(Nota: à velocidade a que a tecnologia evolui este artigo de opinião pode estar desatualizado na data da sua publicação) 

A pretexto da descarbonização e das alterações climáticas, a UE pretendeu proibir o motor a combustão interna a partir de 2035. Trata-se de uma imposição sem qualquer fundamentação técnica, económica e social, que não distingue o motor a combustão interna do motor a combustão interna “de combustíveis fósseis”. Ou seja, o motor a combustão interna não tem que funcionar forçosamente à base de combustíveis fósseis, mas pelo contrário, pode funcionar com combustíveis alternativos como por exemplo, hidrogénio ou combustíveis sintéticos – solução esta com origem na Segunda Guerra Mundial e inventada pelos alemães por não terem recursos para a produção de combustíveis para manter o esforço de guerra, já tem a rede de distribuição e abastecimento montada e as adaptações dos motores são mínimas. Mas estão em estudo outras hipóteses: ainda recentemente um avião comercial ligou Heathrow (Londres) a Nova Iorque com combustível à base de 88% de gorduras residuais + 12% açúcar vegetal. A Ciência e a Tecnologia, demonstraram assim a capacidade de criar soluções e preservar a necessária liberdade de escolha! Sem qualquer argumento válido, a imposição de “tudo elétrico” significa que o consumidor fica impedido de escolher a ferramenta que mais se adequa às suas necessidades. É como se só fosse permitida a chave de fendas para pregar pregos. Pior ainda, esta imposição abre as portas e estende a passadeira vermelha a uma das maiores ameaças para a economia e indústria europeia, face à capacidade de a China produzir mais e mais barato. Historicamente, os erros repetem-se: o mundo ficou dependente do preço do petróleo (choque petrolífero de 1970), quando as suas necessidades ficaram dependentes exclusivamente do petróleo. A Europa ficou refém do Nord Stream (conduta proveniente da Rússia que abastece a Europa com gás) e agora deixou-se ficar prisioneira da sua decisão pela mobilidade só elétrica. Diz a sabedoria do povo: “Não guardar todos os ovos no mesmo cesto”. Pelo contrário, os burocratas escusaram-se de trabalhar com a Ciência para uma solução diversificada e capaz de responder a todo o momento às necessidades energéticas. Assim, grande parte da UE ficou dependente do gás que vem da Rússia pelo qual paga milhares de milhões de euros – a alternativa é não haver energia para aquecimento. Assim, aos nossos parceiros da Europa do Norte, já que têm frio e um clima agreste e precisam do gás russo, dá vontade de os convidar para virem instalar as suas fábricas nos países do Sul onde o clima é mais ameno, sobretudo em Portugal onde há Sol quase todo o ano, ou seja, naqueles PIGS que esbanjam o dinheiro nos copos, patuscadas e em mulheres – conceito altamente ofensivo para as mulheres que parece demonstrar que lá no seu íntimo, nos países do Norte da Europa, a mulher ainda é encarada como recurso de diversão. E a propósito de PIGS, este bullying tecnocrata mostra bem como o conceito de “União” é desprovido de sentido.

A realidade presente

A inexistência de uma solução energética europeia e as deliberações sem sentido evidenciam uma UE dividida, facilmente ultrapassável no contexto financeiro, económico, industrial, político, militar e geoestratégico e também no contexto da energia e levou a que os políticos em Bruxelas corram agora a apagar fogos que durante anos deixaram atear e propagar. Quando era rapazola tinha uma professora que dizia “tão ladrão é o que rouba como o que fica em casa a ver roubar”. E foi isto que a UE fez: deixou-se ficar (inconsciente sobre as consequências ou deliberadamente?) a ver a crescente industrialização da China e a assistir ao aumento da sua capacidade de produção, e ainda por cima não combateu a deslocalização de fábricas para a China e para outros países do Médio Oriente e do Extremo Oriente na mira de, com mão-de-obra barata, as empresas obterem mais lucros (e para talvez pagarem mais impostos). As fábricas foram para lá, os desempregados ficaram cá, mas o know-how também seguiu a tiracolo e com o qual a China e outros países asiáticos se enriqueceram tecnicamente e cientificamente e atualmente desdenham os progressos tecnológicos europeus. Sabem fazer o mesmo ou melhor e mais barato. Por exemplo, onde é agora fabricado o material elétrico da Siemens, da Hager, da Schneider, etc.?

