Correm os primeiros anos da década de 90. António Guterres ocupa a cadeira principal do Largo do Rato e prepara-se para assaltar São Bento. Os máximos dirigentes do partido reúnem-se várias vezes no quartel-general dos socialistas, o Hotel Altis, em Lisboa, para acertarem agulhas e definirem estratégias. Mas as fugas de informação constantes colocam Guterres à beira de um ataque de nervos. “Os relatos das reuniões eram tão fidedignos que começámos a suspeitar que houvesse jornalistas nas condutas de ar”, conta António Galamba, histórico socialista, ao Observador. Mas nem isso os demove de usarem aquele espaço – afinal, o Altis tinha-se transformado no “hotel místico” e no talismã do partido.
A estratégia parece ter dado resultado. Na noite de 1 de outubro de 1995, António Guterres vence as eleições e sucede a Cavaco Silva como primeiro-ministro de Portugal. A história é contada e recontada vezes e vezes sem conta por todas os militantes do Partido Socialista ouvidos pelo Observador, que, invariavelmente, elegem essa noite, essa vitória, como o momento mais marcante da história conjunta então construída entre o partido e o nº 13 da Rua Castilho.
(E quanto ao jornalista nas condutas de ar, qual espião hollywodesco? Bem, a realidade tem este defeito de, às vezes, estragar uma boa estória: afinal, o jornalista limitava-se a escolher uma das muitas salas que rodeavam o espaço de reuniões, incluindo a casa de banho, e conseguia, com maior ou menor esforço, ouvir o que se passava lá dentro. O destino do nosso protagonista não foi muito feliz: “O senhor jornalista foi descoberto e convidado a sair, naturalmente”, ajuda a lembrar o deputado socialista, Miguel Laranjeiro).
A história da política portuguesa fez-se, também, assim: ora longe dos holofotes, entre encontros e desencontros mais discretos em lobbies de hotéis e salas de reuniões, ora publicamente, em noites eleitorais e conselhos nacionais. O Altis assume destaque natural nesta história por ter servido de quartel-general, primeiro à Aliança Democrática de Francisco Sá Carneiro, cujo destino está indissociavelmente ligado ao hotel, e, depois, ao Partido Socialista. Mas há outros: o Meridien, onde Cavaco Silva e PSD começaram o percurso vitorioso, o Tivoli, ponto de encontro de barrosistas, ou o Hotel Mundial. Preparado para correr a história?
O primeiro grande debate entre Cunhal e Soares
Quando, no final dos anos 60, o empresário Fernando Martins, que viria a tornar-se amigo próximo de Mário Soares e Almeida Santos, ousou construir um hotel de luxo em Lisboa, todos os consideraram louco – afinal, Portugal estava longe de ser um paraíso turístico. O nome, esse, foi escolhido pelo filho Raul Martins, inspirado pela mitologia grega – Altis era o nome de um bosque na Antiga Grécia, local de culto e adoração a Zeus, perto do Olimpo. Não deixa de ser curioso que tantos, tantas vezes, o tenham escolhido enquanto esperavam ascender ao Olimpo da política portuguesa.
E tudo poderia ter sido diferente. A primeira contrariedade veio logo no verão de 1973, a escassos meses da abertura: um incêndio tomou o edifício e as chamas só a muito custo foram travadas. Depois, as idas e voltas da Revolução dos Cravos quase obrigaram o hotel a fechar portas – o triste desfecho não se concretizou, mas obrigou a adiar por longos anos a pomposa festa de inauguração sonhada por Fernando Martins. Antes de Abril, os quartos e as salas do Altis serviram de palco para reuniões secretas entre Spínola e Costa Gomes, onde discutiram juntos o golpe que viria a pôr termo a quatro décadas de ditadura. Com a aurora da liberdade, cresceria também a histórica rivalidade entre Mário Soares e Álvaro Cunhal.
O primeiro grande debate entre os dois aconteceu precisamente no Hotel Altis. Lá fora, as ruas derretiam sob o calor do Verão Quente, mas, lá dentro, a troca de argumentos, transmitida apenas pela televisão francesa ORTF fez-se num ambiente ameno, muito diferente daquele mostrado no segundo debate, este já difundido pelas câmaras da RTP – “olhe que não senhor doutor”, lembra-se?
