Para quem tem a profissão de professor ou quem está a estudar e já usa computadores, do básico ao superior, e para os encarregados de educação dos jovens, a revolução em curso trazida pelas aplicações de Inteligência Artificial Generativa não pode nem deve passar despercebida. Não temos ainda resposta a muitas questões, mas devemos conseguir identificar não só os riscos essenciais e dar-lhes resposta, bem como as oportunidades de bom uso e explorá-las. O Luis Aguiar-Conraria escreveu esta semana no Expresso um artigo sobre o uso do chatGPT pelos alunos e os editores escolheram a frase “Muitos professores têm medo de que os alunos façam trabalhos inteiros com ChatGPT. É uma tolice.” No meio de várias ideias com as quais concordo, como a necessidade de aprender estas novas aplicações experimentando, discordo desta absolutamente e acho-a algo perigosa dita assim sem contexto. O mais curioso é que o ChatGPT também discorda de LAC. Perguntei-lhe, em inglês, onde o seu desempenho é melhor, se os alunos deveriam usar exclusivamente o ChatGPT para escrever ensaios. Como é costume responder no caso de questões polémicas foi cauteloso usando argumentos a favor e contra. A favor, ajuda a estruturar ideias  e melhora a qualidade da escrita. Pode  fornecer informação sobre questões complexas ajudando a um melhor entendimento. E, finalmente, ajuda na gestão do tempo dos alunos, leia-se ajuda a “desenrascar” quando são muitas as solicitações. Os argumentos contra são também três. Pode violar a integridade académica, as políticas de honestidade académica e consubstanciar plágio. Tendo em conta que a escrita é uma competência essencial, um uso excessivo de aplicações de Inteligência Artificial Generativa (IAGen) pode impedir os estudantes de desenvolver as suas próprias capacidades de escrita. Finalmente, o último argumento contra, chama-lhe “Originalidade” que define assim: a singularidade das perspectivas e ideias dos alunos pode ser perdida se eles se basearem apenas no conteúdo gerado pela IAGen. Conclui o ChatGPT, dizendo que um uso exclusivo não é desejável, mas trata-se de encontrar um equilíbrio entre o seu uso e o empenho na escrita dos estudantes.

É necessário encorajar os estudantes a utilizar as novas ferramentas, mostrando-lhes o seu alcance e as suas limitações. Realizei um simples teste ao ChatGPT pedindo-lhe para elaborar o syllabus de uma disciplina de economia pública. Em inglês, veio uma resposta bastante boa, com referências bibliográficas adequadas. A mesma pergunta em português, e surgiu mais  um syllabus, de pior qualidade, mas sobretudo com referências bibliográficas inexistentes, com editora e tudo. Descobri que era autor de um livro que nunca escrevi. Mas também posso ilustrar a utilidade do ChatGPT em sala de aula ocorrida nesta semana. Estava a dar os conceitos de “positive and negative feedback loops” no âmbito das alterações climáticas e pedi aos alunos para me darem um exemplo. Uma aluna consultou o ChatGPT e deu um exemplo. Analisámos, discutimos e verificou-se que estava correto.

É também necessário adaptar as formas de avaliação à IAGen e aos recursos existentes. Pessoalmente, como quero saber se estou a avaliar um ensaio de um estudante humano e não o output de um algoritmo, tive de eliminar este ano, a contragosto, os ensaios numa disciplina de mestrado com 27 alunos pois não tenho condições para discutir esses ensaios, mas mantive-os noutra turma com menos alunos. Nesta época de inteligência artificial generativa, parece-me impensável avaliar alunos sem algum tipo de interação pessoal. Precisamente para preservar os valores da integridade académica e de apreciar a “originalidade” do estudante, as suas capacidades de oralidade e estruturação de pensamento e como elas são (ou não) consistentes com o texto escrito que me foi entregue.

Um desafio essencial hoje no campo da educação é o da formação dos docentes e dos alunos na inteligência artificial generativa. Aumentar a sua literacia digital e perceber dentro das inúmeras aplicações existentes, quais as mais relevantes. Uma das mais promissoras, ao nível do ensino superior, parece-me ser o Scispace vocacionado para pesquisa bibliográfica e survey de literatura. Ao contrário do ChatGPT, que usa bases de dados desconhecidas, o Scispace responde às questões, mas com citações de artigos científicos e as respetivas ligações para os artigos originais a que se pode aceder de imediato, caso a instituição de ensino superior os subscreva. Para cada artigo é possível ter o resumo, as conclusões, a metodologia, e é possível “conversar” com o artigo.

Vamos todos usar as aplicações da inteligência artificial generativa, mas saibamos compatibilizar esse uso de forma ética com os valores que sempre regeram a comunidade académica.

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