Descarbonização e alterações climáticas

Estes conceitos são muito modernos e ficam bem no papel como por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A realidade que lhe está associada é bem diferente. Mas parece que algures entre 1948 e a atualidade, a Humanidade se esqueceu dos seus compromissos. Concretamente relativamente à Descarbonização e Mobilidade e a preservação do nosso planeta. Apesar de quase todos os países ratificarem o Acordo de Paris, incluindo a China, esta aposta cada vez mais no carvão. Em escassos meses,  com capacidade 10 vezes superior à das antigas centrais de Sines e do Pego juntas [1]. Este país é agora o maior produtor mundial de carvão e o maior poluidor do mundo — é responsável por mais de um quarto das emissões globais de gases com efeito de estufa, de acordo com o Global Carbon Atlas. Na Europa estamos muito felizes por 10% da energia elétrica já ser proveniente das energias renováveis. Cabe aqui perguntar. Quantas toneladas de CO2 são emitidas para o fabrico de equipamentos para a defesa do ambiente e para a luta contra as alterações climáticas? Enquanto aguardamos a resposta, olhemos de novo para a China: tem constrangimentos técnicos, como por exemplo o transporte e energia em alta tensão, e apostam fortemente nas energias renováveis. O seu compromisso de descarbonização (de quê?) a alcançar em 2060 em nada nos tranquiliza, com a agravante de reivindicar os mesmos duzentos anos de poluição em que os países ocidentais produziram e poluíram durante a sua Revolução Industrial e consequente atividade. Era bom que a China esclarecesse se pretende satisfazer esta reivindicação, para que as suas consequências sejam atempadamente acauteladas e mitigadas. Além disso, para manter o seu poderio industrial e a produção de energia elétrica, volta a olhar para a energia nuclear, assim como todos os países que ratificaram o Acordo de Paris. Ora aí está a solução milagrosa que nos vai permitir dormir descansados (possivelmente o sono Eterno). Ainda no contexto da política de Descarbonização, que tanto tem atacado a indústria automóvel, e levou à obrigatoriedade da mobilidade só elétrica, é preciso ter em conta os seguintes valores: Por KWh produzido, a Alemanha emite 394 g CO2, seguida da Itália com 299 g CO2 e pelo Luxemburgo com 254 g CO2. Por sua vez, Portugal anda perto das 250 g CO2/KWh (dados de 2022). Ora, quanto mais EVs existirem, ou outros equipamentos “verdes” para qualquer utilização a que se destinam, maior a necessidade de energia elétrica e mais toneladas de CO2 serão emitidas para a atmosfera pelas centrais forçosamente de combustíveis fósseis ou nucleares, porque apesar de todos os esforços, ainda são as soluções que permitem satisfazer as necessidades de energia elétrica em quantidade, qualidade e de maneira contínua. As necessidades de energia elétrica já conseguem ser parcialmente satisfeitas por algumas soluções com recurso a energias renováveis que dependerem dos caprichos da Natureza. Tal como os sistemas solares de aquecimento de água necessitam de caldeira a gás, como sistema de apoio, a energia elétrica ainda tem que ser produzida pelas centrais acima referidas. Atualmente, e a nível mundial, existem 1300 milhões de veículos a combustão interna. Imaginem-se as toneladas de emissões para a atmosfera, se todo este parque automóvel fosse elétrico e as centrais a carvão (ou nucleares) tivessem que adaptar a sua produção de energia elétrica para todos estes milhões de veículos. É conhecido que a Descarbonização da produção da energia elétrica é algo que com a tecnologia atual, só conseguirá ser alcançada daqui a 80 anos. Não contesto que quanto mais cedo se iniciar, certamente mais investidores teremos em projetos credíveis e a tecnologia evoluirá mais depressa. Aquele prazo poderá (eventualmente) ser fortemente reduzido. Por enquanto terminar com o motor a combustão interna em 2035, é mais uma data que é “atirada para cima da mesa” para acalmar os ambientalistas. Acontece que o início da Descarbonização da produção de energia elétrica já se iniciou há bem alguns anos com a energia eólica, solar fotovoltaica, solar para produção de água quente e da energia das marés. Mas por enquanto estes sistemas são instáveis devido à dependência dos fenómenos da Natureza que lhes é inata. Na indústria automóvel, as emissões de CO2 têm vindo a diminuir fortemente com a evolução tecnológica. Portanto, a tecnologia está a evoluir e a ciência está a esforçar-se por emitir produtos da combustão menos poluentes. Porém, para que todos os processos se realizem, é necessária energia elétrica. E esta tem origem maioritariamente em combustíveis fósseis, designadamente centrais de produção de energia elétrica a carvão. É esta uma das verdades escondidas dos EVs que usurpam a designação de “mobilidade verde”. Na China, já chegaram ao inevitável impasse dramático: foram dados incentivos (sessenta mil milhões de dólares) para aquisição de viaturas elétricas para despoluir as cidades, e por outro lado aumentaram o número de centrais de produção de energia elétrica a carvão para fazer face às necessidades da mobilidade elétrica. E pergunto: Face a todo este enquadramento, o problema é o meu carro a gasóleo de 1994, quando a comunidade técnica e científica presentemente apenas consegue propor a energia nuclear como alternativa à Descarbonização, para produção de energia elétrica em grande quantidade para satisfazer o consumo doméstico e a indústria? Se queremos descarbonizar já e a sério (que parece ser a exigência dos ambientalistas), comecemos por deitar fora os EVs, os telemóveis e a internet e tudo o que nos dá conforto e utilidade pela eletricidade e começar a utilizar pombos-correio, e quanto à mobilidade regressemos às carroças dos tempos dos nossos avós e bisavós puxadas por juntas de bois, ou cavalos ou burros. Senão, se não queremos prescindir do conforto moderno, temos que pacientar até chegarmos ao “Eureka” que nos salvará. Entretanto, reveste-se de uma flagrante injustiça e de falta de respeito, as acusações ansiosas sobre a urgência de combater a influência da atividade humana nas alterações climáticas, e que “nada se fez e nada se faz”, face ao esforço tecnológico já desenvolvido. É urgente sim, mas não esqueçamos que mulheres grávidas morrem à porta de urgências fechadas. Que urgências são prioritárias, e quais as que podemos resolver de imediato? Produção de energia elétrica com recurso a Centrais Nucleares? Quem exige soluções e se manifesta pela urgência de uma solução e pela crítica avulso e demagógica, então que não faça parte do problema, mas sim da solução e traga e proponha soluções técnicas de acordo com os requisitos técnicos necessários ao consumo.

