Creio que a opinião pública em geral pretende que os cuidados de saúde sejam de acesso universal. Poderá, no entanto, haver alguma discórdia política mais ligada aos níveis de saúde, que se querem universais e às formas de pormos em prática planos que abranjam toda a população.
A universalidade dos cuidados de saúde vai-se assumindo na história de uma forma dinâmica. Mesmo em países desenvolvidos e com uma longa história de serviço público de saúde, como o Canadá e o Reino Unido, a universalidade nunca atingiu níveis pretendidos, apresentando diferentes desempenhos em termos demográficos, continuando-se à procura de formas otimizadas de financiar e prestar cuidados de saúde universais. Os problemas acumulam-se e nenhum sistema parece perfeito. Em Portugal, como noutros países com Serviço Nacional de Saúde, temos um sistema misto que deveria ser mais considerado como tal nas políticas de saúde implementadas, com um nível de cuidados a ser garantido pelos serviços públicos e outros a serem garantidos pela oferta privada.
Os principais desafios relacionados com a cobertura universal de saúde, no que toca à sua governação, foram identificados internacionalmente e passam pela falta de coordenação intersectorial, passa pelas lacunas na capacidade de gestão e de supervisão, tanto nos ministérios da saúde dos países como no próprio campo de execução, o que inclui falhas nas práticas de contratação fundamentais, como recursos humanos, finanças e compras. Além disso, outros desafios, referem-se à ausência de ciclos de feedback de gestão, em parte devido à supervisão e capacitação limitadas nas unidades de saúde; desafios de saúde pública, como mudanças demográficas, mudanças epidemiológicas, baixa equidade e baixo produto interno bruto; a liberalização do comércio global e o aumento correspondente da carga de doenças, resultando numa maior procura por serviços de saúde; a ausência de dados integrados de profissionais de saúde, sistemas de informação de saúde abaixo do ideal, bem como o uso limitado de dados existentes; a necessidade de projetar pacotes de benefícios e priorizar certas necessidades de saúde em três dimensões, que incluem população de cobertura, serviço e custo; ineficiências na gestão de esquemas de seguros; financiamento governamental insuficiente; falta de apoio das principais partes interessadas e baixa confiança nas instalações de saúde pública. *
Em Portugal, a recente criação de uma equipa de gestão do SNS traz-nos alguma esperança de que alguns dos desafios acima mencionados possam ser enfrentados com coragem e liderança, de forma a que a universalidade dos cuidados de saúde possa ser uma realidade crescente mais ajustada às necessidades da população em geral.
*Refª Challenges to Achieving Universal Health Coverage Throughout the World: A Systematic Review, J Prev Med Public Health. 2022 Mar.