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A par dos atos de estadão, desenrolam-se outros mais humildes que não merecerão a cobertura da BBC, pelas congregações de munícipes e jardins de casas particulares abertos aos vizinhos para dar vivas ao Jubileu. Porque, num estilo muito inglês, os particulares foram convidados a juntar-se à iniciativa pública e a registarem-se também eles como “foliões e organizadores” do Jubileu, em espaços particulares ou públicos fechados para a ocasião© Clara Macedo Cabral
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A par dos atos de estadão, desenrolam-se outros mais humildes que não merecerão a cobertura da BBC, pelas congregações de munícipes e jardins de casas particulares abertos aos vizinhos para dar vivas ao Jubileu. Porque, num estilo muito inglês, os particulares foram convidados a juntar-se à iniciativa pública e a registarem-se também eles como “foliões e organizadores” do Jubileu, em espaços particulares ou públicos fechados para a ocasião© Clara Macedo Cabral

A par dos atos de estadão, desenrolam-se outros mais humildes que não merecerão a cobertura da BBC, pelas congregações de munícipes e jardins de casas particulares abertos aos vizinhos para dar vivas ao Jubileu. Porque, num estilo muito inglês, os particulares foram convidados a juntar-se à iniciativa pública e a registarem-se também eles como “foliões e organizadores” do Jubileu, em espaços particulares ou públicos fechados para a ocasião© Clara Macedo Cabral

Um copo de Prosecco, um cupcake e votos de um Happy Jubilee!

Em Londres desde 2005, Clara Macedo Cabral faz o balanço de quatro dias de Jubileu de Platina, com uma "cidade em polvorosa" que assistiu a um marco único e termina os festejos com um grande almoço.

Os bairros de Londres prepararam-se longamente para a festividade. Juntas de freguesia, escolas, bibliotecas, museus, cafés, restaurantes, o Ritz, o Zoo, a Ópera de Londres e até o meu cabeleireiro. Entro e saúdam-me com um “Happy Jubilee!”. “Podemos-lhe oferecer um copo de Prosecco ou um cupcake?”, perguntam. Ok. O Prosecco destoa um pouco na galhardia dos emblemas nacionais, mas é um estrangeirismo pacifico, revelador do cosmopolitismo de Londres. Olho em volta: o cabeleireiro está enfeitado com fitas roxas e prateadas com a imagem da rainha a acenar, naquele gesto que lhe conhecemos bem, familiar, quase imortal.

Conversas com a cabeleireira. Lembro-me de termos já comentado o que a rainha estoicamente aturou: das infidelidades de Filipe aos escândalos com o filho André. Hoje ela declara-me que Isabel II viveu para compromissos que assumiu bastante jovem, tão novinha, e correspondeu às expectativas. Concordo, ela é o espelho das melhores qualidades da nação, à cabeça das quais está a gentileza. Não há nem pode haver ninguém mais “kind” do que a rainha. Uma cliente ao lado junta-se ao paleio: a rainha é uma inspiração, a espinha dorsal da nação, fez um trabalho incrível. Por ali não há vozes discordantes, só unanimidade. Estou ciente de que o acontecimento dá asas a sentimentos nacionalistas, e delícias por se ter nascido num país e cultura maiores; nada disso porém me impede de me associar à festa e ao orgulho que os ingleses extraem da efeméride.

São roxas as fitas suspensas do cabeleireiro como é roxo o logo criado para marcar o Jubileu. Por estes dias, o logo anda por todo o lado. Vi-o pela primeira vez nos crachás distribuídos pela escola do meu filho. Nos painéis em frente do palácio de Buckingham, nas montras das lojas de comércio, hasteado lado a lado com a bandeira nacional, por Regent Street ou em Piccadilly, lá estava a cor deste Jubileu: o roxo.

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E qual é o programa de festas? O programa é basicamente comer e beber em conjunto, mostrando o “Merry” do Jubilee como se mostra o “Merry” do Christmas. Mostrando o júbilo de um povo grato e orgulhoso da rainha que tem. Gratidão e orgulho.

Vai-se comer e beber muito. Em alguns bairros de Londres vão-se arrastar mesas e cadeiras para a via pública, para um banquete de iguarias, paladares e pratos que os ingleses se habituaram a confecionar e a saborear uma vida inteira, cada vez que há festa.

À hora do chá, vão ser servidos o Victoria sponge cake, as sandwiches com pepino, os scones com clotted cream e compota, tudo abundantemente regado com chávenas de English tea (a extravagância tem o nome de Afternoon Tea mas durante o Jubileu passou a chamar-se Royal Afternoon Tea).

Vai-se também dar muito à sola, descendo as ruas centrais de Londres, que incluem Saint James´s Street, Downing Street e a área de Whitehall onde está sedeado o governo britânico, agitando bandeiras nacionais, até se desaguar no palácio da rainha, onde as massas se acotovelam para espreitar paradas, desfiles e mini-carnavais orquestrados ao milímetro durante vários meses de ensaio.

É necessária energia para a euforia. Energia para as festas de rua, algumas com danças de swing, hip hop, Bollywood e street dance. No intervalo, as pessoas sentam-se à espera ou a recuperar o fôlego, por onde arranjarem espaço, escadas, parques ou bermas da estrada.