As vitórias do Partido Socialista nas eleições de 1975 e de 1976, assim como a vitória de Ramalho Eanes nessas primeiras presidenciais, viriam resfriar o combate político entre socialistas e comunistas – eram sinais claros de apoio ao “Grupo dos Nove”, pertencente à ala mais moderada do Movimento das Forças Armadas (MFA). Eanes tornar-se-ia, de resto, um dos grandes amigos de Fernando Martins. Um homem descrito por quem com ele trabalhou de perto como alguém “aglutinador”, que conseguia juntar na mesma sala protagonistas de todos os quadrantes políticos.
Esse é, de resto, um ponto de honra dos responsáveis do hotel ouvidos pelo Observador. Apesar da ligação óbvia do Altis ao Partido Socialista, as portas nunca se fecharam a outros partidos, da esquerda à direita do espetro político português. Essa relação com os socialistas, explicam, foi-se fazendo naturalmente porque o PS não tinha uma sede capaz de acolher todos os militantes. No entanto, antes de o Altis se tornar um símbolo das noites eleitorais socialistas, a vida do hotel cruzou-se com a de outros protagonistas.
As últimas horas de Francisco Sá Carneiro
Novembro de 1977. O clima de tensão no interior do Partido Social Democrata atinge um ponto de rutura e Sá Carneiro toma uma decisão drástica: a poucos dias do VI Conselho Nacional do partido a ter lugar no futuro quartel-general do PS, o então líder dos social-democratas entrega o cartão de militante e comunica a demissão do partido.
Crítico feroz da atuação do Presidente da República, Ramalhe Eanes, decide demitir-se, rompendo a corda com a outra ala do partido. “Sá Carneiro era assim: de posições muito fortes e firmes”, ajuda a recordar Virgínia Estorninho, histórica militante do partido.
O Conselho Nacional chegaria quatro dias depois da demissão de Sá Carneiro. “Foi um debate muito, muito duro. E quente. Sá Carneiro pediu para se sentar numa mesinha, sozinho, ao lado da mesa principal. No final, pouco depois da meia-noite, leu a sua intervenção, muito crítica em relação ao rumo escolhido pelo partido e saiu”.
Marcelo ladeado por Nuno Rodrigues dos Santos. Sá Carneiro ao fundo, isolado. Fonte: Arquivo PSD
Saiu, mas por pouco tempo. Depois de um hiato de quase um ano, assume o volante dos social-democratas e começa a desenhar a Aliança Democrática (AD) a partir do Altis. É lá que escreve a primeira página da direita no Portugal democrático com as vitórias nas legislativas de 79 e 80. E é lá que participa, pela última vez, na vida política do país.
Vitória da AD em 1980. Exterior do Altis. Fonte: Arquivo PSD
Dezembro de 1980. Dia 4. Francisco Sá Carneiro, em rutura com Ramalho Eanes, ameaça publicamente demitir-se caso o candidato presidencial apoiado pela AD, Soares Carneiro, não vença as eleições. Às 19h dá uma conferência de imprensa conjunta com Soares Carneiro e Freitas do Amaral. De lá, parte para o Aeroporto de Lisboa. Acabaria por morrer horas depois, no desastre de Camarate.
Prenúncio ou não, poucos anos antes, num Conselho Nacional do PSD, no Hotel Ritz, Virgínia Estorninho teve uma conversa em particular com Sá Carneiro que ainda hoje recorda. “O Ritz tinha uma sala chamada Jardim de Inverno. Era toda envidraçada, tinha apenas uma parede completamente protegida. A segurança andou a medir ângulos e decidiu mudar a disposição das mesas para garantir a segurança de Sá Carneiro. Quando ele chegou, perguntou-me ‘Virgínia, por que razão mudaram as mesas?’ Eu respondi-lhe que tinham sido ordens da segurança porque podia haver quem lhe quisesse fazer mal. Então, Sá Carneiro respondeu-me: ‘Quando isso acontecer, não há ninguém que me valha”, conta.
