Olhando para as freguesias por este país fora, uma coisa é comum a todas! São raros os eventos no espaço público que não sejam organizados ou patrocinados pelas freguesias… Se há contextos em que tal tem lógica, como é o caso das festividades locais, noutros nem tanto! Esta exclusividade organizacional é absolutamente limitadora da liberdade, pois deixa no poder local o critério de definir o que pode ou não acontecer.
Ao fim de mais de quatro décadas de liberdade, as pessoas continuam a olhar para o poder local sempre que querem algo a acontecer nas suas freguesias! Isto acontece porque politicamente este foi o caminho seguido nestes últimos 40 anos… Uma mera continuação dos 40 anos anteriores, em que o Estado tudo organizava e tudo controlava, em que a iniciativa dos cidadãos era constantemente limitada e que não sendo agora proibida, enfrenta enormes barreiras, difíceis de ultrapassar pelo comum português.
As pessoas estão habituadas a que tudo o que se passa seja “gratuito”! E esse é o primeiro impedimento à iniciativa privada… A realidade é que os eventos organizados por uma freguesia não são gratuitos, são, sim, pagos por via dos nossos impostos, por via da enorme carga fiscal que todos transportamos! Ao invés de ficar ao critério de cada um o interesse num evento, fica ao critério do poder local a decisão do que cada um de nós quer ou não ver, dependente de interesses políticos e não de interesses pessoais e particulares.
Torna-se impossível a qualquer privado concorrer com uma freguesia! Seja pela disponibilidade dos meios e infra-estruturas necessários ao desenvolvimento de actividades locais, que para um privado significam custos elevados, quer seja pelo conhecimento dos processos burocráticos associados ao desenvolvimento e promoção de eventos no espaço público.
Esta situação piora quando analisamos casos de prestação de serviços continuados. Neste caso, o poder local torna-se num concorrente impossível de acompanhar, quer pelos preços praticados para a prestação de serviços, quer pela visibilidade que consegue ter junto dos cidadãos.
São muitas as freguesias que disponibilizam serviços de apoio aos mais idosos, especialmente àqueles que são mais carenciados! Apenas a título de exemplo, vamos considerar um serviço de pedicure ao domicílio. Existem enormes problemas associados aos diabetes que são fruto de um mau cuidado da saúde dos pés dos mais idosos, e algumas freguesias disponibilizam um pedicure que vai a casa destas pessoas cuidar e tratar da saúde dos seus pés!
Ora, nesta demanda das freguesias pela prestação destes serviços, fica de fora uma questão essencial, a liberdade de escolha! Assim, a freguesia disponibiliza um serviço de baixo custo, contratado directamente, com uma base de “clientes” enorme. Este serviço é concorrencial com todos e todas as pedicures locais que fazem o mesmo serviço e que, obviamente, têm que cobrar valores mais elevados. Com o decorrer do tempo, os serviços de pedicure locais deixam de existir, pois não conseguem acompanhar o preço do serviço prestado pelas juntas de freguesia. Ficam assim as pessoas prejudicadas, pois ficam sujeitas a um único prestador, nas regras definidas pela Junta de Freguesia e dentro da disponibilidade que a mesma considere que seja a melhor.
Não interpretem mal! A prestação destes e de outros serviços é essencial e é extremamente positivo que as juntas de freguesia garantam que todos têm acesso a este tipo de cuidados. Mas podem fazê-lo financiando diretamente os fregueses, de modo a que estes obtenham os mesmos cuidados. Assim, cada um pode escolher o seu ou sua pedicure. O valor da comparticipação mantém-se idêntico ao da prestação, não afetando a liberdade de escolha de cada um e retirando as freguesias de um processo concorrencial com os particulares.
Neste país, onde as freguesias tudo fazem, tudo podem e tudo organizam, só existe espaço para aqueles que lhes caem nas boas graças e que se sujeitam aos compromissos políticos que lhes são pedidos. Para desenvolver um negócio local, não basta disponibilizar serviços, há que procurar as boas graças do poder. E essa necessidade cria as bases para a corrupção ao nível local. Não são raras as vezes que particulares são postos na posição de assumir compromissos políticos de que deveriam estar totalmente libertos, de modo a conseguirem avançar com os seus projectos e com a sua actividade.
E é aqui, a este nível mais baixo da esfera de poder, que começa a corrupção e a limitação da liberdade. Uma freguesia tem que ser, antes de mais, um elemento dinamizador da actividade local, suportando os fregueses nos seus projectos, dando-lhes o palco e a atenção que merecem e estando na retaguarda como suporte às suas actividades. As pessoas devem voltar a ser o centro da atenção. São os fregueses que devem ser promovidos e não os órgãos de poder local…
O poder local existe para servir as pessoas e a sociedade e não para servir os interesses de partidos ou de ideologias. Se queremos mais liberdade, mais democracia, mais capacidade de iniciativa, temos que retirar o protagonismo do poder local e colocá-lo de volta no mais importante: nos cidadãos.