Olá.

Nem imagino o que estás a sentir por dentro. Quer dizer, até imagino – estás numa ansiedade há já várias semanas, a contar os dias para te meteres no avião e aterrares em Portugal.

Ver a família, estar com os amigos, aproveitar tudo o que não está ao nosso alcance quando estamos fora mas que é tudo aquilo que queremos quando não o temos por perto.  Bem sabemos que nem todos saem pelas mesmas razões, basta puxar pela cabeça e lembrar-me da Joana, que saiu porque não arranjava emprego, ou do Pedro que estava farto de ganhar meia-dúzia de tostões no hospital e ainda viver em casa dos pais.

Mas não foi isso que me trouxe aqui hoje.

Sei bem o que estás a sentir porque sinto-o todos os dias. Emigrar é aquele ato de coragem que mais facilmente é ignorado ou gozado do que propriamente celebrado, o que faz crescer dentro de nós uma dúvida constante para nos levar a tentar perceber se vale mesmo a pena. Mas depois ligamos a televisão e percebemos que não havia outra saída, e voltamos a cair na realidade que levou a pegar na família, em quatro malas de 23kg – “mais que isto paga taxa”, diz a companhia aérea – e tentar a nossa sorte fora daqui.

A juntar aos medos, receios, vontades e sonhos, essa realidade é também ela muito difícil de gerir e digerir.

O ditado “Coração que não vê, coração que não sente” ganha outra dimensão porque as pessoas continuam o seu dia-a-dia – foste tu quem saiu e se afastou – e também tu te habituas, de certa forma, a viver sem eles. Quando regressas, às vezes sentes que já não é bem a mesma coisa, mas é o suficiente para te deixar feliz por vê-los, contente com o pouco que terás. Eles não sabem, mas continuam a ser das coisas mais importantes da tua vida, e só o estares ali já te faz sentir completo, ainda que te sintas meio vazio. É estranho, não é?

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Um dia li que um emigrante sente que nunca pertence a lado algum e não consigo discordar: em Londres somos os Portugueses, em Portugal somos os que vivem em Londres. E é nesse momento que começas a perceber que, desde que saíste, houve também muita gente que saiu, que se afastou, que se desligou. Ou se calhar foste tu quem se afastou e se desligou. A distância também serve para refletir – nos que só ligam quando precisam de alguma coisa, nos que estão sempre online mas nunca têm tempo para ti, mas, acima de tudo, nos que valem mesmo a pena ter por perto.

Devia haver um Manual do Emigrante, entregue no aeroporto, a explicar que uma vez pronto para partir nada mais será igual. Porque há coisas que ninguém te fala ou ensina – como a morte.

Se houve coisa que aprendi depressa e, lá está, ninguém te ensina quando emigras, é que no final de cada viagem que fazemos para visitar Portugal, nunca sabemos quem vimos pela última vez.

Despedi-me, sem saber, do meu Pai em pleno aeroporto. A última vez que nos abraçámos foi à porta das Partidas, nós rumo a Londres, ele rumo aonde já não o vemos nem tocamos nem ouvimos. E o engraçado foi que passei quase 40 anos da minha vida sem nunca perder um momento a pensar nisto. Mas a distância dá uma nova dimensão à morte. E, por consequência, à vida.

É por isso que, mesmo com mesmo que nada seja como dantes, dou por mim a querer aproveitar todos os momentos que tenho com aqueles que vejo uma, talvez duas vezes por ano. Chateio-me pouco com as coisas que dantes me chateavam muito, e tento não lhes dar o peso que noutra altura lhes daria. Afinal de contas, quem me garante a mim que este é a última vez que vejo A, B ou C?

Por isso, aproveita e relaxa. Faz o que gostas. Se para ti gostar é estar quieto a olhar para a Ilha do Pessegueiro enquanto o Sol se põe, faz. Se é ter minis, tremoços e chouriço, faz. Faças o que fizeres, aproveita este tempo que nos deram.

Abraça, beija, salta, olha, sorri, sente, respira, dança – vive! Porque o importante é perceberes que no próximo mês, Portugal é teu.