Última aparição pública de Sá Carneiro, ladeado por Soares Carneiro e Freitas do Amaral. Fonte: Arquivo PSD
Guterres, Ferro, Sócrates, Seguro e Costa. A história repete-se, o palco é o mesmo
Outubro de 1995. Dia 1. Os dirigentes máximos do PS ocupam o 13º andar do Hotel Altis. Em baixo, no 12º andar, todos os outros. O Altis transformado em quartel-general socialista, tradição herdada dos tempos de Mário Soares. Aguardam com ansiedade o resultado das eleições – afinal, todas as sondagens e projeções davam como quase certa a vitória de António Guterres e, tão ou mais importante, o fim do “Cavaquismo”. A campanha, de resto, fora feita ao som do tema “The Conquest of Paradise”, o que demonstrava bem o estado de espírito dos socialistas naquelas eleições. Poucos minutos depois das oito, chega, por fim, a vitória e o momento de apoteose: António Guterres derrotara Fernando Nogueira e tornava-se primeiro-ministro de Portugal.
“A multidão era tal, que tivemos receio que as estruturas não suportassem o peso de tanta gente”, conta um histórico socialista ao Observador. Miguel Laranjeiro, deputado do PS, ajuda a compor o quadro: “Foi uma festa enorme. Se bem me lembro, ainda saímos de lá em caravana até à Torre de Belém, onde tínhamos feito o último comício”. O “hotel fetiche” dos socialistas voltava a ser sinónimo de vitória.
António Guterres na noite eleitoral de 1995
Anos antes, em 1991, o clima era outro. Nessas legislativas, os socialistas nem sequer chegaram aos 30% nas urnas. Jorge Sampaio admitiu a derrota, Cavaco saiu com uma maioria absoluta reforçada. E António Guterres? Usou o mesmo Altis para iniciar o assalto à liderança do partido, com uma frase que ainda hoje ecoa na história da política portuguesa: “Estou em estado de choque”. Depois de ter ajudado Sampaio a ganhar a liderança do partido na era pós-Constâncio e de ter partilhado com Sampaio as famosas reuniões no sótão mais conhecido do país, começava assim o caminho para a cadeira mais importante do Largo do Rato. Invertia-se aí, naquela noite, o ciclo de derrotas do Partido Socialista.
A primeira vitória chegaria logo nas europeias de 1994: os socialistas, conduzidos por António Vitorino, alcançam a vitória pela margem mínima (34,87% dos votos contra 34,39% do PSD). António Vitorino, que pertencia a um grupo do partido conhecido como o “Grupo Macau”, dava a sua primeira conferência de imprensa na sala… Macau, no Altis. “Os chineses deram sorte”, recorda Miguel Laranjeiro, entre risos. Profecia materializada na noite de 1 de outubro de 95.
Depois dessa vitória, “um dos momentos mais gloriosos da vida do PS”, como descreve o deputado Jorge Lacão, o Altis recebeu a festa de consagração de Guterres em 1999. Nesse período, os velhos hábitos mantêm-se e o hotel transforma-se em quartel-general do Governo socialista. É lá que Jorge Coelho e os mais próximos do primeiro-ministro se reúnem para discutir assuntos sensíveis. E é também lá que o Governo tem de gerir a crise protagonizada pelo então ministro da Agricultura, Fernando Gomes da Silva, que apareceu em público a comer mioleira de vaca ainda o país vivia com o fantasma da doença das Vacas Loucas, conta Miguel Laranjeiro. Nessas e noutras alturas, a pressão da comunicação social era tal que “vários protagonistas tinham de sair pela cozinha hotel para evitar os jornalistas”, como recorda António Galamba.
O ciclo vitorioso do PS acabaria nos idos de 2001. A Tragédia de Entre-os-Rios começa por abalar o Executivo. Jorge Coelho, ministro do Equipamento, é o primeiro a cair. A derrota nas autárquicas viria a dar o golpe final e Guterres despedia-se do Governo e do partido. Ferro Rodrigues assume as rédeas do PS, mas não consegue evitar a derrota nas legislativas de 2002. De resto, só viria a ter oportunidade de festejar a vitória nas europeias de 2004, também com o Altis como pano de fundo. Seria outro homem a alcançar o maior resultado da história dos socialistas. Um homem chamado José Sócrates.
Antes de lá chegar, porém, o ex-ministro de Guterres teve de enfrentar a concorrência de João Soares e Manuel Alegre. A arena? O mesmo hotel talismã dos socialistas. Depois de Seguro ter sido dissuadido de avançar por um telefonema de Jorge Coelho, o caminho para José Sócrates tornou-se mais fácil: foi eleito líder do partido com 80% dos votos. Apesar dos resultados, “a disputa foi muito intensa e cerrada”, lembra a ex-presidente do partido, Maria de Belém. A cavalgada vitoriosa do ex-ministro de Guterres culminaria na primeira maioria absoluta socialista da história da democracia portuguesa. Ao Altis, nessa noite, ocorreu uma avalanche de pessoas só comparável à de 95. Seria a última grande vitória do partido.
