Em janeiro de 2019, começaram a ser partilhadas publicações que afirmavam que o aborto tinha sido legalizado até ao último dia de gravidez em Nova Iorque. Mas, dois anos depois, essa ideia continua a ser difundida pelas redes sociais. Os posts detalham mesmo que governador do estado, Andrew Cuomo, assinou uma lei que permite o aborto na véspera do nascimento e afirmam que um “feto não é uma pessoa” já que uma pessoa é “um ser humano que nasceu e está vivo”.
Mas não é verdade que essas alterações legais tenham ocorrido: houve de facto uma alteração da lei do aborto, em janeiro de 2019, que despenalizou o aborto a qualquer momento da gravidez também nos casos em que os fetos revelem não ter condições para sobreviver depois do parto — tal como acontece em Portugal. Já antes era possível interromper a gravidez nos casos em que a vida da grávida estava em risco.
No dia 22 de janeiro de 2019, o governador Cuomo assinou uma legislação sobre o aborto, a Lei da Saúde Reprodutiva, que gerou algumas críticas e especulações. Algumas publicações no Facebook chegam mesmo ao ponto de partilhar imagens de bebés, supostamente acabados de nascer e com um corte no pescoço — é este o método, segundo os autores, utilizado para realizar o aborto.
Esta lei veio trazer algumas alterações como, por exemplo, retirar o aborto do Código Penal, tornando-o num problema de saúde pública e não num crime. Mas a alteração mais controvérsia foi outra. É que esta lei vem permitir que um profissional de saúde possa “realizar um aborto quando, de acordo com uma avaliação profissional razoável e com a boa fé do médico, baseado nos factos do caso de cada paciente” se “a paciente estiver nas vinte e quatro semanas de gravidez, se não houver viabilidade fetal — isto é, não houver capacidade de um feto sobreviver fora do útero — ou caso o aborto seja necessário para proteger a vida ou a saúde da paciente“.
De acordo com o Politifact, o fact-checker do The Poynter Institute, antes desta lei, as mulheres em Nova Iorque só podiam abortar por decisão própria até às 24 semanas — em Portugal, isso é possível até às 10 semanas — ou, para fazê-lo após as 24 semanas de gravidez, as suas vidas teriam de estar em perigo. Aquilo que mudou em janeiro de 2019 foi o facto de passar a existir mais um critério para a mulher poder interromper a gravidez após as 24 semanas de gravidez: a gravidez pode ser interrompida depois desse período caso se verifique uma “ausência de viabilidade fetal” e não só se a vida da paciente estiver em risco.
Assim, as publicações que circulam sobre o tema são simplistas porque não explicam os critérios para abortar no seu global. Na verdade, já antes da assinatura desta lei, em janeiro de 2019, as mulheres de Nova Iorque podiam realizar um aborto até ao último dia da gravidez desde que a sua vida estivesse em perigo. A diferença é que agora podem também fazê-lo se não houver viabilidade fetal.
Esta não é a primeira vez que uma alteração à lei do aborto é mal interpretada. Em agosto de 2020, também surgiram no Facebook dezenas de publicações a alegar que França tinha permitido o aborto até ao final da gravidez. À data, tinha sido aprovada uma emenda à lei em vigor, que apenas acrescentava mais um critério para a interrupção médica da gravidez, que já podia ser realizada anteriormente até ao final da gestação. Só que, antes, só acontecia se o feto tivesse uma doença grave e incurável ou se a saúde da mãe estivesse em sério risco. Com a alteração de lei, o sofrimento psicossocial passou também a integrar a lista dos critérios elegíveis.
Fact Check. França legalizou aborto até ao final da gravidez?
Conclusão
Publicações afirmam que o aborto tinha sido legalizado até ao último dia de gravidez, em Nova Iorque. Mas não é verdade: houve de facto uma alteração da lei do aborto, a janeiro de 2019, que despenalizou o aborto a qualquer momento da gravidez, mas apenas para os casos em que os fetos são inviáveis — tal como acontece em Portugal.
Antes desta lei, as mulheres em Nova Iorque só podiam abortar por decisão própria até às 24 semanas. Para o fazer após as 24 semanas de gravidez, as suas vidas teriam de estar em perigo. Aquilo que mudou em janeiro de 2019 foi que o aborto pode ser interrompido depois desse período também caso se verifique uma “ausência de viabilidade fetal”.
Assim, as publicações que circulam sobre o tema são simplistas porque não explicam os critérios no seu global e induzem em erro os utilizadores. Na verdade, já antes da assinatura desta lei, as mulheres de Nova Iorque já podiam fazer um aborto até ao último dia da gravidez desde que a sua vida estivesse em perigo. A diferença é que agora podem também fazê-lo se não houve viabilidade fetal.
Assim, segundo a classificação do Observador, este conteúdo é:
ENGANADOR
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.