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Os avisos

De acordo com Carlos Tavares, Presidente do grupo PSA (agora Stellantis), que não tem palavras meigas para com a União Europeia, referiu numa entrevista à Ouest France que as soluções técnicas para cumprimento das normas antipoluição não pertencem aos políticos. Também este CEO afirma que os combustíveis sintéticos são uma via alternativa viável. E queixa-se dos decisores políticos que não escutam os técnicos e os grandes industriais do setor automóvel. Ainda Carlos Tavares se queixa das desvantagens de se descartar o motor Diesel. Desde há muito tempo que os principais players da indústria automóvel têm vindo a alertar para os aspetos técnicos, económicos e financeiros. Quer Carlos Tavares, quer Luca de Meo alertam para o número imenso de postos de trabalho em causa na União Europeia – 13 a 14 milhões de postos de trabalho – face à ameaça dos EVs (Electric Vehicle) chineses a preços de 30 a 50% mais baratos que os EVs produzidos na União Europeia. Considerando que a China produz mais e mais barato, é muito bem capaz de financiar os seus EVs para compensar as taxas de importação que (só agora) a União Europeia pretende impor. Quanto à política da mobilidade elétrica e o crescente desinteresse por esta solução, Carlos Tavares não é parco em críticas à política da União Europeia: na sua entrevista à “20 minutes” refere que a Europa fez tudo ao contrário: em vez de dar prioridade à obtenção de energia elétrica muito mais independente de combustíveis fósseis, e à criação das redes de recarga eficazes antes da comercialização dos EVs, a UE deixou proliferar primeiro a comercialização dos EVs cujo tempo de criação foi de 5 anos. Esta política desastrosa pode ser a base da extinção ou de forte diminuição da procura de EVs, devido à desmotivação dos consumidores.

VITÓRIA POR IPPON (*) pelo motor de combustão interna

Entretanto a tecnologia evoluiu e o motor de combustão interna reganha uma posição de opção acessível e viável e barata de mobilidade pois são evitados muitos dos problemas dos EVs, como por exemplo a manutenção, que exige técnicos especializados e o impacto ambiental pois também a reciclagem das baterias exige técnicas e processos especializados. No campo dos motores a combustão interna, o investimento em formação é muito menor e a adaptação dos fabricantes e fornecedores de componentes é muito mais rápida, evitando-se o cenário das insolvências de empresas deste setor da indústria automóvel, perspetivado num relatório da Crédito y Caución. Curiosamente, apesar de a China ter investido tanto na mobilidade elétrica, também é da indústria deste país que surge o motor a gasóleo com o melhor rendimento no estado atual da técnica. Não é de admirar, pois mais sensatos, percebem que toda a problemática da Descarbonização e depois a Mobilidade Verde, demora dezenas de anos e para um país com as suas dimensões, para já é o motor de combustão interna que tem de trabalhar para a mobilidade. A China também já compreendeu que tem mercado para esta solução nos países onde a mobilidade elétrica é uma miragem, onde ainda predomina (e predominará) o gasóleo e/ou a gasolina. Se a UE mantiver a sua posição radical do “tudo elétrico” e a extinção dos motores de combustão interna, para que países não europeus, irá exportar os seus EVs (?) onde não existem postos de carregamento e onde a China já estará alegremente instalada a vender veículos baratos com motor a combustão interna a gasóleo ou a gasolina? Ou os japoneses, com os seus motores mais recentes, ou as marcas americanas com toda a sua capacidade industrial? A UE, com a sua visão patológica e irrealista demonstra dois aspetos importantes: os seus políticos não fazem a mínima ideia de quando será possível produzir energia elétrica de maneira sustentada e preparada para as necessidades, sem recurso a combustíveis fósseis (2030, 2035? A Ciência vai ter que fazer um grande sprint!) e por outro lado despreza outros mercados que poderiam absorver a produção industrial europeia e evitar a extinção de milhões de postos de trabalho. Felizmente, se por um lado a Alemanha tem a maior influência na UE pelos piores motivos que nenhum outro membro consegue ter, por outro lado tem também gestores industriais que sabem pensar “fora da caixa”. Assim não foi por acaso que a BMW e a Mercedes começaram a desinvestir nos EVs face à reação do consumidor – certamente terão tido uma “conversa” com o Sr. Olaf Scholz – enquanto a Audi se mantém numa posição reservada, talvez devido à sua possível participação no campeonato de F1 e até poder analisar os resultados do desempenho dos combustíveis sintéticos, e tenhamos em conta que o nível do consumidor que adquire estas marcas está vários patamares acima do consumidor português, com muito mais poder reivindicativo e capaz de reverter as decisões políticas e também face à reação do consumidor Premium que despreza os EVs e anseia pelas grandes máquinas de curvas sedutoras – em oposição aos atuais “caixotes de baterias” – motores de alta potência e de alta velocidade, – e os clientes pagam para ter este luxo que são verdadeiras joias de artesão – enquanto um motor elétrico, encontra-se numa esquina em qualquer loja de eletricidade mais especializada.

Em termos básicos, um EV é agora um arrivista, e de modo algum é a “solução verde” que os políticos vendem para piscar o olho aos votos dos ambientalistas. Pelo contrário, quase todas as marcas europeias remontam ao início da história do automóvel, e são responsáveis pela sua constante evolução. Elon Musk mais não fez do que ir atrás de toda a Investigação e Desenvolvimento das marcas fabricantes de automóveis e aproveitá-la para fazer um grande negócio que manipula em contratações e extinções de postos de trabalho para manter o valor das suas ações. E quanto ao seu Tesla, será abordado mais adiante. Para se comprovar até que ponto os nossos políticos se submetem ao “diktat” ambientalista, em Portugal chegámos ao ridículo de desativar a Central do Pego, para vender a ideia de um governo preocupado com o ambiente e com a “Descarbonização”, para passarmos a importar eletricidade de Espanha, produzida numa Central que utiliza carvão e que teve de acomodar as suas emissões de CO2 a este novo consumidor. Ou seja, de produtores autónomos passamos a importadores. Ora aí está uma boa governação! A tendência do mercado mudou tanto, que os preços dos carros clássicos estão a atingir valores estratosféricos. É uma verdadeira expressão de contestação dos consumidores endinheirados. O mercado americano, como o de qualquer país de grandes dimensões debate-se com a mobilidade a grandes distâncias e com o custo e problemas técnicos da adaptação da sua rede elétrica. Para carregar um EV é necessário: um posto de carga e rede para carregar as baterias com energia elétrica. Nos EUA, onde se fazem contas antes de se gastar o dinheiro dos contribuintes, já foi determinado que a recarga de um Tesla num ano equivale em 25 mais, ao consumo de energia elétrica de um frigorífico e duas vezes mais energia elétrica que em ar condicionado numa habitação de classe média. A rede não está preparada para a recarga de um parque automóvel da dimensão dos EUA e, além dos problemas técnicos a resolver, não há orçamento para adaptar a rede elétrica. E falta saber a origem da energia elétrica para a rede: Se das Centrais Nucleares, de Carvão ou de Gás (ou um pouco de todas e nada amigas do ambiente). Do debate, surgiu a completa ingenuidade dos objetivos: 50% dos veículos dos EUA em mobilidade elétrica no ano 2030.

