Para chegar à conclusão de que certas frases são falsas existe no público a ideia de que se pode recorrer a meios técnicos.   Acredita-se que a falsidade deixa atrás de si um rasto fisiológico.  Quem mente arfará mais por natureza; e quem diz a verdade, menos.   Foram assim inventadas máquinas que medem quantas vezes se arfa ao dizer falsidades.   Este desenvolvimento suscitou contudo outros avanços técnicos e levou os mentirosos a tomar precauções, e a aprender cientificamente a arfar como verdadeiros monges.

Nem todas as frases falsas são todavia acompanhadas em quem as profere pela ideia de que está a emitir frases falsas.   Em circunstâncias normais um disparate ou um erro factual é proferido como uma proposição verdadeira, sem que se distingam aventuras na respiração ou haja rebates de consciência.  À maior parte dos que cometem falsidades, ou mesmo àqueles que as professam, não ocorre tomar precauções técnicas, porque realmente professam o que cometem, e em todos os casos cometem realmente o que cometem; arfam como quem diz coisas verdadeiras, e aliás como quem mente de maneira científica.   A esperança de apurar a verdade através de detectores de mentiras é infundada.

O conceito de soro da verdade parece ser mais prometedor.  Em vez de confiar nos sinais fisiológicos da mentira, o soro de verdade anuncia o acesso à consciência de quem emite frases.   Acredita-se que o soro da verdade proporciona um nível desarmante de franqueza; permite aos que querem saber coisas irem directos ao assunto e apurarem se quem emitiu uma frase quis emitir uma frase falsa; e não deixa por meios químicos os mentirosos mais avisados mentir a seu próprio respeito.   A química porém só ajuda até certo ponto.   Como os detectores de mentiras, o soro da verdade parece ineficaz nos casos em que quem emite uma frase falsa acredita que a frase que emitiu é verdadeira, visto que mesmo em situação de franqueza só ocorrerá a essa pessoa reiterar as suas frases falsas.

A ideia de estabelecer a verdade por meios técnicos atrai; mas não atrai apenas porque nos ajude a ultrapassar mentirosos à velocidade de um coxo.  O seu atractivo principal é a promessa de convencer todos os que mentem da inutilidade dos seus propósitos, e todos os que lhes dão ouvidos das mentiras dos mentirosos; e assim, mostrada a falsidade de certas asserções, dissuadir o público de as entreter.   A promessa é no entanto optimista.   A demonstração de que uma pessoa mentiu ou disse disparates raramente a fará mudar de modos; e também quase nunca muda de modos quem já decidiu antes de qualquer exame técnico que está diante da verdade ou da mentira.   Aplicar soros e detectores aos cientistas sociais, aos agentes imobiliários e em especial ao Antigo Presidente é um desperdício: nenhum vai mudar de vida e ninguém vai mudar de opinião sobre eles.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR