A fase pós-Covid foi muito importante para a evolução da utilização no mercado dos pagamentos na Europa. Em Portugal, por exemplo, o ecossistema foi marcado pelo sucesso do wallet MB Way, lançado por SIBS em 2015 e que superou os 5 milhões de utilizadores este verão. Outros sucessos relevantes foram o wallet Bizum em Espanha (24 milhões de utilizadores) e o cartão contactless em vários países da Europa, como na França, graças às incitações das instituções para evitar o pagamento “cash”. Estas realidades confirmam que o mercado dos pagamentos europeu vive actualmente um novo capítulo da sua história, caracterizado pelo desenvolvimento dos usos eletrónicos. Apesar desta situação, certos consumidores não estão prontos a adoptar o pagamento “cashless”.

O white paper “Paiement et inclusion numérique: état de l’art”*, publicado este mês de Setembro, mostra que vários tipos de consumidores têm dificuldades em adoptar os novos meios de pagamento, como certas pessoas idosas que viveram a maioria da vida sem Internet, os jovens precários ou as pessoas que vivem em zonas com pouca conexão à Internet. Elemento também relevante: em alguns países da Europa, como França, certas pessoas com equipamento e capacidades para usar o pagamento eletrónico recuzam fazê-lo por motivos ligados à privacidade ou à ecologia. As observações dos profissionais dos pagamentos mostram que estes consumidores não têm de estar de parte e devem ser acompanhados para que possam beneficiar das inovações, caso estejam interessados. Assim, segundo vários profissionais, o ecossistema não pode “forçar” a população a adoptar os instrumentos electrónicos (e é por isso que o “full electrónico” dificilmente será possível) mas tem de acompanhar estes consumidores com medidas específicas.

Outra observação interessante que sobressai no white paper é o nível de preocupação do ecossistema sobre este assunto. Assim, lembramos que a diretiva europeia sobre a acessibilidade, prevista para 2025, levou a ações sobre este assunto ligadas aos consumidores deficientes. Mas as ações não se limitam a este tema. Todos os atores do mercado têm uma implicação forte sobre a inclusão digital, convencidos de que é um assunto determinante para o futuro dos pagamentos na Europa. O estudo mostra que os profissionais ligam o assunto da inclusão digital a uma “responsabilidade partilhada”, o que significa que todos os atores do ecossistema têm lugar importante nesta reflexão, que deve ser integrada em todos os projetos, desde o princípio dos trabalhos. A inclusão digital “by design” aparece assim como outra ideia forte do mercado.

Que consequências tem para as estratégias dos atores dos pagamentos? Esta integração da inclusão digital como elemento forte do futuro dos pagamentos leva a ações individuais e institucionais, quer seja nos mercados nacionais, ou a nível europeu. Em França, por exemplo, o Comité National des Moyens de Paiement (CNMP) definiu no final de 2022 um plano estratégico sobre a acessibilidade dos pagamentos. Os Paises-Baixos também integraram a inclusão no plano estratégico dos meios de pagamento. Na Itália, a inclusão digital é um assunto institucional onde o papel dos bancos é determinante. Em Portugal, pode sobressair a estratégia do Forum para os sistemas de pagamento para 2020-2022, com a informação e a comunicação constituindo o pilar número 1 para favorecer a evolução do uso. Apesar destas iniciativas determinantes, vários profissionais concordam com a necessidade de realizar um trabalho mais profundo sobre a “financial literacy”: comunicar é uma boa base, mas desenvolver os conhecimentos financeiros é essencial para assegurar uma real evolução na maturidade nos pagamentos.

Outro assunto capital para a inclusão digital nos pagamentos é a harmonização europeia. De facto, como em muitos assuntos ligados aos pagamentos, a fragmentação das estratégias é importante na Europa, apesar de o tema estar presente em todos os países.

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