Comer, beber, dançar em conjunto. A ideia do “coming together”, do arregimentar das massas é muito importante. Tudo é pretexto para aumentar a festa, torná-la mais ruidosa, estendê-la a todos os súbditos, nos mais recônditos cantos do reino. E assim tem sido. Muitos fãs e simpatizantes da rainha convergiram para a capital em camionetas, carros, e até em aviões fretados em países da Commonwealth, aterrados no aeroporto de Londres só para o Jubileu; vieram juntar-se aos londrinos que por cá ficaram e não foram tentados por um fim de semana excecional.

Quinta-feira, tudo começou com os atos mais oficiais e solenes: o “Trooping the Colour”, tradicional parada militar que termina com os aviões da RAF a riscarem o céu com as cores da bandeira nacional pelo Mall, a avenida que conduz ao palácio de Buckingham. Sexta, a pompa e circunstância continuou com um serviço religioso na Catedral de Saint Paul´s, em ação de graças pela vida da Rainha, a que só a ausência da homenageada entristeceu o tom.

A par dos atos de estadão, desenrolam-se outros mais humildes que não merecerão a cobertura da BBC, pelas congregações de munícipes e jardins de casas particulares abertos aos vizinhos para dar vivas ao Jubileu. Porque, num estilo muito inglês, os particulares foram convidados a juntar-se à iniciativa pública e a registarem-se também eles como “foliões e organizadores” do Jubileu, em espaços particulares ou públicos fechados para a ocasião. A ocasião é propícia para exibir os trunfos nacionais e o empreendedorismo e iniciativa privada são apanágios da cultura inglesa. Pessoas, associações, escolas, teatros e igrejas de todo o país ofereceram-se para sedear festas a celebrar o Jubileu e assim juntarem esforços na realização da grande festa nacional, emprestando-lhe o talento da organização em que muitos ingleses são mestres.

Numa sincronia retumbante que lembra o arranque dos jogos olímpicos, várias chamas foram acesas à mesma hora, em todo o Reino Unido e nas capitais dos países da Commonwealth. Fala-se em 3.500 piras que, desde as 21h45 de quinta-feira, passaram a arder na Torre de Londres, Windsor Great Park, Hillsborough Castle e nas residências da rainha de Sandringham e Balmoral. Outras chamas crepitam desde a mesma hora em todas as nações, País de Gales, Escócia, Inglaterra e Irlanda do Norte.

Os écrans de televisão britânicos estão ligados desde a manhã de quinta-feira, para acompanhar a emissão que a BBC faz em directo dos eventos com maior glamour: o Trooping the colour com 200 cavalos, 400 músicos e 1400 soldados, que todos os anos prestam a tradicional homenagem à rainha no seu dia oficial de aniversário e que desta vez teve notas adicionais e um esmero ainda maior. Os guardas vão sendo entrevistados pela BBC e falam sobretudo do orgulho e privilégio (pride and privilege) de serem parte deste tributo.

Conheço um londrino que ainda se lembra da outra festa que varreu Londres no dia em que a antiga princesa Isabel foi coroada. No dia 2 de junho de 1953, este octogenário era então um rapazinho. Dias que não se esquecem; apesar de molhado, o coronation day foi invulgarmente feliz, instilando esperança e otimismo num povo cansado das atribulações e austeridade da guerra e do pós-guerra. O que se fez naquele dia teve o vagar e o formalismo daquela época. Só a cerimónia da entronização, com todos os símbolos da monarquia, coroas, orbe, ceptro e manto, na Abadia de Westminster e presidida pelos mais altos dignatários da igreja anglicana, levou três horas, pela primeira vez tudo sendo filmado e transmitido pela BBC, nacional e internacionalmente. Teve também a marca do Império, com os desfiles que ocorreram depois pelas ruas de Londres com os súbditos da Commonwealth vestidos em exóticos trajes nacionais.

Quantas pessoas ainda restam da geração que acompanhou o começo deste longo reinado? Poucas, e embora a admiração dessa geração tenha transitado para as novas gerações, o fervor é diferente. O compromisso dos mais jovens com a rainha e a família real é de outra espécie. A monarquia é um dado inquestionável para os súbditos e nações do RU, até a Primeira-Ministra da Escócia veio publicamente declarar a sua admiração por Isabel II. O espectáculo que a família real proporciona é uma diversão muito apreciada e ninguém pensaria em desfazer-se de um regime que, além de lúdico, os conecta com a história e é fonte de receitas e admiração internacionais.

Foi com esse espírito que me tentei em vão juntar ao almoço que o meu bairro preparou para o jubileu; tarde demais, os bilhetes esgotaram. Falhei também a descida ao Mall: quando lá cheguei já as ruas de acesso estavam de tal modo congestionadas que não se podia passar. Vi, porém, muita gente com bandeirinhas, enrolados em plásticos estampados com a Union Jack, com chapéus e T-shirts com a Union Jack, e um ou outro celebrante trajado mais a rigor, elas com chapéu e os homens de fato.

Não desisti todavia de fazer uma cobertura jornalística para o Islington Gazette, que desafia as fotos dos convidados, comida, bandeiras, jogos e alegria geral para serem publicadas e ilustrar os esforços coletivos empreendidos.

Porque se trata disso, também, não apenas de foliar mas de trabalhar arduamente para que a festa organizada na perfeição fique consagrada com detalhe para a posteridade. O boletim meteorológico poderá falhar mas os súbditos não se rendem.

Há muita vaidade, honra e orgulho em causa. Porque afinal a Rainha merece tudo e muito mais.

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