É partilhada nas redes sociais a alegação de que um estudo encontrou um “microquimerismo masculino no cérebro de mulheres” e que “as mulheres podem absorver e guardar o ADN dos seus parceiros sexuais”. Em várias publicações, os utilizadores citam notícias recentes, identificando como fonte o site zap.aeiou. É uma afirmação enganadora. O estudo apontado é verdadeiro, mas as conclusões estão fora do contexto.
Neste texto, é citado um estudo de 2012 da Universidade de Seattle, nos Estados Unidos, e do Fred Hutchinson Cancer Research Center, um centro norte-americano fundado há quase 50 anos. É nesse estudo que se baseiam para afirmar que “as mulheres podem absorver e guardar o ADN dos seus parceiros sexuais”, mas erradamente.
O médico Marcelino Mota, sexólogo e especialista em Psicologia Clínica, explica ao Observador que o microquimerismo diz respeito à “presença de ADN de um indivíduo num outro geneticamente diferente”. No caso da mulher, “a gravidez é a principal causa de microquimerismo, dada a troca bidirecional natural entre mãe e feto (as células fetais podem ultrapassar a barreira hematoencefálica) e, neste caso, um feto do sexo masculino”.
Na publicação, é descrito que, ao analisar o cérebro de um grupo de mulheres, uma equipa de cientistas norte-americanos descobriu que o cérebro feminino “registava com frequência episódios de microquimerismo masculino”. Na descoberta de 2012, era apontada “a presença de fragmentos de ADN vindos de um dador masculino, geneticamente diferente das células do organismo da mulher”.
De acordo com o estudo, que está publicado no site do jornal PLOS ONDE, foram examinados os cérebros de 120 mulheres entre os 41 e os 71 anos. Dessas, 21% das mulheres registavam microquimerismo masculino. Os utilizadores passam a conclusões: “Este microquimerismo foi encontrado em várias regiões do cérebro, o que significa que 21% das mulheres têm células com ADN masculino a ‘viver’ nos seus cérebros”. Está certo, mas só até certo ponto, porque falta contexto a esta alegação.
Na conclusão do estudo “Male Microchimerism in the Human Female Brain” (“Microquimerismo masculino no cérebro feminino humano”, podemos ler que, nos humanos, é observado naturalmente microquimerismo em vários tecidos e órgãos. E chegamos ao objetivo do projeto: “Neste estudo, quantificamos o ADN masculino no cérebro das mulheres como um marcador do microquimerismo de origem fetal”, ou seja, a aquisição de ADN masculino enquanto grávida de um feto masculino. Assim, conclui-se que este tipo de microquimerismo está presente em várias regiões do cérebro.
O médico Marcelino Mota explica que isto acontece porque “as células fetais podem ultrapassar a barreira hematoencefálica”. Assim, é errado especular que a presença de ADN masculino nas mulheres seja devido a relações sexuais. Em resposta à Agência Reuters, um dos autores do estudo de 2012, William F. N. Chan, explica que é “errado e enganador afirmar que as relações sexuais levam a microquimerismo”.
O estudo em causa explica que o ADN masculino encontrado no cérebro de mulheres é, “muito provavelmente”, de gravidezes com um feto masculino. Assim, o estudo não conclui que as mulheres armazenam ou absorvem o ADN masculino através de relações sexuais.
O autor William F. N. Chan explica à Reuters que, no estudo, “tal como noutros realizados anteriormente, nós apenas especulamos sobre o microquimerismo através de relações sexuais”. E acrescenta que “essa possibilidade existe, mas ainda não foi testada (nem provada)”.
Conclusão
É enganador afirmar que o cérebro da mulher absorva o ADN do homem depois de relações sexuais. O estudo em causa apenas se debruça no ADN vindo de fetos masculinos aquando da gravidez.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:
PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.