O indevido uso e aproveitamento do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) por parte do Governo é algo que me tem causado grande perplexidade.
O FEFSS é um fundo de emergência gerido pelo Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social (IGFCSS) que tem como objetivo assegurar a estabilidade da Segurança Social (SS) perante uma situação de crise, cobrindo as despesas previstas por um período mínimo de 2 anos (artigo 16º, nº 2 do Decreto-Lei n.º 367/2007)
O IGFCSS, nos termos do Decreto-Lei n.º 203/2012, é definido como uma pessoa coletiva de direito público, dotado de autonomia administrativa, financeira e patrimonial. No entanto, o FEFSS está obrigado pelo Governo a investir no mínimo 50% do seu capital em títulos de dívida pública portuguesa ou outros títulos garantidos pelo Estado português, conforme estabelece o artigo 4º, n.º 3, alínea a) da Portaria n.º 1273/2004, de 7 de outubro – o que parece retirar, à partida, a tal autonomia deste instituto público.
A minha preocupação é que o FEFSS, que deveria servir como um pilar de sustentabilidade para o sistema da SS em tempos de crise, está a ser desviado para financiar o Orçamento de Estado através da obrigatoriedade de compra de dívida pública portuguesa. Ou seja, em vez de o IGFCSS poder optar por investimentos mais vantajosos que poderiam garantir melhores retornos para o FEFSS, o fundo acaba, na prática, a funcionar como um “balão de oxigénio” para as contas públicas.
Quando o FEFSS investe em dívida pública portuguesa por obrigatoriedade em vez de explorar alternativas mais rentáveis por opção, o Governo está, efetivamente, a cobrar um imposto disfarçado sobre as nossas contribuições. Se o retorno deste investimento na dívida pública portuguesa for negativo, a existência deste imposto camuflado torna-se ainda mais evidente. E a verdade é que, devido a esta restrição governamental, o FEFSS terá já perdido 3 mil milhões de euros desde 2018, tal como noticiado pelo Jornal de Negócios.
A lei é clara quando define os objetivos do fundo e o seu caráter de reserva de emergência e, por essa razão, o FEFSS não pode andar a servir de bengala dos sucessivos Orçamentos de Estado, desviando-se do seu propósito estipulado pela lei.
Os portugueses, quando fazem as suas contribuições para a SS, pensam que, conforme estipulado por lei, uma parte está a ser investida no fundo de emergência. No entanto, os Governos estão a usá-las para fins completamente diferentes.
Cada euro desviado é uma clara violação do propósito do fundo e um abuso da boa-fé dos contribuintes.
Sucintamente, o povo português acordou, por meio da força legislativa, pagar um determinado valor de IRS, e esse é o dinheiro que sai dos bolsos dos portugueses para o Orçamento de Estado. Outra coisa são as contribuições para a SS que pagamos na esperança de vir a receber uma reforma (lógica de serviço), mas o que acontece é que o Governo retira ilegitimamente dinheiro que não deveria movimentar e redireciona-o em benefício próprio.
Trata-se de um ato de puro aproveitamento político, que acaba por se diluir na opinião pública, tentando justificar-se pelo aumento de receita do OE, que, por sua vez, se traduz em mais investimento público – à custa da descapitalização do FEFSS.
Em termos mais simples, é como se tivesse tido uma reunião de condomínio em que todos concordaram construir um elevador, pois estavam a entrar numa idade avançada e subir escadas tornar-se-ia mais complicado. No entanto, depois de pagar as suas quotas, descobre que o administrador usou esse dinheiro para pintar a velha fachada do prédio. Agora, ficou sem o elevador e sem o dinheiro que investiu, mas com uma nova fachada – admite a tomada de decisão do administrador?