais novos e diz mesmo que a sua adaptação será “como o início de um novo ano letivo”. “Muitos estão em casa há quase dois meses, vai ser duro. Ainda por cima todos estamos de máscara, o que causa ainda mais estranheza para eles.”
O marido, António, partilha o mesmo receio e defende que “um infantário não pode ser um depósito de crianças, onde a entrega é feita a um mascarado desconhecido”. A reação dos mais pequenos, porém, só será conhecida na segunda-feira, Maria do Céu Teixeira adianta que a partir das 9h lá estará, “de braços abertos, como sempre”, para os receber.