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Caso Alexandra Reis envolveu dois opositores internos no PS e fação pedronunista já afia as facas
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Caso Alexandra Reis envolveu dois opositores internos no PS e fação pedronunista já afia as facas

MÁRIO CRUZ/LUSA

Caso Alexandra Reis envolveu dois opositores internos no PS e fação pedronunista já afia as facas

MÁRIO CRUZ/LUSA

PS não deixa cair Pedro Nuno, mas pede calma. Pedronunistas atiram forte a Medina

Saída do homem com que muitos contavam para suceder a Costa não enterrou o sonho dos pedronunistas que acreditam haver reabilitação política. E a guerra com o rival Medina já começou.

Está dado o tiro de partida para a guerra interna no PS. Depois de uma madrugada dedicada a digerir o último terramoto político que atingiu o Governo, os socialistas não antecipam a morte política de Pedro Nuno, que é até elogiado em vários setores pela saída “digna”, “exemplar”, “à Jorge Coelho”. Para já, no entanto, o conselho é que goze de um período de recolhimento. Entre os pedronunistas, aliás, a tese vai mais longe: não só o ex-ministro é poupado, como as baterias já são apontadas ao possível adversário futuro (e do passado) no PS, Fernando Medina. No PS, a guerra da sucessão começa agora.

“Hoje começou a sucessão de António Costa“, sentencia um dirigente próximo de Pedro Nuno. “A vida interna do PS mudou radicalmente. Antes, tudo era intriga e posicionamento prévio; agora deixou de ser”. Com o caso Alexandra Reis a trazer, ironicamente, os dois possíveis sucessores mais apontados a jogo, já são visíveis as movimentações das tropas no PS — com grande parte do partido a proteger o agora ex-ministro das Infraestruturas, assim como o seu “legado”.

“Pedro Nuno Santos sai disto relativamente melhor do que o expectável no PS e relativamente pior do que o desejável no país”, resume ao Observador um alto dirigente socialista. E esse “melhor do que expectável” no partido é fácil de constatar: como um socialista próximo de Pedro Nuno resumia, em reação ao caso, “o PS chora” a partida do maior rosto da sua ala esquerda, que é também o dirigente que há anos mais trabalha o aparelho do partido, de olhos postos numa futura corrida à sucessão.

FILIPE AMORIM/OBSERVADOR

No seu círculo mais próximo, o responsável por alguns dos dossiês mais quentes do Governo, TAP à cabeça, já tinha confidenciado estar “inquieto” com a resposta do Tribunal Constitucional à questão da sua declaração de rendimentos. Mais: o agora ex-ministro terá confessado aos mais próximos que estava “desejoso” de voltar à Assembleia da República — como agora fará, retomando o mandato como deputado eleito por Aveiro.

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E, por isso, entre os que o conhecem, há até quem arrisque que Pedro Nuno já estaria a planear “ir embora antes do tempo” — “só queria mesmo deixar a TAP resolvida”. Não conseguiu, acabando por ver a sua saída precipitada precisamente por causa de um escândalo relacionado com a TAP.

No PS, ainda assim, não falta quem recorde o “legado” que deixa nas reformas da ferrovia ou da habitação e garanta que há males que vêm por bem: fora de um Governo onde já estava mais do que fragilizado, poderá “soltar-se” e preparar terreno para quando a sua hora (de concorrer à liderança do PS) chegar.

Na CNN, a ex-ministra Alexandra Leitão — conhecida por se ter tornado, nos últimos tempos, uma das maiores críticas internas do Governo de Costa — não poupou nas palavras: elogiou a “enorme dignidade e humildade” de Pedro Nuno na hora da saída; a forma “notável” como assumiu a responsabilidade política pelo caso; o seu “ímpeto reformista” e a “coragem” para assumir o dossiê da TAP; e acabou a sentenciar que Pedro Nuno “continua a ser um ativo fundamental para o PS e o país” e “que ainda terá futuro nessa dimensão”.

Entre os pedronunistas, a convicção é a mesma: há quem questione o que é que “o coitado do Pedro” tem a ver com isto (apesar de ter sido Pedro Nuno Santos quem escolheu Alexandra Reis para a NAV e quem tinha, dentro do seu Ministério, a informação sobre o acordo de meio milhão a que a ex-secretária de Estado chegara com a TAP); há também quem assegure que “não tem culpa e faz falta” ao Governo; e, mais importante, há quem diga que não será por causa deste caso que Pedro Nuno se retirará de cena. “Ele nunca desistiu de tomar conta do partido.”

Resta saber o que sobra de capital político a um ministro que já estava hiperfragilizado desde o caso do despacho do aeroporto. No núcleo duro de Pedro Nuno, o mesmo que nessa altura garantia que o ministro tinha sofrido um golpe grave, mas não “fatal“, garante-se que a reabilitação é possível — e que terá tempo para a fazer.

