Sem castelos conquistados aos mouros e sem a esfera armilar: a nova identidade visual da República Portuguesa, escolhida pelo Governo para ser mais inclusiva, plural e ecológica, foi recebida com várias queixas, vindas principalmente da direita conservadora. Os partidos falam em “wokismo” e num ato criminoso, e, nas redes sociais, foram muitos os utilizadores que se quiseram juntar ao coro de críticas.
Uma dessas publicações, dá destaque ao significado de cada um dos símbolos da bandeira nacional. Refere que as cinco quinas simbolizam “os cinco reis mouros que D. Afonso Henriques venceu na batalha de Ourique”, explica que os pequenos pontos dentro das quinas são “as cinco chagas de Cristo” e destaca os sete castelos que, de acordo com o autor do post, são uma referência às “localidades fortificadas que D. Afonso Henriques conquistou aos mouros”.
A publicação sublinha também que a esfera armilar presente na bandeira corresponde ao “mundo que os navegadores portugueses descobriram” e, ainda, que as cores mais proeminentes — verde e vermelho — representam, respetivamente, “a esperança” e a “coragem e o sangue dos portugueses mortos em combate”. Será que é mesmo assim?
A nova bandeira nacional foi aprovada a 29 de novembro de 1910, semanas após a implantação da República. De acordo com a informação disponível na página oficial do Museu da Presidência da República, com a substituição do azul e branco pelo vermelho e verde pretendia-se “enfatizar” o projeto de “renascimento da Pátria”. No entanto, a aceitação da bandeira não foi um processo “pacífico” ou “imediato”, acabando por opor várias figuras conhecidas da opinião pública da altura.
O longo caminho trilhado pela bandeira nacional é explicado ao detalhe pelo Museu da Presidência da República. Ainda assim, há aspetos em relação aos quais o site não dá certezas, optando antes por recorrer “à explicação que tradicionalmente lhes é atribuída“. É o caso dos sete castelos, simbolismo que um século depois continua envolto em mistério, e que, neste esclarecimento, é associado à “incorporação do Algarve no território nacional”.
O Observador foi tirar dúvidas com um especialista: Miguel Metelo Seixas, investigador do Instituto de Estudos Medievais da Universidade Nova de Lisboa. O professor, autor do livro “Quinas e Castelos — Sinais de Portugal”, é claro: garante que “a informação é falsa”. Numa resposta enviada ao Observador, o investigador esclarece que, “como D. Afonso III foi o responsável pela conquista definitiva do Algarve e pelo uso do título dúplice de rei de Portugal e do Algarve”, criou-se “a associação simbólica da bordadura de castelos com o reino do Algarve”.
O especialista em heráldica refere mesmo que a “primeira notícia escrita” desta ligação “deve-se ao cronista Rui de Pina, no século XV”. “Mais tarde ainda, inventou-se a ideia de que os castelos da bordadura correspondiam aos castelos algarvios tomados por D. Afonso III”, acrescenta Miguel Metelo Seixas, “o que é pura fantasia“.
O investigador remata ainda que, na origem da bandeira, “a bordadura era uma diferença heráldica” criada para assinalar que o “infante D. Afonso, regedor do Reino e futuro D. Afonso III, não era o chefe da linhagem régia” (lugar que cabia ao irmão, D. Sancho II).
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Conclusão
“Pura fantasia”: é assim que o especialista em heráldica Miguel Metelo Santos classifica parte das alegações desta publicação. Os sete castelos presentes na bandeira — e que continuam a motivar muitas dúvidas — não correspondem a localidades fortificadas pelo rei de Portugal. Trata-se de uma desinformação que se arrasta há várias décadas.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.