É sempre de louvar a atenção prestada à educação, não fosse ela uma questão de radical importância para qualquer sociedade, em qualquer tempo. E, nos nossos dias, a razão deste interesse é redobrada devido não só à complexidade inerente à educação, mas, sobretudo, às enormes dificuldades e desafios decorrentes das profundas e rápidas mudanças que têm vindo a acontecer nas sociedades ocidentais. Não admira, portanto, que este problema continue a atrair a atenção de educadores, professores e políticos e a mobilizar, a par da filosofia, os demais saberes, sobretudo as ciências humanas e sociais.

O Governo, através do Ministério da Educação, acaba de demonstrar que se ocupa com esta questão. Fá-lo, porém, de uma forma, no mínimo, problemática e infeliz, porque não só desrespeita o que deve ser educar, mas também, porque, extravassando as suas competências, se intromete, abusivamente, em temas que são do foro íntimo das pessoas ou da inteira responsabilidade dos pais, na educação dos seus filhos, neste caso ainda crianças.

Educar não é formatar, mas antes, baseando-se em valores e critérios éticos, despertar para aquilo que de melhor existe em cada um de nós. Numa relação interpessoal e intercomunicativa, o processo educativo deverá contribuir para o desenvolvimento harmonioso de cada pessoa, na sua pluridimensionalidade, e para o exercício de uma cidadania crítica e participativa no sentido da construção de uma cultura e de uma sociedade cada vez mais humanas.

Não parece, porém, ser por este objectivo pedagógico que se pauta o Ministério da Educação. É disso sinal evidente o documento da responsabilidade das Direcções-Gerais da Educação e da Saúde, denominado “Referencial da Educação para a Saúde”, que admite a existência de educação sexual no pré-escolar e de esclarecimento de conceitos relacionados com o aborto, no 5º Ano de escolaridade. Referindo tratar-se de um documento orientador, o facto é que se trata de uma orientação desajustada ao nível etário das crianças, contendo conteúdos inadequados àqueles alunos. Trata-se, ainda, de uma proposta impositiva e apresentada de uma forma, no mínimo enganosa, elaborada à revelia, quer do respeito pelo papel educativo dos pais, quer da possibilidade de uma efectiva participação democrática dos cidadãos, tanto mais quanto aborda questões muito problemáticas, na sociedade actual.

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Importa, assim, que os autores e os responsáveis por tal documento, no exercício da sua função, reflictam sobre as consequências das suas decisões, em matéria tão importante. Como bem salientam as actuais “teorias críticas e comunicativas” da educação, o homem a educar não é um objecto ou um instrumento; e o “mundo-da-vida” não deve ser colonizado pelo “sistema”, tornando o homem num “homem prisioneiro”.

É, ainda, de referir que a dita “revolução sexual”, a nível global, que passou da política e da economia para o sexo, pretendendo mudar o mundo de forma insidiosa, obteve pouco consenso e foi já reconhecida como muito negativa, “destruindo a liberdade em nome da liberdade”.

Deve, também já estar ultrapassado um tempo de imposição ditatorial e de monopólio do Estado, através de políticas de educação e de estratégias, ideologicamente identificáveis. O tempo actual exige participação activa e efectiva da sociedade civil e, nessa medida, diálogo entre o Estado e os cidadãos, no respeito pelas suas esferas de competência.

Assim, se esta imposição (pois é disso que se trata) do Ministério da Educação viesse a ser implementada, seria a manifestação evidente do Estado como “um aparelho de dominação”, desrespeitando não apenas os alunos e as suas famílias, mas também os demais cidadãos a quem tem a obrigação de servir, no cumprimento das normas de um autêntico Estado de Direito.

Professora Associada com Agregação (Universidade Nova de Lisboa); Doutorada em Filosofia da Educação – Educação e Desenvolvimento