A segunda parte de 2020 aponta para o início de uma crise profunda, evidenciada pelo final do regime de layoff simplificado e a prevista escalada do desemprego como consequência. Enquanto os olhos do mundo se viram para os tempos complicados que se avizinham, milhares de jovens em Portugal estão a entrar no mercado de trabalho com poucas expectativas de sucesso, sem saberem muito bem por onde começar.
Em 2011, no meio de uma outra crise, eu pertencia a esse mesmo grupo. Vendo a troika instalada em Portugal, a ansiedade de um futuro incerto na minha área de estudo obrigou-me a ser criativa. Com uma empregabilidade quase nula, sem experiência profissional de valor e ainda a acabar a licenciatura, virei-me para oportunidades internacionais com uma componente de teletrabalho. Encontrei uma posição de interesse na Airbnb e enviei o meu currículo Europass, com esperança de receber uma resposta positiva. Mas a resposta à minha candidatura online, positiva ou negativa, nunca chegou.
Pela minha experiência, muitas das candidaturas online não chegam a receber uma resposta para além de uma ou outra confirmação automática. Os empregadores são inundados com milhares de currículos para rever e não têm tempo, nem vontade, de responder a todos. Esta falta de feedback é algo completamente fora do nosso controlo enquanto candidatos, mas existem medidas que todos podemos adotar para que as nossas candidaturas sejam mais eficazes.
O primeiro passo, por mais simples que pareça, é fazer o clique no botão “submeter”. De acordo com um estudo recente por parte da Polar Insight, as mulheres que estão ativamente à procura de um novo emprego são, por norma, extremamente cuidadosas. Só se candidatam quando realmente estão seguras de que preenchem todos os requisitos pedidos na descrição da posição. Esta limitação auto-imposta é um obstáculo a que as mulheres tenham o mesmo acesso a oportunidades que os homens. É, também, um excelente exemplo do poder da linguagem e de como esta se pode tornar exclusiva para todo um grupo da população. No processo de recrutamento da Airbnb, o meu perfil profissional não cumpria todos os requisitos pedidos para a posição. Ainda assim, arrisquei – “fake it until I make it” – e compensei a experiência que me faltava, demonstrando certas skills de outra forma. Fiz imensa pesquisa sobre a empresa, abandonei o meu Europass tradicional e aprendi sobre design, para criar um currículo mais visual e chamativo. O objetivo era apelar ao lado criativo do fundador Brian Chesky, licenciado em Design Industrial. Escrevi-lhe um email diretamente com o meu novo currículo e uma semana depois tinha uma entrevista, que resultou numa oferta de emprego.
Quanto mais conhecimento possuímos sobre uma empresa, mais probabilidades temos de sermos bem sucedidos na nossa procura de emprego. Infelizmente, a mentalidade do “spray & pray” ainda existe.. Quando estamos ativamente à procura de emprego, temos a tendência de enviar candidaturas a várias empresas, que acabam por ser bastante genéricas e pouco eficazes. Nenhuma empresa ou trabalho é igual, a competição é forte e o currículo não deve ser o mesmo para todas as candidaturas.
Na minha posição atual na Loom, tenho a oportunidade de ser responsável pela expansão da minha equipa. Sendo a Loom uma empresa de comunicação por vídeo, procuro esta componente nas candidaturas que recebo. Se um candidato gravar um vídeo a apresentar-se, ajuda-me a concluir que essa pessoa entende o valor da Loom e sabe utilizar a plataforma com eficácia. Infelizmente, depois de ver milhares de candidaturas nos últimos anos, posso afirmar que a maioria não é bem sucedida no que procura comunicar.
Comecemos pelo maior problema das candidaturas: sobrecarga de informação. Estima-se que os empregadores passem apenas seis segundos a rever cada candidatura, o que torna o primeiro terço do currículo o mais importante. Tudo o que o empregador deve saber sobre a capacidade do candidato para fazer o trabalho em questão tem de estar visível nessa primeira parte do documento. É, então, necessário remover a informação que não se adequar e adaptar a restante.
Para garantir que a nossa candidatura chama a atenção do recrutador, é também necessário integrar palavras-chave de acordo com a posição. Por exemplo, alguém que se candidate a uma posição de Digital Marketing deve incluir menções a SEO, CRM, Email Marketing, etc. Isto não só garante que o recrutador percebe que o candidato tem experiência relevante na área, mas também que os applicant tracking systems (ATS) eletrónicos não omitem automaticamente a candidatura da lista.
Agora que cumprimos as necessidades básicas da candidatura, como é que nos diferenciamos da concorrência? Quando estou a rever candidaturas, é comum ver descrições de responsabilidades da experiência profissional. O que os empregadores também querem ver, é o impacto dessas mesmas responsabilidades. Por exemplo, um candidato a uma posição de vendas que se queira destacar da concorrência, deve evidenciar os seus resultados no currículo, de modo a demonstrar que pode fazer o mesmo na nova empresa. Poderá utilizar frases do género – “aumentei o número de clientes nos meus mercados em 33%, o que resultou em lucros de 150 mil euros em relação ao ano anterior”. Aos candidatos que estejam a entrar no mercado de trabalho sem experiência profissional prévia, ou sem resultados para mostrar, recomendo que evidenciem sucessos académicos dos quais se orgulham.
Regra geral, a candidatura deve responder a perguntas, não criar mais. Se nos colocarmos na perspetiva do empregador, aprovar a fase seguinte (seja uma entrevista, ou um teste de habilidades) requer um certo nível de confiança. A candidatura tem de demonstrar o potencial das capacidades do candidato, tanto em termos de competências técnicas, como também de soft skills.
Existem inúmeros guias online sobre como enviar a candidatura perfeita ou como melhorar o currículo. Importa salientar que não existe uma solução única, replicável em todos os processos de recrutamento. Nesta altura de incerteza económica, e uma vez que que ter sucesso não depende só de nós, é importante ser criativo. Acima de tudo, usar os recursos ao nosso dispor e pensar de forma crítica sobre a melhor maneira de comunicar a nossa experiência pessoal e profissional.
Susana de Sousa é atualmente manager na Loom, empresa de comunicação por vídeo sediada em São Francisco, onde lidera uma equipa internacional de suporte ao cliente. Anteriormente, na Airbnb liderou a equipa de suporte a pagamentos dos mercados europeu e asiático, tendo sido, com 20 anos, a primeira portuguesa a integrar a empresa. Para além de Lisboa, já teve oportunidade de viver e trabalhar em outras cidades europeias como Barcelona, Amesterdão e Dublin.
O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor, enquadrada nos valores da comunidade.