O problema é aguentar quieto seis meses“, desabafa uma fonte próxima do ex-responsável das Infraestruturas, fazendo eco dos conselhos que outros pedronunistas vão deixando à boca pequena. Outro amigo e deputado elogia os “princípios, competências e visão” de Pedro Nuno, “úteis à vida pública” portuguesa, e aconselha uma avaliação do futuro político do já não tão jovem turco sem “tremendismos: “O capital político que tem no partido e no país não se esfumará – pelo menos todo – com este episódio”.

Mas uma coisa é certa, antecipa a mesma fonte: não seria “inteligente” da parte de Pedro Nuno Santos tornar-se uma voz demasiado audível no PS, sobretudo se optar por criticar António Costa, “nos próximos tempos, de forma muito evidente”.

“Em política nada nos prejudica, porque o tempo trata. Tem de ir para o Parlamento e ficar calado. Gerir a tropa, mas calado, e mandando os seus estarem calados”, aconselha outro socialista, antevendo uma espécie de período de nojo para Pedro Nuno de cerca de “seis meses ou um ano”. “Indo para a bancada tem de ficar recolhido“, concorda outro dirigente do partido.

Há até quem ache que a saída mais airosa seria, ao fim desse tempo, passar a comentador televisivo para ter um palco onde pudesse transmitir as suas posições de forma mais livre — embora sem arriscar tanto como Alexandra Leitão, que com as críticas constantes ao Governo passou a ser colocada pelos socialistas na categoria dos críticos internos de Costa.

Apoios não ficaram só entre pedronunistas

Os apoios chegaram de vários pontos do PS. Ana Gomes, que quando se candidatou a Belém contou com o apoio do agora ex-ministro, não demorou a considerar que Pedro Nuno “sai como sempre esteve no Governo”: “Com seriedade, convicção e dignidade. E com ambição para o país. A tempo de revigorar o PS, espero”.

Na rádio Observador, o influente líder da distrital do Porto, Eduardo Vítor Rodrigues, frisou que Pedro Nuno tomou esta posição — que era, na sua avaliação, dispensável — para dar um “sinal de ética republicana” comparável ao que deu Jorge Coelho quando se demitiu em reação à queda da ponte de Entre os Rios, em 2001, antes mesmo de qualquer facto apurado — um exemplo a que o PS está a recorrer frequentemente para elogiar Pedro Nuno.

“Este momento serve para a oposição fazer disto um cavalo de batalha, mas também para alguns ódios internos virem à tona”, avisou o dirigente do Porto, criticando o ex-ministro João Leão por ter vindo absolver-se de culpas no processo (que começou ainda Medina não lhe tinha sucedido nas Finanças). “No fim, a culpa vai ser da empregada da limpeza“, ironizou.

Eduardo Vítor Rodrigues deixou ainda ainda outro aviso para consumo interno: as “disputas internas imberbes” trazem riscos e são inúteis, uma vez que Costa “é quem é sufragado e tem legitimidade”. Pior: para o líder do PS/Porto, “há um aproveitamento de umas fações que tentam, à custa disto, ir degradando a vida interna”.

Um dirigente socialista critica a tendência para a "autofagia" do PS, lamentando a "guerra interna no PS e o grupo de pessoas que andam preocupadas com a sua família interna, fazendo apenas um trabalho estratégico-partidária". Incluindo Pedro Nuno e Medina, que "usam o partido como brinquedo". A mesma fonte sentencia: "O António Costa não merece e vai limpar a casa"

Fernando Medina na mira

Por muitos avisos que sejam lançados sobre os perigos de pôr a vida interna ou a sucessão precoce no PS no centro da discussão, na cabeça de muitos socialistas a ideia é mesmo essa. Sobretudo, num dossiê que pôs em confronto direto Pedro Nuno Santos e Fernando Medina.

Não é para menos. Alexandra Reis integrou o Ministério de Medina, que não hesitou em demitir a sua secretária de Estado assim que os contornos do caso se tornaram mais cristalinos. A poucas horas do anúncio da demissão de Pedro Nuno Santos, o mesmo gabinete de Medina garantiu à RTP que o governante nada tinha que ver com o assunto e que desconhecia o acordo entre a TAP e Alexandra Reis — isolando ainda mais Pedro Nuno Santos.

Entre pedronunistas, mas não só, as críticas à forma como Medina geriu todo o processo são mais do que muitas. Na CNN, Alexandra Leitão reforçou a necessidade de continuar a pedir “explicações” para um caso que não se encerra com a despedida de Pedro Nuno. A ex-ministra  da Modernização Administrativa pôs o dedo na ferida: quem “escolheu” Alexandra Reis e a convidou para o Governo (Fernando Medina, leia-se) tem de prestar esclarecimentos.

À boca pequena, ouvem-se muitos ecos desta tese no PS. “Se alguém devia saber [do acordo] era Medina, que a escolheu para secretária de Estado”, dizia ao Observador um dirigente próximo de Pedro Nuno. “É crível que Fernando Medina não soubesse?”, interroga a mesma fonte. Por outras palavaras: Medina está tão metido nesta embrulhada como Pedro Nuno Santos.

