Com o término dos debates a quatro para as eleições europeias, surge a oportunidade ideal para proceder a uma análise detalhada da sua qualidade. O que se verificou ao longo destas duas semanas foi, como já se antevia, que os debates se revelaram uma oportunidade perdida para discutir temas cruciais para o futuro da União Europeia.
Uma das principais críticas aos debates foi a falta de profundidade e substância nas intervenções dos candidatos. Em vez de se focarem nas questões de real importância para o futuro, optaram por chavões desgastados e discussões irrelevantes, evidenciando uma carência de visão política europeia. Além disso, a polarização excessiva também constituiu um problema. Em vez de procurarem pontos de diálogo, convergência e compromisso, os candidatos preferiram enfatizar as suas divergências de forma exagerada, recorrendo a discursos pré-fabricados e aos habituais ataques políticos, criando um clima de confronto e hostilidade (algo que gostaria de abordar em maior detalhe em futuros artigos, visando uma compreensão mais abrangente dos desafios enfrentados pela democracia europeia). Tal abordagem não só dificultou a compreensão das questões em jogo, como também deixou os espectadores com pouca informação substantiva para tomar qualquer tipo de decisão informada nas urnas.
Como era previsível, a discussão de ideias e propostas concretas foi praticamente inexistente. Em vez disso, os debates foram marcados por uma ênfase desproporcional nos temas clichê habituais como o racismo, a intolerância e a xenofobia. Embora sejam questões importantes, a sua utilização repetitiva e superficial não contribuiu para elevar o nível do debate, mas sim para desviar a atenção dos eleitores dos problemas mais prementes da Europa.
É surpreendente observar quanto tempo foi desperdiçado a discutir temas de ordem nacional, que pouco ou nada têm que ver com as competências europeias. Os candidatos pareceram mais preocupados em debater assuntos internos, como a política de saúde, habitação e educação, que são predominantemente da responsabilidade dos governos nacionais, do que em abordar as questões cruciais da União Europeia. A dada altura, a afiliação dos partidos às famílias políticas europeias tornou-se, um dos principais pontos de discussão dos debates, como se essa fosse uma das questões mais centrais para o futuro da Europa. Entretanto, temas como a reforma das instituições europeias, o inverno demográfico ou a perda da relevância económica ficaram em segundo plano.
A segurança europeia, a política de defesa comum e as relações com países vizinhos e potências globais mereciam uma atenção que simplesmente não receberam. Por exemplo, a guerra na Ucrânia e no Médio Oriente, deveria ter sido alvo de um verdadeiro debate de ideias e soluções. A resposta da União Europeia a essa crise, tanto em termos de apoio militar e humanitário quanto de sanções económicas, é crucial para a estabilidade e segurança do continente. No entanto, os candidatos evitaram discutir estratégias específicas para lidar com essas ameaças e os desafios geopolíticos associados.
Outro tema negligenciado foi a soberania dos Estados-membros no contexto da União Europeia. O equilíbrio entre a soberania nacional e a necessidade de uma maior integração europeia é um dos debates mais importantes para o futuro da UE. Questões como o alargamento da Europa e a coordenação das políticas económicas exigem uma discussão aprofundada. Nesta matéria, os candidatos foram incapazes de apresentar uma estratégia de como a União Europeia pode avançar em direcção a uma maior integração sem comprometer a soberania dos seus membros, um debate complexo que requer propostas detalhadas e um entendimento claro das implicações políticas, económicas e sociais.
A migração e a gestão das fronteiras externas da União Europeia, temas de extrema relevância, foram abordadas de forma superficial. Considerando que a crise migratória afecta diversos países europeus, seria expectável que os candidatos apresentassem estratégias concretas para enfrentar este desafio complexo. Contudo, as intervenções dos candidatos sobre esta matéria foram limitadas a soundbites superficiais e polarizados, culminando numa discordância generalizada em torno do novo pacto das migrações. Este pacto, já amplamente reconhecido como um fracasso redundante, não foi acompanhado por propostas políticas substanciais capazes de o reformar ou aprimorar. Em vez disso, os candidatos limitaram-se a criticar o status quo sem oferecer alternativas concretas.
A União Europeia enfrenta desafios significativos em termos de gestão das suas fronteiras externas e da integração de migrantes e refugiados. Discussões sobre uma política de imigração comum, a distribuição equitativa dos refugiados entre os Estados-membros e as medidas de integração social e económica são essenciais. Os debates deveriam ter explorado como a Europa pode criar um sistema de imigração mais justo e eficiente, respeitando os direitos humanos e garantindo, ao mesmo tempo, a segurança dos seus cidadãos. Este é um tema que irá afectar directamente a coesão social e a estabilidade política da União Europeia nos próximos anos.
De facto, o que seria verdadeiramente relevante ouvir por parte dos candidatos é de que forma a sua eleição poderá influenciar o debate europeu e contribuir para os interesses fundamentais de Portugal. No entanto, o que se viu foram intervenções marcadas por uma falta de substância e uma visão política europeia provincial e inadequada, incapazes de demonstrar como pretendem representar os interesses nacionais no Parlamento Europeu, enquanto contribuem para o fortalecimento e a coesão da União Europeia. A capacidade de influenciar o debate europeu em áreas cruciais como a economia, a segurança, a política externa e a sustentabilidade ambiental foi, lamentavelmente, negligenciada e relegada a segundo plano.
Pelo exposto, é patente que os debates para as eleições europeias representaram, mais uma vez, uma oportunidade desperdiçada. Ao invés de se configurarem como palcos para discussões substanciais e construtivas acerca de que futuro queremos para a União Europeia, transformaram-se em meros espectáculos de retórica política superficial. Esta falta de profundidade e visão estratégica reflecte a necessidade premente de uma abordagem mais séria e comprometida com os desafios que a Europa enfrenta na actualidade. O verdadeiro potencial dos debates foi subutilizado, deixando os eleitores com pouca clareza sobre as propostas concretas dos candidatos e sobre como estes pretendem representar eficazmente os interesses dos cidadãos europeus no Parlamento Europeu. Torna-se, pois, imperativo que os futuros debates se revistam de maior substância e se concentrem nas questões essenciais que determinarão o futuro da União Europeia, assegurando, desta forma, um verdadeiro exercício democrático e uma tomada de decisão informada por parte dos eleitores.