A ideia de que vivemos numa época extraordinária – e que o passado nada tem para ensinar-nos – não passa de uma ilusão. Uma ilusão perigosa que explica muitas das atitudes populistas que hoje estão a surgir na Europa e no resto do Mundo.
Até há pouco tempo, na Europa, era muito difícil afastar o espectro dos erros passados e das suas trágicas consequências.
Para uma geração de políticos que viveram ou tinham uma memória fresca dos terríveis conflitos europeus do século XX e, sobretudo, dos morticínios da II Guerra Mundial, a democracia e a coesão na Europa eram uma prioridade política essencial. Eles sabiam que é muito frágil a linha divisória entre a barbárie e a civilização. Eles sabiam que a democracia e a paz não eram conquistas irreversíveis. Sabiam que nas décadas que antecederam a I Guerra Mundial também havia a presunção que a globalização então em curso e a interligação entre as principais economias eram suficientes para garantir a paz e uma prosperidade inigualável. Foi o que se viu. A I Guerra, com 9 milhões de mortos, pôs fim a esses devaneios.
Mas o que surpreende é até que ponto nos esquecemos rapidamente das causas e das consequências da guerra no século XX – sim, porque o século XX foi, em muitos aspectos, uma época brutal de ocupação, destruição, privação e assassínio em massa, sem paralelo na história.
Com optimismo a mais, avançamos pelo século XXI agitando as bandeiras da globalização, do mercado livre e da comunicação planetária, como panaceias simples que assegurariam para sempre as nossas democracias face a movimentos autoritários ou repressivos.
Em 1992 Francis Fukuyama havia anunciado a democracia liberal como a “solução final” do governo humano. Mas o medo está a reaparecer nas nossas sociedades ocidentais – o medo do terrorismo, o medo da precaridade, o medo do desemprego, o medo do outro e do desconhecido.
Perante estas circunstâncias corrosivas, e como no passado, ressurgem os “cantos de sereia” do proteccionismo, do autoritarismo, do isolacionismo, da xenofobia, do racismo e de outros radicalismos… – como soluções fáceis para os problemas que atormentam os cidadãos das nossas sociedades europeias envelhecidas.
Eis os ingredientes que surgiram há mais de oitenta anos e que levaram ao colapso e à devastação das sociedades liberais.
Hoje, uma nova geração de políticos e de cidadãos está cada vez mais esquecida da História. A União Europeia está paralisada politicamente. Os partidos do centro, social-democratas e democratas cristãos, os tais que construíram os Estados Sociais pós-1945, exibem uma inabilidade discursiva e uma impotência política total para lidarem com esta insegurança colectiva difusa que se espalha como um vírus nas nossas sociedades democráticas.
Os problemas existem, estão à vista de todos, mas para além do recurso ao “economismo” vigente, estes partidos e os seus líderes são incapazes de impor uma agenda política verdadeiramente reformista para enfrentar os populismos em ascensão.
Precisamos de restabelecer o crescimento económico e de políticas inclusivas capazes de gerar uma nova era de bem-estar geral nas sociedades europeias. Para isso é necessário coragem, visão reformista e disponibilidade para o compromisso.
Nada disso tem existido. Até agora as elites políticas europeias apenas têm mostrado um talento notável para tentar apagar fogos com gasolina.
Presidente do Governo Regional da Madeira