De madrugada, pelos Whatsapps dos pedronunistas corria um parágrafo específico do comunicado de saída do ministro das Infraestruturas, com um sublinhado relevante: a parte em que se referia que o acordo tinha passado pela equipa jurídica da TAP — liderada à época por Stéphanie Sá da Silva, casada com Fernando Medina, embora estivesse de licença de maternidade — e pelo escritório de advogados encabeçado por Pedro Rebelo de Sousa, irmão do Presidente da República.

Ou seja, a ala próxima de Pedro Nuno entendeu a referência como uma espécie de lembrete de que as responsabilidades não ficam pelo seu Ministério — e não perdeu tempo a fazer pontaria contra Medina. Quem conhece o ministro das Finanças descarta essa premeditação e ironiza: isso seria Medina “revelar um killer instinct de que todos o acusam de não ter”.

Por tudo isto, há socialistas que entendem que, se Pedro Nuno ficou melhor no partido do que no país, Medina, pela forma como se comportou, acabou por perder o que lhe restava do partido de vez. “Medina não trabalha a pensar no partido, para o bem e para o mal”, analisa um dirigente do partido — ao contrário de Pedro Nuno, que trabalha o aparelho do PS há anos e tem braços em muitas das principais federações socialistas.

Mesmo fora da ala mais próxima do ministro demissionário, há de resto quem continue a achar que o ministro das Finanças deve explicações: “As Finanças são as responsáveis por convidarem alguém sem o mínimo de escrutínio”, sentencia um deputado. “Acho que o Pedro Nuno até é o menos culpado…”, conclui a mesma fonte.

Outro dirigente socialista critica a tendência para a “autofagia” do PS, lamentando a “guerra interna no PS e o grupo de pessoas que andam preocupadas com a sua família interna, fazendo apenas um trabalho estratégico-partidária“. Incluindo Pedro Nuno e Medina, que “usam o partido como brinquedo“.

A mesma fonte sentencia: “O António Costa não merece e vai limpar a casa. Tem de meter experiência política e pessoas que não cometam erros“. Parte da experiência política com que contava sai agora do Governo — e Pedro Nuno conta com uma ala do PS ansiosa para assistir aos seus próximos passos.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Aproveitar para remodelar mais? Há elos mais fracos

A saída de Pedro Nuno Santos provoca novo reajuste no Governo e no PS há quem reclame que é hora para António Costa fazer o que não costuma ser a sua prática: uma remodelação mais extensa. Há também socialistas que avisam: “Não subestimem António Costa. Pode aparecer com uma solução totalmente nova.”

Só que com sete anos de governação às costas, o primeiro-ministro não tem condições arriscar novas formulações de Governo” ou para tirar grandes nomes da cartola para responder a mais uma crise. O socialista Ascenso Simões escreveu, num artigo publicado no Expresso, que trabalhou “diariamente com António Costa entre 2002 e 2007” e que sempre viu “que Costa tinha no seu leque de conhecimentos cinco nomes credíveis e ‘limpos’ para cada lugar governativo”.

Mas a passagem de Costa pela Câmara de Lisboa, escreveu Ascenso Simões, que acompanhou de perto a ascensão meteórica do socialista, “reduziu-lhe o universo de recrutamento e determinou as escolhas nos seus três Executivos”. É preciso inverter o rumo, alertou.

A necessidade de um Governo com mais peso político é um desejo que os socialistas acalentam há já algum tempo. Aliás, depois das últimas autárquicas — onde houve alguns avisos eleitorais que assustaram os socialistas — pediu-se isso mesmo. Mas as eleições antecipadas do início de 2022 trouxeram uma maioria absoluta e o líder socialista pouco mexeu no Executivo.

Costa, aliás, tem sido sempre muito conservador nas alterações — mesmo sob alta pressão — e as que faz são sempre pouco alargadas. A maior terá sido já em 2018, quando saíram quatro ministros: Adalberto Campos Fernandes (Saúde), Manuel Caldeira Cabral (Economia), Azeredo Lopes (Defesa) e Castro Mendes (Cultura).

A estratégia tem sido acumular pedidos de saída e promovê-los quando há uma aberta. Nesta última remodelação referida, o gatilho foi a saída de Azeredo Lopes, na sequência do caso Tancos. Nesta altura, no PS, apontam-se vários membros do Governo fragilizados, caso de Ana Abrunhosa, ministra da Coesão, João Gomes Cravinho, ministro dos Negócios Estrangeiros, Maria do Céu Antunes, ministra da Agricultura.

No partido não são poucos os que começam a fazer comparações com outro primeiro-ministro, igualmente duradouro, no seu último mandato e também em maioria absoluta: Cavaco Silva. “No último Governo de Cavaco Silva, em 1992, o Governo também estava de tal forma bloqueado que nada funcionava. É inevitável. Deixam de ouvir e de ponderar opções”, lamenta um socialista. Resta saber se Costa consegue recuperar a iniciativa política.

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