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Um lobo ameaça os socialistas franceses

A primeira volta das primárias da esquerda decorre neste domingo. Emmanuel Macron não se apresenta agora a votos, mas é o político de que todos falam.

Um lobo esconde-se nas sombras do território socialista francês. Esse lobo é a jovem estrela da política francesa Emmanuel Macron. Ministro da Economia do Governo de Manuel Valls, saiu pelo seu pé, criou o movimento político En Marche! e avançou com uma candidatura à Presidência da República, sem passar pelas eleições primárias, que considera uma “aberração”.

Foi rotulado de “traidor” por colegas de Governo mas a cisão colheu, a crer nas sondagens. Macron, de 39 anos, é neste momento dono de uma popularidade invejável, liderando com 40% de opiniões favoráveis (sondagem Odoxa), e recolhe a maioria das intenções de voto na segunda volta das presidenciais, quer seja Marine Le Pen (65% contra 35%), quer seja François Fillon (52% contra 48%, sondagem Ipsos) o adversário.

Com um currículo assente na banca de investimento, o ex-estudante de Filosofia defende ideias mais liberais (na medida gaulesa) do que os socialistas, pelo que acaba por ocupar o espaço do centro político e pisca o olho ao centro-direita: François Fillon, candidato da direita, está ideologicamente colado à extrema-direita personificada pela candidata Marine Le Pen (exceto nos programas de choque que defende na Segurança Social e na Administração Pública).

Qual populista de centro, ao apresentar-se fora do sistema partidário, Macron lucra com o nevoeiro em que está escondido o seu programa político. Ou melhor, é ele o próprio programa. “É inútil ter ideias, basta bater-se nos dois campos que se opõem e fazer a síntese das contradições”, afirma Benoit de Valicourt no site Atlantico, num texto em que compara Macron à estrela da tele-realidade Kim Kardashian.

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Nos últimos dias vários dirigentes socialistas juntaram-se a um movimento que tem como eminência parda Dominique Strauss-Khan. Nada menos que o candidato preferido dos franceses em 2011, antes de ter recebido um K.O. graças a um escândalo de agressão sexual. Foi revelado há dias pela Paris Match que ambos se têm encontrado com regularidade. Mas há mais gente de peso no Partido Socialista francês que vê com bons olhos a aventura de Macron, casos de Ségolène Royal, candidata derrotada nas primárias e actual ministra do Ambiente, e do seu ex-marido e actual Presidente, François Hollande. Embora de forma oficial nada transpareça, corre que o chefe de Estado – até porque não digeriu a candidatura de Manuel Valls – simpatiza com En Marche!. E com ele 140 mil franceses, o número de adesões ao movimento, que supera em 20 mil o número de militantes do PS francês.

Perante as sondagens que teimam em deixar o candidato socialista, seja ele quem for, em quinto lugar (atrás de Fillon, Le Pen, Macron e Jean-Luc Mélenchon, o candidato da extrema-esquerda), muita tinta correu sobre a hipótese de o candidato vencedor das primárias desistir em favor de Macron.

Marine Le Pen, a líder da Frente Nacional, tem ganho espaço para a extrema-direita em França.

AFP/Getty Images

Foi com naturalidade, portanto, que na quinta-feira, no último debate antes das eleições deste domingo, Macron tenha sido escolhido como um dos alvos a abater. Arnaud Montebourg retomou uma expressão intraduzível da autoria de Martine Aubry, quando a autarca de Lille, então concorrente às eleições primárias de 2011, se referiu ao concorrente François Hollande: “Quand c’est flou, c’est qu’il y a un loup”. A tirada sobre o lobo escondido teve o condão de soltar uma gargalhada a Manuel Valls, mas sobre o rival não quis alongar-se: “Chega”. Preferiu comentar a ideia de desistir para Macron em resultado de sondagens: “Há que unir a esquerda e os franceses, mas não com velhos acordos de aparelho. Que concepção de política…”, lastimou.

Se houve diversidade neste debate, esta ficou expressa nas reacções sobre este tema. “Macron não nos dá medo. É uma criança prodígio (sic), ele partiu e irá um dia regressar” (Vincent Peillon); “Os franceses dizem-me que hesitam, que estão tentados pela candidatura de Emmanuel Macron porque há uma vontade de renovação” (François de Rugy); “Ninguém percebe coisa alguma. Qual é o seu programa?” (Montebourg); “Uma aventura clássica, com ideias desenvolvidas por Tony Blair há 20 anos” (Benoît Hamon).

Além deste receio generalizado sobre o lobo em pele de cordeiro, há ainda outro aspeto, mais caricato, que junta Macron e lobo na mesma frase. Em Dezembro, no primeiro grande comício em que se apresentou aos parisienses como candidato, o político surpreendeu pela forma exaltada como se dirigiu ao público, o que lhe valeu comparações, nas redes sociais, com Leonardo DiCaprio o ator que desempenha o papel principal no filme O Lobo de Wall Street.

É também nas redes sociais e nos media que Macron se deu a conhecer: a história do estudante liceal que desperta a paixão de Brigitte Trogneux, uma professora de francês, 24 anos mais velha, casada e mãe de uma sua colega. “Há um louco entre nós, sabe tudo sobre tudo”, reza a lenda. O resto é história: estão casados há dez anos.