O Automóvel: sobretudo uma ferramenta para lazer, transporte e trabalho e… de liberdade

É conhecida a apetência dos consumidores americanos (e não só) pelos “muscle cars”. A sua origem foi durante a Lei Seca quando os contrabandistas procuravam soluções de mais potência para escaparem à polícia. Depois, passaram para as pistas até chegarmos ao atual campeonato americano NASCAR (National Association for Stock Car Auto Racing). Além disso, coisa que os políticos não querem compreender, é que o automóvel é uma ferramenta de lazer, de transporte e de trabalho. Se nos focarmos no clima de grandes países como os EUA, países de Africa e América do Sul, do Médio Oriente e do Extremo Oriente, e continente australiano, o motor de combustão interna é que ainda lhes proporciona a mobilidade para todas aquelas vertentes de utilização, sobretudo em climas de temperaturas extremas (Alasca, por exemplo). E nessas condições nem sequer se coloca o problema da origem da energia elétrica. A viatura tem de ser autónoma durante muitas horas de mobilidade e de trabalho e ponto final. As grandes viaturas de caixa aberta para transporte de carga, SUVs (SUV: Sport Utility Vehicle) e grandes camiões, precisam de autonomia, potência e velocidade. Por isso não admira que a sociedade americana, sobretudo fora das grandes cidades e em territórios inóspitos onde se trabalha no duro, já comece a protestar contra a intenção de se comercializarem só EVs, ainda antes da origem da produção da energia elétrica se tornar independente dos combustíveis fósseis e de estar formada uma rede elétrica pelo menos suficiente. E não são propriamente protestos com palavras amigáveis.

Além disso, o automóvel é uma ferramenta de… liberdade: o automóvel permite-nos uma liberdade que os transportes públicos não oferecem. Poder ir passear e almoçar onde se quiser e quando se quiser ao fim de semana, sem depender de uma rede de transportes públicos que teima em ser ineficaz nos percursos que disponibiliza e não fiável (ou por avarias ou por greves) e dispensar o lápis de merceeiro na orelha para fazer contas aos KWh de autonomia é uma sensação libertadora que só nos traz a necessária tranquilidade e paz de espírito. E com a vantagem de não estar de consciência pesada por não ter um EV, de falsa “mobilidade verde”.

EVs, uma mão-cheia de problemas

Para além do aumento das emissões de CO2 para a atmosfera devido à necessidade de energia elétrica produzida em centrais de produção de energia elétrica a partir de combustíveis fósseis, os EVs acarretam outros problemas que é necessário abordar pela gravidade que constituem:

Impacto ambiental. Por exemplo, para fabricar uma bateria para um Tesla Modelo Y, é necessário escavar: 12 toneladas de rocha para o lítio (também pode ser extraída da água do mar); 5 toneladas de minerais de cobalto (a maioria do cobalto é feito como um subproduto do processamento de minérios de cobre e níquel. É o material mais difícil e caro de se obter para uma bateria); 3 toneladas de minério de níquel; 12 toneladas de minério de cobre. É necessário movimentar 250 toneladas de solo para obter: 26,5 libras (12 Kg) de lítio; 30 libras (13,6 Kg) de níquel; 48,5 libras (22 Kg) de manganês; 15 libras (6,8 Kg) de cobalto. Para fabricar a bateria também requer: 441 libras (200 Kg) de alumínio, aço e/ou plástico; 112 libras (50 Kg) de grafite. Sobre o equipamento utilizado: a Lagarta 994A que é utilizada para movimentar a terra para obter os minerais necessários para esta bateria consome 264 galões US (995,56 litros) de Diesel em 12 horas; A maior parte dos minerais necessários para fabricar as baterias vem da China ou da África. Quando se compra um carro elétrico, a China lucra mais. A bateria Tesla Model Y OEM 2021 (a bateria Tesla mais barata) está atualmente à venda na internet por $ 4.999 que não inclui envio ou instalação. A bateria pesa 1000 libras (453,59 Kg: imagine-se o custo de envio). O custo das baterias Tesla são: Modelo 3 — $14.000 + (Carro MSRP $38.990); Modelo Y — $5.000 a $5.500 (Carro MSRP $47.740); Modelo S — $13.000 a $20.000 (Carro MSRP $74.990); Modelo X — $13.000 + (Carro MSRP $79.990). Nota: MSRP, manufacturer’s suggested retail price 8 (em língua portuguesa: Preço de Venda Recomendado, PVR). A expectativa de vida da bateria é de 10 anos (média). Só nos últimos 3 anos é que se começa a reduzir a pegada de carbono, mas depois as baterias têm de ser substituídas e perdem-se todos os ganhos obtidos. Finalmente, algumas observações: a quantidade de energia necessária para processar as matérias-primas e a quantidade de energia utilizada para transportar estas baterias para os EUA e outros locais de montagem dos Tesla; no fundo, e de acordo com o estudo do Centro de Estudos Económicos da Alemanha, os veículos elétricos não são uma panaceia para as mudanças climáticas. O estudo, por exemplo, estima que conduzir um Tesla Model 3 na Alemanha é responsável por 156 a 181 gramas de CO2 por quilómetro. Isso é mais do que um Mercedes C 220D movido a Diesel que produz apenas 141 gramas por quilómetro.

