Onde começa, por onde passa e onde acaba a nossa liberdade? Todos nós já nos deparámos com pelo menos uma destas questões, que em certos cenários, são tudo menos fáceis de ser definidas! Mas quantos de nós já alguma vez parou para pensar: Afinal o que é a liberdade?

A liberdade pode ser considerada como o conceito central da vida humana, é o elemento fundamental de qualquer animal, é o que o distingue de um ser vegetal.

Assim que o Homem nasce, adquire múltiplas faculdades, sendo uma delas a liberdade, que de acordo com a filosofia de Jean Jaques Rousseau, entre outros tais como John Locke ou Montesquieu, aquele é quem melhor defende esta tese, sendo esta a chamada liberdade natural. O Homem é livre de escolher, este pode optar por praticar o bem ou o mal, nada o impede, ou seja, a liberdade no seu estado mais puro ou inocente. Esta faculdade está presente em qualquer animal vivo, desde um insecto à mais alta, culta, desenvolvida ou até mais importante pessoa no mundo. Como exemplo prático, não existe nenhum código de conduta entre os caranguejos que os proíba de praticar atos canibais, no entanto eles são livres de o fazer e jamais serão punidos por tal ação.

Não nos choca se um símio acasalar com outro símio seu consanguíneo, bem como tantos outros factos, facilmente censuráveis se aplicados ao Homem, que podemos encontrar na vida selvagem… Mas será que se eles coabitassem em sociedade, se se achassem o ser mais importante e mais avançado do planeta isto se passaria assim? Claro que não! Enquanto o animal vive em bando, o Homem vive em sociedade, razão pela qual, muitos dos cultos praticados pelas tribos humanas são censuráveis, pois uma tribo é algo que se aproxima mais de um bando do que de uma sociedade. E é precisamente aqui que o Homem atravessa esta linha entre o chamado ser civilizado e o não civilizado, é onde nascem os preconceitos, a distinção entre o bem e o mal, os códigos morais e consequentemente a regulação de condutas! Acima de tudo, surge a matéria da igualdade, a qual aparentemente nada tem a ver com liberdade, mas no fundo são dois elementos que jamais podem existir um sem o outro.

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Voltando ainda a Rousseau, este afirma que “o Homem nasce livre, mas está em toda a parte acorrentado”. Mas se o Homem nasce livre e é livre de escolher as suas próprias ações, então porque está ele acorrentado? O que o impede de ser livre? Na verdade nada o impede, bem como nada o desvincula da consequente responsabilidade que possam advir dos seus atos. Quando um leão ataca outro leão, ele arrisca-se a perder a vida de seguida, é a consequência de um ato pelo qual ele será responsabilizado à la boa moda da lei de Talião: “olho por olho, dente por dente”. Se um homem atacar outro, ele será punido pela sanção aplicável naquele contexto social, o que tipicamente, nos países ditos mais desenvolvidos, culminará numa pena de reparação monetária, pena de prisão ou mesmo pena de morte, consoante a gravidade e os contornos de cada situação. Esta consequência forma, a chamada moldura penal, é a corrente mencionada por Rousseau, a qual restringe a liberdade natural do Homem, fazendo nascer assim a liberdade civil, necessária para assegurar o interesse coletivo da sociedade.

A sociedade é algo que não existe no estado natural, ao contrário da liberdade, esta não é adquirida naturalmente com o nascimento, mas sim através de um conceito criado pelo Homem, onde inclui e vincula, ou melhor, acorrenta, todos os que dela fazem parte: antes do seu nascimento, durante a vida e até mesmo após a morte, servindo-se do Direito como que um agente arbitrário programado para garantir a paz através da justiça. Como podemos então definir a sociedade? É uma alegoria que se traduz em abstenção de liberdade, no sentido de criar a sociedade utópica, a sociedade perfeita, onde todo o cidadão contribui para o mesmo objetivo comum:

• a família (previne a extinção e assegura a sua continuidade);

• o poder Estatal (quanto mais coesa for uma sociedade, mais poderoso será o Estado a todos os níveis, nomeadamente nas duas disciplinas mais importantes: na economia, seja dum ponto de vista interno ou externo; e na defesa, a qual não só contribui para a estabilidade moral da sociedade – fator interno – como impõe através da soberania, a sua hegemonia, perante qualquer ameaça externa – fator externo).

Neste ponto, damos por garantido, em tom de conclusão prévia, que a liberdade natural é um elemento intrínseco da vida, balizado pela liberdade civil, que por sua vez é ajustada à sociedade em questão. Resta agora compreender e abrir as portas a um pensamento um pouco mais profundo e artificial: onde se cruza então a liberdade com a política?

Todos sabemos que existem sistemas políticos mais liberalistas e outros mais restritivos, mas qual deles será o mais correto? A resposta é bastante simples: depende das necessidades prementes de determinada sociedade, em determinada época e em determinada localização geográfica. Não existe uma receita certa, o que funciona num núcleo, pode não funcionar noutro, e até mesmo fracturando este pensamento, de nível nacional para um nível municipal, podemos afirmar que determinado partido político, por detrás de determinado presidente de uma câmara municipal, por muito competente e promissor que possa ser, pode não representar a resposta certa para as necessidades emergentes de uma outra câmara municipal, a qual apresentará, por certo, uma

realidade social diferente, separada geograficamente, ainda que dentro do mesmo país.

Cada cidadão é livre de pensar, é livre de desenhar a sua utopia, é livre de apoiar os seus ideais e jamais deverá ser julgado por acreditar no que acha ser mais correto. No entanto, ele é também responsável pelo seu voto em democracia. O grande problema que tem assolado o nosso sistema democrático, é a abstenção, sendo esta a principal responsável por uma falsa representação parlamentar, no que concerne à verdadeira vontade do povo, ou seja, com uma abstenção a rondar os 50%, o poder de decisão parlamentar, irradia da vontade proveniente da mesma porção de cidadãos eleitores. Mas de quem será a culpa, do cidadão ou do sistema? A meu ver, esta culpa encontra 3 responsáveis diretos: em primeiro lugar, o próprio sistema democrático, o qual não deveria permitir taxas de abstenção de tamanho relevo. Deveria sim instituir mecanismos de incentivo e até de obrigatoriedade eleitoral, ou seja, lançar mão da faculdade de regulação da liberdade civil neste âmbito; em segundo lugar, o desinteresse do cidadão que muitas das vezes se traduz ou em ignorância, nem tanto pela simples importância mas mais pela potencialidade do seu ato eleitoral, ou até mesmo por sentimento de exclusão, simplesmente não se sente incluído na atividade política. O cidadão deverá ter sempre presente a convicção doutrinária de que a soberania pertence ao povo e não a qualquer figura, cargo ou entidade política, pois toda e qualquer figura política, é uma mera representação de uma porção de cidadãos; em terceiro e último lugar, mas não menos importante, a variedade prática de soluções políticas, destinadas à prossecução do interesse publico. Assistimos nos dias de hoje a um fenómeno de crescente variedade de partidos que oferecem soluções completamente desajustadas da realidade e necessidade social.

É necessário no seguimento deste entendimento, sublinhar que, através da liberdade civil reconhecida a todos os cidadãos, estes deverão ser pessoalmente responsáveis (tanto consigo mesmos como com a nação) pela escolha, participação e acompanhamento da atuação política e no reconhecimento das suas ideologias.

Quanto à intensidade ou medida da liberdade civil, também existem vários níveis, desde a chamada anarquia até ao sistema totalitário, ou seja, a abertura da liberdade é diretamente proporcional a cada sistema político, fazendo-se sentir assim em diferentes intensidades ao longo da jornada ideológica. A utopia fantástica, do ponto de vista dos cidadãos, seria uma sociedade perfeitamente coordenada, de modo a que a liberdade civil roçasse a natural, onde o crime não fosse sequer opção para ninguém e sobretudo onde as condições de vida abonassem em todos os lares. Claro que a conjugação destes elementos, nestas proporções, seria completamente impossível de ser exteriorizado para além da esfera utópica. A grande prioridade do Estado, sobretudo a do Governo, é a mediação doseada de cada um destes elementos, através de muitos outros subelementos. Como paradigmas conclusivos desta visão temos por exemplo: Quanto ao âmbito laboral, se trabalharmos apenas 4 horas diárias ao invés das tradicionais 8 horas, temos mais liberdade para desfrutar da vida, mas ao mesmo tempo, visto que a produção foi menor, também deveremos ter uma redução do salário, que por proporção, hipoteticamente seria de metade; Quanto ao âmbito penal, seriam toleraras muitas práticas que neste momento são consideradas crime; Quanto ao âmbito negocial, tanto profissional como civil, ao receberem mais liberdade, estaremos a abrir as portas para a burla e a corrupção. Haverá mais fuga aos impostos e quem beneficiará será o mercado paralelo, descapitalizando assim o Estado.

Se pensarmos bem, existem centenas de casos onde podemos aplicar esta visão, portanto é necessário encontrarmos o equilíbrio junto das necessidades atuais, sem qualquer cegueira política, pois como já foi visto, o que funciona hoje, pode não funcionar amanhã, bem como o que funciona numa certa região, pode não funcionar noutra. Teremos de ser nós, os cidadãos, a dissecar as necessidades do nosso País e concluir se o que precisamos é de uma abertura da liberdade ou de uma contenção nela.

Agora a grande questão é: até que ponto estamos dispostos a ceder a nossa liberdade, em troca de outras condições?