Tempo frio, com possibilidade de fiasco

“Eu partilho os valores da esquerda e dos ecologistas”. Os eleitores que se dirijam neste domingo e no próximo (segunda volta) a uma das 7500 mesas de voto têm de subscrever esta declaração e pagar um euro (metade do que gastaram os eleitores que elegeram François Fillon). Se as sondagens apontam para o apuramento se decidir entre Manuel Valls, Arnaud Montebourg e Benoît Hamon, já o número de votantes é uma incógnita, mas aguarda-se entre um milhão e três milhões (em 2011, a primeira volta das primárias socialistas chamou 2,6 milhões de votantes).

Manuel Valls foi ministro do Interior e primeiro-ministro de François Hollande.

GREGOR FISCHER/EPA

À esquerda e à direita minimiza-se a importância do acto. Mélenchon apela ao boicote, porque um voto neste sufrágio é “amnistiar” os cinco anos da presidência Hollande. E Macron anunciou que não está disponível para qualquer tipo de acordo pós-primárias.

“São os eleitores que dão legitimidade (aos candidatos)”, relembra Manuel Valls. “Há sondagens e há sufrágios. As sondagens são de mil pessoas, os sufrágios podem ser de dois ou três milhões”, comenta Montebourg. O voto em massa traz não só legitimidade, mas também um dinamismo e uma mensagem de esperança que umas eleições pouco participadas não trarão.

“Menos de 1,5 milhões de eleitores e será um insucesso. Menos de um milhão é uma derrota esmagadora”, comenta o deputado socialista Christophe Bourgel. Uma derrota que fará a diferença entre eleger alguém com hipóteses de chegar à segunda volta das presidenciais ou eleger somente o próximo secretário-geral.

Aplacar a Macron-mania

Tomados reféns pela Macron-mania, como alguns jornais já titularam, os socialistas e congéneres sabem que estão a viver uma crise sem precedentes, que tem na inédita decisão, na VI República, de o presidente não se recandidatar o símbolo de um partido que perdeu uma parte significativa das bases. Desemprego, austeridade e perda de direitos e garantias dos trabalhadores, aliados aos problemas denunciados pela extrema-direita (imigração, crise dos refugiados, islamização…) e o terrorismo fazem do quinquenato de François Hollande o culminar de esperanças frustradas e mais de duas décadas em marcha lenta.

Os sete candidatos da Bela Aliança Popular – além do PS, inclui o Partido Radical de Esquerda, o Partido Ecologista e a Frente Democrata – estão cientes da gravidade do momento e são unânimes em se apresentarem como o elemento agregador, a cola da esquerda e do centro-esquerda. Mas além de Macron, que quer dinamitar uma política dominada pelos partidos (e pela ideologia), também Jean-Luc Mélenchon faz pela vida fora destas primárias ao afirmar que entre ele e Macron há um vazio. “O último argumento (socialista) era o do voto útil, mas estão atrás de mim e de Macron. Nestas condições, sem projecto e sem vantagem eleitoral, para que serve um candidato do PS?”, interroga-se.

François Fillon, o candidato da Direita, tenta não perder espaço para a Frente Nacional de Marine Le Pen

AFP/Getty Images

O líder de A França Insubmissa (reúne cinco formações partidárias, dentre as quais o Partido Comunista), que em 2016 chegou a liderar as intenções de voto da esquerda, bem gostaria que isso fosse verdade. Até porque há dois candidatos do PS que lhe disputam o espaço político – e estão no grupo dos favoritos à segunda volta. São eles Arnaud Montebourg e Benoît Hamon, dois ministros frondeurs (críticos) que saíram do Governo de Valls em litígio. Acérrimo defensor da produção nacional, o primeiro propõe uma “revolução democrática” assente num programa de investimento público e, entre outras medidas, prevê a nacionalização de um banco para “financiar a economia real”. Mas é a proposta do rendimento universal, introduzida por Hamon, a que mais controvérsia gera.

Durante um quarto de hora, o último debate serviu para os adversários políticos (à excepção do castiço Jean-Luc Bennahmias, da Frente Democrata, que encorajou o projecto) atacarem de todos os ângulos uma “quimera” (para Sylvia Pinel, a ex-ministra da Habitação e líder do Partido Radical de Esquerda) que consiste na atribuição de 750 euros por mês a cada um dos franceses maiores de idade. “São 300 mil milhões, é o equivalente ao orçamento actual. Vemo-nos nas primárias de 2021”, disse Montebourg, ao que Hamon retrucou: “Não tens o direito, isso não é sério”.

E por falar em sério, a cartada do homem sério e responsável, presidencial numa palavra, é jogada por Manuel Valls. “Não quero uma esquerda que faz promessas a crédito e que perde o seu crédito no futuro”, disse Valls a propósito da utopia de Hamon, apesar de ter no programa uma medida comparável, o rendimento decente. Este dirige-se em especial aos jovens entre os 18 e os 25 anos e tem um custo estimado de oito mil milhões.

Algures entre Valls e os dois esquerdistas estão Vincent Peillon (uma candidatura tardia deste homem que se diz herdeiro de Hollande impedirá outros voos) e o ecologista François de Rugy. O primeiro propõe uma reforma constitucional e respectivo referendo e um plano de investimento à escala europeia; o segundo tem como objectivo a transformação da França num país 100% assente em energias renováveis em 2050.

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