Num mundo onde a espera é muitas vezes vista como um empecilho, as filas surgem como um cenário que desafia a nossa crescente incapacidade de simplesmente estar.
O que é que a forma de estar numa fila de espera diz sobre a nossa relação com o “tempo morto”?
Esta semana tive de esperar 15 minutos numa fila. Assim que me apercebo do tempo que tenho pela frente, a reação é automática: levar a mão ao bolso para tirar o telemóvel.
Swipe, scroll, click & repeat.
Olho à volta e não sou o único. Não só não sou o único, como não vejo ninguém que não esteja de cabeça inclinada para baixo a olhar para um ecrã — a mais fácil solução para lidar com o desconforto da espera e o tédio da inatividade.
Vivemos numa época em que quase tudo é imediato e a espera é uma espécie de tabu. Onde a expectativa de estímulo constante nos tornou reféns da distração. Este impulso de preencher cada segundo livre com um scroll aponta para uma desconexão mais profunda: a dificuldade de enfrentar o aparente tédio da inatividade, e a eventual introspecção que a espera impõe.
Don’t get me wrong, não vejo grande mal em usar o telemóvel para me entreter enquanto espero na fila dos CTT. O real problema é perceber que já não preciso de uma fila de 15 minutos. Quaisquer 30 segundos de “tempo morto” fazem disparar um estímulo que leva a minha mão a pegar no telemóvel, muitas vezes (a maioria, talvez) para depois o desbloquear e pensar “O que é que eu ia mesmo fazer?”.
Este impulso visceral de pegar no telemóvel aponta para que estejamos a perder a capacidade de simplesmente estar sem fazer nada.
Porque é que esta ideia de não fazer nada nos assusta tanto?
Apesar de ter um enorme potencial de frustração, estar numa fila de espera pode ser uma boa “ida ao ginásio da mente”. Uma ocasião onde podemos combater a necessidade contínua de estímulos frenéticos e, ainda que inicialmente seja forçado, treinar a paciência, reaprender a esperar e fazer as pazes com o “não estar a fazer nada”.
Com o ritmo altamente acelerado a que praticamente todos vivemos, não há de fazer grande mossa ter 15 minutos de pura inatividade.
A espera pode ser um tédio, desafio e uma oportunidade. Só depende da forma como a enfrentamos.
Quanto a mim, vou tentar manter o telemóvel no bolso da próxima vez que estiver numa fila de espera.
Vamos ver se sobrevivo para contar.
Nota: O autor não é um boomer que rejeita a tecnologia. Pelo contrário, é um enorme entusiasta e depende dela para grande parte do trabalho que faz. O objetivo desta reflexão não é demonizar os telemóveis ou “essa coisa agora das redes sociais!”. Trata-se de encontrar um equilíbrio saudável entre o bom que a tecnologia nos trás e tudo o que de muito bom existe fora de um ecrã.
O Observador associa-se aos Global ShapersLisbon, comunidade do Fórum Económico Mundial, para, semanalmente, discutir um tópico relevante da política nacional visto pelos olhos de um destes jovens líderes da sociedade portuguesa. Ao longo dos próximos meses, irão partilhar com os leitores a visão para o futuro nacional e global, com base na sua experiência pessoal e profissional. O artigo representa, portanto, a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da Comunidade dos Global Shapers, ainda que de forma não vinculativa.