Há cerca de uma semana, durante os debates sobre a especialidade do orçamento de estado, a deputada Rita Matias foi interrompida durante a sua intervenção pelo deputado do PSD Carlos Reis. Rita responde chamando a atenção da mesa para a  interrupção indevida. Até aí tudo nos conformes e nada de novo, quem acompanha o canal da Assembleia da República já se habituou ao ritmo dickensiano dos debates parlamentares, onde uma diversidade de personagens se envolvem em enredos dantescos e qualquer pessoa sã pensará que chegou ao nono círculo do Inferno. Notei no entanto algo de peculiar na sua resposta, em que dizia não admitir ser interrompida “ainda menos por um homem!”. Et tu, Rita? Passo a explicar.

O ambiente de constante atrito entre homens e mulheres no mundo académico é infelizmente uma realidade diária a que me habituei durante os meus tempos de estudante e assalariado tanto na University College London, como na University of Edinburgh. Esse tópico é em si material para dois artigos e um filme. Mas em resumo: a esquerda conceptualizou que o homem é a constante opressão da mulher.

Quando as mulheres dominam o número de doutoramentos em Biologia (incluindo Neurociências, a minha área), nada a declarar. Mas se são os homens a dominar as Engenharias, então precisamos urgentemente de mais incentivos e bolsas para mulheres. Se um estudo (caso real) sai que demonstra que as mulheres entrevistadas para certos empregos científicos são contratadas em maior número, é porque são melhores a ser entrevistadas. Mas se (caso real) as mulheres falam menos nas reuniões, aí temos de fazer tudo para chegar a paridade, não se pode sequer por a possibilidade de os homens terem o mérito de intervir e trazer mais ideias, por exemplo. Tem que se assumir que é porque silenciam as mulheres com a sua agressividade, preconceito subconsciente ou mesmo caneladas por baixo da mesa.

Fui um rapaz tímido quando era mais novo, e tive de aprender a ter a coragem e tenacidade para participar e discutir ideias em reuniões e grupos de discussão. Se tivesse tido essa mentalidade de vítima nunca teria conseguido progredir e ensinar na faculdade. Roçaria o absurdo culpar outrem.

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Este estatuto do homem culpado até prova de inocência (com data de julgamento adiada para as calendas gregas) também é abundante em empresas de biotecnologia para quem, e com quem trabalhei. Para qualquer lado que me vire na vida profissional sou o pecado original e um vilão grotesco preparado para reprimir a primeira colega que me aparecer à frente. Isto sem, obviamente, ter feito nada disso, e tendo trabalhado maioritariamente com mulheres. A maioria dos meus superiores foi mulher e, imagine-se, dávamos bem e nunca tive problemas em seguir ordens e conselhos de uma mulher. Também acompanhei várias estudantes nos seus projectos de laboratório e sempre as tratei com justiça e sem assumir inferioridade alguma.

E o que tem a ver o parágrafo acima com a situação que espoletou este artigo? Sou cientista, e não um político, politólogo ou militante partidário. Como eleitor, tenho tempo limitado para entender os detalhes sobre se o IVA aqui e ali deve aumentar, ou se devemos taxar indivíduos chamados Tiago quando escrevem artigos sobre mulheres. Mas comecei a prestar mais atenção recentemente quando deputadas como a Rita se começaram a manifestar contra os exageros marxistas da extrema esquerda, incluindo questionar a falácia da disparidade salarial, questionar que a pequena percentagem de mulheres em áreas de engenharia se deve a misoginia e estruturas patriarcais que impedem a Márcia de pegar num computador e aprender código. Consequentemente, comecei a seguir a política em Portugal. Nasceu a esperança de que o discurso de extrema esquerda a propósito da relação entre homens e mulheres se dissipasse e desse lugar a discussões mutuamente benéficas, incluindo na área da neurociência e biotecnologia.

Infelizmente, veio então há uns dias este tal “ainda menos por um homem!”. Parece que não há fim a este ciclo redutor de conceptualização do homem como objecto sedento de uma oportunidade de interromper, desrespeitar uma mulher, pois como se atrevem elas agora a usar lógica e competência?

Vindo da extrema esquerda agressiva nas universidades já me habituei, mas também a direita com este discurso?

Pede-se aqui um pouco de pensamento estatístico. Se o deputado Carlos Reis interrompesse 101 deputados, e fossem todos mulher, aí sim teríamos um resultado robusto que sugeriria que Carlos Reis tinha um traço de personalidade misógino, ou sem rodeios, seria misógino. Mas estamos a falar de um acontecimento. Quantas vezes não terá Carlos Reis gritado a André Ventura, ou a Pedro Pinto? Até evidência em contrário, Carlos Reis fez o que muitos deputados fazem diariamente, e fê-lo pelo conteúdo do discurso, e não por ser Rita a proferir dito discurso. Os políticos têm que começar a ser mais científicos como avaliam as situações. E se falham nisto, posso confiar que apliquem pensamento estatístico e idóneo nas políticas que defendem?

Esperava melhor de uma deputada que repetidamente se diz conservadora e anti woke. Este tipo de atitude, em que o homem é o bicho papão da mulher, trouxe de volta o sentimento que tenho tido de constante demonização na esfera profissional. Também a Rita parece cair no engodo da guerra dos sexos. Então se o interruptor fosse uma pessoa que menstrua, seria menos mau? Estamos de volta ao paradigma de que os homens não se conseguem conter, e como veem a mulher em ascensão social querem cortar a palavra às mulheres, para que a mulher fique no pano de fundo da sociedade. Confundem-me estas atitudes por parte dos políticos. Porque não conseguem manter consistência com as suas crenças e valores? E se não os tem, não os defendam.

Durante milénios os homens e mulheres encontraram o caminho, caminhando. Ao contrário de revisionismos recentes, a maioria dos homens nunca quis oprimir as mulheres como um todo. Claro que houve disparidades acentuadas em certas épocas e contextos sociais, bem ilustrado na prosa de George Eliot, mas também houve união e mútua ajuda, como na prosa de Dickens e excepcionalmente visível em filmes como Do Céu Caiu Uma Estrela (“It’s a Wonderful Life”).

Vivemos em tempos interessantes. A missão quixotesca das feministas woke não parece poupar ninguém, e apodera-se das melhores. Os homens são a oferta inesgotável de moinhos.

Na minha relativamente humilde opinião, a deputada Rita Matias continua a ser uma das melhores deputadas portuguesas, e melhor que a maioria dos deputados britânicos. Este artigo não tem como objetivo criticar a sua competência como deputada eleita democraticamente. Nem denegrir o Chega, para isso já muita tinta foi gasta, muita dela injustamente. Mas custa ver o envenenamento da guerra dos sexos atingir os melhores.

O eleitorado precisa de descanso deste ataque constante aos homens. Precisamos que deputadas como a Rita tenham o compasso moral de Roger Scruton e Christina Hoff-Sommers, e não o de Kate Smurthwaite ou, Deus nos perdoe, Keir Starmer. Pescadora de gostos no TikTok e X, que se torne pescadora de seres humanos, incluindo os homens, mostrando que de facto estamos juntos  A Direita precisa de verdade e repúdio a esta divisão entre homem e mulher.