Há dias conversava com uma amiga acerca da mudança para o horário de inverno. Chegou mais uma vez o trágico dia no final de Outubro que marca o início de uma era com dias mais curtos e noites mais longas. O pôr-do-sol passa agora a ser às 17h35, ou seja, pelas 18h já é noite cerrada e a atmosfera convida a estar em casa a ver séries ou a ler, acompanhado de uma bebida quente e uma manta com uma área grande o suficiente para cobrir todo o sofá. Infelizmente, esta não é a realidade de ninguém que tenha um trabalho presencial no escritório com o horário dito “normal” das 9h às 18h.

A mudança de hora na Europa deu-se preliminarmente em 1916 na Alemanha (quando ainda em guerra) na tentativa de reduzir o consumo de carvão para o reutilizar em fábricas de armas. Concretizou-se assim, a primeira alteração de fuso-horário para a hora de verão, com dias mais longos e mais horas de sol. Por consequência, países como o Reino Unido, a Austrália e os Estados Unidos da América seguiram este exemplo e integraram a medida na sua rotina. Esta foi abandonada na Europa após a Segunda Guerra Mundial, mas foi repetidamente implementada em 1970, logo após um choque petrolífero, a fim de limitar a necessidade de luz artificial e o consumo energético.

Desde então, muitos são os estudos que atribuem a esta transição efeitos adversos na saúde. Na semana após a mudança para o horário de inverno há um aumento de acidentes de viação, ataques cardíacos, doenças digestivas e imunológicas. Os efeitos a longo prazo desta perturbação variam entre depressões, atrasos no metabolismo, aumento de peso e dores de cabeça. Estas variações decorrem da dessincronização entre o nosso “relógio biológico” e as horas de sol.

Se esta alteração já causava desconforto antes, em 2022 o panorama só tende a piorar. O Plano de Poupança de Energia foi divulgado no dia 27 de Setembro e já está em vigor. Muitas foram as medidas aplicadas, entre elas a redução da intensidade dos ares condicionados em espaços fechados e, mais relevante ainda, a redução do consumo energético associado à iluminação pública, de luzes ligadas durante a noite, bem como a iluminação de faixas, lonas e estandartes publicitários na via pública. Aliar longos períodos noturnos à redução de luz artificial pode ajudar a economia, mas representa sem dúvida vulnerabilidade, insegurança e perigo para todos os que circulam sozinhos, vindos do trabalho, com computadores e outros dispositivos consigo.

Para além disso, os tempos agrestes em que vivemos já nos mostraram vários episódios que demostram a ansiedade de várias famílias portuguesas. Assistimos diariamente ao aumento abrupto dos preços de bens alimentares essenciais e às sequelas que estes têm provocado: atitudes violentas por parte de pessoas desesperadas que têm filhos e/ou familiares ao seu cargo. Entrámos numa grave crise social onde há cada vez mais roubos por parte de pessoas que já não conseguem sobreviver apenas com os seus salários. Há progressivamente mais sem-abrigo, pessoas incapazes de se sustentar e os índices de pobreza escalam de dia para dia.

Os extensos intervalos de tempo noctívagos só propiciarão mais assaltos, desconfiança e receio. É tempo de repensar esta medida que, apesar de subsistir há dezenas de anos, nada traz senão instabilidade. Instabilidade essa que já perdura há tempo a mais e que não necessita de ser agravada

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR