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Fabian Hürzeler treina o St. Pauli desde a temporada passada e é um dos obreiros do regresso à Bundesliga 13 anos depois

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Fabian Hürzeler treina o St. Pauli desde a temporada passada e é um dos obreiros do regresso à Bundesliga 13 anos depois

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St. Pauli, o clube que luta contra preconceito, racismo, homofobia e é contra o capitalismo (e nasceu de uma bebedeira)

Está de regresso à Bundesliga mas a história do clube de um bairro de Hamburgo é maior do que o que se passa no relvado. Afirmou-se contra os nazis, opôs-se ao capitalismo e representa as origens.

Hamburgo é sinónimo de futebol. Cidade que está há várias décadas no topo do futebol alemão, a histórica descida de divisão do Hamburgo, em 2018, tirou o brilho à cidade, atirando-a para o escalão secundário. Porém, seis anos depois, Hamburgo volta a ser cidade de Bundesliga, mas desta feita à escala de um bairro. O bairro de St. Pauli.

O St. Pauli garantiu na última semana a subida de divisão, depois de ter vencido, em casa, o Osnabrück por 3-1. As imagens do final dessa partida correram o mundo, com os adeptos a invadirem o relvado depois de o árbitro ter apitado para o término do encontro. A emoção e o grito que aquelas pessoas carregaram no peito durante os últimos 13 anos pôde, finalmente, sair para fora. Já este domingo, o St. Pauli pode carimbar o primeiro lugar e a conquista da Bundesliga 2, no jogo em casa do WehenWiesbaden.

Porém, a história deste clube centenário que nasceu num bairro de Hamburgo vai muito para lá de 2024 e está bastante acima do futebol. Mas vamos por partes. O FC St. Pauli começou como um departamento de futebol chamado Hamburgo-St. Pauli Turnverein 1862 e, reza a lenda, surgiu numa noite de bebedeira num bar da cidade. O St. Pauli como o conhecemos atualmente foi oficialmente fundado a 15 de maio de 1910, embora só tenha sido inscrito como clube independente em 1924. O seu registo no Tribunal Distrital de Hamburgo data de 25 de maio de 1925. Desde a sua origem que o clube utiliza o castanho e o branco como cores principais.

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As partidas oficiais começaram em 1909/10, na altura num campeonato equivalente à distrital de Hamburgo, que era composto pelas equipas secundárias dos clubes que se encontravam na primeira divisão. No jogo inaugural, diante do SC Germania, o St. Pauli venceu por 2-0, apesar de ter disponíveis apenas dez jogadores. Essa temporada ficou ainda marcada pelos primeiros jogos disputados fora da cidade de Hamburgo, que chegaram inclusivamente à Dinamarca. Começava, assim, o crescimento de um clube que tinha todas as condições para ser um grande.

Em termos desportivos, o St. Pauli foi conhecido na década de 40 do século passado como a “equipa milagres”, já que demorou a atingir o topo do futebol regional mas, quando lá chegou, estabeleceu-se como uma das melhores equipas do norte da Alemanha. Foi nessa altura que a rivalidade com o Hamburgo se intensificou. Em 1947, os piratas conquistaram o primeiro título da sua história, vencendo a Oberliga Hamburgo. Nesse ano a equipa recusou-se a participar no campeonato regional, perdendo simpatia no seio dos adeptos da cidade.

No final da temporada 1962/63 apareceu a Bundesliga, porém a Federação Alemã de Futebol (DFB) não permitiu que o St. Pauli participasse na nova primeira divisão do futebol alemão. Nessa época a equipa teve de regressar ao Campeonato regional do norte da Alemanha, que venceu logo no primeiro ano. Depois de 11 anos no futebol regional, os piratas conseguiram a ansiada chegada ao futebol profissional, atingindo a Bundesliga em 1977.

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As mensagens políticas estão muito presentes no seio do St. Pauli

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Como seria de esperar de uma equipa inexperiente e com poucos anos de profissionalismo, os primeiros tempos não foram fáceis e, na primeira época, o St. Pauli terminou nos últimos lugares, acabando por descer de divisão. No ano seguinte, a DFB revogou a licença atribuída ao clube, que retornou à Oberliga Norte, nesta altura equivalente à Terceira Divisão alemã. Só em 2001 o St. Pauli conseguiu reerguer-se e voltou a disputar a Bundesliga.

Em 2000/01, o St. Pauli era o principal favorito a descer de divisão, mas, surpreendentemente, a equipa de Hamburgo conseguiu a tão procurada manutenção. Porém, como não podia deixar de ser, no ano seguinte chegou a tempestade. Com apenas quatro vitórias durante toda a época, os piratas regressaram à Segunda Divisão. O clube estava, de novo, em risco de perder a licença da DFB devido a problemas financeiros, mas conseguiu aguentar… por pouco tempo. A segunda despromoção consecutiva veio com 17 derrotas em 34 jornadas e a penúltima posição no final da Bundesliga 2.

O St. Pauli foi, de novo, forçado a reestruturar-se, e só em 2007 conseguiu regressar ao segundo escalão. Por lá permaneceram nas duas épocas seguinte, até que, em 2009/10, voltaram a aparecer na elite do futebol germânico. Ainda assim, a estadia foi curta. A temporada foi intermitente e terminou com o clube na última posição e a dizer adeus a Holger Stanislawski, técnico que estava ligado ao St. Pauli há 20 anos. Seguiram-se 13 longos anos na Segunda Divisão e, já em 2024, o tão aguardado regresso à Bundesliga, pela mão de Fabian Hürzeler que, com 31 anos, é o treinador mais jovem das divisões profissionais.

Quando comparado com o rival da cidade, o St. Pauli é visto como a equipa “secundária”, que está bastante longe do Hamburgo em tudo: títulos, recursos financeiros e massa associativa. O maior feito do clube foi a vitória, em 2001/02, contra o Bayern Munique, que, naquela época, tinha Oliver Kahn na baliza. Essa vitória acabou por ser representativa daquilo que se vive e sente no bairro de St. Pauli, já que, do outro lado, estava um clube rico, cheio de estrelas e com muitas vitórias. No fundo, tudo aquilo que o St. Pauli não almeja alcançar.

Essa vitória foi de tal maneira importante que levou o clube a fazer uma camisola comemorativa histórica, intitulada de “Weltpokalsiegerbesieger” (“vencedores contra o campeão do mundo”, em português), que continua à venda nas lojas oficiais do clube – diga-se de passagem que estas são vistas com maus olhos por uma falange dos adeptos, que considera que o marketing e a venda da marca do clube é um fenómeno capitalista e que não vai ao encontro da comunidade.

O clube de causas que usa a caveira como símbolo

Fora das quatro linhas e longe de ver a bola a rolar, o St. Pauli é um dos clubes mais populares da Alemanha, contabilizando, em março deste ano, 40 mil sócios, como indica o seu site. A história ioiô, marcada pelas constantes subidas e descidas de divisão, é certamente um fator importante que leva os adeptos a identificarem-se com o clube. Mas há muito para além disso.

Os piratas são um clube pautado pelas causas sociais e o combate às discriminações. Politicamente conotado como clube de esquerda desde muito cedo, o St. Pauli é um dos poucos clubes do mundo que tem uma posição pública contra o machismo, a homofobia e o racismo. O St. Pauli foi o primeiro clube a proibir manifestações de extrema-direita nos seus jogos e a expulsar adeptos de extrema-direita. A luta contra o preconceito está, inclusivamente, inscrita nos estatutos do clube.

Fundado, como já vimos, em 1910, o St. Pauli teve uma origem progressista, apresentando-se como uma fonte de resistência ao Partido Nazi alemão. Quando este chegou ao poder, exigiu que os atletas judeus fossem expulsos das equipas, medida que o clube não acatou e resistiu até ser obrigado a ceder, devido à ameaça de ter de fechar.

Foi durante a década de 80 do século passado que o “clube de culto” começou a ter verdadeiramente essa definição. Um grupo de adeptos conhecido como “black block” começou a juntar-se nas bancadas do Estádio Millerntor, depois de a cidade ter sido tomada pelas discussões em torno de terrenos que estavam ao abandono e eram ocupados por pessoas sem casa e trabalhadores. A partir daí, os adeptos lideraram um movimento que visava expulsar o fascismo de dentro da claque, proibindo a venda de bilhetes e a adesão de sócio a pessoas que tivessem ligações à extrema-direita.

O grupo de apoio ao clube foi crescendo paulatinamente e começou a “seduzir” subculturas alternativas, ganhando a reputação de clube agregador e inclusivo. O grupo procurou focar-se em problemas sociais e no ativismo político, não embarcando no aumento do fenómeno hooligan que estava a acontecer na Europa.

Um dos membros do grupo intitulava-se por “Doc Mabuse”, nome pelo qual era conhecido, e foi ele que expandiu a imagem da bandeira da caveira dos ossos em formato cruzado pelo estádio e pelo clube, num dia em que se deslocava para um jogo do St. Pauli e, deparando-se com uma bandeira com uma caveira, decidiu pagá-la e levá-la para o interior do estádio. A bandeira era, na altura, símbolo dos lavradores, estando ligada à tradição dos piratas. O símbolo pretendia passar a mensagem de “pobres contra ricos” e de “trabalhadores contra patrões”, conquistando a empatia e simpatia dos mais pobres e oprimidos. O símbolo demorou a ser reconhecido pela direção do St. Pauli mas, em 1989, o clube permitiu que os adeptos criassem uma loja de fãs independente, que viralizou rapidamente. Anos depois, o clube comprou a licença do símbolo e, a partir daí, ganhou a alcunha de piratas, tornando essa uma marca da sua história.

A imagem de marca é icónica, mas no bairro onde o clube prospera, as ideias são bem mais profundas. A bandeira com o símbolo pirata está contemplada na declaração de missão do clube que, em 2009, tornou-se no primeiro emblema alemão a adotar um conjunto de princípios orientadores, aprovando uma resolução na assembleia-geral que acontece todos os anos. Nestes princípios incluem-se a promoção dos interesses de sócios, funcionários, voluntários e simpatizantes, promovendo a tolerância, o respeito e a responsabilidade social.

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A imagem de marca do St. Pauli é a caveira

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Essa é, também, uma das missivas da claque do St. Pauli. Ao observarmos um jogo dos piratas, o que mais salta à vista são as bandeiras utilizadas pelos adeptos, que vão desde Che Guevara, ao arco-íris do movimento LGBTQIA+, a mensagens contra o capitalismo e o período nazi. Para além disso, os jogadores entram em campo ao som de Hells Bells, dos AC/DC, e, aquando dos golos, escuta-se Song 2, dos Blur, bem ao estilo de um clube punk. Como parte dessa inclusão, o St. Pauli chegou a ter um presidente assumidamente homossexual durante oito anos. Caorny Littman esteve ligado à subida à Bundesliga em 2010.

Mais recentemente, o St. Pauli tornou-se no primeiro clube do mundo a tornar público o seu balanço para o bem comum, que é uma auditoria à responsabilidade social das empresas. Nesse relatório, os piratas obtiveram uma pontuação acima da média e apareceram a par de organizações pioneiras da sustentabilidade, como o Greenpeace e o Voelkel.

Nos principais projetos desenvolvidos pelo clubes estão a não inclusão de um patrocinador relacionado com apostas desportivas, a criação de diretrizes para a diversidade, a paridade de género no seu Conselho de Supervisão, a venda de produtos ecologicamente sustentáveis e produzidos de forma justa e a implementação de salsichas veganas e produzidas organicamente no seu estádio. Apesar de o seu futuro desportivo ser uma grande incerteza, o futuro do St. Pauli parece estar bem assegurado.

 
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