José Sócrates no Altis, na noite da maior vitória do partido socialista, em 2005
Aos resultados de 2005 sucederam-se derrotas e meias-vitórias que deixaram mossa no PS. Com o partido dividido, Mário Soares falha a eleição nas presidenciais de 2006; três anos depois, abalado por alguns escândalos, o PS vence as eleições, mas perde a maioria absoluta. Sócrates, embalado pela euforia da assistência socialista no Altis, afirma que “o PS [conseguira] uma extraordinária vitória eleitoral” e que o “povo português [queria] que o PS [continuasse] a governar Portugal”.
Mas os sucessivos escândalos, a crise no país e a consequente intervenção da troika traçam-lhe o destino em 2011: Sócrates é derrotado por Passos e o Executivo muda novamente de cor. Na noite da despedida, a azáfama era tal que, entre a confusão de pernas, cabos e câmaras de televisão, a porta envidraçada da entrada da sala do Altis partiu-se com a pressão causada pelos jornalistas.
O ex-ministro de Guterres daria lugar a novos protagonistas que iriam usar, tal como os antecessores, o Altis como quartel-general e arena de batalhas internas. A história tem tendência a repetir-se e a vida política portuguesa é prova disso mesmo. Se em 1991 os maus resultados nas legislativas escancararam as portas da liderança socialista, a vitória pouco entusiasmante do PS nas europeias de 2014, também. Se Sampaio caiu perante Guterres, Seguro cairia perante Costa. O Altis, sempre o Altis, como barómetro interno do partido.
Maio de 2014. Dia 25. Passavam poucos minutos depois das 10 da noite. No Altis, a tensão é evidente, os resultados tinham ficado muito aquém das expectativas. Mas Seguro decide carregar no tom – Sócrates fizera o mesmo em 2009. “O PS teve hoje uma grande vitoria”, gritou, perante uma audiência reduzida e pouco convencida. “Nessa noite, foi preciso gerir a colocação das pessoas porque havia muitos espaços vazios na sala”, recorda o deputado socialista, António Galamba. Costa, longe do Altis, respondia a Seguro e soavam os tambores de guerra: “Há que refletir para garantir que a vitória não volte a saber a pouco” – era o “estou em estado de choque” de Guterres. O resto da história é conhecido: Costa viria a vencer as eleições internas do partido e a assumir a liderança socialista. E será ele e a sua equipa que ocuparão o 13º andar do nº 13 da Rua Castilho quando for altura de conhecer os primeiros resultados das eleições legislativas de 2015.
Cavaco, Durão e Passos. Três hotéis, três percursos
Os encontros e desencontros entre protagonistas não se fizeram apenas no Altis. Antes de deixar o Governo e o país, Sócrates gostava de ter longas refeições no restaurante italiano Il Gattopardo, no hotel Dom Pedro, na Avenida Engenheiro Duarte Pacheco. Ou de se encontrar com Mário Soares no Hotel Mundial, no Martim Moniz, para discutirem o rumo do partido sob a liderança de Seguro. O mesmo que servira de palco às conspirações organizadas por Jorge Sampaio. Já Marcelo Rebelo de Sousa preferia o número 88 da rua Rodrigo da Fonseca, em Lisboa. Se as paredes do Hotel Ritz falassem, tinham muito para contar.
Quanto aos outros líderes do PSD, e ao contrário do que acontece com o PS, foram sempre alternando os hotéis onde o partido se reunia e celebrava algumas das noites eleitorais. “Nós variávamos de hotel como quem muda de camisa”, começa por explicar António Capucho, ex-ministro dos Assuntos Parlamentares de Cavaco Silva. “Quando a sede do partido foi construída, na rua de São Caetano à Lapa, em Lisboa, foi pensada para poder receber muita gente”, facto que ajuda a perceber por que motivo não existe uma ligação tão íntima a nenhum hotel em particular, além da relação histórica entre o Altis e AD, claro.
Ainda assim, as ligações não se esgotam aqui: foi no Hotel Meridien, agora Intercontinental, por exemplo, que Cavaco Silva celebrou as vitórias nas eleições legislativas de 1985 e de 1987, a primeira maioria absoluta da história do PSD, depois reforçada em 1991, nas tais eleições que precipitariam a saída de Jorge Sampaio do Largo do Rato. E foi também lá que se despediu de São Bento, depois de dez anos como primeiro-ministro do país.
