A publicação recorre a uma fotografia de Bill Gates para deixar no ar uma questão hipotética. Lê-se, no texto escrito em inglês, que se deve tratar de uma “coincidência” que na última década não se tenha registado “um único caso de malária transmitido por mosquitos”, até que “aparece uma companhia fundada” pelo dono da Microsoft que quer “resolver um problema que não existe”. É precisamente nesse momento que, acrescenta o autor deste post, “do nada, no exato lugar onde ele [Gates] liberta mosquitos surge um surto de malária”.


A publicação, originalmente partilhada no Twitter mas entretanto replicada em redes sociais como o Facebook, parece estar a referir-se aos cinco casos de malária registados nos Estados Unidos da América (EUA) há cerca de um mês — os primeiros contágios locais da doença no país em duas décadas — e que levaram o Centro de Controlo e Prevenção de Doenças norte-americano a emitir um alerta.

É verdade que Bill Gates tem sido, nos últimos anos, uma das figuras mais vocais na luta pela erradicação de doenças como a tuberculose ou a malária. Em relação à malária, em particular, a Fundação que criou — juntamente com a sua (agora ex) mulher Melinda Gates — já apoiou financeiramente vários projetos de investigação focados na doença. É o caso da empresa de biotecnologia Oxitec, que investe na sequenciação do vírus para identificar mutações e formas de combate à malária.

A Oxitec é uma empresa norte-americana com sede e instalações no Reino Unido, a poucos quilómetros da Universidade de Oxford. Ao longo dos últimos anos, recebeu bolsas de investigação da Fundação Bill & Melinda Gates, relacionadas com investigações de malária na África e na América Central. Essa informação pode ser confirmada na página da instituição criada pelo fundador da Microsoft. Ainda no ano passado, a empresa foi apoiada com um investimento adicional de 18 milhões de dólares — quase 18 milhões de euros — para financiar um projeto-piloto nas duas regiões referidas.

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Em simultâneo, a Oxitec está a trabalhar num projeto nos Estados Unidos, que consiste na libertação no estado norte-americano da Florida de milhões de mosquitos geneticamente modificados da espécie Aedes aegypti — também conhecido como mosquito da febre amarela, como esclarece a página do Centro Nacional de Informação Biotecnológica dos EUA. O objetivo desta investigação passa por controlar doenças tropicais na região, como zika ou dengue. Ainda assim, o projeto em questão não está relacionado com a malária, nem é diretamente financiada pela organização criada pelo fundador da Microsoft. Foi também aprovado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (US Environmental Protection Agency — EPA), como se pode ler na revista científica Smithsonian.

Esta informação é corroborada pela própria empresa de biotecnologia numa resposta enviada ao Observador. Um porta-voz da Oxitec garante que “não há qualquer verdade nas alegações” em questão, sublinhando que “nenhum trabalho da Oxitec baseado nos EUA é fundado pela Fundação Bill & Melinda Gates”. Esclarece, ainda, que a investigação que está a ser desenvolvida no estado da Florida tem como base o já referido “Aedes aegypti — uma espécie de mosquito que transmite dengue, chicungunha, febre zika e febre amarela — mas não a malária”, doença que, adianta, é “transmitida na Florida através de mosquitos Anopheles infetados”. O porta-voz da empresa escreve ainda, nesta resposta, que “a Oxitec não desenvolve trabalho relacionado com a malária nos Estados Unidos”, sublinhando que toda esta informação está disponível na página oficial da EPA.

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Ao Observador, o porta-voz da Oxitec confessa ainda saber que “existem muitos tweets e posts nas redes sociais” a fazer alegações semelhantes, que “não são legítimas”, mas, antes, “teorias da conspiração” publicadas por pessoas “sem passado científico, qualificações ou dados credíveis”. Adianta ainda que seria “cientificamente impossível” que a espécie Aedes aegypti, com a qual a companhia trabalha, seja “portadora de malária”, e esclarece que a Oxitec trabalha “com mosquitos 100% macho”, que, ao contrário dos mosquitos fêmea, “não são portadores de doenças, nem picam humanos”.

Também a Fundação Bill e Melinda Gates garante que “é falsa” a alegação que liga o trabalho desenvolvido pela organização aos casos de malária reportados nos Estados Unidos. Numa resposta enviada ao Observador, a Fundação escreve que “não financia nenhum trabalho que envolva a libertação de mosquitos” em território norte-americano. Acrescenta ainda, neste esclarecimento por email, que a erradicação da malária “tem sido uma prioridade da fundação há mais décadas” e que se mantém “comprometida em dedicar recursos e conhecimento” para “acabar com a doença de forma definitiva”.

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De resto, importa recordar que Bill Gates é frequentemente alvo de desinformação nas redes sociais, em particular sobre o papel que teve no financiamento da vacinação contra a Covid-19, através da Fundação Bill e Melinda Gates – instituição filantrópica criada pelo fundador da Microsoft e pela ex-mulher Melinda Gates.

Conclusão

É falso que um projeto com financiamento da Fundação Bill e Melinda Gates Social seja responsável pelos casos de contágio de malária registados nos Estados Unidos. A instituição filantrópica do fundador da Microsoft não apoia projetos relacionados com o vírus da malária que tenham sede no território norte-americano. A Oxitec, responsável por uma investigação que prevê a libertação de mosquitos geneticamente modificados, conta, sim, com financiamento da Fundação, mas também não trabalha com a doença nos Estados Unidos. O trabalho desenvolvido na Florida está apenas relacionado com mosquitos portadores de vírus como dengue ou zinka. Questionadas pelo Observador, tanto a Oxitec como a Fundação desmentiram a publicação em análise.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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