“Os ladrões têm prémios.” É assim que começa a mensagem que está a ser divulgada na internet, que afirma que, atualmente, o antigo presidente e fundador do BCP terá conseguido do banco um acordo de reforma de 167 mil euros mensais, agregado a outros benefícios.
Esta afirmação poderia ter sido verdadeira, não fosse ter sido publicada a 18 de janeiro deste ano. Atualmente, Jardim Gonçalves recebe 49 mil euros por mês de reforma, pagos com fundos privados. Mas nem sempre foi assim.
Batalha judicial entre BCP e o ex-presidente do banco que durou 10 anos
Jardim Gonçalves teve, de facto, uma reforma que inicialmente rondava esse valor e que chegou mesmo a atingir os 174 mil euros. A pensão — suportada em 40% pelo fundo de pensões do BCP e o restante (cerca de 100 mil euros) pela companhia de seguros Ocidental, detida pelo banco e pela Ageas — começou a ser paga ao banqueiro em 2005.
Em 2011, o banco, presidido então por Carlos Santos Ferreira, interpôs uma primeira ação judicial contra o empresário, no Tribunal de Sintra, por não concordar com o valor atribuído a Jardim Gonçalves (que esteve à frente do BCP entre 1985 e 2005), alegando que o montante superava o limite máximo auferido por ex-administradores ainda no ativo.
Dois anos depois de receber o processo, o Tribunal de Sintra alegou que, por se tratar de assuntos comerciais, não teria competências para avaliar o caso. O banco recorreu para o Tribunal da Relação que, num primeiro momento, deu razão ao Tribunal de Sintra. Volvidos quatro anos, voltou atrás na decisão, e o dossier regressou às mãos da primeira instância.
O corte de 2/3 da reforma alcançado fora dos tribunais
O julgamento, que arrancou em 2015, só ficou concluído três anos depois por parte de Sintra, que deu razão a Jardim Gonçalves e permitiu-lhe manter a reforma que recebia, assim como as restantes regalias a que teria acesso. Mas o BCP não atirou a toalha ao chão e, já sob a liderança de Miguel Maya, decidiu recorrer novamente ao Tribunal da Relação que, em 2020, alterou a rota do processo, dando razão ao banco. Assim, o fundador do banco teria de abdicar de dois terços da pensão e deveria ainda devolver o valor correspondente recebido a mais até àquela data.
Desta vez foi o antigo presidente do Banco Comercial Português a tomar uma posição no processo e, em março de 2020, recorreu ao Supremo Tribunal de Justiça, por insistir que tinha direito à pensão auferida, afirmando que era o que estava definido entre as duas partes.
Sete meses depois, em dezembro de 2020, antes de o Supremo se pronunciar, o Banco Comercial Português e o antigo presidente da instituição acabaram por chegar a um acordo extrajudicial, que levou o banqueiro concordar com o corte de dois terços da reforma, abdicando ainda das regalias adicionais, como motorista e segurança pessoal. Jardim Gonçalves passou assim a receber 49 mil euros mensais, mas não teve de restituir o valor excedente recebido até à data, como tinha decretado o Tribunal da Relação.
Ao semanário Expresso, o BCP explicou então que o acordo alcançado foi semelhante a outros que envolveram ex-administradores do banco, tendo como base o Código das Sociedades Comerciais, que determina que as pensões atribuídas pela instituição não podem exceder o salário máximo antes atribuído aos agora ex-administradores no ativo.
Conclusão
A publicação do passado mês de janeiro que indica que Jardim Gonçalves, ex-presidente do BCP, recebe uma reforma de 167 mil euros é falsa. Apesar de o banqueiro ter auferido esse valor quando deixou a liderança da instituição, a pensão foi cortada em dois terços, em 2020, por mútuo acordo. Jardim Gonçalves ficou a receber, a partir dessa data, 49 mil euros por mês, pagos pelo banco, perdendo direito a outras regalias — motorista e segurança — mas evitando a restituição do valor excedente recebido até esse momento.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.