Talvez pela simbologia do espaço, o número 149 da Rua Castilho foi também escolhido por Durão Barroso para acompanhar a vitória nas legislativas de 2002. Na noite de 17 de março, perante os dirigentes e militantes do partido, o futuro presidente da Comissão Europeia prometia liderar um “Governo credível e de estabilidade”.
A vitória por pouco menos 200 mil votos obrigá-lo-ia a coligar-se com o CDS de Paulo Portas e, naquilo que parece ser mais um ato carregado de simbolismo, os dois assinam o acordo programático que guiaria a coligação na Sala Castelo Branco, do Hotel Tivoli em Lisboa, a mesma, precisamente, onde Sá Carneiro e Freitas do Amaral assinaram o acordo para a Aliança Democrática em 1979. O Hotel Tivoli tornava-se, assim, quartel-general da coligação, tantas foram as vezes em que lá reuniram e falaram aos jornalistas.
A marca Tivoli, detida pelo Grupo Espírito Santo (GES), viria depois a ser apanhada pelo furacão que arrasou as empresas de Ricardo Salgado. No início de 2015, dois hotéis Tivoli no Brasil foram vendidos aos tailandeses do Minor Hotel Group, num negócio que envolveu, ainda, a aquisição de quatro terrenos em Portugal onde estão instaladas unidades da marca: três no Algarve e uma em Lisboa. A transação envolveu 168,2 milhões de euros, mas não abrangeu todas as unidades da marca que era do GES. Mesmo assim, o garrote que se apertou em torno das empresas do universo Espírito Santo pode, porém, precipitar a venda de outras unidades. O Observador tentou contactar os representantes do Tivoli em Lisboa, mas não conseguiu obter qualquer comentário.
Nove anos depois da vitória de Durão Barroso, chegaria um novo líder social-democrata ao cargo de primeiro-ministro: Pedro Passos Coelho. Ao contrário dos seus antecessores, escolhe o Hotel Sana, em Lisboa, para acompanhar a noite eleitoral. Discursa, no fim, vitorioso. “[Vai ser um trabalho] difícil, mas que vai valer a pena (…) Os portugueses mostraram uma vontade inequívoca de mudar”, afirma antes de se dirigir para o Marquês de Pombal, onde a festa laranja seguiu o seu curso pela noite dentro.
Passos Coelho na noite eleitoral de 2011, depois de deixar o Hotel Sana
Começavam naquela noite, com aquela vitória, quatro anos de governação difícil, entre a presença da troika no país e alguns escândalos que fragilizaram o Executivo. Como o caso que envolveu a licenciatura de Miguel Relvas, “o” homem de confiança de Pedro Passos Coelho. Depois de meses de forte contestação, o então ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares decide demitir-se. A 13 de abril de 2013, o Conselho Nacional do PSD reúne-se no Sana e decide aprovar um voto de louvor a Miguel Relvas, pela “inexcedível lealdade à causa pública”. O voto de louvor foi aprovado pela maioria com três abstenções e apenas um voto contra. De quem? De Virgínia Estorninho, claro. “A minha atuação no partido foi sempre de dizer aquilo que tenho a dizer. As pessoas já me conhecem. Umas ficam incomodas, outras já nem ligam”. Encerrava-se, assim, a passagem controversa de Miguel Relvas pelo XIX Governo Constitucional.
Apesar da preferência pelo Sana, no número 8 da Avenida Fontes Pereira de Melo, o Hotel Tivoli acabaria por cruzar-se, pelo menos, mais uma vez com a vida do partido e com a história da política portuguesa: é lá, a 6 de julho de 2013, depois do “verão quente” da coligação PSD/CDS e da demissão “irrevogável” de Portas, que o primeiro-ministro anuncia o “acordo sólido e abrangente para manter a coligação” e para “assegurar a estabilidade política indispensável” ao país. No mesmo hotel onde Sá Carneiro e Freitas do Amaral assinaram a Aliança Democrática, no mesmo espaço onde Durão Barroso e Paulo Portas reeditaram esse acordo, era agora a vez de o líder do CDS se tornar vice-primeiro-ministro de Portugal. A história tem destas coisas.