Custos comerciais para o consumidor e valor no mercado dos usados. Do ponto de vista comercial, um EV perde metade do seu valor ao fim de três anos e vale a pena ver conhecer os pontos de vista de outras latitudes e culturas no referente ao mercado dos usados, nomeadamente do híbrido que é considerado a pior aquisição; Na altura da venda, e tenhamos em conta que uma família portuguesa conserva o seu veículo até ao fim do contrato de crédito, bem superior a três anos, coloca-se a questão: ou o proprietário coloca baterias novas para conseguir vender o seu EV, que terá um valor muito inferior ao das baterias, ou terá que vender o seu EV a um preço simbólico pois quem o compra sabe que terá de comprar baterias novas. Já se perspetiva aqui, um impacto ambiental de EVs abandonados por não se conseguirem vender no mercado dos usados.

Custos de Aquisição e manutenção. Não foi por acaso que as empresas de aluguer de automóveis como a Hertz e outras, dispensaram uma frota de vinte mil Teslas, devido aos custos de manutenção. Os técnicos têm que ter formação para intervirem em determinados componentes, as baterias são caras e prejudicam o retorno financeiro do negócio. Além disso, as baterias também exigem técnicos especializados para a sua reciclagem.

Aumento do consumo de combustível. Ora, já começam a aparecer registos de aumento de consumo de combustível, sobretudo nos SUV híbridos tão apreciados e divulgados. Cientes do elevado custo das baterias, os proprietários optam por não as utilizar e depender exclusivamente da gasolina. Acontece que a solução híbrida está fortemente divulgada nos veículos SUV híbridos. Estes veículos são aerodinamicamente desfavoráveis e como consequência gastam mais gasolina, inclusivamente também devido ao acréscimo de peso das baterias, pelo emitem mais emissões de CO2.

Perigo para a saúde. Recordemo-nos que qualquer aparelho elétrico gera um campo eletromagnético que pode ser prejudicial para a saúde humana. Quando surgiram os telemóveis, passado pouco tempo surgiu a questão da sua perigosidade. Na altura, não faltaram relatórios de técnicos idóneos a contrariar esta preocupação. O que é certo é que atualmente os telemóveis têm que obedecer à norma EN 50360, que constitui uma resposta à preocupação crescente com os efeitos das radiações transmitidas pelos terminais móveis. E os EVs? A que norma deverão obedecer? A União Europeia — e organizações de certificação tão exigentes em normas e testes prévios relacionados com a segurança — parece indiferente às questões relacionadas com a segurança das baterias dos EVs e dos respetivos campos eletromagnéticos gerados. Pelo contrário, nenhum navio pode operar sem testes de mar e posterior certificação, nem um avião pode voar sem também testes prévios de certificação. E na União Europeia, nenhum automóvel pode circular se na data de fabrico não estiver homologado para as normas de segurança ativa e passiva e de antipoluição em vigor. E no referente a radiações? Em 1979, a preocupação da Renault relativamente aos EVs era primeiramente a questão da influência dos campos eletromagnéticos relativamente à saúde humana.

E presentemente, os psicólogos já detetaram um novo tipo de ansiedade: a de ficar com o seu EV imobilizado sem bateria. Ansiedade só igualável por quem sofre de incontinência e tem medo de não conseguir chegar a casa a tempo. Efetivamente, uma viagem de férias num EV carregadinho de malas, tem que ser cuidadosamente planeada: agora para além do café e do cigarro e idas à casa de banho, há que considerar o local e o tempo de recarga das baterias (que canseira tanta conta).

