Em 1940, Churchill não passava de um filho segundo com tiques de criança hiperactiva, a quem toda a gente tratava como se trata o idiota da família: com embaraço e impaciência. Os conservadores detestavam-no porque ele os traíra em 1904, abandonando o partido e juntando-se aos liberais (por ser contra as taxas alfandegárias proteccionistas defendidas pelos conservadores). E o movimento trabalhista odiava-o desde 1910 quando, no papel de Home Secretary, mandara o exército carregar sobre os mineiros galeses em greve durante os confrontos que ficaram depois conhecidos por “Tonypandy Riots”. Parece que Churchill não ordenara de facto a carga mas a sua reputação entre os galeses e os trabalhistas nunca mais recuperou. A isto somavam-se erros que punham em causa a sua própria competência como governante e como político: Galípoli e o regresso ao padrão-ouro. E, nos anos 1930, opusera-se ferozmente à independência da Índia (uma posição que os seus próprios contemporâneos consideravam reaccionária e obtusa) e defendera o rei Eduardo VIII e Wallis Simpson até ao fim, num assomo de lealdade incompreensível. Foi tudo isso e não a insistência no perigo nazi que levou à sua marginalização pelas chefias conservadoras.

No fundo, Churchill assustava-os. Mesmo os seus bons momentos partilhavam com os desastres um identificável aroma a loucura: a espectacular fuga das prisões do exército boer na África do Sul, que protagonizara nos últimos dias de 1899, ou ter-se oferecido, depois do desastre de Galípoli, como voluntário para as trincheiras da Flandres. Nada disso estava de acordo com os cânones da “gentlemanship”. Mas eram esses defeitos (ou qualidades) que tornavam Churchill singularmente apto para fazer, na primavera de 1940, o que mais ninguém parecia querer fazer: enfrentar Hitler. “Against all odds”.

Uma velha anedota afiança que o segredo de uma boa reputação histórica está em saber morrer na altura certa. No caso de Churchill, foi sobreviver o tempo necessário. Em 1940 tinha 65 anos. No dia em que tomou posse como primeiro-ministro, escreveu: “Toda a minha vida passada foi uma preparação para este momento e para esta prova.”

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