Várias publicações que circulam na rede social Facebook partilham um artigo de um site de desinformação (o The People’s Voice Community), em que se pode ler que um grupo de cientistas neerlandeses alertou que pelo menos 35 milhões de pessoas morreram em resultado direto das vacinas de mRNA contra a Covid-19. “‘Como resultado direto…’ mas ainda existem charlatões capazes de afirmar que as ‘sopas experimentais salvaram milhões’. A justiça vai demorar muito com esses criminosos?”, questiona-se um dos utilizadores que partilhou um excerto do artigo.

Mas terão estas vacinas provocado tantas vítimas mortais? O estudo em causa foi publicado na revista científica BMJ Public Health no início de junho deste ano, e analisa o excesso de mortalidade registado em 47 países ocidentais no período compreendido entre o mês de janeiro de 2020 e dezembro de 2022, isto é, praticamente durante três anos.

No entanto, os resultados são muito diferentes daqueles que estão explanados no excerto do artigo publicado nas redes sociais. Segundo os investigadores do Centro Médico da Universidade de Amesterdão, o número total de mortes em excesso no período analisado foi cerca de 11 vezes inferior ao número avançado pelo The Peoples’s Voice Community: 3,1 milhões.

Os especialistas detalham que o excesso de mortalidade foi documentado em 41 países (87% do total) em 2020, 42 países (89%) em 2021 e 43 países (91%) em 2022. Na distribuição da mortalidade em excesso por cada um dos anos, foi em 2021 que se registaram mais mortes além do expectável — cerca de 1 milhão e 250 mil, contra cerca de um milhão em 2020 e 800 mil em 2022.

Para além da diferença em relação às mortes em excesso entre o artigo científico e o artigo partilhado nas redes sociais, há ainda uma outra diferença relevante: no estudo publicado na BMJ Public Health os investigadores não atribuem às vacinas de mRNA a responsabilidade pelas mortes em excesso. Por outro lado, referem apenas o excesso de mortalidade se manteve elevado nos países ocidentais durante três anos consecutivos, “apesar da implementação de medidas de contenção e vacinas contra a Covid-19”.

Os investigadores admitem que, nestas circunstâncias, o excesso de mortalidade “levanta sérias preocupações” e sugerem aos líderes governamentais” que investiguem “minuciosamente” as causas “subjacentes ao excesso de mortalidade persistente”. No entanto, e ao contrário do que sugerem as publicações, os cientistas não avançam nenhuma explicação para o fenómeno.

Esta não é, aliás, a primeira vez que páginas de desinformação atribuem às vacinas de mRNA contra a Covid-19 a responsabilidade pelo excesso de mortalidade durante este período.

Conclusão

O estudo citado na publicação não refere que as vacinas de mRNA contra a Covid-19 causaram 35 milhões de mortes acima do expectável entre 2020 e 2022. Nos países ocidentais, verificou-se, de facto, um excesso de mortalidade (de muito menor dimensão, na ordem dos três milhões) que os investigadores neerlandeses não atribuem às vacinas contra a Covid-19 — defendem que sejam “minuciosamente” investigadas as causas do excesso de mortalidade, mas não apontam qualquer explicação para os números que se verificaram.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: As principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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