Impostos, seguros e crise social. quanto a impostos, é preciso não esquecer que a receita de impostos diretos e indiretos sobre veículos figura no Orçamento do Estado e da União Europeia que em 2019 arrecadou quatrocentos e vinte mil milhões de euros em impostos. À falta de ISP irá surgir um imposto qualquer, eventualmente um ISME – Imposto Sobre a Mobilidade Elétrica – imposto ao qual irá acrescer o IUC face ao impacto ambiental que causam os EVs, considerando que o cálculo do IUC para os EVs inclui a contabilização das emissões de CO2 não à saída do tubo de escape, mas bastante superior no referente ao fabrico das baterias e dos próprios EVs, e ainda pelas emissões de CO2 que causam para que se construam postos de recarga com energia elétrica disponível. O que é certo, é que o imposto terá fatalmente que entrar nos cofres do Estado. E esse imposto deveria ser canalizado para financiar a construção da infraestrutura elétrica que os EVs exigem.

Risco de incêndio e seguros. Por outro lado, o risco de incêndio que representam já coloca a hipótese, noutros estados membros da UE, a possibilidade de interdição de postos de recarga nos estacionamentos dos edifícios. Por seu lado, as seguradoras ainda não se pronunciaram sobre o agravamento do prémio do seguro do crédito associado à compra de habitação ou em edifícios de serviços.

Tensões Sociais. E finalmente os EVs são caros e inacessíveis à maioria da população. O EV tornou-se assim pelo seu preço, mais um instrumento de promoção social, que ignora todos os problemas que lhe são subjacentes. É por isso previsível que surjam tensões sociais que poderão vir a ser uma forte dor de cabeça para os governantes: existe o risco de a maioria dos consumidores cada vez com menos poder de compra deixarem de ter acesso ao automóvel, devido ao preço e aos custos de manutenção, nomeadamente a substituição das baterias Ou então, para serem baratos, os EVs passarão a ser um bem de consumo, ou seja, “telemóveis com rodas” quando na realidade, a seguir aos encargos com a hipoteca da casa, é o segundo maior encargo das famílias, que só recentemente foi ultrapassado (por quem pode) pelo encargo com a alimentação (francamente, é razoável que uma garrafa de 0,8 litros de azeite seja vendida a quase 8 euros o litro?). Além disso, o valor de mercado de um EV passa para 50% em 3 anos. Como técnico nunca optaria por fazer conviver um combustível altamente volátil e inflamável (gasolina) com um equipamento altamente instável e que apresenta risco de incêndio (baterias) para fabricar um veículo com motorização híbrida. Mas o produto está consumado e em comercialização e Carlos Tavares considera que a motorização híbrida (motor de combustão interna + motor elétrico) será a solução para que a classe média tenha acesso a uma viatura.

Impacto humano. Convém não esquecer as condições de trabalho dos mineiros e do tráfico humano para aumento de mão-de-obra nas minas. A maior parte dos minerais necessários para fabricar as baterias vem da China ou da África. Grande parte do trabalho na África é feito por crianças. Também a Amnistia Internacional denuncia que o cobalto extraído por crianças na República Democrática do Congo pode estar a entrar nas cadeias de abastecimento de algumas das maiores marcas de EVs e dispositivos eletrónicos do mundo. Além da RD Congo, as comunidades de zonas de mineração em países como a Argentina, Chile ou Bolívia já estão a “sentir a face adversa do crescimento da indústria das baterias”, refere a AI. As populações locais são expropriadas à força, crianças pequenas são postas a trabalhar nas minas, imperam os salários baixos e as más condições de trabalho, descreve a organização.

A Biela-manivela contra o motor a reação

Desde a antiguidade que o mecanismo biela-manivela tem servido para converter movimento alternado em movimento contínuo e vice-versa. Um motor de combustão interna transforma energia química (explosão) em energia mecânica que faz rodar um veio que é constituído por um conjunto de bielas manivelas montadas em série. Por isso se designa na nomenclatura de mecânica por veio de manivelas (erradamente designado por “cambota” por amadores da mecânica). Do ponto de vista do motor de combustão e do automóvel, resulta num sistema de transmissão de movimento de baixo rendimento e seria desejável um sistema mecânico de transmissão rotativo-rotativo, implicitamente de maior rendimento. Apenas no final da Segunda Guerra Mundial, surgiu o motor de reação (ou a jato para simplificar) pela Messerschmitt (modelo 262). Sendo também um motor de combustão interna, se adequado para a indústria aeronáutica (e como evoluiu a civilização com o desenvolvimento desta solução de propulsão!) não se adequou à indústria automóvel. Não se pode falar neste assunto sem uma referência histórica: o primeiro artefacto rotativo a combustão, foi inventado no século I por Heron de Alexandria. Desde o final do século XIX e durante o século XX, vários técnicos se inspiraram no mesmo princípio de funcionamento para concretizarem engenhos rotativos. Foi em plena Segunda Guerra Mundial que Frank Whittle e o alemão Hans Von Ohnein desenvolveram os primeiros motores a reação que, de conceção mecânica diferente, também obedeciam ao princípio rudimentar do engenho de Heron. Sendo de melhor rendimento, a tecnologia obteve a atenção da indústria automóvel, mas foi rapidamente descartada pelos custos que representava a adaptação. Ainda assim, em 1950, a ROVER apresentou o modelo JET 1, com um motor a reação (ou a jato por simplicidade) que rodava a 50000 rotações por minuto para fornecer uma potência de 100 CV, com a particularidade de não ter caixa de velocidades. Um autêntico foguete (240 Km/h em pista) para o condutor. Seguiu-se o fabricante de camiões Kenworth em parceria com a Boeing. A Boeing construiu um motor experimental designado por T-50 que debitava 175 CV às 24000 rpm, com apenas 50 Kg de peso. Os problemas técnicos relacionados com o binário a baixa rotação (para simplicidade utilizar-se-á o termo “força” em vez de binário, que corresponde à perceção do condutor). Ora a falta de força a baixa rotação e o sempre elevado consumo, foram determinantes para o abandono do projeto. Talvez por influência à corrida ao espaço que caracterizava as relações entre os EUA e a URSS, a Chrysler apresentou o modelo “turbine” desenhado pela Ghia, com o motor A131 com 130 CV às 36000 rpm. Foram cedidos alguns modelos à população e entre 1963 e 1966 foram percorridos mais de um milhão de quilómetros. Os resultados do ensaio foram animadores: suavidade de condução, pouca manutenção, possibilidade de utilizar qualquer combustível e arranque em quaisquer condições de clima. Como desvantagens, foram registados os níveis de ruído, o elevado consumo e a aceleração lenta. Os motores a reação também fizeram a sua aparição nas corridas: montados nos ROVER-BRM foram conduzidos por pilotos de renome como Graham Hill, Sir Jackie Stewart e Richie Ginther. Nos EUA surgiu o modelo Hornet TX que obteve resultados expressivos nas 24 horas de Le Mans com um motor Continental TS-325 com 350 CV às 57000 rpm. No campeonato Indy, foi o STP Paxto Turbocar que obteve os melhores resultados, equipado com um motor Pratt and Whitney com 550 CV às 62000 rpm. O motor a reação ainda passou pela Lotus, modelo 86 com tração às quatro rodas. Todas estas experiências desportivas determinaram que o motor a reação era bom para acelerações progressivas e em longas pistas para alcançar alta velocidade de ponta (daí o seu sucesso no campeonato Indy) mas nada competitivo na fórmula 1 onde as acelerações e desacelerações são constantes, além de continuar a padecer de pouca força a baixa rotação. Ora este comportamento era incompatível com a condução normal, já que as velocidades são baixas e as acelerações e desacelerações são constantes em tráfego urbano. Devido ao elevado consumo de combustível, o primeiro choque petrolífero ditou o fim dos projetos com motores a reação. Os custos de produção também eram muito elevados devido à precisão de fabrico e qualidade dos materiais do número de peças dos sucessivos compressores e turbinas, sobretudo as respetivas pás, que constituem o motor a reação e também devido à necessidade de resistirem ao aparecimento de fissuras por fadiga de rotação. Por todos estes motivos, os motores a reação ficaram reservados para a indústria aeronáutica. Ainda houve uma passagem fugaz pelo revolucionário motor Wankel de êmbolos rotativos, utilizado na NSU, na Mazda e na Citroën (modelo GS). Esta opção ditou a falência das duas primeiras marcas devido a problemas técnicos e comerciais e a Citroën abandonou o projeto logo no seu início, talvez porque se tenha apercebido a tempo do eventual fracasso comercial.

Por enquanto o automóvel com motor a combustão interna baseado em biela-manivela já ganhou aos pontos ao EV e agora ao motor a reação no referente às suas aplicações na indústria automóvel. Já demonstrou ser uma alternativa válida à mobilidade elétrica por poder utilizar combustíveis não fósseis e ser desprovido de todos os inconvenientes de um EV. Permite a diversificação de aplicações e a possibilidade de escolha da mobilidade que mais se adequa a cada consumidor. Constitui-se como uma forte opção aos EVs evidenciando como é desadequada a decisão do seu extermínio. E quando a energia elétrica for produzida por centrais independentes de combustíveis fósseis e não nucleares e o motor a combustão funcionar também sempre com recurso a combustíveis não fósseis, teremos finalmente a tão desejada Descarbonização e Liberdade de Escolha que agora nos querem recusar.

(*) Do Judo: Vitória dada pelo árbitro encerrando a luta